agosto 31, 2015

Que Horas Ela Volta? (CINEMA & MOVIMENTO)

PICICA: "Se em “Casa Grande” (2014), de Fellipe Barbosa a voz dissonante gritando as diferenças sociais e os temores era a classe dominante, em “Que Horas Ela Volta?” de Anna Muylaert o lugar de onde se fala é o da classe dominada. O filme é cheio de atravessamentos,  as questões sociais é a linha que costura a trama e faz uma radiografia dos muros invisíveis construídos pelas classes instituídas, silenciosamente. E ainda mergulha de cabeça na questão das políticas públicas de inclusão social."

Que Horas Ela Volta?


Que Horas Ela Volta? (Drama); Elenco: Regina Casé, Michel Joelsas, Camila Márdila, Karine Teles; Direção: Anna Muylaert; Brasil, 2015. 112 Min.


Se em “Casa Grande” (2014), de Fellipe Barbosa a voz dissonante gritando as diferenças sociais e os temores era a classe dominante, em “Que Horas Ela Volta?” de Anna Muylaert o lugar de onde se fala é o da classe dominada. O filme é cheio de atravessamentos,  as questões sociais é a linha que costura a trama e faz uma radiografia dos muros invisíveis construídos pelas classes instituídas, silenciosamente. E ainda mergulha de cabeça na questão das políticas públicas de inclusão social.


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O enredo faz uma ligação cultural entre São Paulo e Pernambuco. Uma babá pernambucana, Val (Regina Casé) que trabalha para uma família abastada de São Paulo, cria o filho de seus patrões, Fabinho (Michel Joelsas) mas não pode criar a sua própria filha, Jéssica (Camila Mádila),  que vive em Recife com familiares, a troco de um contribuição mensal que Val os envia.  Até que um dia Jéssica decide fazer vestibular para arquitetura na FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP) e precisa de um lugar para ficar em São Paulo enquanto faz as provas de seleção do concurso. Liga para a mãe, a quem não vê há dez anos, e pede para se hospedar na casa dela. Val mora na casa dos patrões e, é ai que a história se desenrola com uma sutileza de situações do cotidiano que pede para o roteiro ser aplaudido de pé: o sorvete da geladeira, o quarto de hóspedes, o uso da piscina, o lugar de fazer as refeições e o polimento dos discursos hipócritas.

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O longa dirigido e roteirizado por Anna Muylaert faz um passeio pelas diferenças/distâncias e muros pautado pela trilha sonora: o forró e a Bossa Nova; pela planta da casa: o quarto de empregada e o quarto de hóspedes; pelas expressões de geografia espacial da casa: da cozinha pra lá/da cozinha pra cá. O roteiro é uma viagem pelos dois mundos sociais dentro de uma mesma casa: a maneira de falar, a maneira de raciocinar e entender o dito. Os signos metafóricos de adonamento da própria vida, de tomada de rédeas da jornada da existência, a singeleza e a dureza da transgressão e seus profundos significados.


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Anna Muylaert é conhecida pelo roteiro de “O Ano Em Que  Meus Pais Saíram de Férias” (2006) e a direção de “É Proibido Fumar” (2009). A trilha sonora de Vítor Araújo costura o muro das relações sociais, a fotografia de bárbara Alvarez de “Boa Sorte” (2014) une esses  mundos: o sol, a luz, as cores brilham em ambos os lados. Quanto as atuações, Camila Márdila, de “O Outro Lado do Paraíso” (2014)  ganhou o prêmio do júri dos Festival de Sundance de melhor atriz coadjuvante, Karine Teles de “Madame Satã” (2002) e “Lobo Atrás da Porta” (2013) está soberba no papel de bárbara, a patroa. Mas o destaque fica para Regina Casé que abocanhou o prêmio do Juri do Festival de Sundance de melhor Atriz, e está na medida, nem se empolga na improvisação, nem se aquieta num papel contido como é o de Val. Sua interação vocabular com o regionalismo pernambucano vai para além do sotaque, está nas expressões não tão conhecidas que ela faz uso com propriedade.


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O que nos faz pensar o quanto não sabemos ou não notamos do talento de nossos atores. Regina é mais conhecida pelos filmes voltados para comédia, pela série TV Pirata e apresentações de programas televisivos, e a gente esqueceu que Regina atuou em 19  filmes para cinema, dentre eles alguns premiados e reconhecidos internacionalmente como: “Marvada Carne” (1985) de André Klotzel; “Luar Sobre Parador” (1988) de Paul Mazursky – indicado a dois globos de ouro – e “Eu, Tu, Eles” (2000) de Andrucha Waddington. Dizem que as atuações de Regina Casé são variações dela mesma, mas fazer o quê se a mulher é múltipla. O estilo da atriz é a representação genuína dessa diversidade cultural brasileira e a cara da periferia, sem sê-lo.


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‘The Second Mother” ( a versão em inglês do título) já esta sendo apontado como uma possibilidade brasileira ao Oscar 2016 de melhor filme estrangeiro. Know how já tem, abocanhou os prêmios CICAE e o Panorama do Festival de Berlim 2015 para Anna Muylaert e o prêmio do júri de melhor roteiro no festival  RiverRun. Agora, imaginemos por um minuto, (passados todos os trâmites) a possibilidade de o primeiro Oscar brasileiro vir de um filme dirigido por uma mulher e estrelado por Regina Casé… mais subversão da ordem impossível.


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O filme nacional que foi notícia no Festival de Berlim e Sundance é um primor em reflexões sobre os aspectos sociais, políticos e existenciais, com uma linguagem fácil, diálogos engraçados e inteligentes e cheio de transgressões contidas e altamente significativas. Magistral!


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Homenagem à indgnação, de Rodrigo Roal

PICICA: Inspirados pelos recentes levantes do mundo árabe, como os da praça Tahrir, no Egito, em 15 de maio de 2011, em um movimento popular, expontâneo e "viral", jovens espanhóis, assolados pelos baixos salários e pelo desemprego, acamparam na praça Porta do Sol, em Madri. Preparados por anos de estudo, fruidores, produtores e difusores de informação, assim como seus congêneres africanos, a partir da praça os manifestantes montaram acampamento, organizaram comissões e deflagraram uma onda de protestos pacíficos, batizada de movimento “INDIGNADOS”, ou 15M. 

Leia mais aqui. 

A sociedade contra o Estado e o Mercado. POR Moysés Pinto Neto

PICICA: "De todos os problemas que percorrem o diagnóstico dessa crise política talvez o mais grave seja que boa parte dos seus analistas — especialmente aqueles atrelados ao governismo wishful thinking —  não consegue a visualizar senão sob o manto do golpismo ou de algum tipo de arranjo conspiratório contra algo que era positivo. Ou seja, o grande problema dessas análises é que não se deram conta que boa parte da crise política está ligada ao fracasso das suas próprias ideias, e não apenas a um contragolpe baixo do inimigo. Intelectuais como André Singer e Bresser-Pereira, por exemplo, que foram verdadeiros “pensadores” do governismo atual e sustentaram o bloco de iniciativas que norteou o primeiro mandato de Dilma não conseguem entender que a crise atual não é apenas uma contingência momentânea da conjuntura política, mas um fracasso geral da matriz produtivista, industrialista e tecnocrática, apelidada por essas bandas de “neodesenvolvimentismo”, em relação ao mundo do século XXI. Eles continuam interpretando Dilma por vezes até como “estadista” e colocam a culpa no mercado financeiro e na mídia, sem cogitar que o erro possa estar no projeto no qual suas próprias ideias servem de base."

A sociedade contra o Estado e o Mercado




Pierre Clastres e os índios

De todos os problemas que percorrem o diagnóstico dessa crise política talvez o mais grave seja que boa parte dos seus analistas — especialmente aqueles atrelados ao governismo wishful thinking —  não consegue a visualizar senão sob o manto do golpismo ou de algum tipo de arranjo conspiratório contra algo que era positivo. Ou seja, o grande problema dessas análises é que não se deram conta que boa parte da crise política está ligada ao fracasso das suas próprias ideias, e não apenas a um contragolpe baixo do inimigo. Intelectuais como André Singer e Bresser-Pereira, por exemplo, que foram verdadeiros “pensadores” do governismo atual e sustentaram o bloco de iniciativas que norteou o primeiro mandato de Dilma não conseguem entender que a crise atual não é apenas uma contingência momentânea da conjuntura política, mas um fracasso geral da matriz produtivista, industrialista e tecnocrática, apelidada por essas bandas de “neodesenvolvimentismo”, em relação ao mundo do século XXI. Eles continuam interpretando Dilma por vezes até como “estadista” e colocam a culpa no mercado financeiro e na mídia, sem cogitar que o erro possa estar no projeto no qual suas próprias ideias servem de base.

