PICICA: "Mais de um mês após a erupção de 15 de
maio, a plena realidade de um movimento revolucionário sem precedentes e
imprevisível não deixa de provocar admiração e entusiasmo àqueles que
tenham apenas alguns minutos para pensar sobre o que está acontecendo na
Espanha.
15M, multidão que se utiliza de máscaras para ser uma > Raúl Sánchez Cedillo
15M, multidão que se utiliza de máscaras para ser uma
Raúl Sánchez Cedillo, Universidad Nómada
Tradução de Bruno Tarin
Mais
de um mês após a erupção de 15 de maio, a plena realidade de um
movimento revolucionário sem precedentes e imprevisível não deixa de
provocar admiração e entusiasmo àqueles que tenham apenas alguns minutos
para pensar sobre o que está acontecendo na Espanha.
Esta
erupção não está sendo uma jacquerie (revolta) contra as políticas de
austeridade econômica, e também não é um movimento pelos direitos civis e
de desobediência que podemos encaixar em um esquema (liberal) clássico.
O movimento estourou e tem aparecido como um movimento de
democratização radical e ao mesmo tempo de radicalização democrática.
“Não somos mercadorias nas mãos de banqueiros e políticos. Democracia de
verdade agora! “. Não só em suas críticas e propostas para a reforma
radical do sistema representativo de partidos, mas também em seus modos
de discussão e deliberação nas assembleias e comissões, expressa
intensamente a força e os problemas das instâncias de democracia direta
de massas. Nos seus modos e repertórios de ação coletiva, os da
desobediência civil de massa pacífica e não testemunhal, os da
resistência e proteção mútua dos corpos contra a violência policial e os
do desafio e assédio aos parlamentos, o 15M se afirma como um movimento
de radicalização democrática, o mais poderoso e desconhecido da
história constitucional espanhola.
O
afeto da indignação não é suficiente para dar conta da extensão,
intensidade e persistência do 15M, mesmo que explique a natureza
tumultuosa de seu surgimento. Na minha opinião, os aspectos mais
interessantes (e felizmente inquietantes) tem a ver com o fato de que o
movimento vem se firmando como uma rede de redes, de singularidades, que
opera em vários níveis da realidade (das praças às redes sociais,
passando pela mídia corporativa) e que é capaz de autoregular-se em cada
novo ato de seu processo e de seu antagonismo.
Parece
como si o 15M fosse plenamente consciente de que não existe um fora
viável do sistema de regulação constitucional dos antagonismos (e de sua
lógica subjacente de amigo-inimigo) e de que precisa de máscaras que
evitem qualquer tentativa de identificação e divisão, desviando a luz
dos focos policiais e midiáticos.
É
extraordinário ver agora como o movimento foi capaz de organizar em
rede sua erupção, o 15M, de realizar uma mutação sem se destruir e em
tempo útil em acampamentos e assembleias nas praças, para assembleias
de bairro nas grandes cidades, de organizar ações distribuídas e
inesperadas contra a execução de despejos pelas hipotecas não pagas e
de voltar a inundar as ruas contra o Pacto do euro de 19 de junho. E
como converteu até agora em fonte de legitimidade e de nova indignação
todas as tentativas de neutralização e criminalização, sem perder a
multiplicidade, complexidade e radicalidade e, acima de tudo, unidade de
esforço e aplicação sem uma unidade de comando.
Mas
talvez o mais surpreendente é que o 15M está fazendo tudo isso sem a
participação de qualquer estrutura pré-existente de protestos políticos e
sindicais. Cuidadosamente mantidas a parte, são incentivadas a
participar dissolvendo-se e metamorfoseando-se no movimento.
Esta
natureza de sistema-rede aberto, é na minha opinião a chave do carácter
constituinte do 15M. O problema do auto-governo de uma multidão, ou
seja, o da combinação da diversidade do movimento e sua capacidade para
se unir na implementação oportuna da força, nas formas de decisão por
uma espécie de “consenso emergente”, na capacidade de decidir na
abundância de tons e opiniões, fazem deste movimento uma ameaça
formidável e duradoura. Hoje, começa a amadurecer o projeto de concerto
polifônico de instituições analógicas e digitais capazes de
responsabilizarem-se de produzir o comum. O principal atrativo do 15M
diante das tentações recorrentes de “solução política”, eleitoral ou
não, vai na minha opinião na ênfase na produção de instituições
materialmente capazes de se reapropriar e de gerir a produção social que
ocorre nas metrópoles (cidades-fábrica).
Nem
é necessário falar que como na Grécia ou na Tunísia, Marrocos ou Egito,
o 15M dificilmente se manterá vivo ou será diminuído a um destino
trágico se não tiver intercessores, relevos, parceiros em outras áreas e
cidades Euro-Mediterrânicas. A inteligência indignada distribuída está
nas melhores condições para identificar os adversários principais e
secundários e de evitar os atalhos do voluntarismo e do desespero.
