julho 31, 2012

Diplô e Outras Palavras: O retorno dos filósofos comunistas; Como a Europa prepara a sua Década Perdida; Coca-Cola terá de sair da Bolívia antes do fim-do-mundo

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Boletim de atualização de Outras Palavras e Biblioteca Diplô - Nº 195 - 30/7/2012


Londres-2012, euforia e fantasmas 
Numa Grã-Bretanha mergulhada em incertezas, romance convida a repensar Jogos, dissipando discurso ingênuo de orgulho-e-legado e enxergando interesses em conflito. Por Joanna Kavenna

O retorno dos filósofos comunistas
Empobrecimento, desigualdade e declínio das velhas democracias estão levando pensadores a dialogar com face anti-estatista, radical e libertária do marxismo. 
Por Santiago Zabala
 
Outra América: uma viagem
Nova coluna: fotógrafa brasileira conta como decidiu, aos 32, suspender carreira e vida urbana, para conhecer continente a fundo. Por Elaine Santana

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OUTRAS MÍDIAS 
Uma seleção de ótimos textos publicados na blogosfera brasileira


Como a Europa prepara sua Década Perdida
Economista aponta notáveis semelhanças entre políticas seguidas pelo Velho Continente e as que empobreceram América Latina no século 20. Nos dois casos, pequena minoria ganhou com a crise. Entrevista de Eric Toussaint à Agência Adital


Coca-Cola terá de sair da Bolívia antes do fim-do-mundo
Empresa deverá deixar país até o dia 21 de dezembro desse ano. Segundo governantes, o fim do calendário maia marca o fim de uma era, o capitalismo.
No Vermelho
 

Planos de saúde e as campanhas eleitorais
Estudo aponta que medicina privada tem aumentado seu apoio a candidatos e partidos; muitos de seus interesses já foram contemplados.
Por Patrícia Benvenuti, no Brasil de Fato
 

Banqueiros ou Banksters?
Cresce, em todo o mundo, consciência sobre manipulações e até crimes praticados pelas instituições financeiras. E volta ao uso um termo curioso usado durante a Grande Depressão...
Por Julio Godoy, na Envolverde-IPS

Um passo contra o machismo em Londres-2012
 

Pela primeira vez na história dos Jogos, mulheres competem em todas as modalidades - inclusive em mais que os homens. E (outro fato inédito) todas as delegações enviaram competidoras. Por Benjamin Mack, na Deutsche Welle
 
Os números chocantes da agressão aos homossexuais
Nova pesquisa de Centro de Referência em DST/Aids sugere: um em cada seis sofreu agressão sexual ou física; maioria já foi molestada verbalmente.
Por Elaine Patricia Cruz, na Agência Brasil

Avanços e limites da Lei de Acesso à Informação
No Brasil, ela abrange também Estados e Municípios, o que pode favorecer participação popular. Porém, velhos costumem podem atrasar sua implementação concreta.
No Correio do Brasil

"Pinheirinho - Tiraram minha casa, Tiraram minha vida"

PICICA: Este vídeo foi postado  originalmente em Brasil de Fato.
 

"Walter Benjamin e o império do instante", por Márcia Junges

PICICA: "É muito curioso, por exemplo, quando Benjamin se fixa em tipos humanos que povoam o que hoje chamaríamos de shopping, mas que naquela época eram as passagens parisienses. Então, o filósofo fala da relação que os sujeitos têm quando estão na massa, quando estão nessas concentrações humanas. E ele se dá conta de que os passeantes se exibem diante dos outros, se vendem diante dos outros, adquirem eles mesmos o caráter de mercadoria que se oferece ao outros. O que Marx havia analisado, que o homem vende a sua força de trabalho e se converte em mercadoria no mercado de trabalho, pela venda de sua força de trabalho, é insuficiente para entender o capitalismo na época posterior e atual. E Benjamin rastreia uma forma de conversão dos sujeitos em mercadoria que tem a ver com o fetichismo da mercadoria, com a aura alucinatória, com a experiência estética, cultural com a mercadoria, não material. Pensemos que ele está escrevendo nos anos 1920-1930 do século passado, então se supõe um adiantamento, uma lucidez."

Walter Benjamin e o império do instante

Progresso como ideologia institui o império do instante, destruindo a experiência em função da fugacidade e da velocidade sempre mais acelerada na modernidade capitalista. Nesse cenário, não há espaço para a memória, critica o filósofo José Antonio Zamora

Por: Márcia Junges | Tradução: Moisés Sbardelotto

As estruturas temporais da modernidade capitalista estão marcadas pela velocidade, por uma aceleração permanente. Ao mesmo tempo, parece que nada de novo, em seu sentido radical e autêntico, é produzido. “Novidades” proliferam em ritmo frenético, e essa avalanche de bens de consumo nos conduz ao império do instante, do fugaz, do descartável. Ao nos inscrevermos nessa lógica, acontece “uma anulação e uma destruição da experiência, porque a relação que o sujeito estabelece com a realidade por meio do consumo está marcada por essa fugacidade, por essa transitoriedade”. A análise é do filósofo espanhol José Antonio Zamora na entrevista exclusiva que concedeu, pessoalmente, à IHU On-Line. Há uma “empatização com a mercadoria”, assegura Zamora, referindo-se ao pensamento de Walter Benjamin. Não se trata mais de um consumo material em si, e o valor de uso do produto fica de lado. Entra em cena a aura alucinatória das mercadorias, que são convertidas em objeto de desejo pelas qualidades subjetivas que conferem ao seu possuidor. Daí à conversão dos sujeitos em mercadoria é um passo. “Benjamin rastreia uma forma de conversão dos sujeitos em mercadoria que tem a ver com o fetichismo da mercadoria, com a aura alucinatória, com a experiência estética, cultural com a mercadoria, não material”. Zamora critica esse devir cronológico, que tem na elaboração ideológica do progresso sua mais rematada concretização. A figura do redemoinho seria mais adequada para compreendermos a realidade social, quando tudo é movido, mas nada muda.

Zamora foi conferencista do evento O tempo messiânico contra o furacão destrutivo do capitalismo, de 28 de setembro a 1º de outubro de 2009, promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Unisinos. Docente no Instituto de Filosofia do Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC) da Espanha, é autor de, entre outros, Th. W. Adorno: pensar contra la barbarie (Madrid: Trotta, 2004) e Ciudadania, multiculturalidad e inmigración (Navarra: Verbo Divino, 2003). Estudou Filosofia, Psicologia e Teologia na Universidade Pontifícia de Comillas, em Madri. Doutorou-se na Universidade de Münster, na Alemanha, com uma tese sobre Theodor Adorno, orientada por Johann Baptitst Metz.

Confira a entrevista.

IHU On-Line - Qual é a relação que o senhor estabelece entre Walter Benjamin  e o tempo e consumo no capitalismo?

José Antonio Zamora - Walter Benjamin é um pensador que pretende desentranhar as chaves da modernidade capitalista. Uma dessas chaves fundamentais é a questão do tempo. Normalmente, consideramos o tempo como uma realidade imutável, como se o tempo houvesse sido sempre igual em todas as épocas históricas, mas, na realidade, o tempo também é uma construção social. Nesse sentido, a modernidade capitalista estabelece estruturas temporais. Estas estão marcadas por uma aceleração permanente, a velocidade. E, ao mesmo tempo, há uma sensação de que nada novo, em um sentido radical, se produz. A modernidade está relacionada com o novo. Este é o tempo novo frente ao antigo, frente à Idade Média, frente ao antigo regime. Entretanto, a proliferação de novidades e a aceleração na proliferação destas produz um certo “instantaneísmo”, o domínio do instante, do fugaz. E isso, ao mesmo tempo, faz com que se produza uma desqualificação do instante pela falta de duração. Ao não ter duração, não se inscreve experiencialmente no sujeito, e então isso produz uma sensação de vazio nisso que, hoje em dia, recebeu o nome de pós-modernidade. Há uma sensação de que as utopias, o sujeito, a razão, morrem. Vivemos em um mundo "pós": pós-humano, pós-político, pós-histórico, pós-moderno. É uma consequência última desse processo de aceleração. Então, digamos, isso que faz parte das estruturas, para mim, é uma chave para desentranhar o que a modernidade capitalista produz na sociedade e na experiência que os sujeitos têm nessas sociedades. Isso por um lado.

O tempo devorado

O problema é a mediação entre o que poderíamos chamar de tempo concreto, o tempo em seu caráter experiencial, e depois um marco, que, no capitalismo, é o marco do valor abstrato, que é o tempo enquanto critério de quantificação do valor do capital, do dinheiro. Trata-se de buscar e de entender essa mediação, porque a modernidade produz uma grande quantidade de inovação tecnológica, de mudança social, de mudança de mentalidades. É uma revolução permanente de costumes, de ideias, de afetos, de técnicas, de todo tipo. E, ao mesmo tempo, apesar de tudo estar em revolução, no entanto, o marco abstrato do valor e o tempo abstrato do valor de troca, ou do dinheiro, do capital, é um marco fixo, estático. Parece como se esse marco estático devorasse o tempo concreto, engolisse, se apoderasse do tempo concreto e anulasse sua capacidade de produzir verdadeira novidade, algo verdadeiramente novo. Evidentemente, isso tem a ver com o consumo, na medida em que o capitalismo também produziu uma infinidade enorme de mercadorias, de produtos, uma multiplicação. Mas essa multiplicação de produtos está a serviço da multiplicação do benefício, então os sujeitos são impulsionados a consumir vorazmente. Porém, nesse consumo, produz-se realmente uma anulação e uma destruição da experiência, porque a relação que o sujeito estabelece com a realidade por meio do consumo está marcada por essa fugacidade, por essa transitoriedade.

IHU On-Line - A que se atribui essa aceleração do tempo? Ela está, então, submetida ao imperativo do consumo?

José Antonio Zamora - Sim, porque, de um lado, o capitalismo, por meio da inovação tecnológica, organizativa e logística, tem uma capacidade enorme de produzir cada vez mais com menos. É a lógica de racionalização, de efetividade, de eficácia, a competitividade. Os saltos de produtividade têm sido enormes. Então, isso faz com que possamos produzir muito mais com menos, mas a criação de riqueza material não é o mesmo que a criação de benefício. A criação de benefício não depende da criação de riqueza, mas sim do valor de troca associado às mercadorias. Então, para seguir mantendo a acumulação, é necessário produzir mais, isto é, a produtividade não tem como consequência um ganho de tempo, de tempo não produtivo, de tempo de descanso, de tempo fora do âmbito da produção e do consumo. O crescimento da produtividade tem que ser compensado com um crescimento tremendo do consumo. Estamos continuamente compelidos a consumir, senão seria impossível que a maquinaria seguisse funcionando.