O reflexo simétrico desse campo desorientado de análises “espetacularmente erradas” é o surgimento de uma “nova direita” inspirada profundamente em valores liberais e apoiada no amplo material dos think tanks norte-americanos disponível na net. O campo discursivo é construído de forma completamente artificial, importando conceitos e análises de modo totalmente descontextualizado. Trabalhos como por exemplo o de Alberto Carlos Almeida ou mesmo de Roberto DaMatta, que fazem uma comparação interessante (não sem controvérsias) entre brasileiros e norte-americanos, são totalmente ignorados em nome de um pensamento que projeta sobre as manifestações um desejo de “menos Estado, mais mercado”, ou a luta dos “microempresários” contra os impostos. Que isso tenha pouca relação com a mentalidade efetiva da sociedade brasileira é, para essa visão, apenas um detalhe, pois afinal se sabe que o “homem comum” desse tipo de liberalismo é apenas a projeção de um ethos específico elevado à condição de universalidade. Quando falam em nome do “homem comum” estão apenas reproduzindo o discurso de uma fatia minúscula da sociedade que incorporou esses valores e mimetiza — de maneira que não posso evitar chamar de colonizada — as ideias norte-americanas. A obsessão contra o pensamento de Marx e Paulo Freire é pautada na ignorância: não se deve ensinar isso!, como se a educação fosse doutrinação e debater um autor significasse, simultaneamente, defender suas ideias. Com isso, só conseguem confessar involuntariamente seus próprios métodos e a forma como encaram a relação com a teoria e a manipulação. No seu nível máximo que felizmente não é tão popular, esse obscurantismo chega ao ponto de importar a polêmica oca entre evolucionismo e design inteligente, fazendo eco aos fundamentalistas cristãos que disseminam apenas pela mídia a falsa polêmica [um texto sobre o assunto, p.ex., não passa por comitês científicos de periódicos]. A UTI desse pensamento é o ceticismo contra as mudanças climáticas, hoje representado por uma fração minúscula diante de um consenso avassalador no campo científico.
Curiosamente, o ponto de encontro entre esses dois pensamentos é a total desconsideração da questão ecológica e do mundo sob o signo do Antropoceno. Tanto os neodesenvolvimentistas quanto os liberais mantêm a visão de que a ecologia é uma “externalidade” em relação à economia, convergindo para um aceleracionismo que supõe possíveis mudanças tecnológicas capazes de sustentar o crescimento ao infinito sem destruir a Terra. E aqui, obviamente, está o outro ponto de encontro: ambos discursos são francamente etnocêntricos e projetam um modelo unidimensional de desenvolvimento, disputando apenas se o instrumento principal será o Estado ou o mercado. A pobreza antropológica é consubstancial a um pensamento incapaz de compreender a multiplicidade ontológica que produz uma variação de mundos para além do projeto ocidental, simplesmente não prevendo espaço para outras formas de vida que não aquela do consumismo. No limite e observado o caso brasileiro, os dois pensamentos convergem para a ameaça ecológica sobre a Terra e o etnocídio das culturas indígenas.

Essa coincidência — que converte no desprezo pela antropologia e na pobreza da subjetivação baseada no consumo — pode ser explicação para a crise política na sociedade brasileira. O estado precário do imaginário político intelectual se reflete na crise das instituições e dos projetos.


Em 2013, a falta de uma resposta mais convincente iniciou o ocaso do lulismo. Mas esse problema é mais profundo que parece. Na verdade, o lulismo não consistiu apenas numa política bem-sucedida de conciliação de classes do “pacto conservador” de enriquecer ricos e pobres contemplando as demandas do sistema financeiro, estímulo ao agronegócio nas exportações de commodities compensadas com medidas distributivas de renda, como o viés economicista tem sustentado. Ali estava um rearranjo que foi muito além do que o imaginário petista era capaz de especular. As forças criativas da sociedade brasileira foram liberadas e um povo a quem poucas vezes foi dada chance de emergir apareceu. A multiplicidade que percorre formas jurídicas, econômicas e tradições culturais estoura as previsões e mostra o caldo reprimido — e desperdiçado — ao longo do último século vinda de uma formação heterogênea em vozes plurais. A gestão Gil/Ferreira no Ministério da Cultura, despertando a criatividade local a partir dos pontos de cultura, é o exemplo mais emblemático desse processo. Mas não só. No meio ambiente, por exemplo, o Brasil de repente aparecia como uma alternativa socioambiental ao modelo baseado no petróleo e poderia ocupar o espaço de experimentação de uma nova matriz energética. A demarcação de terras indígenas ampliava o espaço ambiental dos povos e permitia seu reflorescimento, com a religação do Brasil com suas tradições ancestrais, refazendo o caminho recalcado pela conquista. O “povo brasileiro” que Darcy Ribeiro tantas vezes saudou aparecia em toda sua multiplicidade e criatividade.

Rapidamente, no entanto, o dogmatismo corroeu esses arranjos inesperados e substituiu por uma visão padronizada do progresso e do crescimento. Com o sucesso do lulismo, começa o debate pela “fase 2”, que é sugado pelo neodesenvolvimentismo fundado no economicismo uspiano. A obsessão contra o “neoliberalismo” fez depositarem sobre o Estado um papel indutor e de comando vertical sobre a sociedade, entregando a um complexo burocrático-oligopolista o controle do país. O governo torna-se cada vez mais unidimensional, transitando do modelo do fomento criativo e despertar da autonomia, cujas matrizes eram o Bolsa-Família e os pontos de cultura, para uma visão vertical e tecnocrática em conluio com os “supercampeões” (empreiteiras, especialmente), traçando uma nova matriz a partir do PAC e do Minha Casa Minha Vida. Neste último caso, o foco do projeto não é a energia criativa que brota das comunidades, possibilitando a autonomia e adaptação às condições locais e a invenção de novas possibilidades urbano-ecológicas na construção de moradia, mas o modelo ultrapassadíssimo e hoje diagnosticado universalmente como horrendo dos arranha-céus, das autopistas, das remoções e das gentrificações que se impõe. O “pós-neoliberalismo” defendido pelos ideólogos do governo renova a idolatria no Estado e procura executar — a despeito de todos os limites ambientais e da pluralidade da sociedade brasileira — o programa de crescimento do século XX.

Tudo isso mostra o ocaso de um certo modelo de esquerda que precisa revisar seus dogmas no mínimo desde 1968. A crença no Estado não é melhor que a crença no mercado. Parece que ninguém se deu o trabalho de ler Pierre Clastres, por exemplo, para entender que é possível pensar em uma sociedade que não seja o “mercado” composto de indivíduos utilitaristas e, ao mesmo tempo, seja capaz de uma ação coletiva sem cair na burocracia estatal. O que o lulismo involuntariamente despertara fora exatamente essa sociedade selvagem, repleta de energia criativa, que oferece novas alternativas sem precisar cair nas dualidades infernais do século XX. Tudo isso foi subestimado pelos burocratas do PT, que só conseguem enxergar o mundo em duas cores: ou o Estado — que remete ao socialismo — ou o mercado — que remete ao neoliberalismo. A sociedade, que não é Estado nem mercado liberal, no entanto, despertou e mostrou seu rosto em 2013. Ela não é monolítica nem utilitarista, nem conservadora nem progressista, mas múltipla e indomesticável. Aliás, a sociedade unifica seu inimigo na medida em que sabe que ambos — Estado e mercado — sempre andam juntos. Os liberais sabem que dependem do Estado para assegurar o principal dos direitos no seu imaginário: a propriedade privada. Os estatistas, igualmente, sabem que o Estado hoje é um grande mercado comandado pelos oligopólios econômicos, como o próprio caso brasileiro demonstra. Ambos vendem suas versões como se fossem as únicas e inevitáveis, sem que seja possível encontrar uma linha de fuga capaz de exceder esse jogo batido. A sociedade, no entanto, sabe que existe essa saída. A todo momento brotam experimentações que são criadas pelos mais variados sujeitos a reinventar permanentemente a noção de espaço coletivo, de festa e escola, de natureza e desenvolvimento, traçando alternativas econômicas, políticas e ecológicas ao binômio Estado/mercado e sua lógica do capitalismo consumista e da burocracia desligada da sociedade. Desenhar essa alternativa passa por uma descolonização geral do pensamento, livrar-se dos complexos de subdesenvolvimento e inferioridade. O mundo hoje respira por aparelhos e os dilemas da Europa com Syriza e Podemos parecem mostrar o quanto esse brete exige uma alternativa que poderia brotar daqui mesmo, com os coletivos de ocupação, a luta contra a obsolescência programada, a vida pautada em outros motivos que não o dinheiro, a alimentação pautada na saúde, na variedade e na qualidade. Ao contrário do que se pensa, nada disso é exclusividade de uma "minoria esclarecida", mas desejo de muitos que não se veem representados pela falta de ousadia dos projetos do Estado-mercado. Trata-se sim de uma utopia que muitos desejariam embarcar.

Fonte: MEDIUM

Na comunidade das frustrações, por Diego Viana

PICICA: "Um mês agitado para um ano agitado. Tivemos manifestações, denúncias formais, guerra de narrativas, dança de cadeiras, mas continuamos na incerteza sobre quem despachará do Planalto em 2016. Voltamos a experimentar a combinação sufocante de desemprego em alta, poder de compra em baixa e câmbio proibitivo, enquanto as medidas destinadas a recolocar a economia nos trilhos parecem ter o efeito contrário. Em que pese tudo isso, a constatação mais interessante de agosto de 2015 é provavelmente o vigor daquilo que poderíamos denominar, sem hesitação, a classe dominante do Brasil – mas com artigo definido: “a” classe dominante.

Sabemos que ela existe; sempre há algo como uma classe dominante, e não é só aqui. Podemos até descrevê-la, apontar quem faz parte dela, citar o latifúndio, as “doze famílias” da mídia – se é que são mesmo doze –, os industriais de São Paulo, o sistema financeiro. Mas não é todo dia que a vemos em ação, mobilizada em um esforço concentrado, com a cara à mostra. No mínimo, é instrutivo. E também sintomático.

Como se sabe, os itens a serem levados ao parlamento sob o título de “Agenda Brasil” – note-se como o nome, deliberadamente, não denota coisa alguma (fora o anglicismo) – resultam de uma concertação ágil e veloz. Segundo consta, a iniciativa partiu dos proprietários do maior grupo de comunicação do país, envolveu as entidades de classe do setor produtivo no Sudeste, também abarcou as confederações de indústria e agronegócio, e por fim foi costurado pelo presidente do Senado, em diálogo direto com o ministro da Fazenda. Talvez essa seqüência esteja trocada, mas que importa? O dado relevante é vermos mídia, indústria, agronegócio, dinastias políticas, todos amalgamados e abençoados pelo sistema financeiro."

