outubro 09, 2012

"Segundo Turno, Afinal", por Hugo Albuquerque

PICICA 1: "Serra e Haddad é confronto chave? Sim, é, aliás menos porque São Paulo é a maior cidade do Brasil e mais pelo singelo motivo que uma derrota de Serra é uma vitória de Aécio, e altera o panorama para 2014; derrotado, dificilmente a oposição ao PT nas próximas eleições gerais passará pelo PSDB paulista, o que muda substancialmente o jogo. Será Aécio o adversário e ponto final, a menos que tramem algo sórdido demais contra o governador mineiro.

PICICA 2: Enquanto isso, em Manaus a oposição animou-se com a possibilidade de dar ninho novo para tucano velho. Com isso o Amazonas ameaça armar o palanque para uma candidatura presidencial dos arqui-inimigos da Zona Franca de Manaus: o PSDB. Mesmo com a eventual derrota de Serra em São Paulo, é bom lembrar que o tucano Aécio Neves - o segundo na linha de sucessão à candidatura presidencial -, também não morre de amores pela zona franca. É ave do mesmo ninho. Para obter apoio da base de tucanos paulista, caso eleito presidente do Brasil, o neto de Tancredo Neves continuará abrindo as caixinhas da maldade contra o modelo econômico amazonense, que até então milagrosamente sustenta nossas florestas em pé (ainda somos a parte da Amazônia menos agredida pela expansão das fronteiras agrícolas; em compensação, a cidade uma esculhambação). Tamanha são as pressões sobre a zona franca pelo empresariado paulista que o tucano candidato à prefeitura de Manaus, quando Ministro da Casa Civil no governo de FHC, não conseguiu fugir da camisa-de-força confeccionada sob medida pelos barões e tubarões do capitalismo bandeirante, que não dorme de toca e não dá ponto sem nó. Caso Aécio seja candidato à presidência da república, o empresariado paulista não vai ser "besta" de abrir os cofres para o tucano mineiro. Óbvio, maninho(a)! O eleitor manauara consciente de cabelos em pé. Evidentemente que nenhum crítico que respeite a inteligência dos seus leitores ousaria defender incondicionalmente o modelo zona franca. Seria insensato apostar na longevidade do modelo, face as instabilidades da economia globalizada. Mas é bom lembrar que a eterna lenga-lenga dos parlamentares não tem servido apenas para suas sobrevivências políticas. São reais as preocupações com os níveis de emprego em Manaus, empregos que atingiram números expressivos antes da crise mundial. O problema é que não há discussão sobre as alternativas econômicas. O fato é que nem as fragilidades do modelo conseguem fortalecer o discurso do que se salvou da oposição ao governo federal na capital do Amazonas. Nesse sentido, não veremos o candidato tucano trazendo nova idéias para o debate. Ele também é refém do mesmo modelo. De certa maneira seu discurso se assemelha aos dos situacionistas: a zona franca é intocável. Evidentemente que tucanos et caterva aproveitam para trollar o governo federal toda vez que são impostas perdas de postos de trabalho ao Polo Industrial, oriundas de manobras político-empresarias de outros mercados da federação. Instala-se um clima - com justa razão - de deus-nos-acuda (pergunte aos desempregados aqueles que sabem que pimenta também arde no seu fiofó), com grande visibilidade midiática, sem que as inconsistências do modelo sejam devidamente analisadas. Uma espécie de paralisia mental progressiva instalou-de de tal maneira que não há soluções à vista senão a recorrente prorrogação do fim da zona franca. Salvo as exceções de praxe, os debates costumam ser marcados por profunda anemia analítica. É de causar indigestão entre gregos e troianos.  Nesse cenário, a rejeição das urnas à candidatura de Vanessa Graziottin, do PC do B, é também uma resposta à catatonia imposta à bancada de parlamentares no Congresso Nacional, fruto do jogo cruel das regras do capitalismo tropical. Esse é apenas um dos recados do fundo das urnas. Tem mais. Voltaremos ao tema. No presente é preciso reconhecer que há insegurança em muitos lares manauaras. O paradoxo baré é crer que sob as asas de um tucano voltaríamos a voar. Quem conhece a cultura amazônica sabe que vôo de tucano é vôo curto e de curta duração. É uma ave que costuma se alimentar das fezes de outras aves, para tanto fazendo um barulho danado... pra nada!  A candidatura de Vanessa Graziottin, do PC do B, com candidato a  vice-prefeito pelo PT, corrigidas os erros do primeiro turno, pode representar um sinal de alerta contra o sucídio coletivo da sociedade manauara. Confiar em tucanos (vixe!) é o mesmo que lavar a bacia e jogar fora a água com o bebê dentro. Sugiro dar um caráter mais laico ao segundo turno, depois da pernada que as igrejas evangélicas deram na coordenação política da sua campanha. Tais igrejas parecem insatisfeitas com questões menos espirituais e mais republicanas.

