janeiro 30, 2013

Governo desapropria 31 km de terra no beiradão do rio Amazonas, e as Comunidades Tradicionais de Ribeirinhos se organizam em defesa dos seus direitos

PICICA: No imaginário dos manauaras PURAQUEQUARA é a região que fica depois do Encontro das Águas, no limite da cidade. Uma espécie de divisor entre o perímetro urbano de Manaus e sua área rural. Rio abaixo tudo vira "puraquequara". A olhos vistos, numa eventual viagem pelas redondezas o que se divisa é uma imensa extensão conhecida como beiradão, banhada pelas águas amarelas do rio Amazonas, onde desponta, aqui e ali, uma casinha típica de ribeirinho. Montadas sob palafitas, para proteger as famílias ribeirinhas do regime da cheia dos rios, que muda de 6 em 6 meses, se constitui - principalmente para aqueles que só conhecem a cultura urbana - num detalhe exótico da paisagem amazônica. No momento dessas mal traçadas, estamos na fase da cheia, sem que haja alguma indicação de uma outra enchente como a de 2012. As cheias vão e vem, e uma parte da sociedade manauara continua desconhecendo a existência de 19 comunidades situadas entre a Vila de Puraquequara e o Paraná da Eva, região que já integra o município de Rio Preto da Eva, no baixo Amazonas. Nem sempre é possível ver a comunidade em sua maior dimensão. Algumas crescem perpendicularmente à beira do rio; outras - poucas - é visível na linha do horizonte. De todas, 9 delas estavam presentes na comunidade de Bonsucesso (sim, cada uma tem nome: São Francisco do Mainã, São José do Jatuarana, São Francisco do Tiririca, Tabocal, São Pedro, entre outras) na manhã de domindo, 27 de janeiro. Na pauta da reunião que contou com a presença de Procuradores da República, do Ministério Público Federal;  apoiadores institucionais e representantes de coletivos que atuam no movimento socioambiental, bem como a Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa: o programa Luz Para Todos, o Linhão de Tucuruí e a mais recente novidade: a desapropriação, por decreto governamental, de 31 quilometros de beiradão para a construção de um Polo Industrial Naval. Parte dos interesses envolve o Exército Nacional e o Governo de Estado do Amazonas. Os ribeirinhos dessas comunidades tradicionais até agora não foram ouvidos. Até outubro do ano passado - data da assinatura do decreto - duas comunidades enfrentavam a interdição do programa Luz Para Todos, por serem as únicas que não aceitavam a invasão de suas terras - ocupadas desde o século XIX - pelo Exército Nacional. O que se pergunta é que poder tem o Exército junto à Eletrobrás para interditar um direito proveniente de uma Política de Estado. A gravidade da situação é conhecida da opinião pública através da mídia local, no que pese a intervenção das editorias, como em matéria gerada a partir de Manaus, que teve repercussão na Rede Bandeirantes de Televisão. O jornalista goza de respeito e credibilidade na imprensa amazonense. Não há dúvidas quanto a sua isenção. O mesmo não se pode afirmar dos responsáveis pela edição da matéria. Em depoimento, numa entrevista feita fora de Manaus, um ex-general, que fora do Comando Militar da Amazônia, em nome do Exército afirmou que o zelo militar na região em causa - que fica a leste de Manaus - deve-se ao temor de ocupação desordenada do solo. Voltaremos ao tema. Para dimensionar o tamanho do conflito deflagrado pelo decreto, que vem tirando noites de sono das comunidades ribeirinhas, vale lembrar que a comunidade de São José do Jatuarana, na década de 1950, chegou a ter 200 famílias residentes. Com a intimidação militar, iniciada nem meados da década de 1990, e gerada pela expansão da área de treinamento de Guerra na Selva para além do perímetro das terras doadas pelo governo estadual, na gestão Danilo de Mattos Areosa, na década de 1970, muitos abandonaram o chão onde nasceram reduzindo, assim, a comunidade a pouco mais de 90 famílias. Imagine voce, que mora num condomínio de prédios com 160 famílias como eu, sendo convidado a sair do lugar onde estão parte das suas relações sociais por um suposto interesse público. Falo suposto porque tá difícil ser convencido que um Polo Industrial Naval demanda 31 quilometros de terra contínua para seu funcionamento. Muita coisa merece explicação. Inclusive as razões pelas quais o projeto sequer foi discutido na Assembléia Legislativa, onde estão os representantes eleitos da população, ainda que alguns parlamentares pouco estão se lixando para o destino de uma área com tão baixa densidade populacional e eleitoral. É só fazer as contas: dezenove comunidades, com uma média de 100 famílas; quem liga para elas?  As fotografias abaixo são de autoria do companheiro Valter Calheiros, do movimento SOS Encontro das Águas, que vieram acompanhadas de dois documentos que ficarão para o próximo post, com mais informações.


 Centro Social da Comunidade do Bom Sucesso
 Início do encontro
 Procuradores da República ouvem comunitário da costa do Jatuarana

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