Na comunidade das frustrações


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Um mês agitado para um ano agitado. Tivemos manifestações, denúncias formais, guerra de narrativas, dança de cadeiras, mas continuamos na incerteza sobre quem despachará do Planalto em 2016. Voltamos a experimentar a combinação sufocante de desemprego em alta, poder de compra em baixa e câmbio proibitivo, enquanto as medidas destinadas a recolocar a economia nos trilhos parecem ter o efeito contrário. Em que pese tudo isso, a constatação mais interessante de agosto de 2015 é provavelmente o vigor daquilo que poderíamos denominar, sem hesitação, a classe dominante do Brasil – mas com artigo definido: “a” classe dominante.

Sabemos que ela existe; sempre há algo como uma classe dominante, e não é só aqui. Podemos até descrevê-la, apontar quem faz parte dela, citar o latifúndio, as “doze famílias” da mídia – se é que são mesmo doze –, os industriais de São Paulo, o sistema financeiro. Mas não é todo dia que a vemos em ação, mobilizada em um esforço concentrado, com a cara à mostra. No mínimo, é instrutivo. E também sintomático.

Como se sabe, os itens a serem levados ao parlamento sob o título de “Agenda Brasil” – note-se como o nome, deliberadamente, não denota coisa alguma (fora o anglicismo) – resultam de uma concertação ágil e veloz. Segundo consta, a iniciativa partiu dos proprietários do maior grupo de comunicação do país, envolveu as entidades de classe do setor produtivo no Sudeste, também abarcou as confederações de indústria e agronegócio, e por fim foi costurado pelo presidente do Senado, em diálogo direto com o ministro da Fazenda. Talvez essa seqüência esteja trocada, mas que importa? O dado relevante é vermos mídia, indústria, agronegócio, dinastias políticas, todos amalgamados e abençoados pelo sistema financeiro.

O que convenceu esse conjunto de poderosos a deixar os bastidores, mesmo que momentaneamente, parece ter sido a bagunça (e essa é realmente a melhor palavra) da conjuntura política. Nada garante que essa bagunça vá se dissipar, já que não temos motivos para achar que a cúpula do Executivo vai aprender a fazer política da noite para o dia – depois de tanto tempo?! E com a saída de Michel Temer da articulação política, essa hipótese parece ainda mais absurda. O que significa que mesmo o acordão de cúpula pode ruir, a depender da sorte de Dilma Rousseff com o TCU e o destino que esteja reservado para Eduardo Cunha – que já deu mostras de que quer sabotar também esse acordão, comprando briga com os poderosos que estão incomodados com ele.

Isso para não falar da economia…

Ainda assim, pode ser amargo, mas também é interessante observar à distância a destreza e a desenvoltura com que nossa classe dominante age e decide o futuro do país, quando julga necessário. Uma desenvoltura que ficou intocada nesses 27 anos de Nova República, sem sofrer um arranhão sequer desde a adoção da Constituição de 1988, nem com os avanços atribuídos aos tucanos, como o Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal, nem com aqueles atribuídos aos petistas, como a inclusão de renda e a expansão do mercado interno.

* *

Se, por um lado, possuir uma classe dominante que paira impávida acima do sistema político está longe de ser algo aberrante – basta ver o que se passou nos EUA e na Europa desde a crise de 2008 –, por outro também parece que estamos assistindo a um evento com cara e cheiro de Brasil. Da dissolução da primeira constituinte em 1823 à proclamação da República, da reforma urbana de Pereira Passos à revolução de 30, do Estado Novo às cassações de 1964 e ao AI-5, decisões verticais em momentos graves são recorrentes.1

Os itens divulgados da tal agenda, em suas diferentes versões e mesmo ainda na forma de meras intenções, são talhados com toda a clareza para satisfazer a interesses, muitos deles imediatistas, de quem controla o PIB brasileiro. A começar pelo agronegócio e as empreiteiras, com as infames medidas para agilizar a concessão de licenças ambientais, como se estivéssemos com falta de desastres ecológicos nas megaobras e nos latifúndios país afora. Como se a estação de Cabrobó, recém-inaugurada, não fosse feita para transpor água de um rio São Francisco que está secando. E, se há claramente problemas no sistema tributário e na legislação trabalhista, a regularização dos terceirizados, tal como proposta, fará pouco para reduzir a discrepância entre o “empregado sortudo e privilegiado” e o trabalhador precário, “pejotizado”, e muito para garantir que corporações tratem o trabalho ainda pior do que já tratam.

Considerações de maior envergadura, que antecipem tendências globais inclusive já anunciadas, como o imperativo sustentável e o redesenho da estrutura produtiva global, estão inteiramente ausentes, substituídas por um termo polivalente e ambíguo: a “competitividade”. Mas a competitividade de um miserável país de latifúndios e baixo valor agregado é incompatível com a de um país sustentável e pujante, do mesmo modo que o sentido do desenvolvimento na era do aço e do carvão é um e na era do byte e do painel solar é outro. A “agenda Brasil”, por trás de seu silêncio, já carrega uma escolha nesse mar de distinções – infelizmente, a mesma escolha que o círculo de Dilma já tinha feito.

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Outro problema, igualmente grave, de uma carta de intenções tão extensa, que se aproveita daquilo mesmo que pretensamente viria resolver – o momento de desarticulação completa tanto na esquerda como no centro (precisamos ter isso em mente!) –, é que ela lança a uma condição secundária todo o processo político, as negociações entre diferentes grupos de interesse e representantes de classe, a busca de soluções intermediárias (chamadas também de soluções “de compromisso”, em mais um anglicismo – não que eu seja necessariamente contra os anglicismos). Todas essas coisas que fazem da democracia parlamentar um regime mais maleável e palatável que qualquer outro já experimentado – como na famosa frase de Churchill.

É verdade que tudo que está proposto ali ainda vai passar pelo Congresso, o que é da natureza da democracia parlamentar, com todos os seus defeitos. Mas o que há de mais despolitizante e no caso da “agenda Brasil” é o próprio acordo de bastidores. Com o pano de fundo de toda a nossa história de soluções verticais para a política e a economia – se não citei acima o mais descarado de todos, cito agora: o convênio de Taubaté –, fica difícil evitar a sensação de que a posição secundária reservada à política propriamente dita é como o seu “lugar natural” no Brasil, o que daria razão a Sérgio Buarque de Holanda quando ele escreve que a democracia no Brasil é um “lamentável mal-entendido”. Será que continua sendo assim, depois de tantas gerações, tantas lutas – tanto sangue, suor e lágrimas, para citar Churchill mais uma vez?

* *

Pensamentos negativos, esses. Mas o estranho nisso tudo é que não há como dizer que o país esteja na pasmaceira, despolitizado e desinteressado dos assuntos de Brasília. Temos, afinal, manifestações a rodo, múltiplas e desconexas, desde o famoso junho de 2013 até os “Fora Dilma”, passando pelo “Não Vai Ter Copa” do ano passado e as contraposições governistas, mas encabuladas, aos protestos de direita – e os panelaços, claro. As contradições do Brasil estão perfeitamente explícitas nesses episódios todos: da escolha de quem a polícia e a Justiça reprimirá, sob aplausos de todo o espectro político institucional e com instrumentos bem questionáveis do ponto de vista legal (que o diga Rafael Braga Vieira, preso por porte de Pinho Sol) até a estranha mistura de recusa à corrupção com uniformes da CBF, passando pelos aplausos a uma das polícias mais brutais e corruptas do universo. Eu diria que o momento histórico já está merecendo o epíteto “decisivo”.

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A rigor, o que se pode dizer não é que o país esteja paralisado ou desmobilizado – antes o contrário, isso era o que se dizia antes de 2013 – mas que está amarrado, rodando em falso, tateando às escuras. De um lado, com dificuldade em desapegar-se do PT, ou já desapegados desse partido mas sem ter outro ao qual se referenciar, aqueles com sensibilidade de centro-esquerda sentem que estão no meio de um túnel escuro, com uma luz no fundo se aproximando em alta velocidade, apitando e cheirando a fumaça.

De outro lado, os que têm sensibilidade de centro-direita abrem os jornais e dão com os representantes do partido que poderia acolher seus sentimentos – refiro-me ao PSDB – emitindo declarações cada vez mais tacanhas e retrógradas. E, muitas vezes, nada mais do que tolas. Sem falar na incompetência de um governador que deixa sua capital sem água (e depois mente sem enrubescer, dizendo que isso não aconteceu). Não é sem motivo que se refugiam no mero anti-petismo, sem grande desenvolvimento programático. Em certa medida, é um caso de escapismo.

Assim, na falta das âncoras do que um dia foi o centro, sem ninguém investido de suficiente autoridade moral para, como dizia Fernando Henrique, “administrar o atraso”, o caminho da hegemonia e até, cruz credo, do poder está desimpedido para toda uma malta de fundamentalistas religiosos, saudosos da ditadura, adoradores da truculência policial e qualquer grupelho de desvairados pretensamente politizados, desses cujos cartazes os sensatos – porém órfãos – se comprazem em ironizar, como se esse sarcasmo todo fosse conter a enxurrada do retrocesso.