Aura alucinatória das mercadorias

O capitalismo também é uma forma de cultura, não só uma forma de produzir. Então, tem que estar continuamente alimentado o desejo, gerando, portanto, uma apetência permanente de mercadorias. E Benjamin consegue rastrear um fenômeno específico – e eu acredito que foi a pessoa que melhor o entendeu –, que ele chamou de "empatização com a mercadoria". É uma aproximação e uma identificação empática com a mercadoria, que não é seu consumo material, não tem a ver com o valor de uso, mas sim com a aura alucinatória que as mercadorias adquirem no capitalismo para se converter em objeto de desejo. Aí há um processo de assimilação, de “empatização”, diz ele, com o anorgânico. Isso transforma os sujeitos em sujeitos auráticos mercantilizados.

É muito curioso, por exemplo, quando Benjamin se fixa em tipos humanos que povoam o que hoje chamaríamos de shopping, mas que naquela época eram as passagens parisienses. Então, o filósofo fala da relação que os sujeitos têm quando estão na massa, quando estão nessas concentrações humanas. E ele se dá conta de que os passeantes se exibem diante dos outros, se vendem diante dos outros, adquirem eles mesmos o caráter de mercadoria que se oferece ao outros. O que Marx havia analisado, que o homem vende a sua força de trabalho e se converte em mercadoria no mercado de trabalho, pela venda de sua força de trabalho, é insuficiente para entender o capitalismo na época posterior e atual. E Benjamin rastreia uma forma de conversão dos sujeitos em mercadoria que tem a ver com o fetichismo da mercadoria, com a aura alucinatória, com a experiência estética, cultural com a mercadoria, não material. Pensemos que ele está escrevendo nos anos 1920-1930 do século passado, então se supõe um adiantamento, uma lucidez. 

Hoje, basta entrar em um shopping para entender Benjamin. É uma coisa que Theodor Adorno  também analisa. Porque o valor de troca em Marx era simplesmente o preço, tinha a ver com o sistema de dinheiro para trocar mercadorias que são qualitativamente diferentes. Mas aqui estamos falando de outra coisa, estamos falando dessa aura alucinatória, o brilho, o esplendor que as mercadorias adquirem, que lhe permitem ter vivências, experiências subjetivas da relação que não tem a ver com o substrato material da mercadoria. Por que um carro de luxo faz com que o possuidor tenha “sex appeal”? É a relação da materialidade da mercadoria e os atributos que se projetam alucinatoriamente sobre ele. Então, isso permite rastrear uma coisa que, por exemplo, Adorno chamava de “o consumo do valor de troca”, que, na forma habitual de pensar as teorias marxistas, tradicionais, não teria sentido, só se pode consumir o valor de uso de uma mercadoria.

IHU On-Line - Voltando à questão da aceleração do tempo, que conexões há entre ela e o fim da história, da razão, do sujeito, da política e das ideologias? Não se cria aí uma apatia do sujeito contemporâneo em função desse cenário?

José Antonio Zamora - A questão da aceleração e do fim da história aparece como duas interpretações opostas. A categoria da aceleração parece ser um impulso para frente, à velocidade, ao rápido, a uma meta. Parece que, no conceito de aceleração, há como que um esquema tecnológico de fundo. No entanto, o fim da história parece propor que o que se produz é uma “estática”, uma parada, uma detenção, algo que não se move, que está detido. Benjamin, claro, não se refere a esse teorema do fim da história, que é um teorema hegeliano, que depois foi percorrido por Francis Fukuyama. Mas Benjamin tinha diante de si o teorema nietzschiano do eterno retorno. Então, diz ele, tanto a ideia burguesa, marxista ou social-democrata de progresso, de avanço a uma meta, concepção teleológica da história, e esta outra, do eterno retorno, são duas formas de falsa consciência daquilo que realmente ocorre. Porque só se entende o que realmente ocorre a partir da mediação desses dois esquemas interpretativos. Teríamos que recorrer, talvez, a uma imagem do redemoinho. Quando você vê um fluxo de água, forma-se um redemoinho, que começa a mover tudo, mas fica fixo, está fixo, não muda, não se move. Essa imagem pode nos ajudar a entender o que Walter Benjamin persegue em sua análise. Porque essa aceleração tremenda, esse processo de inovação tecnológica, de transformação permanente faz com que, na realidade do sistema social, tudo mude para que nada mude: está imóvel.

O novo qualitativo e o novo cronológico

A análise de Benjamin persegue essa questão tão própria do sistema produtor de mercadorias de, por um lado, criar uma pluralidade, uma diversidade, um ato de inovação permanente, de multiplicação, de diversificação. Pensemos, por exemplo, como era a vida dos sujeitos antes da revolução econômica que é o sistema capitalista. Seu mundo de objetos, de vivência, era relativamente pobre comparado ao que nós hoje vivemos em todas as ordens. No entanto, nessa produção contínua da novidade, realmente está se escamoteando o novo, o radicalmente novo.

Benjamin analisa o fenômeno da moda e diz que as mercadorias precisam utilizar a propaganda da novidade. Mas a novidade, pela pura novidade, é um critério abstrato, é simplesmente aquilo que no tempo acontece em último lugar, não tem outra qualificação a não ser aquilo que ocorreu por último. Então é isso que se busca: quando se oferece as mercadorias, prometem-nos que teremos o último, pois aquilo que já temos está atrasado. Contudo, não se analisa o que há realmente de novo no novo. Porque o novo, em sentido enfático, profundo, tem que ser qualitativamente novo, é uma determinação qualitativa, e não meramente cronológica. Então, no império da cronologia, do devir cronológico, em um continuum de instantes que se sucedem no tempo, o que se produz realmente é uma sabotagem da produção do radical e do verdadeiramente novo. Acrescenta-se a isso que essa concepção que chamamos teleológica do tempo, que é expressada de um modo muito preciso na ideia moderna de progresso, é a forma como nós, modernos, entendemos o tempo. Entendemos o tempo como progresso. Então, diz Benjamin, essa forma de interpretar o processo histórico é uma forma de interpretar que reflete essa aceleração constante do tempo, esse processo inovador constante, que, no entanto, como mero reflexo, é uma elaboração ideológica, porque não permite ver o que, nesse processo, há de regressão, destruição, aniquilamento, vítimas.


Lógica sacrificial

Nesse processo histórico, interpretado como progresso, tudo é submetido à consecução da meta. O resultado aparece como capaz de justificar todos os preços pagos para a sua consecução. Na realidade, essa ideia de progresso responde a uma lógica sacrificial. E, de fato, um dos autores em que essa ideia tem, na filosofia da história, uma interpretação mais acabada, Hegel, fala precisamente do altar da história, onde são sacrificadas gerações, homens, para a consecução de uma meta futura, que é a plenitude da história. Nesse sentido, o fim da história é também o juízo final. Não é preciso esperar nenhum juízo ulterior que revogue o acontecer fático da história, mas a própria história é seu juízo. A história vai realizando seu juízo no próprio devir. Então, tudo é justificado como preço do resultado. Então, se pensarmos que Walter Benjamin encontra diante de seus olhos, no momento histórico em que vive, a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais, a emergência dos fascismos na Europa, o triunfo do nacional-socialismo na Alemanha, a perseguição dos judeus, ele não pode entender que esse presente possa ser, digamos, o epílogo de um processo histórico anterior. Algo falhou nessa interpretação da história, que nos cegou para compreender realmente os custos desse processo. E, quando não somos capazes de ver os custos desse processo em termos de vítimas, de destruição, de ruínas acumuladas, estamos alimentando a própria lógica sacrificial que se sustenta como esquema de dominação histórico que não foi rebaixado. Então, a novidade viria só do fato de sermos capazes de interromper esse processo. Benjamin tem um conceito messiânico do tempo.

IHU On-Line – A partir disso, como podemos compreender a junção messianismo e política nesse pensador?

José Antonio Zamora - Não é simples a interpretação que Benjamin faz do messiânico. Ele tem um fragmento, que é o Fragmento Teológico-Político, em que ele fala da relação entre a ordem do profano e a ordem do messiânico. Normalmente, o messiânico está relacionado à teologia, à religião. Então, ele fala dessas duas ordens como duas ordens diferentes, separadas e com uma certa tensão: enquanto que a ordem do profano é voltada à busca da felicidade dos sujeitos, a ordem do messiânico é interpretada por Benjamin como interrupção. Ele não pensa o Reino de Deus, podemos dizer, como o fruto maduro de um processo histórico, que é como muitas vezes o interpretamos: pensamos que a história vai caminhando rumo a uma plenitude, e essa plenitude é o Reino do Deus, o epílogo da história. Isso converteria o Reino de Deus no prêmio dos vencedores. Então, pensando o esquema apocalíptico, ele diz: o Reino de Deus não é a meta da história, mas sim seu final, seu final como interrupção. Na visão apocalíptica, o Messias chega como aquele que derrota o AntiCristo, é aquele que enfrenta uma situação de dominação destrutiva dos seres humanos. O Messias não é o herdeiro do trono histórico. Então, isso é importante no sentido de que o messiânico é entendido como a irrupção do radicalmente novo, que tem como condição de possibilidade a interrupção da prolongação da catástrofe que foi a história.

IHU On-Line – Então, a partir dessa ideia, poderíamos repensar o conceito de política?

José Antonio Zamora - Isso é o que pretende Walter Benjamin. Aquilo que conhecemos como o teorema da secularização vinha dizer que a modernidade europeia é uma tradução, translação das contribuições do cristianismo levados a conceitos seculares. Benjamin tem um conceito diferente da relação entre a ordem política e a ordem religiosa. Ele não busca uma tradução, uma translação. Ele fala de uma relação como um papel secante com a tinta, mesmo que a tinta nunca possa ser absorvida totalmente. Ele tenta introduzir a teologia dentro da política, de uma maneira que tanto a teologia quanto a política fiquem “translocadas”, “transtocadas” em sua dinâmica. Então, para que isso possa ficar entendível, ele diz: Karl Marx secularizou a ideia de Reino messiânico e a ideia de sociedade sem classes. Imediatamente, diz: é imprescindível devolver à revolução seu rosto messiânico, se não queremos que a classe trabalhadora seja arrasada pelo processo que ele via nesse momento de dissolução. Então, o que quer dizer devolver um rosto messiânico? Até agora, Marx pensou as revoluções como locomotoras da história, como aquilo que faz avançar para frente, que impulsiona a história para sua meta. Mas, diz Benjamin, é preciso entender as revoluções como um “agarrar” o freio de emergência do trem da história. Então, devolver um rosto messiânico quer dizer interromper uma marcha. Benjamin pensa a revolução não como um salto à meta, mas sim como interrupção de um processo que, até agora, tem sido um processo catastrófico. Poderíamos dizer a Walter Benjamin: “Você exagera um pouco o negativo desse processo. Realmente houve progressos”. Suponho que ele não negasse esse progresso.