Segundo Turno, Afinal

Batalha pelo simbólico em PoA: o Tatu da Coca e a privatização da cidade
As eleições municipais apresentaram poucas surpresas. Em geral, gestões bem-avaliadas venceram em primeiro turno com certa tranquilidade, o que nem sempre é positivo: é o gerencialismo que domina aqui e acolá, um certo comodismo mórbido com melhoras inerciais, dificilmente acompanhadas de qualquer perspectiva de urbanismo mais sofisticada, de direito à cidade. A crítica da esquerda, no entanto, precisa ir mais longe; de fato, esse gerencialismo urbano (que é conservador, mas não levanta bandeira nem deixa de incorporar certos maneirismos de esquerda) melhora em alguns aspectos a vida das pessoas, o desafio, portanto, é mostrar qual é a alternativa, construir um programa bem estruturado com tudo que se imagina de uma cidade liberta e viva e um sistema de propaganda suficiente -- é preciso atacar o tatu da coca-cola, mas também é preciso ir além. 

O consenso em torno de Fortunati, Lacerda, Paes foi exatamente isso. Só mudou, nos lugares  onde algo deu errado, como em Salvador e São Paulo -- onde talvez os projetos (ou dejetos, conforme se veja) que governaram a prefeitura nos últimos quatro anos precisavam, pela tensão de forças em seu interior, caminhar mais à direita. Justamente será em São Paulo e Salvador onde a velha oposição ao governo Lula irá confrontar o PT, onde o cenário está mais polarizado do que nas brigas quase consensuais entre facetas da base governista (e, por que não, do próprio Lulismo). ACM Neto é uma ameaça importante, apesar de isolado. Serra e Haddad -- que é ele, mas é Lula como poucos -- protagonizarão outro confronto importantíssimo. Em Belo Horizonte, é errado pensar numa vitória da velha oposição, mas de outra coisa: do tipo de oposição que Aécio Neves sonha em implementar, a despeito do PSDB paulista, que é a alternativa gerencial em parceria com o PSB de Eduardo Campos (isto é, dilmismo completamente sem esquerda, um horror sem dúvida) -- como também é igualmente errado, pelos mesmos motivos, pensar que o que houve no Recife, com a ascensão do PSB sobre o PT, não seja preocupante.

Serra e Haddad é confronto chave? Sim, é, aliás menos porque São Paulo é a maior cidade do Brasil e mais pelo singelo motivo que uma derrota de Serra é uma vitória de Aécio, e altera o panorama para 2014; derrotado, dificilmente a oposição ao PT nas próximas eleições gerais passará pelo PSDB paulista, o que muda substancialmente o jogo. Será Aécio o adversário e ponto final, a menos que tramem algo sórdido demais contra o governador mineiro. No plano municipal propriamente dito, Serra manteve o apoio entre as classes médias tradicionais do centro expandido, conquistou boa votação nos bairros da periferia próxima -- zona norte, zona leste --, mas ainda registra uma altíssima rejeição do público local pelo desastroso rumo da gestão Kassab, que é de responsabilidade sua -- e com a qual se mantém coligado via PSD. Haddad, por sua vez, é uma aposta de renovação do Lulismo por dentro. Um quadro jovem, com chances intelectuais e capacidade de atuação, em relação ao qual não resta dúvida que Lula espera muito dele, do contrário o teria abandonado em algum momento dessa eleição -- e, tão logo debateremos o Lulismo, mas se ele existe (e suspeitamos que sim), Haddad é uma possibilidade de sua manutenção e resolução à esquerda pelo seu histórico.

Fonte: O Descurvo

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