* *

Pois é justamente nesse momento que vemos costurar-se um acordo de cúpula operado pela tal classe dominante, e para ela mesma, por cima das nossas cabeças. Um acordo que (repito) se aproveita da própria situação que supostamente vem resolver: a tibieza nos círculos centrais, normalmente os mais parrudos, do sistema político; o Executivo politicamente incapaz e administrativamente imóvel; a Câmara dos Deputados entregue a interesses pessoais e delírios fundamentalistas; a desconfiança global com a economia brasileira. A contrapartida que nos oferecem, se é que se pode falar assim, é a permanência da mandatária no poder, para alegria de seus parcos correligionários restantes – mas como no máximo um fantoche, uma vez que sua equipe já deu inúmeras mostras de incapacidade para recuperar o poder de iniciativa.2

Fico me perguntando qual seria o resultado, se o acordo e a “agenda Brasil” forem bem-sucedidos em manter Dilma no posto até o fim do mandato. Afinal, as energias que estão à solta nas ruas do Brasil, a começar pelas do “Fora Dilma” (mas de jeito nenhum se limitando a elas) não vão simplesmente se dissipar. A erosão lenta do PT nesse período não vai contribuir para a elaboração de novas forças de centro-esquerda, assim como a fixação de parte do PSDB com o impeachment – bem como o jogo de caciques do resto do partido – vai manter a centro-direita anestesiada e satisfeita em andar a reboque do extremismo conservador.3 Em uma palavra, repetida três vezes: frustração, frustração, frustração.

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Há outros pontos nevrálgicos no Brasil contemporâneo onde a frustração pode já estar construindo comportamentos e narrativas insensatos – a frustração é péssima conselheira. Vendeu-se na última década a idéia do Brasil Grande, Brasil Potência, Brasil quinta maior economia, Brasil desenvolvido, sem miséria e assim por diante. Vendeu-se a idéia de que seríamos um país de classe média e que todos teriam chances na vida. De uns tempos para cá, essa imagem ficou reduzida às viagens de avião e ao consumo de roupas e eletrônicos, como no já longínquo episódio do rolezinho – que no entanto ocorreu há menos de dois anos. Mas há elementos muito mais essenciais.

O caso das faculdades, por exemplo. O jovem da classe C, ou “nova classe média”, como se dizia, via no acesso ao ensino superior a porta de entrada para o respeito. Melhor dizendo, o reconhecimento. A bolsa do Fies, o ProUni e, mais tarde, o Ciência Sem Fronteiras seriam o caminho para uma carreira de sucesso, algo como um “sonho americano” em que o diploma exerceria um papel crucial. E agora, com cortes no CsF e com um quadro recessivo intenso, como vai reagir quem acreditou nesse sonho, se endividou, passou anos dormindo poucas horas por noite para poder conciliar trabalho e estudo? Alguém que se dá conta de que a faculdade que fez é de baixíssima qualidade; que o mercado de trabalho, não bastasse encolher, ainda por cima esnoba o fruto de tanto esforço?4


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Uma das falhas das narrativas polarizadoras, à direita (“petralhas!”) como à esquerda (“coxinhas!”), é fechar os olhos justamente para essa comunidade das frustrações. Pensando bem, chega a ser engraçado se dar conta de que existe um abraço de afogados entre gente que se odeia tanto. Nessa comunidade das frustrações há espaço para todos nós, incluindo aqueles que chegamos a crer, em algum momento, que seria dado um salto quântico na política deste país, e também no dia-a-dia social, quando a miséria extrema fosse erradicada, inviabilizando alguns dos modos pelos quais as oligarquias se perpetuam. Pode até ser (quem sabe?) que esse vácuo, esse impasse, tenha origem numa ainda invisível derrocada das oligarquias… Mas seria invisível mesmo: hoje, tudo que podemos ver é o exato oposto, a oligarquia propondo um acordão de cúpula para superar o impasse da maneira que mais a beneficie. A ela e mais ninguém.

É preciso enxergar melhor essa comunidade da frustração, que transparece, por exemplo, na heterogeneidade das opiniões que uma pesquisa realizada por universidades paulistas captou nas manifestações “Fora Dilma” do dia 16. Em primeiro lugar: como bem apontaram seus detratores, de fato, verdade verdadeira, a grande maioria das pessoas que ali estavam eram brancas, eleitoras de Aécio Neves em 2014, detentoras de diplomas universitários. São contra cotas (62%) e são punitivistas (60%). O que justificaria, pelo visto, tachá-los de elite, “elite branca”, ou, como eu dizia meses atrás, “a elite que não é elite”.

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Mas os tais detratores preferiram ignorar que essa mesma pesquisa aponta nas nossas “manifestações de direita” a concordância “total” com a saúde pública para todos (88%) e gratuita (74%), a educação pública para todos (92%) e gratuita (87%), e com o transporte coletivo (72%) – que poderia ser gratuito, com concordância total ou parcial, para 50,4%. Isso mesmo: metade dos manifestantes “de direita e saudosos da ditadura” vêem algum sentido na idéia de tarifa zero, o que os coloca em linha com os anarquistas do MPL. A mesma multidão supostamente ultra-capitalista rejeita em massa (73%) o financiamento empresarial de campanha.

Acontece que uma multidão como aquela pode parecer um grande bloco quando vista nas fotografias à distância, e mais ainda nos recortes feitos com interesses precisos, ao elencar os cartazes mais esquisitos e os personagens mais pitorescos, como o já batido “por que não mataram todos em 64”. Mas multidões não se deixam apreender assim. Elas costumam se comportar menos como o gado conduzido ao abatedouro e mais como os íons de um campo eletromagnético ainda não polarizado, vinculados por ligações fracas; e no caso dessa multidão de agosto, ligações até mesmo circunstanciais, como a rejeição enfática a um governo em particular.

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O quadro se torna ainda mais heterogêneo se incorporarmos a ele aqueles que rejeitam o governo sem participarem das manifestações – nas periferias, por exemplo. E mais heterogêneo ainda quando lembramos de tantos grupos de esquerda que estiveram nas ruas entre junho de 2013 e o “Não Vai Ter Copa” – sem falar nas manifestações do Movimento Passe Livre também este ano em São Paulo e Belo Horizonte, as greves de professores no Paraná e em São Paulo, a resistência de índios e ribeirinhos em Belo Monte. É muita energia se acumulando, muita raiva, muita hostilidade. E muita repressão, sem dúvida, o que não ajuda em nada. Acima de tudo, muita frustração, o afeto-rei da política brasileira em 2015.

Não consigo deixar de ver uma boa dose dessa frustração no recrudescimento da violência quotidiana, social, que se materializa em massacres como o do Cabula, chacinas como a de Osasco, linchamentos em diversas cidades, estupros recorrentes (fiquei particularmente chocado com um dos casos ocorridos no metrô de São Paulo, felizmente não consumado), ataques a transexuais, atentados contra religiões de matriz africana, a polícia do Rio barrando jovens negros, suburbanos, que queriam ir à praia. Talvez em outra escala, o mesmo valha para a guerra em torno das ciclovias “do Haddad” em São Paulo – na verdade, em torno de qualquer iniciativa do prefeito petista. Com o risco de soar especulativo, anti-científico e o cacete, sinto que tudo isso manifesta uma tensão crescente: as pessoas estão com os nervos à flor da pele e os caminhos mais sensatos para discutir a convivência social estão fechados no Brasil.

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Tentando clarear um pouco o quadro, eu poderia tentar vincular tudo isso aí acima às expectativas dos diferentes segmentos sociais, tal como expressas, por exemplo, em 2010, o ano do “crescimento chinês”. Uma nova estrutura social, dizia-se, em forma de losango e não mais pirâmide, traria um novo ciclo de desenvolvimento, ao custo dos privilégios de alguns poucos. Quais privilégios? Talvez a falha trágica esteja em não se ter tocado nessa pergunta, levantando assuntos sensíveis e cruciais como o latifúndio, o patrimonialismo e a carteirada. Falou-se bastante em baixar os juros (parece que isso ficou para as calendas gregas) e no fim do trabalho doméstico. E só.

É claro que este último item já seria uma enorme conquista, mas dificilmente viria sozinho e se estabeleceria de maneira duradoura. De fato, continuaremos a ser uns escravocratas mal disfarçados enquanto qualquer assalariado puder contar com uma doméstica em casa. “Ter uma empregada”, como se diz. Qualquer gerente, qualquer assistente. No Brasil, até algumas empregadas domésticas têm empregadas domésticas! Mas não é só a empregada, claro, embora essa seja uma figura paradigmática. O que dizer de porteiros para abrir a porta do elevador, restaurantes com um garçom para cada duas mesas, postos de gasolina cheios de frentistas?

Mas veio o crescimento. Vieram o ProUni e o Fies. Filhos de trabalhadores precários, domésticos em particular, puderam tentar profissões mais bem pagas e consideradas mais dignas. O custo desse trabalho começou a subir e a gritaria foi tão violenta que camponeses da China ouviram e ficaram se perguntando de onde vinha tanta barulheira. Por causa de um único, mísero privilégio ameaçado. Finalmente, estávamos diante da perspectiva de que alguns não seriam mais obrigados a se humilhar e outros teriam de tomar conta da própria vida. E foi um pandemônio.

Acontece que parou por aí. Para contra-atacar a ofensiva anti-governista, os defensores de Dilma podem perfeitamente invocar a raiva de uma elite que vê seus privilégios ameaçados – um deles, pelo menos. “Agora pobre anda de avião e faz faculdade”, como se diz. E o que mais? Os ruralistas seguem exaurindo as terras e metendo a grana no bolso. Os bancos continuam sendo alimentados como gansos de foie gras pelos juros usados para segurar o câmbio e, com ele, a inflação. A mídia continua absurdamente concentrada. Os elefantes brancos da Copa, a poluição e as remoções na “Cidade Olímpica” e e o ecocídio de Belo Monte estão aí para mostrar que o único temor que um empreiteiro precisa ter hoje no Brasil é o de passar uma breve temporada na cadeia. E depois voltar à rotina.