O que acontece é que, evidentemente, seu horizonte e sua perspectiva não é a perspectiva dos vencedores, mas sim a perspectiva dos vencidos. Por isso, na tese 8 da Filosofia da história, ele diz: para os oprimidos, o estado de exceção é a regra. Isto é, essa história, vista a partir dos que foram esmagados, dos que foram anulados, é uma história catastrófica. E, desde muito cedo, ele quis pensar messianicamente a história, que é pensar a partir dos deserdados, dos últimos, dos esmagados, dos oprimidos. Pensar a história messianicamente é pensá-la a partir desse horizonte. E isso já está no escrito sobre Goethe  e as afinidades eletivas, em que ele diz: não nos foi dada outra esperança mais do que pelos que carecem de esperança. Então, não é a esperança daqueles que têm perspectiva de êxito, que querem dar o último salto para o paraíso, porque essa é a perspectiva dos vencedores da história. Por isso, a sua crítica tão forte à social-democracia e, em parte também, mesmo que nunca o nomeie, ao comunismo. As classes trabalhadoras fizeram com que as vítimas se vejam com a ideologia daqueles que os oprimem, com a ideologia burguesa. Segundo Benjamin, acreditar que cavalgamos na crista da onda e que somos o motor da história – assim eram interpretadas, dentro da tradição marxista, as organizações dos trabalhadores no começo do século – é uma espécie de obnubilação, de autoengano. Porque a história aparecia aos seus olhos como dotada de uma espécie de automatismo de emancipação, que, de um modo ou outro, bastava esperar, porque a história caminhava inexoravelmente para o paraíso comunista. O filósofo completa que nada pior poderia ter ocorrido com aqueles que são chamados a transformar a história do que pensar que a história, por sua própria dinâmica, conduz à emancipação, à superação da dominação.

IHU On-Line - Em que sentido se pode falar de uma destruição da experiência a partir do pensamento desse filósofo? O que isso significa?

José Antonio Zamora - O que Benjamin descreve como destruição da experiência tem a ver com esses processos que analisamos no começo, de aceleração do tempo. Já a própria industrialização supõe uma mudança estrutural de grandes dimensões na relação dos sujeitos, dos indivíduos com o mundo, com as coisas, com os acontecimentos. Ele tem um artigo em que fala sobre a pobreza da experiência, referindo-se, precisamente, às pessoas que voltavam do front da Primeira Guerra Mundial. E ele diz que, diferentemente de outras guerras, em que as pessoas voltavam contando o que havia acontecido, as pessoas que voltavam do front da Primeira Guerra Mundial vinham atônitas, sem palavras. Como se sabe, a Primeira Guerra Mundial foi uma guerra tremendamente cruel, em que se enviavam as tropas às trincheiras, que eram bombardeadas com os canhões e tanques. Era uma guerra de seres humanos convertidos em carne de canhão. Esse choque, essa comoção, é intragável ao sujeito, que não é capaz de inscrever o que lhe acontece em uma sequência biográfica. Se transladarmos esse exemplo à experiência cotidiana, da aceleração, Benjamin diz que essa multiplicação de sensações é inassimilável. Então, não podem ser traduzidas em experiências.

Máquina de esquecimento

Nós vemos televisão e estamos sendo continuamente impactados por imagens a uma grande velocidade. Por assim dizer, os videoclipes são a vanguarda do meio televisivo. E se o impacto televisivo não é suficientemente acelerado, ajudamos com o controle remoto e ficamos trocando de canal continuamente. É uma metáfora do que está ocorrendo conosco. Esse desassossego é a experiência do choque, do impacto. E, sem duração, os acontecimentos, os fenômenos, as coisas não podem se inscrever, não podem ser apropriados pelo sujeito. O sujeito está como que “resvalando” sobre as coisas. Na realidade, a experiência do consumo é algo assim. Essa é a diferença que havia entre uma viagem no século XIX e uma viagem no século XX. Podemos ir de um lugar para o outro, porque a velocidade é imensa. A palavra experiência, em alemão, vem da palavra viajar. “Erfahrung”, experiência em alemão, e “fahren”, viajar. E ter experiência era isso, era aventurar-se pelo novo, por aquilo que não era conhecido, pelo estranho, era descobrir o mundo. Experimentar é descobrir o mundo. É abandonar-se, entregar-se ao que não é próprio, entregar-se ao outro. E essa capacidade para entregar-se, para abandonar-se ao outro é anulada pela vertiginosidade do impacto, da sensação. Nessa forma transformada de relação com o mundo, não tem cabimento a recordação, a memória. Então, esse cúmulo de impactos, de sensações, na realidade, é uma máquina poderosíssima de esquecimento.

Quando falamos das gerações jovens, dizemos que elas vivem num instante eterno, que é o último que viveram. Produz-se uma destruição da memória. A memória precisa inscrever o acontecer na sequência biográfica e, para isso, precisa da duração. Romper a capacidade rememorativa incapacita os sujeitos para isso que Benjamin realmente busca, que está muito associado à crítica do progresso. Isto é, nós não podemos romper o curso e a sequência linear do tempo, se não estabelecermos uma relação diferente com o passado. E essa nova forma de relação, que são as sensações, é uma destruição da memória. Poderíamos dizer que, em Benjamin, destruição da experiência, destruição da memória e, portanto, a anulação da capacidade de subtrair-se a esse processo destrutivo do progresso vão de mãos dadas, estão unidas.

Fonte: IHU

Lançamento: Ho Chi Minh

"Técnicos do ICMBio protestam contra usinas no Tapajós" (União Campo Cidade e Floresta)

PICICA: "Além do plano para instalação de usinas, a bacia do Tapajós, conforme revelou o Valor em reportagem da semana passada, tem sido alvo crescente da extração ilegal de ouro e diamante, ações que já traíram cerca de 60 mil garimpeiros para a região. Praticamente tudo é feito de forma ilegal. As áreas que pertenciam às florestas protegidas e que agora estão fora das unidades já são cobiçadas por iniciativas extrativistas. Para os especialistas do ICMBio que atuam na região, o corte das florestas “em áreas de significativa biodiversidade ainda desconhecida, a favor de um empreendimento que não comprovou minimamente a sua viabilidade técnica, econômica, social e ambiental, subverte gravemente as normas constitucionais de proteção ao patrimônio ambiental e os princípios fundamentais de gestão das unidades de conservação”."

Técnicos do ICMBio protestam contra usinas no Tapajós

do site Combate Racismo Ambiental


Técnicos da Eletrobrás inspecionam um dos locais onde poderá ser contruída a hidrelétrica de Sao Luiz do Tapajós Créditos: Ruy Baron/Valor

André Borges, Valor

Os técnicos e analistas ambientais responsáveis pela gestão das principais unidades de conservação da floresta amazônica, na bacia do Tapajós, decidiram manifestar sua contrariedade com a decisão do governo de reduzir as áreas protegidas para viabilizar a construção de usinas hidrelétricas nessa região do Pará. O Valor teve acesso a uma carta aberta que os especialistas pretendem divulgar. No documento, carimbado e assinado por 12 técnicos ambientais ligados ao Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), os especialistas afirmam que, como servidores públicos, é “grave o fato de não haver qualquer estudo que embase a desafetação (redução das florestas), relacionando os impactos diretos e indiretos do empreendimento às características socioambientais” da região.

“Entendemos que a compreensão dos impactos, bem como o licenciamento do empreendimento, não pode ser tratada de forma fragmentária, negligenciando as dimensões reais das consequências da viabilização de todo o complexo”, afirma o texto. Os registros ambientais feitos até agora, alegam os especialistas, apontam “altíssima biodiversidade, com considerável taxa de endemismo e grande representatividade de espécies ameaçadas de extinção”.

Em janeiro, o governo cortou áreas de oito unidades de conservação ambiental com o propósito de liberar espaço para o estudo ambiental das hidrelétricas de São Luiz do Tapajós e de Jatobá, duas obras consideradas prioritárias pelo governo para ampliar a capacidade de geração de energia do país. Em maio, o Congresso Nacional converteu a MP em lei, sem nenhum tipo de debate ou audiência pública prévia.
“Do ponto de vista da legalidade, denunciamos a desafetação das unidades realizada primeiramente por medida provisória com objetivo único de dar celeridade ao processo em detrimento da realização de estudos comprometidos com a destinação original dessas áreas: proteção e conservação da biodiversidade”, afirmam os técnicos ambientais.

Além do plano para instalação de usinas, a bacia do Tapajós, conforme revelou o Valor em reportagem da semana passada, tem sido alvo crescente da extração ilegal de ouro e diamante, ações que já traíram cerca de 60 mil garimpeiros para a região. Praticamente tudo é feito de forma ilegal. As áreas que pertenciam às florestas protegidas e que agora estão fora das unidades já são cobiçadas por iniciativas extrativistas. Para os especialistas do ICMBio que atuam na região, o corte das florestas “em áreas de significativa biodiversidade ainda desconhecida, a favor de um empreendimento que não comprovou minimamente a sua viabilidade técnica, econômica, social e ambiental, subverte gravemente as normas constitucionais de proteção ao patrimônio ambiental e os princípios fundamentais de gestão das unidades de conservação”.

O presidente do ICMBio, Roberto Ricardo Vizentin, disse ao Valor que reconhece o direito dos servidores do instituto de se manifestarem sobre o assunto, mas que a carta não reflete o posicionamento oficial do órgão. “Há uma decisão estratégica de desenvolvimento do país e o potencial para gerar a energia capaz de atender essa demanda está localizado em áreas de proteção integral. Para permitir a realização dos estudos, a área tinha que ser desafetada. É uma questão lógica”, disse.

Boa parte das queixas apresentadas pelos técnicos, segundo Vizentin, será respondida exatamente por conta dos estudos de impacto ambiental em andamento. “As preocupações são legítimas, mas estão contempladas nos estudos. É esse relatório que chegará à conclusão se licencia ou não”, afirmou o presidente do ICMBio. “Se a desafetação é constitucional ou não, é o STF que vai dizer. Não tenho condições de opinar sobre isso. Nossa posição, como instituição, é realizar o que foi estabelecido.”

Uma ação de inconstitucionalidade sobre o corte nas áreas protegidas foi movida pelo Ministério Público Federal. A ação espera uma resposta do Supremo Tribunal Federal. “Reconhecemos que todo cidadão tem direito de se manifestar, mas não há nenhuma dificuldade de se fazer um debate sobre esse assunto dentro do ICMBio. Não existe nenhuma crise”, disse Vizentin.