Movimento 15M na Praça do Sol, Madrid
Foto: Marcelo Expósito (publicado sob licença CC 3.0)
Raúl Sánchez Cedillo, Universidad Nómada (Tradução de Bruno Tarin)
Mais de um mês após a erupção de 15 de
maio, a plena realidade de um movimento revolucionário sem precedentes e
imprevisível não deixa de provocar admiração e entusiasmo àqueles que
tenham apenas alguns minutos para pensar sobre o que está acontecendo na
Espanha.
Esta erupção não está sendo uma
jacquerie (revolta) contra as políticas de austeridade econômica, e
também não é um movimento pelos direitos civis e de desobediência que
podemos encaixar em um esquema (liberal) clássico. O movimento estourou e
tem aparecido como um movimento de democratização radical e ao mesmo
tempo de radicalização democrática. “Não somos mercadorias nas mãos de
banqueiros e políticos. Democracia de verdade agora!”. Não só em suas
críticas e propostas para a reforma radical do sistema representativo de
partidos, mas também em seus modos de discussão e deliberação nas
assembleias e comissões, expressa intensamente a força e os problemas
das instâncias de democracia direta de massas. Nos seus modos e
repertórios de ação coletiva, os da desobediência civil de massa
pacífica e não testemunhal, os da resistência e proteção mútua dos
corpos contra a violência policial e os do desafio e assédio aos
parlamentos, o 15M se afirma como um movimento de radicalização
democrática, o mais poderoso e desconhecido da história constitucional
espanhola.
O afeto da indignação não é suficiente
para dar conta da extensão, intensidade e persistência do 15M, mesmo que
explique a natureza tumultuosa de seu surgimento. Na minha opinião, os
aspectos mais interessantes (e felizmente inquietantes) tem a ver com o
fato de que o movimento vem se firmando como uma rede de redes, de
singularidades, que opera em vários níveis da realidade (das praças às
redes sociais, passando pela mídia corporativa) e que é capaz de
autoregular-se em cada novo ato de seu processo e de seu antagonismo.
Parece como si o 15M fosse plenamente
consciente de que não existe um fora viável do sistema de regulação
constitucional dos antagonismos (e de sua lógica subjacente de
amigo-inimigo) e de que precisa de máscaras que evitem qualquer
tentativa de identificação e divisão, desviando a luz dos focos
policiais e midiáticos.
É extraordinário ver agora como o
movimento foi capaz de organizar em rede sua erupção, o 15M, de realizar
uma mutação sem se destruir e em tempo útil em acampamentos e
assembleias nas praças, para assembleias de bairro nas grandes cidades,
de organizar ações distribuídas e inesperadas contra a execução de
despejos pelas hipotecas não pagas e de voltar a inundar as ruas contra
o Pacto do euro de 19 de junho. E como converteu até agora em fonte de
legitimidade e de nova indignação todas as tentativas de neutralização e
criminalização, sem perder a multiplicidade, complexidade e
radicalidade e, acima de tudo, unidade de esforço e aplicação sem uma
unidade de comando.
Mas talvez o mais surpreendente é que o
15M está fazendo tudo isso sem a participação de qualquer estrutura
pré-existente de protestos políticos e sindicais. Cuidadosamente
mantidas a parte, são incentivadas a participar dissolvendo-se e
metamorfoseando-se no movimento.
Esta natureza de sistema-rede aberto, é
na minha opinião a chave do carácter constituinte do 15M. O problema do
auto-governo de uma multidão, ou seja, o da combinação da diversidade do
movimento e sua capacidade para se unir na implementação oportuna da
força, nas formas de decisão por uma espécie de “consenso emergente”, na
capacidade de decidir na abundância de tons e opiniões, fazem deste
movimento uma ameaça formidável e duradoura. Hoje, começa a amadurecer o
projeto de concerto polifônico de instituições analógicas e digitais
capazes de responsabilizarem-se de produzir o comum. O principal
atrativo do 15M diante das tentações recorrentes de “solução política”,
eleitoral ou não, vai na minha opinião na ênfase na produção de
instituições materialmente capazes de se reapropriar e de gerir a
produção social que ocorre nas metrópoles (cidades-fábrica).
Nem é necessário falar que como na
Grécia ou na Tunísia, Marrocos ou Egito, o 15M dificilmente se manterá
vivo ou será diminuído a um destino trágico se não tiver intercessores,
relevos, parceiros em outras áreas e cidades Euro-Mediterrânicas. A
inteligência indignada distribuída está nas melhores condições para
identificar os adversários principais e secundários e de evitar os
atalhos do voluntarismo e do desespero.
Fonte: Global Brasil Revista Nômade
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