Paradoxo! Mais um para a interminável coleção brasileira: é perfeitamente verdadeira a raiva por causa de privilégios perdidos… e é perfeitamente verdadeira a manutenção dos privilégios históricos. Isto aqui, ô-ô, é um pouquinho de Brasil, iaiá.

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Momentos como este, que misturam agressividade, imobilismo e frustração, sugerem a aproximação de um clímax catártico. Talvez a ascensão de um líder muito carismático, para o bem ou para o mal, arrastando multidões com a promessa de eliminar a sujeira ou reconquistar a pujança nacional, algo assim. Talvez uma guerra civil, um golpe de Estado, um colapso financeiro. Já passamos por algumas dessas experiências, e até mais: tivemos também um suicídio.

A esta altura, uma possível catarse seria o tão propalado impeachment de Dilma, com suas variantes – impugnação da chapa, renúncia, licença médica. Fico imaginando como seria esse momento (talvez eu descubra logo), dado o nível de tensão em que as pessoas se encontram. Seria certamente uma imagem impactante, o retrato vivo da destruição do PT, que alguns iam vivenciar como epifania e outros tentariam retratar com tintas de tragédia – Dilma, aliás, certamente tem cara de quem se esforçaria para ser um Creonte do planalto central…

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É mesmo preciso discutir a sério o que seria essa catarse, o que ela implicaria, o que viria depois, a quem interessa – e o que podemos esperar caso ela não ocorra. Esta última hipótese talvez seja a mais fácil de responder: a tensão continuaria crescendo, o PT continuaria sendo carcomido, os tucanos continuariam em suas disputas de caciques. As sensibilidades mais ao centro, esquerda como direita, seguiriam órfãs, e talvez pudéssemos torcer avidamente pela recomposição de outras forças para ocupar esse espaço antes que sobrevenha a próxima reviravolta – ou, para seguir na analogia teatral, a próxima peripécia –, que seria cataclísmica. Caso contrário, vozes no estilo Reinaldo Azevedo vão encontrar cada vez mais ressonância e cada vez mais hidrófobos passariam à ação. Para não falar em personagens terríveis, daqueles que circulam pelo meio político e podem fazer leis, controlar orçamentos públicos, gozar de imunidade parlamentar…

Sobre a catarse de um impeachment ou renúncia, meu medo é que ocorra o exato oposto disso: que as tensões se acalmem de uma vez só – o que seria uma ilusão temporária, sem dúvida. Nesse cenário, Dilma desceria a rampa, em grande medida, com o figurino de um bode expiatório, sacrificado pela pólis (estranha pólis, essa nossa) para expurgar nossas incontáveis transgressões. Não é por acaso que um dos maiores interessados em manter de pé a tese do impeachment (mas talvez não levá-lo a cabo) é justamente Cunha, no esforço de enfraquecer o governo e afastar de si próprio o perigo espectral das investigações de corrupção.

Na imaginação simplória de muita gente, a remoção do PT do poder significaria o sucesso do combate à corrupção, a realização definitiva de um processo acompanhado com avidez; daí por diante, nada mais seria necessário fazer, o problema estaria resolvido, o mal cortado pela raiz. Seria possível voltar ao dia-a-dia, ao “business as usual”, à vida de sempre. Mas a vida de sempre, no Brasil, bem sabemos o quanto envolve a violência, a corrupção, o déficit democrático. Sangra o boi de piranha, a boiada segue firme, pisoteando o território.

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Escoar todas as frustrações pelo buraco negro de um impeachment poderia ter a vantagem de evitar a explosão que se anuncia, mas seria uma solução falsa, que removeria o ímpeto daquela que talvez seja a única boa notícia do momento: a ofensiva contra as relações incestuosas entre grande capital e grande política no Brasil, que são, não custa lembrar, generalizadas e suprapartidárias (prefiro dizer: diapartidárias). Passado o momento catártico, permaneceria o rancor. Novas frustrações se somariam às já existentes quando ficasse claro o quanto as estruturas permanecem intocadas – estruturas que sustentam o incesto mencionado acima.

Muitos da multidão presente no “Fora Dilma” se sentiriam traídos e, mais uma vez, frustrados. Mas é bastante comum que mobilizações multitudinárias acabem resultando em transformações políticas que em nada lembram as reivindicações originais dos protestos; está aí a Primavera Árabe que não me deixa mentir. Acontece que, ao provocar um curto-circuito no exercício quotidiano do poder, essas mobilizações abrem espaço para oa ação de outras forças e outros poderes, em geral mais organizados e com objetivos mais claros que os seus. No nosso caso, ainda não chegamos a esse ponto, já que a tal classe dominante entrou em ação.

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Isso tudo é o que caracteriza o impasse, o mato-sem-cachorro, o vai-não-vai. Estamos entre dois pólos. Aqui, uma catarse que nada resolve, mas passa a impressão de resolver, para a alegria dos eventuais sobreviventes – Cunha à testa. Ali, o acordão que tudo resolve, mas seria melhor que não resolvesse, porque só resolve para uns e deixa o abacaxi na mão de todos os demais – você e eu, basicamente. No meio, um governo que já se demonstrou inviável em inúmeras ocasiões desde 2011, incapaz de garantir vitórias parlamentares com segurança mesmo nos momentos de maior apoio popular, e hoje sem quase nenhuma popularidade, nenhum poder de iniciativa e nenhum diálogo com as próprias bases, isto é, com o que um dia foram suas bases.

Seguimos assistindo ao desenrolar da trama em nossa comunidade de frustrações, em nosso abraço de afogados. Seguimos torcendo pelos nossos grupos políticos favoritos e odiando uns aos outros. Seguimos acompanhando as chacinas reiteradas e a dissolução dos códigos de convívio social, acusados de “defender bandido” e outras imbecilidades. Aqui na terra, como diz Chico Buarque, vão jogando futebol; mas cada vez pior, e nem uma goleada em casa por 7 a 1 nos dá forças para derrubar o Ancien Régime. E seguindo com Chico – já que citei o pai, cito o filho também: uns dias chove (cada vez menos), outros dias bate sol (cada vez mais forte), “mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta”.



NOTINHAS
1Há também os exemplos que contaram com expressivo apoio popular, como a candidatura de Tancredo (depois de rejeitada a emenda Dante de Oliveira) e a derrubada de Collor.

2É especialmente difícil analisar uma conjuntura em que uma das principais variáveis é a incompetência e o comportamento errático de um pequeno grupo de indivíduos que ocupam uma posição central. Nos últimos meses, até anos, houve várias ocasiões em que portas se abriram para que o governo saísse das cordas, e ele mesmo preferiu continuar levando bordoadas. Não dá para explicar. Tudo seria muito diferente com lideranças mais sagazes.

3Que está estranhamente misturado a grupos ultra-liberais em economia, composto por jovens incultos que importaram suas idéias de neo-conservadores americanos, já desqualificados em seu próprio país.

4No que está muitas vezes enganado, diga-se. O diploma de uma péssima faculdade, na mão de um formando esforçado e ambicioso, pode valer bem mais do que o de muitos colegas que tive da USP.

Fonte: Diego Viana

A proteção do privado que desumaniza o outro. Entrevista especial com Cecília Coimbra (IHU)

PICICA: ""As pessoas ficam horrorizadas quando falamos da tortura. Agora, com o neguinho da esquina ninguém se sensibiliza. A tortura não foi feita para a classe média. A tortura foi feita para a pobreza, da mesma forma que a prisão" afirma a professora. "

A proteção do privado que desumaniza o outro. Entrevista especial com Cecília Coimbra




"As pessoas ficam horrorizadas quando falamos da tortura. Agora, com o neguinho da esquina ninguém se sensibiliza. A tortura não foi feita para a classe média. A tortura foi feita para a pobreza, da mesma forma que a prisão" afirma a professora. 

Foto: eduardovalente.com.br
Questionada sobre a militarização das casas prisionais, a professora Cecília Coimbra, fundadora do Movimento Tortura Nunca Mais, é enfática: “é a militarização da vida”. Ela entende que se vive numa lógica de militarização da vida em sociedade como decorrência de “uma das heranças malditas que a ditadura deixa no Brasil”.
Com o subterfúgio de preservar a integridade e a propriedade particular, instala-se o aparato repressor militarizado. Isto gera um processo de desumanização, em que a população é “produzida para ter medo do outro”. Outro que é, em geral, o pobre, o marginalizado. “A sociedade pede isso. É levada a pedir isso. Há um processo competente de produção de corações e mentes, produções de subjetividades, de modos de pensar e estar no mundo que levam as pessoas a achar que essa é a melhor maneira”, explica.


Assim, o sistema carcerário nada mais faz do que repetir um modelo social de repressão. Modelo que tenta vingar a suposta vítima e punir severamente o agressor, gerando medo. O objetivo, segundo Cecília, é que “aqueles que fujam às regras, às leis, às normas, ou seja, os marginais e margilanizados deste sistema que a gente vive, sigam o exemplo disciplinado. Assim, a prisão tem a função social de repressão através do medo — que é a mesma coisa que a tortura fez”, explica.


Na entrevista, concedia por telefone à IHU On-Line, Cecília destaca que esse aparato repressivo desumanizador é fortemente manifestado na formação dos agentes de segurança. “A hierarquia, todo o juramento de fidelidade nas corporações que participam do aparato repressivo, não é por acaso. Eles são desumanizados, desrespeitados no cotidiano para desumanizarem aqueles seguimentos que não são considerados humanos”, pontua.