Fonte: União Campo Cidade e Floresta

"Izquierda social e izquierda política", por Raúl Zibechi

PICICA: "Los obreros que construyen la gigantesca hidroeléctrica de Belo Monte en Brasil, que será la tercera del mundo, se lanzaron a la huelga en diciembre porque ganan 500 dólares mensuales por 12 horas diarias de trabajo y la comida que les sirven está podrida. Los representantes sindicales fueron hasta la obra para convencer a los obreros de que volvieran al trabajo. Los fondos de pensiones de tres empresas estatales tienen 25 por ciento de las acciones del consorcio que construye Belo Monte." 


Aumentar tamaño del texto Disminuir tamaño del texto Partir el texto en columnas Ver como pdf 28-01-2012

Izquierda social e izquierda política



La profundización de las diversas crisis y la emergencia de nuevos movimientos están promoviendo un debate sobre el papel de la izquierda en los cambios posibles y deseables. Muchos apuestan a una profunda renovación o a la unidad como forma de encontrar un norte que permita quebrar la hegemonía del sector financiero.

En general, los debates apuntan al papel de la izquierda política, o sea los partidos que se proclaman de izquierda. Superar las divisiones históricas, supuestamente alimentadas por diferencias ideológicas, sería un paso decisivo para ir más allá de la situación actual. La unidad entre las tres grandes corrientes, socialistas o socialdemócratas, comunistas y anarquistas o radicales, sería un paso imprescindible para que este sector esté en condiciones de jugar un papel decisivo en la superación de la crisis actual.

La experiencia histórica dice, sin embargo, otra cosa. La primera es que los partidos de izquierda no se unen si no existe un poderoso movimiento desde abajo que les imponga una agenda común. Quiero decir que los partidos de izquierda dependen del estado de ánimo y la disposición, para resistir o para acomodarse al sistema, de los trabajadores. Para la gente común los debates ideológicos son cosa de poca importancia.

Las experiencias del Frente Popular en la España republicana, de la Unidad Popular en el Chile de Salvador Allende y del Frente Amplio en Uruguay, indican que es el empuje de los diversos abajos lo que termina por derribar los sectarismos e impone, como mínimo, la unidad de acción. Fue la potencia del movimiento obrero la que decidió a los anarquistas a apoyar en las urnas a los candidatos del Frente Popular, venciendo sus resistencias a lo electoral.

La segunda es que ese 99 por ciento que se supone que somos, frente al uno por ciento que detenta el poder y la riqueza, tiene intereses diversos y, en esta etapa del capitalismo, contradictorios. A grandes rasgos, hay dos abajos, como dicen los zapatistas. Los de más abajo, o los del sótano –indios, afros, inmigrantes, clandestinos e informales–, componen el sector más oprimido y explotado del amplio mundo del trabajo. Ese mundo está integrado básicamente por mujeres y jóvenes pobres, en general de piel oscura, que viven en áreas rurales y en periferias urbanas. Son los más interesados en cambiar el mundo, porque son los que no tienen nada que perder.

El otro abajo es diferente. En 1929 sólo uno por ciento de los estadunidenses tenía acciones que cotizaban en la bolsa de Wall Street. En 1965 ya eran 10 por ciento, y en 1980, 14 por ciento. Pero en 2010 50 por ciento de los estadunidenses eran propietarios de acciones. Con la privatización del sistema de jubilaciones y la creación de los fondos de pensiones, todo un sector de la clase trabajadora quedó engrapado al capital. General Motors y Chrysler fueron salvadas de la quiebra en 2009 por los aportes de los fondos controlados por los sindicatos.

La segunda minera del mundo, la brasileña Vale, rechazada por ambientalistas y sin tierra, es controlada por Previ, fondo de pensiones de los empleados del Banco de Brasil, que tiene junto al BNDES una sólida mayoría en el consejo de administración de la multinacional. Los fondos de pensiones de Brasil tienen inversiones que representan casi 20 por ciento del PIB del país emergente y controlan enormes empresas y grupos económicos. Los fondos son el núcleo de la acumulación de capital y son gestionados por sindicatos, empresas y Estado.

Se trata apenas de dos ejemplos bien distantes para ilustrar el hecho de que la izquierda social, o los movimientos, supuestamente antisistémicos, tienen intereses contradictorios.

La tercera cuestión es que si reconocemos esta diversidad de intereses es para construir estrategias de cambio que estén enraizadas en la realidad y no en declaraciones o ideologías. ¿Cómo unir obreros manuales que ganan una miseria con empleados de cuello blanco que se sienten más cerca del patrón que de sus hermanos de clase?

Los obreros que construyen la gigantesca hidroeléctrica de Belo Monte en Brasil, que será la tercera del mundo, se lanzaron a la huelga en diciembre porque ganan 500 dólares mensuales por 12 horas diarias de trabajo y la comida que les sirven está podrida. Los representantes sindicales fueron hasta la obra para convencer a los obreros de que volvieran al trabajo. Los fondos de pensiones de tres empresas estatales tienen 25 por ciento de las acciones del consorcio que construye Belo Monte.

Los trabajadores de Petrobras, de la Caja Económica Federal y del Banco do Brasil están interesados en el éxito de Belo Monte ya que sus fondos de pensiones, controlados en gran medida por delegados sindicales, repartirán más dinero a costa de la explotación de los obreros, de la naturaleza y de los indígenas que desplaza la hidroeléctrica.

La cuarta es que toda estrategia para cambiar el sistema debe instalarse sólidamente entre aquellos que más sufren este sistema, los del sótano. Pensar en la unidad orgánica de los de abajo es colocar en el timón de mando a los que hablan y negocian mejor, a los que tienen más medios para estar allí donde se toman las decisiones, o sea, el arriba del abajo. Son los que mejor se mueven en las organizaciones formales, las que cuentan con locales amplios y cómodos, funcionarios y medios de comunicación y de transporte.

Los del sótano se reúnen donde pueden. A menudo en la calle, el espacio más democrático, como los Occupy Wall Street, los indignados de Grecia y España, y los rebeldes de El Cairo. No lo hacen en torno a un programa sino a un plan de acción. Y, claro, son desordenados, hablan a la vez y a borbotones.

Las estrategias para cambiar el mundo deben partir, a mi modo de ver, de la creación de espacios para que los diferentes abajos, o izquierdas, se conozcan, encuentren formas de comunicarse y de hacer, y establezcan lazos de confianza. Puede parecer poco, pero el primer paso es comprender que ambos sectores, o trayectorias, nos necesitamos, ya que el enemigo concentra más poder que nunca.

Fuente: http://www.jornada.unam.mx/2012/01/27/index.php?section=opinion&article=023a1pol

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Fonte: Rebelión

"Conjuntura da Semana. O que há de esquerda no governo Dilma Rousseff?" (IHU)

PICICA: "Os acontecimentos indicam que o governo é presto em atender os interesses que envolvem os grupos do 'andar de cima', mas lento quando se trata de atender as reivindicações dos grupos sociais mais fracos. Assiste-se dessa forma, tristemente, um governo que faz da economia o seu grande e único epicentro. Tudo concerne ao projeto desenvolvimentista, atropelando, postergando e colocando de lado a agenda social. Resta a pergunta para estimular o debate: O que há de esquerda no governo Dilma Rousseff?

Destaque-se ainda que os temas explorados aqui tiveram pouca repercussão na grande imprensa e até mesmo entre os movimentos sociais. Revelam que a agenda social perdeu força no governo, assim como a capacidade de reação dos movimentos – apenas fragilidade?" 


 

Conjuntura da Semana. O que há de esquerda no governo Dilma Rousseff?

A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia.


Sumário:
Povos indígenas. Marcados para desaparecerem?
Um novo ataque genocida à vista?
Portaria da AGU viabiliza modelo agroexportador
Suspensão ou revogação da portaria?
Cenário de retrocessos
Reforma agrária agoniza
Desempenho vergonhoso
Incra travou. Disputas e burocratização
O “silêncio” do MST
Dilma não aposta na Reforma Agrária
Tratado de Comércio de Armas
Brasil assume posição obscura
O que se pretendia com o Tratado de Comércio de Armas?
“Brasil! Qual é o teu negócio? O nome do teu sócio?”
“E eu aqui na praça dando milho aos pombos”
Conjuntura da Semana em frases


Eis a análise.


As Notícias do Dia publicadas diariamente pelo sítio do IHU, entre muitos temas relevantes, destacam na última semana três fatos: a portaria da Advocacia Geral da UniãoAGU que se traduz numa ameaça aos territórios e populações indígenas, a crise no Incra que emperrou de vez a Reforma Agrária e o Tratado de Comércio de Armas no qual o Brasil assumiu posição obscura. Os três acontecimentos – poder-se-ia acrescentar ainda o Decreto nº 7.777 – manifestam a face conservadora do governo Dilma Rousseff.

Os fatos mencionados, analisados na sequência, manifestam três características em comum. Primeira, o descaso para com a agenda social (indígenas e reforma agrária) e de direitos humanos (indústria das armas); segunda, a falta de sensibilidade para com grupos sociais mais vulneráveis e terceira, a rendição do governo aos interesses dos grandes potentados como afirma o sociólogo Werneck Vianna.


Os acontecimentos indicam que o governo é presto em atender os interesses que envolvem os grupos do 'andar de cima', mas lento quando se trata de atender as reivindicações dos grupos sociais mais fracos. Assiste-se dessa forma, tristemente, um governo que faz da economia o seu grande e único epicentro. Tudo concerne ao projeto desenvolvimentista, atropelando, postergando e colocando de lado a agenda social. Resta a pergunta para estimular o debate: O que há de esquerda no governo Dilma Rousseff?

Destaque-se ainda que os temas explorados aqui tiveram pouca repercussão na grande imprensa e até mesmo entre os movimentos sociais. Revelam que a agenda social perdeu força no governo, assim como a capacidade de reação dos movimentos – apenas fragilidade?


Vamos aos fatos.


Povos indígenas. Marcados para desaparecerem em pleno século XXI?
Um novo ataque genocida à vista?


Há uma questão intrigante em algumas iniciativas jurídico-políticas, com fundo econômico, em andamento em nosso país nos últimos anos. Os povos indígenas sofreram diversos golpes ao longo da história brasileira, reduzindo-os de populações, povos e etnias numerosos para cerca de 90.000 a 100.000 pessoas, na década de 1970. Tribos inteiras foram dizimadas, mas outras resistiram. Sofreram, é verdade, todo tipo de marginalização. Até hoje. Gradativamente, e com o apoio do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), criado em abril de 1972, foram se reorganizando, conquistando direitos e terras e crescendo em número. Isso em plena ditadura militar.