Cecília Coimbra é psicóloga, historiadora, fundadora do Grupo Tortura Nunca Mais, no Rio de Janeiro, e professora na Universidade Federal Fluminense - UFF, vinculada ao programa de Pós-Graduação Estudos da Subjetividade. Formada em História, em 1966, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, também é graduada em Psicologia pela Universidade Gama Filho. É mestre em Psicologia da Educação pela Fundação Getulio Vargas-FGV-Rio, doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano na Universidade de São Paulo-USP, onde também realizou pós-doutorado em Ciência Política. Foi militante do Partido Comunista Brasileiro – PCB.


Esteve presa no Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna, o DOI-CODI, em 1970, onde também foi torturada. Interessada no nexo que une a psicologia à ditadura, afirma que não se trata de acaso o fato desta ciência e da psicanálise terem se desenvolvido tanto em nosso país no período autoritário. Ex-integrante do Conselho Regional de Psicologia, foi presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia.


À frente do Tortura Nunca Mais, trava batalha incessante em nome da verdade e da memória de um período sombrio de nossa história.

Confira a entrevista.

Foto: youtube.com
IHU On-Line - Como avalia o Sistema Prisional Brasileiro?
 
Cecília Coimbra - Totalmente falido. É mais fácil perguntar: “por que ainda continua existindo?”. Se trabalharmos com a visão de Michael Foucault [1], entenderemos por que a prisão emerge. Na história da humanidade, as prisões nem sempre existiram. Porém, elas emergem num determinado ponto da sociedade, capitalista obviamente. E ela tem um papel social importante. Não tem somente o papel de retirar o indivíduo da sociedade, aqueles ditos perigosos e que precisam ser afastados do convívio social. Tem também o papel de dar exemplo. Isso para que aqueles que fujam às regras, às leis, às normas, ou seja, os marginais e marginalizados deste sistema que a gente vive, sigam o exemplo disciplinado.


Assim, a prisão tem a função social de repressão através do medo — que é a mesma coisa que a tortura fez. Por isso faço aqui uma ligação grande entre a prisão e a tortura, sabendo que a tortura é uma prática comum em todas as prisões. Sua fundação principal é a produção de corpos dóceis. É a produção de pessoas que não questionem, produção de pessoas que aceitem passivamente tudo aquilo que deve ser aceito pelo contrato social.


IHU On-Line - Há uma dualidade entre o presídio enquanto aparato de repressão do Estado e a promessa de recuperação das pessoas e reinserção ao convívio em sociedade. Como a senhora vê essa relação? Como convive com essa dualidade? E, de fato, qual a função que os presídios vêm cumprir?


Cecília Coimbra - Está dentro da lógica de que quanto mais você punir, mais você castigar, mais se torna o sujeito ‘bom cidadão’. É a lógica do capitalismo. Porque é a lógica do Estado Capitalista. Assim, a prisão se torna um braço repressivo desse Estado. Se não for a prisão, pode ser qualquer outro equipamento social que produza medo e castigos.


Há um texto de Vera Malaguti Batista [2] em que fala das ilusões do “re”. Ela coloca que não é só a prisão que quer “reeducar” o sujeito, “recuperar” o sujeito. De modo geral, a sociedade e o capitalismo, ou na sociedade de controle, de biopoder, como queira chamar, incentiva o tempo todo essas ilusões. Ou seja, faz pensar que vai reeducar, recuperar e reinserir o sujeito na sociedade. Porém, como ela mesma diz, são “ilusões ‘re’”. Então, os profissionais ligados às áreas humanas e sociais em geral são muito formados nesses mitos e crenças. E reproduzem isso, até mesmo quando muitos vão trabalhar com esses indivíduos ditos perigosos.


Precisamos pensar, questionar, quanto à existência das prisões. As pessoas perguntam se é possível existir uma sociedade sem prisão. Eu sempre digo: não sei. A gente nunca tentou, pois é muito mais fácil a gente reproduzir o que já está feito. Embora questionemos este modelo, as pessoas dizem “não ter outro jeito”. É em cima desse refrão, de que não é possível mudar nada, que se acaba reproduzindo uma lógica que interessa ao Estado. É a lógica que interessa à produção de bons cidadãos.


A grande questão é estar sempre problematizando as coisas. Se não problematizamos, acabamos aceitando tudo como natural. A prisão sempre existiu e sempre vai existir. Não! A prisão nem sempre existiu. Ela emerge em determinado tempo na história da humanidade. Podemos pensar em outras alternativas. Porém, a dificuldade que nós temos de criar e inventar é muito grande. E todos nós temos essa dificuldade. Somos justamente formados, modelados para aceitar o modelo que está em vigor. Pensando assim: “esse é o modelo certo de família, esse é o modelo certo de boa mãe, esse é o modelo certo de bom filho, é o modelo certo de bom professor, de bom psicólogo...”. Assim, são postos os modelitos que você tem de seguir. E quebrar esses modelos é muito difícil. Porque você pode ser visto como uma pessoa que está fora da regra, da norma. É um desafio, para cada um de nós, no cotidiano da vida, e não só sobre a questão prisional, mas de todas as questões institucionais que existem e são sacralizadas, pensar que sempre podemos inventar outra coisa diferente do que sempre existiu.



“O neguinho da esquina pode ser exterminado, preso, torturado e morto, pois ameaça a segurança”


IHU On-Line - Quais são as implicações da militarização do ambiente prisional?


Cecília Coimbra - É a militarização da vida. É óbvio que tem militarização do ambiente prisional, tem militarização onde todos os serviços de repressão servem ao Estado. Percebemos isso nos treinamentos que são dados inclusive para guarda municipal, onde as pessoas passam por tortura. Isso já foi denunciado, todo mundo sabe e ninguém se mete. É um tabu. E, assim, vai-se cada vez mais militarizando a vida.


Há a militarização dos presídios em nome da segurança. A militarização de modo geral, da vida, das polícias, das instituições, das escolas — que estão com polícia militar dentro delas — é feita em nome de nossa segurança. E há algo muito sério que estamos vivendo hoje: em nome de nossa segurança, acabamos aplaudindo medidas repressivas, mais punição, pena de morte — que já existe informalmente. Não é por acaso que Foucault dizia que nós vivemos numa sociedade de segurança, onde tudo gira em torno da tua segurança. E você acaba acreditando nisso. O neguinho da esquina pode ser exterminado, preso, torturado e morto, pois ameaça a segurança. Não é por acaso o aumento de pessoas que aplaudem o extermínio, a tortura, pessoas dizendo que para alguns segmentos isso é necessário.


A população vai engolindo isso. As nossas subjetividades, nossos modos de existir e de estar no mundo, nossos modos de sentir, de perceber e pensar são produzidos por esses meios. Especialmente pelos grandes meios de comunicação de massa, somos produzidos a acreditar que para segurança a vida precisa ser militarizada. As ruas precisam ser militarizadas.


A militarização do presídio, aquele cotidiano de terror a que se é submetido, fora as torturas, é algo que nunca mais se esquece. Quem passa por aquilo ali — e eu passei no período da ditatura — está marcado para o resto da vida. Fora o desrespeito às famílias destas pessoas. A sensação que dá, e eu senti isso, é de que não somos humanos. Certas pessoas não são humanas e podem ser tratadas de forma até pior do que animais peçonhentos. O preso não é humano, e isso já nos diziam na ditadura. E o pobre, e principalmente o negro, que mora em periferia, também não é humano. E aí há algo muito sério e em que acreditamos piamente, que Foucault traz como “dispositivo da periculosidade”: em determinados segmentos sociais, por algo que é dado a eles, há uma essência perversa, perigosa e criminosa. Se essas pessoas ainda não fizeram — cometeram atos de violência —, cuidado. Pois, pela essência criminosa delas, um dia farão.


IHU On-Line - Como se constitui a ideia de “suspeito padrão”? Em que medida se relaciona com a criminalização da pobreza?


Cecília Coimbra - Na nossa época (da ditadura), isso era chamado de inimigo interno, inimigo da pátria. Nós éramos os inimigos da pátria. É a mesma lógica que se aplica hoje à chamada democracia. Há um sociólogo francês que trabalha nos Estados Unidos, Loic Wacquant [3], que escreveu um livro chamado As prisões da Miséria [4]. Ele se dedicou a trabalhar com a criminalização da pobreza, mostrando que as prisões atuais são as prisões da miséria. Fora algumas espetacularizações de prisões de alguns empresários, o que é minoria, podemos perceber que a prisão foi feita mesmo para miseráveis. Wacquant mostra isso através da realidade dos Estados Unidos, de uma experiência do ex-prefeito de Nova Iorque, Rudolph Giuliani [5], e já esteve até no Rio de Janeiro à convite do prefeito Eduardo Paes [6].


Giuliani adota o que Wacquant chama de “política de tolerância zero”. Vai limpar as ruas da cidade, vai tirar esses “perigosos” e esses “marginais” das ruas da cidade. Assim, Wacquant, embora não cite Foucault, vai trabalhando com a “teoria da vidraça quebrada”. Foi o que aconteceu aqui no Brasil durante as manifestações de junho de 2013. Os meninos foram criminalizados [7], os jovens manifestantes. O que se coloca é isso: se hoje você quebra a vidraça, cuidado. Amanhã, você pode se tornar um terrorista perigoso. A ideia de terrorista aumentou muito depois do atentado ao World Trade Center [8], nos Estados Unidos. Assim, a política de tolerância zero vai se ampliando cada vez mais. Principalmente se as pessoas forem negros, pobres e de periferia.