Entretanto, no princípio do século XXI, já restabelecida a democracia, parecem confrontar-se com uma nova onda de ataques aos seus direitos e territórios, ameaçando inclusive sua integridade física. Estaríamos diante de um novo ataque genocida, desta vez perpetrado sob o manto de um governo dito de esquerda e com a omissão (ou o consentimento) da sociedade em geral, particularmente das forças e movimentos sociais de esquerda?


“O governo brasileiro dá mais um passo rumo ao genocídio  dos povos indígenas,  em claro confronto com a legislação nacional e internacional da qual o país é signatário e põe em total insegurança jurídica  as terras indígenas”, escreve, sem meias palavras, o coordenador do CIMI-MS, Egon Heck. Sua indignação tem como pano de fundo a Portaria 303 da AGU (Advocacia Geral da União), de 17 de julho passado. Heck prossegue sustentando que a Portaria 303 “é mais um passo no caminho da extinção de grupos indígenas, na medida em que piora ainda mais a já caótica situação de reconhecimento e demarcação das terras indígenas no país”.


“Está ocorrendo uma verdadeira guerra contra os povos indígenas, a qual é puxada pelos setores que querem explorar as terras indígenas e os próprios povos indígenas do país. Infelizmente, o governo brasileiro e as instituições estão contribuindo nesse processo”, denuncia, por sua vez, o secretário executivo do CIMI, Cleber Buzatto, em entrevista especial à IHU On-Line.


A Portaria 303 da AGU, portanto vinda do Executivo federal, é publicada três anos depois do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que homologou a demarcação da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol em área contínua, para regulamentar a atuação de advogados e procuradores em processos judiciais que envolvem áreas indígenas em todo o país. Na prática, a portaria coloca em vigor as 19 condicionantes pelo STF para demarcação e direito de uso de terras indígenas na época do julgamento. Entre os pontos polêmicos da portaria, estão a proibição da ampliação de terras indígenas já demarcadas e a garantia de participação de estados e municípios em todas as etapas do processo de demarcação.


A Portaria 303 proíbe a comercialização ou arrendamento de qualquer parte de terra indígena que possa restringir o pleno exercício do usufruto e da posse direta pelas comunidades indígenas, veda o garimpo, a mineração e o aproveitamento hídrico pelos índios e impede a cobrança, pelos índios, de qualquer taxa ou exigência para utilização de estradas, linhas de transmissão e outros equipamentos de serviço público que estejam dentro das áreas demarcadas.


Entretanto, há uma condicionante, a de número 17, muito preocupante. A portaria também confirma o entendimento do STF de que os direitos dos índios sobre as terras não se sobrepõem aos interesses da política de defesa nacional, ficando garantida a entrada e instalação de bases, unidades e postos militares no interior das reservas. A expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas e de “riquezas de cunho estratégico para o país” também não dependerão de consentimento das comunidades que vivem nas TIs afetadas, de acordo com as regras. Ou seja, se colocada em prática, significa porteira aberta para os interesses do agronegócio. Voltaremos a este aspecto mais adiante.


Acrescente-se que as condicionantes são alvo de ao menos seis pedidos de esclarecimento – os chamados embargos de declaração – que podem resultar na alteração ou até mesmo na anulação de parte dos pontos questionados. Além disso, defensores da causa indígena e juristas têm o entendimento de que as 19 condicionantes se aplicam apenas à TI Raposa Serra do Sol e não a outras situações.


Em nota, o CIMI caracterizou a Portaria 303 como “um absurdo”, “uma excrescência jurídica”, que deve levar à “conflagração generalizada de conflitos fundiários envolvendo a posse das terras indígenas, inclusive a reabertura daqueles anteriormente solucionados com o ato demarcatório”. Em vez de solucionar de vez os problemas dos povos indígenas, agrava-os.


Na nota, o CIMI também desmascara as intenções e subserviências do governo brasileiro. “A real intencionalidade do Governo brasileiro ao editar a presente portaria não é outra senão a de tentar estancar de vez os procedimentos de reconhecimento de demarcação de terras indígenas no país. Usando uma decisão do STF como subterfúgio, o Governo Federal, mais uma vez, ‘dobra os joelhos’ e, rezando a cartilha do capital ditada pelo agronegócio, tenta pôr uma ‘pá de cal’ sobre o artigo 231 da Carta Magna de nosso país.”


Outras organizações se somam ao CIMI nessa denúncia. É o caso do Instituto Socioambiental (ISA). “O que assusta na portaria é seu autoritarismo. A AGU está se antecipando ao STF e adotando uma interpretação reacionária das condicionantes”, critica Raul do Valle, coordenador adjunto de Política e Direito Socioambiental do ISA. Para ele, a portaria é um retrocesso no posicionamento da União em relação aos direitos indígenas. “A medida retoma um linguajar e uma racionalidade que imaginávamos superados desde o fim do regime militar. Implicitamente, coloca os índios na condição de ameaça à soberania nacional, submetendo aspectos fundamentais de sua vida a uma decisão do Conselho de Defesa Nacional, sem que tenham sequer o direito de opinar sobre o destino de suas terras”, afirma Valle.
Além disso, segundo Raul do Valle, “a portaria atropela boas práticas administrativas que estão sendo construídas a duras penas e que têm como princípio o respeito à opinião e aos interesses dos povos e comunidades indígenas. Adota como regra, como exemplo, as más práticas, que subjugam os interesses dos índios em nome de um suposto interesse do Estado”.


A própria Fundação Nacional do Índio (Funai) divulgou, no dia 20 de julho, uma nota técnica em que afirma ser contrária à edição da Portaria nº 303, publicada pela Advocacia Geral da União (AGU). De acordo com a Funai, com a Portaria 303 a AGU “restringe o reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, especialmente os direitos territoriais, consagrados pela Constituição Federal”.


Portaria da AGU viabiliza modelo agroexportador


A Bancada Ruralista não faz nenhum segredo em relação ao seu lobby junto ao governo federal para a aprovação da Portaria 303 da AGU. A Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul, FAMASUL, junto aos Deputados do MS, com apoio da  Presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a Senadora Katia Abreu, assumem que pediram à Advocacia Geral da União, a Portaria 303 para retirar do judiciário os processos demarcatórios e dar poder ao governo para tomar as decisões e resolver os conflitos. (...)


“Para a Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul, a publicação da portaria é resultado de um esforço conjunto da instituição e seus sindicatos rurais, a bancada federal, governos, agentes políticos e vários atores nacionais. A decisão vai ajudar na resolução dos litígios registrados nas propriedades antes pretendidas pelos indígenas", diz matéria da FAMASUL. A solicitação foi oficializada junto à AGU em novembro de 2011.


A publicação da Portaria 303 é uma demonstração das sensibilidades do governo e sua sujeição às pressões dos fazendeiros e dos grandes proprietários de terras do país. Tem ouvidos para os interesses do agronegócio, mas é surdo aos direitos dos povos indígenas. Quando toca questões de interesse do andar de cima, parece reinar a celeridade, ao passo que as questões relativas aos índios são tratadas com morosidade, lentidão, falta de vontade política, como, aliás, já denunciamos neste espaço em análises feitas em dezembro e março passados. O que acaba repontando em aumento da violência contra os povos indígenas.


Indigenistas e ambientalistas são unânimes em afirmar que a Portaria atende a um pedido dos grandes fazendeiros deste país e a seus interesses de exploração desenfreada dos recursos naturais, às custas da marginalização de grupos humanos, especificamente os povos indígenas. Em nota, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira-COIAB sustenta que “a finalidade é remover os chamados obstáculos ao desenvolvimento, com a incorporação de novas terras para o agronegócio e facilitar o acesso e a super exploração dos recursos naturais”. “As terras indígenas e a luta dos povos indígenas para manterem seus projetos próprios de vida resistem contra essa perspectiva insustentável do ponto de vista social e ambiental. Na região sul da Amazônia, por exemplo, é facilmente percebível como as terras indígenas aparecem como verdadeiros oásis verdes em meio a terra arrasada pelo latifúndio, sem florestas e sem gente”, acrescenta a nota da COIAB.


De acordo com Cleber Buzatto, secretário executivo do CIMI, “a portaria abre, digamos assim, as ‘porteiras’ das terras indígenas para serem exploradas de diversas formas seja pelo Estado brasileiro seja por empresas particulares, no sentido de viabilizar infraestrutura para deslocamento de commodities agrícolas até os portos do país, e para viabilizar a exploração mineral ou exploração de recursos hídricos para produção de energia. Portanto, essa portaria pretende viabilizar justamente o modelo agroexportador vigente no país”.


Mais grave ainda, destaca Buzatto, é o fato de que “há um ataque duro e lastimável por parte do Executivo, que está usando a Portaria 303 como um instrumento de ataque aos direitos dos povos indígenas, atingindo as terras já demarcadas no país”.


Suspensão ou revogação da portaria?


Por pressão do movimento indigenista, a Portaria 303 foi, no dia 25 de julho, suspensa até setembro. A revisão da data de entrada em vigor das regras foi confirmada pelo advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e atende a uma reivindicação da Fundação Nacional do Índio (Funai), que se manifestou contrariamente à portaria argumentando que a norma restringiria o reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, especialmente os direitos territoriais, consagrados na Constituição Federal. Luís Adams, porém, esclarece que não está disposto a rever a Portaria. “Não pretendo rever a Portaria. O que devemos é estabelecer uma vigência mais adiante, no futuro, para permitir que a Funai possa promover algum diálogo com as comunidades sobre o assunto e ouvi-las sobre aspectos da portaria”, disse.


Mas, fica a pergunta: é suficiente suspender a Portaria para solucionar o problema ou ela deve ser revogada? Diante da insuficiência da suspensão temporária, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira-COIAB, em nota, “exige a imediata revogação da Portaria 303 da Advocacia Geral da União (AGU) que orienta os órgãos do governo federal a aplicar as condicionantes decididas pelo Supremo Tribunal Federal na demarcação da TI Raposa Serra do Sol/RR, para todas as terras indígenas do país. Somente a SUSPENSÃO dos efeitos como anunciado, não é suficiente. Exigimos sua revogação”.
Isso porque, segundo o secretário executivo do CIMI, Cleber César Buzatto, a Portaria “não tem fundamentação legal” e caso seja consolidada criará uma “situação de vácuo jurídico e de grande insegurança jurídica e política”.


Cenário de retrocessos


Para o coordenador do CIMI-MS, Egon Heck, com a entrada em vigor da Portaria 303, "todo o trabalho realizado há vários anos e décadas será jogado na lata do lixo, pois o que querem fazer prevalecer sobre os direitos constitucionais são os interesses do grande capital nacional e internacional".