Essa teoria da vidraça quebrada embasa a política de tolerância zero. É a política que está vigendo no Brasil. E a gente aplaude, em função da nossa segurança. E o pior: nós pedimos a repressão. Cada vez mais pedimos a tutela do Estado, pedimos cada vez mais leis duras e repressivas. Por quê? Porque queremos a lei e a ordem. Essa lei e ordem que seria a democracia. Mas, para quem?

 


“A tortura é sistemática no Brasil”

IHU On-Line - A tortura ainda é prática recorrente nas ações policiais no Brasil, dentro e fora de presídios? É por essa prática que podemos entender o Caso Amarildo [9]?


Cecília Coimbra - São milhares de Amarildos que existem pelo Brasil. Por acaso, Amarildo ficou conhecido porque foi naquele momento da emergência das manifestações de 2013. Agora, e os outros, milhares de desaparecidos, os pobres que não têm visibilidade nenhuma? Não se tem, inclusive, um levantamento de pessoas desaparecidas. É um número altíssimo. A ditadura brasileira deixou essa maldita e perversa figura do desaparecido.


Não tínhamos, na História do Brasil, grande número de desaparecidos por aparatos e mecanismos policiais. Isso surge com a ditadura. É uma das heranças malditas que a ditadura deixa no Brasil. Além da questão dos desaparecimentos, há os casos de autos de resistência. É importante que a gente fale nisso. Os números de autos de resistência nas grandes cidades são altíssimos. Ou seja, você mata e executa o sujeito e depois vai para a delegacia e oficializa: morto ao resistir à prisão. Isso é o auto de resistência.


E tem ainda a tortura. Não ocorre só na prisão. Temos tortura nos manicômios, nos hospitais psiquiátricos, nas chamadas instituições socioeducativas. Aliás, o que é uma piada. Aqueles meninos colocados como infratores vão para estas instituições que de educativas não têm nada. São verdadeiras prisões. Lá, são estuprados, torturados e todo mundo sabe disso. Quando se discute a baixa da maioridade penal, não se percebe que na prática isso já acontece. A tortura é sistemática no Brasil. É endêmica, como diria Paulo Sérgio Pinheiro [10]. As autoridades sabem onde se pratica tortura, quando se pratica tortura. No presídio de Água Santa [11], por exemplo, que é de máxima segurança, tem um dia da semana, que é quando os presos novos chegam, que a tortura é institucionalizada. Os novos presos são recebidos debaixo de tortura.


IHU On-Line - E a que a senhora atribui esse tipo de conduta, a manutenção da tortura como prática policial?


Cecília Coimbra - A sociedade pede isso. É levada a pedir isso. Por tudo isso que falamos até agora. Há um processo competente de produção de corações e mentes, produções de subjetividades, de modos de pensar e estar no mundo que levam as pessoas a achar que essa é a melhor maneira. E o Estado, obviamente, se coloca como o grande árbitro disso tudo — e ele não é — e acaba reafirmando essa conduta para agradar e fortalecer os clamores populares dessa chamada Justiça. A gente sabe de casos, por exemplo, de linchamento. Aqui perto da minha casa, no bairro do Flamengo, no Rio de Janeiro, um menino foi linchado por um grupo de playboys. Era um negro, mal vestido, que foi amarrado a um poste e linchado.


Esses casos de linchamentos não ocorrem porque a população é má e perversa. Ela é produzida para ter medo do outro. Vemos isso nas telenovelas, está espalhado no mundo. “O que está ao teu lado, cuidado! Pode ser teu inimigo. Não confie em ninguém”. Assim, você vai produzindo uma subjetividade que eu chamaria de “punitivo-paranoica”. Vai produzindo uma paranoia geral, onde todo mundo tem medo de todo mundo. E isso justifica as medidas repressivas, duras. Outro dia, Eduardo Cunha [12] disse que se poderia botar em plebiscito a questão da maioridade penal que obviamente ganharia a ideia de redução. É verdade. Eu me lembrei da época em que o Carlos Lacerda [13] — político representante do conservadorismo — queria colocar em plebiscito a questão da pena de morte. E na época a gente dizia: ganha. Porque a população inteira vai achar que, para sua segurança, a pena de morte tem que estar vigente. Embora extraoficialmente ela já exista.


“Capital e miséria se complementam”

IHU On-Line - A atualização de instrumentos da ditadura, como autos de resistência e os desaparecimentos, acontece por que motivo?


Cecília Coimbra - Tem a ver com o clamor social, mas tem a ver com o capitalismo. Ele só funciona tendo miséria. Capital e miséria se complementam. E os miseráveis são perigosos, assim como a participação política do jovem é perigosa. Esses garotos [14], 23 manifestantes aqui no Rio de Janeiro, estão sendo crucificados para servirem de exemplo. Um menino ficou preso durante sete meses. E isso não é por acaso, estão sendo tomados como exemplo.


Não podemos esquecer a história do Brasil. Tenta-se escravizar o índio e não se consegue. Então, pega-se o negro. Nossa herança é de mais de 300 anos de escravidão. O escravo não é humano. É uma coisa que você vende e compra. Isso está nas nossas subjetividades. Óbvio que a ditadura acirrou isso. Eu me lembro da Marilena Chauí [15] fazendo uma palestra, em 1985, e falando que os novos perigosos agora não são mais os terroristas ou ativistas políticos. São os pobres na imagem do traficante. Não é dizer que traficante não existe, que não é cruel. Mas você vai produzindo uma crueldade no outro.


IHU On-Line - Como se dá o processo de desumanização dos detentos?


Cecília Coimbra - Os agentes penitenciários, polícias civis e militares, guardas municipais, além daqueles que servem às Forças Armadas, recebem treinamentos onde eles passam por tortura. É onde são produzidos para combater um inimigo que não é humano. Ele é tão perigoso que perde sua humanidade. Eu assisti a isso. Enquanto estive presa do DOI-CODI [16], assistíamos todo dia. Um soldadinho me perguntou: “Mas como? Você tem filho? Comunista não tem filho”. Parece uma pergunta idiota, mas ele não era idiota. O processo vai desumanizando, na medida em que você é desumanizado.


A hierarquia, todo o juramento de fidelidade que a gente vê nas corporações que participam do aparato repressivo, não é por acaso. Eles são desumanizados, desrespeitados no cotidiano para desumanizarem aqueles segmentos que não são considerados humanos. E isso não se fala. A questão da formação é um tabu de todas essas categorias. As pessoas ainda dizem: “Ah, mas a gente dá aula de Direitos Humanos”. Mas de que adianta dar essa “aula”, fazendo com que o cara decore os artigos da Constituição Universal dos Direitos Humanos, quando está sendo torturado diariamente no quartel?

“Direitos Humanos hoje virou mercadoria que se vende a preços bons no mercado”

IHU On-Line - Como analisa os debates em torno dos Direitos Humanos dentro dos presídios, diante de todo esse clamor da sociedade por essa ideia de Justiça, baseado no processo de desumanização?


Cecília Coimbra - Direitos Humanos, hoje, virou mercadoria que se vende a preços bons no mercado. Eu sou militante de Direitos Humanos e faço crítica à forma como a luta é levada. Dizem que temos uma Secretaria de Direitos Humanos, mas de que adianta? Dizem que damos muita aula de Direitos Humanos, mas depende de que Direitos Humanos estamos levando. A expressão Direitos Humanos também emerge com o capitalismo. É filha da Revolução Francesa. Direitos Humanos é o que precisamos colocar em análise, diante de tudo isso que falei até agora. Direitos para quem, cara-pálida? Humanidade para quem? Se formos falar em Direitos Humanos, temos que falar para todos, e não para aqueles que sempre tiveram seus direitos e sua humanidade garantidos, ou seja, as elites e classe média de forma geral.


As pessoas ficam horrorizadas quando falamos da tortura. Agora, com o neguinho da esquina ninguém se sensibiliza. Até porque ele não tem visibilidade e é rotulado de perigoso. A tortura não foi feita para a classe média. A tortura foi feita para a pobreza, da mesma forma que a prisão. Para falar de Direitos Humanos precisamos de muito cuidado. Virou bandeira de governo, de partido político, totalmente esvaziada do que deveria ser. É uma expressão muito vaga para hoje.