De fato, excetuando alguns avanços – como a recente decisão da Justiça Federal de retirar os não índios da Terra Indígena Marãiwatsédé, no nordeste de Mato Grosso, homologada em 1998 através de um decreto presidencial, mas cujo conflito remonta aos anos 1960 –, os povos indígenas vêm acumulando ultimamente mais derrotas que vitórias.


São sinais disso: a aprovação no Congresso do Código “Florestal” ruralista; da PEC 215, que dá ao Legislativo a competência de decidir sobre as demarcações de Terras Indígenas; e da Medida Provisória nº 558, que altera o limite de oito unidades federais na Amazônia. A aprovação da PEC 215 é outro sinal evidente da omissão do Executivo federal. Sem falar da inglória luta dos indígenas contra a construção de hidrelétricas no coração da Amazônia.


Reforma agrária agoniza. Desempenho vergonhoso
O primeiro ano do mandato de Dilma Rousseff inscreveu em sua biografia uma marca: o pior desempenho desde a Era FHC na execução da Reforma Agrária. Dados oficiais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra, revelam que a presidenta em 2011 registrou a pior marca dos últimos dezessete anos no assentamento de famílias sem terra. Os números de 2011 são vergonhosos. Apenas 21,9 mil famílias de sem-terra foram assentadas no 1º ano do governo Dilma.


Comparando os números relativos ao primeiro ano dos mandatos desde 2003, têm-se o seguinte quadro: FHC – 43 mil famílias em 1995; Lula – 36 mil famílias em 2003 e Dilma – 22 mil famílias em 2011. Os dados são do Incra em levantamento organizado por Paulo Kliass.


Caso sejam analisados os dados de todo o período, percebe-se que o primeiro mandato de Lula foi mais efetivo em termos de reforma agrária. A média de assentamentos de famílias por ano obedeceu ao seguinte quadro: FHC 1 (1995-1998) – 72 mil/ano; FHC 2 (1999-2002) – 63 mil/ano; Lula 1 (2003-2006) – 95mil/ano;  Lula 2 (2007-2010) – 58 mil/ano.


Isso significa que, caso Dilma pretenda manter a média do primeiro mandato de Lula, ela terá de assentar uma média de 120 mil famílias nos próximos 2,5 anos que lhe restam. Mas a maioria dos analistas do setor considera muito difícil atingir tal meta, uma vez que o próprio MDA trabalha com a hipótese de assentar apenas 35 mil famílias até o final desse ano de 2012. Destaque-se que segundo o Incra existem cerca de 180 mil famílias esperando um lote.


Para agravar ainda mais o quadro, o orçamento para a execução da Reforma Agrária foi reduzido. Para se ter uma ideia, até agosto de 2011 Dilma tinha gasto R$ 60,3 milhões para desapropriar novas áreas e transformá-las em assentamentos de trabalhadores rurais sem-terra. No auge do investimento em reforma agrária, em 2005, o governo Lula gastou mais R$ de 800 milhões no mesmo período. Para 2012, o quadro pouco mudou, o orçamento continuou em baixa.


O travamento da Reforma Agrária deve-se ainda ao estilo Dilma. Segundo o ex-presidente do Incra, Celso Lacerda, a presidente Dilma Rousseff rejeitou cerca de 90 processos de desapropriação de áreas em 2011. Segundo Lacerda “Dilma é uma administradora muito minuciosa", para em seguida e com polidez afirmar: "Ela não deu decreto não foi porque ela não dá importância à reforma agrária, é porque ela quer de fato um processo qualificado”. Dentre as exigências de Dilma para as áreas, diz o ex-presidente do Incra, a presidente orientou que sejam "de qualidade, bem localizadas, e que sirvam ao combate da pobreza rural”.


Incra travou. Disputas e burocratização


Parte da paralisia da Reforma Agrária pode ser tributada ao Ministério de Desenvolvimento Agrário – MDA e ao seu braço executivo da Reforma Agrária, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra. O Incra está travado. Disputas internas, greves, cortes no orçamento e burocratização tornaram o órgão inoperante. Desde o começo do governo Dilma, as coisas começaram mal. A nomeação do superintendente se deu tardiamente, três meses após o início da gestão de Dilma Rousseff e num contexto de disputa, assim como a nomeação dos superintendentes regionais.


Após sete meses de governo, muitos diretores regionais não haviam ainda sido nomeados. João Paulo Rodrigues, membro da coordenação nacional do MST, mandou um recado à presidente em seu Twitter: "Dilma, estamos em junho e até agora os diretores do Incra não foram nomeados, ou seja: a reforma está parada. Poderia nos informar o que se passa?". Perguntava ele: "Tem algum cargo importante no Banco Central que continua vago após seis meses da posse do novo governo? Algum cargo-chave na Petrobrás? Na Itaipu?".


A nomeação do superintendente nacional também não foi bem assimilada por setores do governo.  O escolhido foi Celso Lisboa de Lacerda que recebeu o apoio do MST. O cargo, entretanto, era reivindicado pelo agrupamento Democracia Socialista (DS), corrente interna do PT. A DS, desde a época do governo Lula, indica o ministro do Desenvolvimento Agrário e esperava também indicar o presidente do Incra – órgão que reúne um número maior de cargos comissionados.


Na oportunidade, a DS indicou Afonso Florence, deputado federal pelo PT baiano para o ministério que foi substituído posteriormente por outro nome indicado pela DS, o deputado federal Pepe Vargas do PT gaúcho. A substituição de ministro ao que tudo indica se deu pelo desgaste enfrentado por Florence em função dos resultados pífios da Reforma Agrária no primeiro ano do mandato de Dilma.


Celso Lacerda nomeado à revelia da DS e contra a vontade do antigo ministro, desde o início enfrentou dificuldades internas no Incra. Por um lado viu-se diante dos corporativismos e, por outro, não conseguiu tornar o órgão mais ágil e “adaptado” às exigências de Dilma que cobrava por um Incra mais técnico. A ausência de resultados e as disputas internas derrubaram o superintendente e para o seu lugar foi nomeado Carlos Guedes de Guedes, alinhado à DS.


O MST não gostou da mudança. "Essa mudança não tem explicação. Não ajuda, não fortalece o Incra, não acelera o processo de reforma agrária. Pela primeira vez, o Incra vai ter um presidente da DS. A substituição pegou todos de surpresa", disse o deputado Valmir Assunção (PT/BA), ligado ao MST.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – Contag também não gostou da mudança. O secretário de Política Agrária da entidade, Willian Clementino, disse que o governo não consultou os movimentos sociais sobre a mudança e que a troca de nomes não deve acelerar o processo de assentamento. "A política de reforma agrária está praticamente parada. O governo não dá a importância que a área merece", disse.


Por outro lado, a DS elogiou a escolha e aproveitou para dar uma estocada no MST. Guilherme Cassel, do MDA, que integra a DS e do mesmo grupo político de Pepe Vargas e do novo nomeado para o Incra afirmou: "É um quadro raro, muito inteligente e inventivo. O problema é que a reforma agrária se desconectou da agenda do desenvolvimento pois avançou muito na última década. Os movimentos sociais não conseguiram reciclar seu discurso, insistem em uma agenda de conflito. Quando eu era ministro o presidente do Incra era de outro grupo e isso não influiu em nada no trabalho", disse.


Envolto em disputas, pouco prestigiado por Dilma, com redução de orçamento e enfrentando greve interna, o Incra travou e junto com ele a Reforma Agrária.


O “silêncio” do MST


No contexto da paralisia da Reforma Agrária e dos resultados vergonhosos na quantidade de famílias assentadas até o momento pelo governo Dilma, chama atenção o “silêncio” do MST. Silêncio que ganha amplitude quando se vê a generosidade do governo para com o “outro lado” - o agronegócio.
O MST tem protestado, porém, a indignação não tem se manifestado em ações mais contundentes. Em recente artigo, João Pedro Stédile afirma: “entra governo, sai governo, e a luta pela reforma agrária continua sempre igual. Durante os governos Lula e Dilma, os movimentos sociais achavam que a reforma agrária, enquanto programa de governo poderia avançar. Mas infelizmente seguiu a mesma lógica. Só anda, nas regiões e locais aonde houver maior pressão social”.


No seu diagnóstico acerca da inoperância da Reforma Agrária destaca entre outras razões a “pequenês” do governo Dilma. Diz ele: “O Governo Dilma continua refém, de suas alianças conservadoras. Continuam refém da falta de debate sobre projeto para o país. Continua refém de desvios tecnocráticos, como se assentamento de sem-terra fosse apenas problema de orçamento publico. Continua refém de sua pequenês”.
O fato, entretanto, é que o MST de longe tem sido duro com o governo Dilma no que diz respeito a ações coletivas. O Abril Vermelho não realizou ações de grande contundência em Brasília, apenas uma breve ocupação do Incra. Em outras épocas, principalmente nos anos de governo FHC, o MST já estaria na “jugular” do governo. Entre a indignação verbal e publica do Movimento e a pressão real vê-se uma razoável distância.


Conjunturalmente os setores que mais botam pressão no governo Dilma nesses últimos tempos têm sido o dos servidores públicos. Registre-se que a reação do governo no caso tem sido considerada por muitos como similar apenas à época da ditadura. Até a moderada CUT em nota protestou contra aquilo que chamou de “inflexão governamental” no tratamento com os servidores.


Dilma não aposta na Reforma Agrária


A paralisia, entretanto, na Reforma Agrária não deve ser tributada apenas ao Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), ao seu braço executivo, o Incra, e a falta de uma pressão maior do MST. Deve-se também e, sobretudo, a concepção de Reforma Agrária de Dilma Rousseff.


O foco de Dilma é economia, emprego e desenvolvimento e o campo nessa equação entra como uma base exportadora. Guilherme Costa Delgado, do Ipea diz que o governo fez a "opção estratégica" pelo modelo de agronegócio, que envolve grandes propriedades e monocultura: "O agronegócio seria um jeito de inserir a economia brasileira na economia mundial, por meio da provisão de commodities, como a salvação das contas externas." Nesse contexto, a presidente não acredita na Reforma Agrária como um mecanismo efetivo de desenvolvimento nacional, o quanto muito vincula a Reforma Agrária ao programa de erradicação da miséria.


O pouco apetite demonstrado pelo governo com a Reforma Agrária contrasta com o entusiasmo e a generosidade do Estado brasileiro para com o agronegócio. Dilma vê o campo como uma plataforma exportadora. Análise da Comissão Pastoral da TerraCPT mostra que o governo não mediu esforços para atender os interesses do agronegócio. A CPT cita um exemplo: Em maio de 2011, a presidenta Dilma assinou de uma única vez, decreto de desapropriação de quase 14 mil hectares na Chapada do Apodí/RN, para implantação do Projeto de irrigação que beneficiará meia dúzia de empresas do agronegócio. Ao mesmo tempo, também no RN, foram desapropriados cerca de 8 mil hectares na região de Assú, para a Zona de Processamento de Exportação (ZPEs). Enquanto isso no Estado há cerca de 4 mil famílias acampadas.


A CPT lembra ainda que a dureza do governo não é apenas com os sem-terra, mas estende-se aos povos indígenas e quilombolas. Como destacado anteriormente nessa análise, o governo não se sensibiliza com a situação dos povos indígenas de Mato Grosso do Sul, em especial os Kaiowá e Guarani, que vivem em conflito com fazendeiros e usineiros da região. Nenhuma ação contundente foi feita para homologação das terras no estado até agora. No caso das populações quilombolas, diz a CPT, fora a desapropriação do território da comunidade de Brejo dos Crioulos, em Minas Gerais, poucos foram os resultados conseguidos frente às reivindicações das 3,5 mil comunidades quilombolas existentes no Brasil. De todas, apenas 6% tem a titulação de suas terras.


Em contrapartida à política de migalhas aos sem-terra, indígenas e quilombolas, o agronegócio é constantemente agraciado com generosos subsídios como se vê, entre outros, no financiamento para produção de etanol. Por outro lado, o mesmo agronegócio comanda o desmonte do Código Florestal para atender aos seus interesses agroexportadores.


A CPT destaca ainda o andamento dos grandes projetos – obras impactantes como a Transposição do Rio São Francisco, Transnordestina, projetos de mineração, construções de BR's, obras da Copa, Porto de Suape, a construção da Hidrelétrica de Belo Monte e das usinas no Rio Madeira, barragens, além de outros mega-projetos – que avançam sobre áreas de biodiversidade, agrícolas, ribeirinhas e, além de atingirem em grande parte as comunidades tradicionais, promovem conflitos e violência.


Fracassa Tratado de Comércio de Armas


Brasil. Posição obscura


Assistiu-se na última sexta-feira ao fracasso das negociações, na ONU, para a criação de um Tratado de Comércio de Armas (ATT Arms Trade Treaty) entre os 193 países membros da organização. O resultado não foi uma novidade para os organismos e grupos humanitários que acompanhavam todo o processo. Seria se, de fato, os grandes comerciantes de armas tivessem aderido ao projeto de um mundo com menos violência e mortes.


Não surpreende, por exemplo, que principalmente Estados Unidos e Rússia tenham obstruído a chance do pacto em favor do controle da venda de armas, já que é um comércio muito lucrativo e que ajuda a alimentar e muito as suas economias. No entanto, o que surpreende, num primeiro momento, é a obscura posição do Brasil, que embora não tenha se posicionado contundentemente contra o Tratado, também não liderou e nem se esforçou, como líder regional, pela sua efetivação.


O que se pretendia com o Tratado de Comércio de Armas?


O mundo do comércio de armas é um assunto muito sério, que remete a uma verdadeira carnificina humana, ou seja, é um mundo lucrativo que cresce à custa da morte de civis em diferentes lugares do mundo. Segundo o Instituto Internacional de Estudos para a Paz de Estocolmo (SPRI), no último quinquênio (2007-2011), o comércio mundial de armas cresceu 24%. Esse expansivo setor, só no comércio de armas convencionais movimenta cerca de 70 bilhões de dólares, anualmente, e estima-se que tais armamentos são responsáveis pela morte de 750.000 pessoas por ano.


Ainda, de acordo com o jornalista Cristiano Dias, os números do SPRI apontam que “os gastos com o setor de defesa consumiram US$ 1,74 trilhão no mundo todo. A maior parte dessa movimentação vem dos EUA, que gastaram US$ 711 bilhões no ano passado, pouco mais de 40% do total mundial”.
Na ONU, desde 2006, vem ocorrendo debates em torno de uma maior transparência e por uma regulamentação mais rígida para o comércio internacional de armas. E antes disso, ainda nos anos 1990, segundo Marie Ann Wangen Krahn, coordenadora do SERPAZ, já havia um movimento em favor de um pacto com critérios mínimos para a transferência de armas (pistolas, munições, caças, mísseis e tanques), “impulsionado por um grupo capitaneado por Oscar Aras, ex-presidente da Costa Rica e prêmio Nobel da Paz de 1987”.


Para entender o que se almejava com a aprovação do Tratado de Comércio de Armas é interessante citar as diretrizes - documento provisório (14-07-2012), que norteou o debate na ONU - apresentadas, em entrevista ao IHU, por Marie Ann Wangen Krahn:


1. Promover as metas e os objetivos da Carta das Nações Unidas;


2. Estabelecer os mais altos padrões comuns internacionais para a importação, exportação e transferência de armas convencionais;


3. Prevenir e erradicar a transferência ilícita, a produção ilícita e a intermediação ilícita de armas convencionais e o seu desvio para mercados ilícitos, inclusive para o uso em crime organizados transnacional e em terrorismo;


4. Contribuir para a paz, segurança e estabilidade internacional e regional através do impedimento de transferências internacionais de armas convencionais que contribuam ou facilitem o sofrimento humano, violações da lei internacional dos direitos humanos e da lei internacional humanitária, obrigações internacionais, conflito armado, desalojamento de pessoas, crime organizado transnacional, atos terroristas. Isso tudo mirando a paz, a reconciliação, a segurança, a estabilidade, o desenvolvimento sustentável social e econômico;


5. Promover a transparência e a prestação de contas na importação, exportação e transferências de armas convencionais;


6. Que seja universal em sua aplicação.


Como se verifica, foram propostas fundamentais, que poderiam contribuir na diminuição do número de mortos em conflitos por todo o planeta. Uma temática crucial na agenda humanitária dos mais diferentes grupos empenhados na defesa dos direitos humanos, e em prol da convivência pacífica na, e entre, as nações. Infelizmente, não houve o consenso necessário para a aprovação dessas diretrizes. Sobre esse assunto, o Governo brasileiro tem pouco a dizer ou a lamentar, uma vez que apresenta seu lado sombrio nesta temática, sendo que sua política armamentista é a responsável pela embaraçosa posição que vem assumindo, como veremos abaixo.


“Brasil! Qual é o teu negócio? O nome do teu sócio?”


A posição brasileira quanto ao tema do comércio internacional de armas, faz lembrar a composição de Cazuza, intitulada “Brasil”. Afinal de contas, que país é esse? Quais negócios defende? Para os interesses de quem, o país que é considerado progressista trabalha? Assim como vem tratando outras frentes, como a questão indígena e a reforma agrária, também no quesito transparência na política armamentista, o país anda mal.


Informações estarrecedoras sobre o Brasil foram apresentadas em reportagem de Rubens Valente. São dados inéditos sobre a exportação de material bélico, que estavam sob sigilo militar. Neles se aponta que, de janeiro de 2001 a maio de 2002, foram registradas 204 operações de exportação de armas de munição, somando 315 milhões de dólares. E para mostrar uma abominável face do Brasil, nas relações com a comunidade externa, documentos indicam que o país vendeu 5,8 milhões de dólares em bombas de fragmentação e incendiárias para o ditador Robert Mugabe, do Zimbábue.


Na reportagem, Valente recorda a posição brasileira, em relação às bombas de fragmentação, dizendo que, “em 2008, mais de cem países assinaram a convenção que veta a fabricação e venda do (deste) tipo de bomba. Brasil, EUA e Rússia, dentre outros, recusaram-se”, evidenciando sua falta de transparência neste assunto.


Não é por acaso que o país não se posiciona contundentemente em favor da transparência no comércio de armas. Uma de suas falsas justificativas é a de que isso “poderia expor os recursos e a capacidade dos países [...] de sustentar um conflito prolongado”.


Na realidade, de acordo com o jornalista Jânio Freitas, tal justificativa pretende “esconder o fato de que o Brasil exportador de armas está envolvido em monstruosidades que finge condenar” como, por exemplo, na produção e venda destas bombas de fragmentação. Ele relembra que elas “são proibidas por acordo internacional: não têm alvo preciso, desabrocham no ar em milhares de bolas de aço que atingem a população civil em áreas imensas”. O que leva o jornalista a concluir que é para “esse Brasil opaco que a falta de transparência dá proteção. Como sua continuidade permitirá que a Rússia arme Bashar AL Assad, e os Estados Unidos, a Inglaterra, e o Brasil também, façam o mesmo pelo mundo todo”.


Ainda no calor da semana em que se discutiu a possibilidade de um efetivo acordo para o comércio de armas, Cristian Wittmann, da Universidade Federal do Pampa, destacou que “74 Estados apóiam de forma justa e perfeita um texto considerado positivo, de acordo com a rede “Control Arms” que compreende a sociedade civil organizada”, mas, lamentavelmente, o Brasil não faz parte deste grupo. Wittimann também lembrou que “o Brasil foi responsabilizado recentemente pela comunidade nacional e internacional por ter vendido inúmeras armas, incluindo desde revólveres a minas terrestres ao regime ditatorial da Líbia”. Assim, o Brasil caminha na contramão da história, o que leva Wittmann a considerar que “um ponto de vista relevante na posição brasileira é a questão econômico-comercial da produção e exportação desse armamento”.


O professor de relações internacionais da UFPel, Gustavo Vieira em entrevista ao IHU atenta para o fato de que “dados mais precisos, como para quais países vão os armamentos brasileiros e quanto, não são disponibilizados.” E isto torna impossível controlar o destino e a utilização destas armas. O Ministério da Defesa e o Ministério das Relações Exteriores são responsáveis pelo controle da produção e exportação das armas, mas bloqueiam essas informações. Geralmente, elas chegam por fontes nem sempre confiáveis.
Na opinião de Vieira, “o Brasil ainda está em busca da afirmação da sua soberania e a produção de armas tem a ver com a lógica da persuasão. Contudo, a tal persuasão só é útil quando há intenção de agredir, caso contrário é um potencial inútil”. Os custos “tanto financeiro, na medida em que há parceria público-privada e os financiamentos subsidiados, desvio de prioridades sociais, de cooperação, manchas na imagem do país”, tornam esse caminho extremamente inglório, uma vez que o país tradicionalmente privilegia, em suas relações externas (de acordo com o artigo 4o da Constituição), “a prevalência dos direitos humanos, defesa da paz, solução pacífica de controvérsias, e cooperação entre os povos”. O que, portanto, deixa estampada as contradições do Governo brasileiro.