Por Leslie Chaves e João Vitor Santos


Notas:


[1] Michel Foucault (1926-1984): filósofo francês. Suas obras, desde a História da Loucura até a História da sexualidade (a qual não pôde completar devido a sua morte) situam-se dentro de uma filosofia do conhecimento. Foucault trata principalmente do tema do poder, rompendo com as concepções clássicas do termo. Em várias edições, a IHU On-Line dedicou matéria de capa a Foucault: edição 119, de 18-10-2004, disponível em http://bit.ly/ihuon119; edição 203, de 06-11-2006, disponível em http://bit.ly/ihuon203; edição 364, de 06-06-2011, intitulada 'História da loucura' e o discurso racional em debate, disponível em http://bit.ly/ihuon364; edição 343, O (des)governo biopolítico da vida humana, de 13-09-2010, disponível em http://bit.ly/ihuon343, e edição 344, Biopolítica, estado de exceção e vida nua. Um debate, disponível em http://bit.ly/ihuon344. Confira ainda a edição nº 13 dos Cadernos IHU em formação, disponível em http://bit.ly/ihuem13, Michel Foucault. (Nota da IHU On-Line)


[2] BATISTA, Vera Malaguti. Adeus às ilusões “re”. In COIMBRA, C., NASCIMENTO, M. L. & AYRES, L.S.M. PIVETES – Encontros entre a Psicologia e o Judiciário. Curitiba: Juruá Editora, 2008. Vera Malaguti Batista é mestre em História Social pela Universidade Federal Fluminense, Doutora em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Professora de Criminologia, da Universidade Cândido Mendes, e integra o Instituto Carioca de Criminologia. (Nota da IHU On-Line)


[3] Loïc Wacquant (1960): professor de sociologia e pesquisador associado do Institute for Legal Research na Boalt Law School da Universidade da Califórnia, onde é filiado ao Global Metropolitan Studies Program, ao Program in Medical Anthropology, ao Center for the Study of Race and Gender, ao Designated Emphasis in Critical Theory e ao Center for Urban Ethnography. Wacquant também é pesquisador do Centre européen de sociologie et de science politique em Paris. Seus interesses perpassam estudos comparativos sobre marginalidade urbana, dominação étnico-racial, pugilismo, o Estado penal, teoria social e a política da razão. É cofundador da publicação interdisciplinar Ethnography, da qual foi coeditor de 2000 a 2008, e apresentou regulares contribuições para o Le Monde Diplomatique de 1996 a 2004. Entre seus projetos atuais estão estudos sobre antropologia do desejo, uma pesquisa epistemológica sobre a construção do objeto da etnografia urbana e um estudo sociológico histórico-comparativo a respeito das formas e mecanismos da dominação racial que perpassa quatro séculos e três continentes, provisoriamente denominado “Peculiar Institutions”. (Nota da IHU On-Line)


[4] WACQUANT, Loïc. As prisões da Miséria. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. (Nota da IHU On-Line)


[5] Rudolph William Louis Giuliani (1944): é um político americano, descendente de imigrantes italianos da região da Toscana, ex-chefe do governo municipal da cidade de Nova Iorque (de 1º de janeiro de 1994 a 31 de dezembro de 2002). Tornou-se famoso por implementar uma política de "tolerância zero" contra criminosos, o que diminuiu sensivelmente as taxas de criminalidade da cidade. (Nota da IHU On-Line)


[6] Eduardo da Costa Paes (1969) advogado, político brasileiro filiado ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e atual prefeito do Rio de Janeiro, cargo que ocupa desde 1º de janeiro de 2009. (Nota da IHU On-Line)


[7] A entrevistada se refere ao grupo de jovens que integravam os Black Blocs na cidade do Rio de Janeiro. Black Bloc é a expressão do inglês black, negro, e bloc, agrupamento de pessoas para uma ação conjunta ou propósito comum. É também o nome dado a uma tática de ação direta, de perfil anarquista, caracterizada pela ação de grupos de afinidade mascarados e vestidos de preto, que se reúnem para protestar em manifestações de rua, utilizando-se da propaganda pela ação para desafiar, em linhas gerais, o Estado e as elites financeiras. Do que se pode apurar, esses grupos são estruturas efêmeras, informais, não hierárquicas e descentralizadas. (Nota da IHU On-Line)


[8] 11 de setembro de 2001: membros do grupo islâmico Al-Qaeda sequestraram quatro aeronaves, fazendo duas colidirem contra as duas torres do World Trade Center, em Manhattan, Nova Iorque, e uma terceira contra o quartel general do departamento de defesa dos Estados Unidos, o Pentágono, na Virgínia, próximo à capital dos Estados Unidos, Washington. O quarto avião sequestrado foi intencionalmente derrubado em um campo próximo a Shanksville, Pensilvânia, após os passageiros enfrentarem os terroristas. Esse foi o primeiro ataque letal de uma força estrangeira em território americano desde a Guerra de 1812. O saldo de mortos aproxima-se de 3 mil pessoas. (Nota da IHU On-Line)


[9] Amarildo de Souza: foi um ajudante de pedreiro que desapareceu desde o dia 14 de julho. Investigações do Ministério Público, que contam com depoimentos, inclusive de policiais militares, indicam que ele foi torturado e assassinado pela Polícia Militar do Rio de Janeiro. O sítio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU publicou material sobre o caso, entre eles, Brasil tem de agir contra violência policial, diz Anistia, publicado nas Notícias do Dia, de 10-08-2013, disponível em http://bit.ly/19btKzK; e Amarildos, onde estão?, publicado nas Notícias do Dia, de 27-08-2013, disponível em http://bit.ly/1aNFXqy. (Nota da IHU On-Line)


[10] Paulo Sérgio Pinheiro (1944): diplomata e acadêmico brasileiro. É professor no Watson Institute da Brown University, em Providence, EUA. Dentro da Estrutura da Organização das Nações Unidas, exerceu o cargo de relator especial para a situação dos direitos humanos de Myanmar. Em 2011 foi nomeado Coordenador (Chairman) da Comissão Internacional de Inquérito para a Síria. Foi um dos sete integrantes da Comissão Nacional da Verdade, que apresentou um relatório com a narrativa e as conclusões sobre os crimes cometidos durante a Ditadura Militar.(Nota da IHU On-Line)


[11] Presídio Ary Franco: é considerado porta de entrada do sistema penitenciário do Rio de Janeiro. Foi inaugurado em 1974. Fica localizado na Rua Violeta n°15 no bairro da Água Santa, nas proximidades do pedágio da Linha Amarela. (Nota da IHU On-Line)


[12] Eduardo Cosentino da Cunha (1958): economista, radialista e político brasileiro. Evangélico, é membro da igreja neopentecostal Sara Nossa Terra. Atualmente é deputado federal pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) pelo Rio de Janeiro. Desde 1º de fevereiro de 2015 é presidente da Câmara dos Deputados. (Nota da IHU On-Line)


[13] Carlos Lacerda [Carlos Frederico Werneck de Lacerda] (1914-1977): jornalista e político carioca. Iniciou sua carreira profissional em 1929, escrevendo artigos para o Diário de Notícias, publicados numa seção dirigida por Cecília Meireles. Em inícios de 1934, acadêmico de Direito, aproximou-se da Federação da Juventude Comunista, órgão do PCB. Durante um tempo foi comunista, passando para a extrema-direita, nos anos 1940. Editava o jornal Tribuna da Imprensa. Foi o principal inimigo do presidente Getúlio Vargas. Em 1955, publicou uma série de reportagens denominada A Batalha do Rio, que puxou a favela para a mídia e colocou-a no centro do conflito ideológico, o qual não desaparecera com a simples prescrição jurídica do Partido Comunista, que foi posto na ilegalidade. (Nota da IHU On-Line)


[14] Idem nota 7.
[15] Marilena Chauí: filósofa brasileira reconhecida pela sua ativa participação no contexto do pensamento e política brasileira. (Nota IHU On-Line)


[16] DOI-Codi: sigla de Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna, órgão repressor criado pela ditadura militar brasileira e que funcionava como polícia política, responsável pela prisão e tortura de pessoas contrárias ao regime autoritário. (Nota da IHU On-Line)

Para ler mais:




  • 30/03/2010 - "Prisão não pode ser cruel, desumana ou degradante". Entrevista especial com Bruno de Souza Toledo
  • 10/08/2015 - Linchamentos: “É possível uma tranquilidade fundada na violência?”. Entrevista especial com Ariadne Natal
  • 09/07/2015 - O linchamento como sintoma
  • 09/12/2013 - Sistema carcerário. 'É o caos'
  • 10/04/2014 - A morte dos direitos humanos na ditadura militar
  • 04/10/2013 - Caso Amarildo escancara situação de medo, violência e tortura nas favelas
  • 08/06/2015 - Cadeias: depósitos de “lixo humano” (leia: pobres)
  • 06/12/2013 - “Negros e pobres ainda são tratados como inimigos internos”
  • 30/05/2012 - Brasil tem 4ª maior população carcerária do mundo e deficit de 200 mil vagas
  • 10/01/2014 - ''As prisões são produtoras de violência. Quanto mais prisões construirmos, mais violenta se tornará a sociedade.'' Entrevista especial com Camila Dias
  • 09/01/2014 - Crise em presídio no Maranhão reflete problema nacional crônico
  • 30/10/2014 - "Dilma, olhe para os presídios"
  • 06/11/2012 - Violações de direitos humanos nos presídios Aníbal Bruno e Urso Branco são discutidas na OEA
  • 08/05/2014 - Prisões são as senzalas de hoje, diz ativista da Pastoral Carcerária
  • 03/10/2014 - Após 22 anos do Massacre do Carandiru contexto para novo extermínio continua, sem que cause indignação
  • 27/02/2015 - "O governo Dilma é extremamente repressivo"
  • 01/04/2014 - Denúncias de tortura no Brasil cresceram 129% nos últimos 3 anos
  • 28/05/2015 - Metrópole e Ordem Urbana. Pela desmilitarização da polícia. Entrevista especial com José Claudio Alves
  • 28/07/2015 - O juiz e a banalidade do mal
  • 03/03/2015 - Se cadeia resolvesse, o Brasil seria exemplar
  • 06/08/2015 - Fracasso do sistema prisional: “Dos juízes espera-se mais do que uma atuação burocrática e formal”. Entrevista especial com Haroldo Caetano da Silva
  • 12/08/2015 - Redução da maioridade penal: “O crime só inclui quando o Estado exclui”. Entrevista especial com Ariel de Castro Alves

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    Veja também:




  • Uma polícia militar e a lógica da guerra. Revista IHU On-Line, Nº. 466
  • O sistema prisional brasileiro. Um espelho da sociedade. Revista IHU On-Line, Nº. 293
  • A violência gaúcha e brasileira. Um debate. Revista IHU On-Line, Nº. 252

  • Fonte: IHU