“E eu aqui na praça dando milho aos pombos”


Como diz a belíssima composição de Zé Geraldo, “isso tudo acontecendo e eu aqui na praça dando milho aos pombos”, pois enquanto a maior parte da população está presa em seus afazeres cotidianos, lutando para garantir sua sobrevivência e sonhos de consumo, uma imagem cinzenta do Brasil começa a ganhar tonalidades, com o aprofundamento de políticas que não condizem com a garantia dos direitos humanos para todos os povos.


A analista de relações internacionais, Daniela Alves, chamou a atenção para o fato de que “o pouco que os brasileiros sabem sobre ela (as negociações para o Tratado de Comércio de Armas) se deve à divulgação da mídia e das parcelas da sociedade civil que estão diretamente envolvidas, pois não são disseminadas notas oficiais do governo sobre a iniciativa, assim como não se tem nenhuma divulgação clara sobre qual será a linha adotada”.


Desde 2003, dizem que o Brasil é governado por um partido de esquerda, ao menos este é o discurso. Que estranha esquerda é esta que toma decisões unilaterais, desrespeitando os direitos humanos e contribuindo para o assassinato de civis inocentes, com a exportação de armas, legais ou não, para diferentes cantos do mundo? Onde estão as vozes da liberdade, que não se atrelam com esse tipo de política escondida pelo discurso de defensora dos direitos humanos?


Por sorte, alguns organismos e parcelas da sociedade civil, em vários países, vêm participando deste processo de negociação do Tratado. Algumas são: Anistia Internacional do Chile, a Campanha Colombiana Contra Minas, a Rede Nacional Iniciativas pela Paz contra a Guerra da Colômbia, o Serpaj do Equador, o Instituto Sou da Paz e o Serpaz do Brasil, a Associação para Políticas Públicas, o Parlamentarians for Global Action e a Campanha Ecumênica do Conselho Mundial de Igrejas. É chegado o momento de que essa cadeia de protagonistas pela paz ganhe novos membros contra o comércio da morte e em favor da cultura da vida. O fracasso de sexta-feira não significa que a batalha esteja totalmente perdida.


Conjuntura da Semana em frases


Jeito pobre


“A presidenta Dilma Rousseff repetiu em Londres um erro comum de quem olha superficialmente para a atividade esportiva. Em vez de olhar para o esporte como fator de saúde, a mais alta autoridade do país mirou-o apenas como fator de sucesso competitivo, jeito pobre de o conceber” – Juca Kfouri, jornalista – Folha de S. Paulo, 29-07-2012.


Mapa da violência - Crianças e Adolescentes no Brasil


“De 1981 a 2010, 176.044 crianças e adolescentes foram assassinados no Brasil. Neste período, o chamado país do futuro registrou, em média, 16 pessoas com até 19 anos de idade mortas a cada dia” – editorial “Mapa da violência” – Folha de S.Paulo, 23-07-2012


Nem aí


“Surfando nos altos índices de popularidade, Dilma quer esvaziar as greves jogando duro com os servidores. O decreto que autoriza a substituição de grevistas por funcionários estaduais revoltou os sindicalistas, que reclamam da falta de diálogo” - Carolina Bahia, jornalista - Zero Hora, 26-07-2012.
PIB! PIB! PIB!


“O som da semana: PIB! PIB! PIB! Só se fala em PIB! O PIB caiu. Com o Mantega pra baixo! Não é sempre assim? Pão de pobre sempre cai com o Mantega pra baixo!” – José Simão, humorista – Folha de S. Paulo, 18-07-2012.


A raposa e as uvas


“A fábula da raposa e as uvas é um dos textos de maior sucesso no governo. Quando o PIB cresce, é trombeteado como prova "de que nunca antes nesse país", etc. Quando cai, perde importância porque o essencial é cuidar das criancinhas, que num passado não muito distante éramos acusados de comê-las” – Fernando Gabeira, jornalista – O Estado de S. Paulo, 20-07-2012.


Agiotagem


“Enquanto a Selic, a taxa básica, desce a patamares civilizados (cerca de 3% ao ano, em termos reais), os juros do financiamento rotativo do cartão alcançam 323% anuais. Que nome dar a isso? Agiotagem parece pouco” – Marcos Augusto Gonçalves, jornalista – Folha de S. Paulo, 20-07-2012.


Terceirização da imagem
“A tragédia moral de Maluf virou um problema do PT” – Eugênio Bucci, professor da ECA-USP e da ESPM – O Estado de S. Paulo, 26-07-2012.
Anistia


“Maluf desfila como quem foi anistiado por Lula” – Eugênio Bucci, professor da ECA-USP e da ESPM – O Estado de S. Paulo, 26-07-2012.


Dilma e o mensalão


“Dilma foi quem mais lucrou com o mensalão. Quando o escândalo surgiu, ela ocupava um ministério menor, hoje de Lobão. A queda de Dirceu a alçou à Casa Civil e eliminou o sucessor natural de Lula. Foi a desgraça dele e de Palocci, no episódio do caseiro, que permitiu a ascensão da ex-guerrilheira que não tinha disputado nem eleição para vereador” – Bernardo Mello Franco, jornalista – Folha de S. Paulo, 26-07-2012.


Zé Dirceu


“Se ele (José Dirceu) não for absolvido, vai haver pressão para levar todo mundo. Se for, abre a porta para outras absolvições. Ele pode fazer a picada para outras condenações. A corte vai ter problema se condenar o Dirceu e não o resto” – Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB  – Folha de S. Paulo, 25-07-2012.


"O Zé (Dirceu) era galã! A gente o via como um Che Guevara brasileiro. Era o namorado das estudantes de esquerda" – Lauro César Muniz, novelista, narrando quando tinha cerca de 30 anos, já formado em engenharia pelo Mackenzie e vindo do "partidão" (PCB) sendo comandado por Dirceu em passeatas – Folha de S. Paulo, 29-0-2012.


Batalha política


"Todos sabem que este julgamento é uma batalha política. E essa batalha deve ser travada nas ruas também porque senão a gente só vai ouvir uma voz, a voz pedindo a condenação, mesmo sem provas. É a voz do monopólio da mídia. Eu preciso do apoio de vocês" – José Dirceu, ex-ministro Chefe da Casa Civil – O Estado de S. Paulo, 24-07-2012.


Hay que endurecer?


“O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares diz que não vai "endurecer o dedo" quando se defender no julgamento do mensalão, afirma o advogado Arnaldo Malheiros. Ainda que se diga que ele serviria de bode expiatório. "Delúbio costuma dizer que, no fim, sempre dá certo. E, se não deu certo, é porque não chegou ao fim", diz, parafraseando Fernando Sabino” – Mônica Bergamo, jornalista – Folha de S. Paulo, 23-07-2012.


Mensalão e eleição


"Alguém pode conceber um julgamento durante o dia e o programa eleitoral à noite? Isso é um absurdo" - Sigmaringa Seixas, ex-deputado do PT-DF – O Estado de S. Paulo, 29-07-2012.


Catinga do povo


“Tenho grande admiração por ele (Lula). É um grande político, não abandona os amigos. O Lula vai continuar sendo o Lula. Ele é povo, tem a catinga do povo” – Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB  – Folha de S. Paulo, 25-07-2012.


Piada cara


“Os nanicos são uma piada cara ao contribuinte. No ano passado, o PRTB recebeu R$ 1,57 milhão do fundo partidário. O PSDC, R$ 1,19 milhão” – Bernardo Mello Franco, jornalista – Folha de S. Paulo, 19-07-2012.


Público e privado


“O uso de cargo público como trampolim de negócios é antigo no Brasil, como mostra o livro “O bagaço da cana”, do grande historiador Evaldo Cabral de Mello, editado pela Penguin & Companhia das Letras. Um exemplo citado é o de Jerônimo de Albuquerque (1548-1616), o “capitão da conquista do Maranhão”, que premiou seus descendentes com terras e o engenho Cunhaú” – Ancelmo Gois, jornalista – O Globo, 18-07-2012.


Segue...


“O livro mostra que, no Brasil Colônia, ao menos dez caciques do Judiciário fundaram engenho de açúcar em Pernambuco” – Ancelmo Gois, jornalista – O Globo, 18-07-2012.


Caindo aos pedaços


“Quando olhamos a situação social e econômica do mundo, não podemos deixar de sentir perplexidade acompanhada de um sentimento de apreensão. A sensação é a de que ele está caindo aos pedaços” – Antonio Delfim Netto, economista – Folha de S. Paulo, 25-07-2012.


Patifarias


“A explicação para tudo isso é que parte do sistema financeiro internacional transformou-se numa fonte inesgotável de patifarias” – Antonio Delfim Netto, economista – Folha de S. Paulo, 25-07-2012.
The Economist x Le Monde Diplomatique


“(Dilma) Lê assiduamente o econômico "Financial Times", não o esquerdista "Le Monde Diplomatique", ou a diplomática "Foreign Affairs" – Sergio Leo, jornalista – Valor, 23-07-2012.


Dilma e Reagan


“A ideia de terceirizar grevistas deu certo nos Estados Unidos em 1981, quando pararam os controladores de voo. O presidente Ronald Reagan convocou militares e interessados nos postos, desempregou 11 mil, quebrou o movimento e destruiu o sindicato. Dilma Rousseff não é Ronald Reagan” – Elio Gaspari, jornalista – Folha de S. Paulo, 29-07-2012.


TAM esquece


“Já me aconteceu de tudo. Já perderam minha cadeira de rodas motorizada, me esqueceram dentro de uma van... Um dia, fiquei no meio da pista e o avião decolou sem mim - na época, porém, não tinha Twitter. Na semana passada, no Recife, um funcionário me derrubou no chão... Já estou acostumado, viajo há 30 anos e sou cadeirante há 32. A TAM é, inclusive, uma das companhias melhorzinhas. Segundo a companhia, chegaram três cadeirantes na mesma hora, achei engraçado” – Marcelo Rubens Paiva, escritor, cadeirante, ‘esquecido’ pela TAM no avião – O Estado de S. Paulo, 24-07-2012.


Engraçado


“A Paraolimpíada vai ser no Rio, onde o táxi para deficiente não tem lugar demarcado para estacionar. De modo geral, os aeroportos estão bem, têm vagas especiais, elevadores. Fico imaginando quando chegar um avião lotado de americanos em cadeiras de rodas. Vai ser engraçado” – Marcelo Rubens Paiva, escritor, cadeirante, ‘esquecido’ pela TAM no avião – O Estado de S. Paulo, 24-07-2012.
Youtube


“O que é "conteúdo impróprio" para tempos onde se nasce no Youtube?” – Tadeu Jungle, diretor de cinema e TV, é sócio do Grupo Ink, produtor de audiovisual e João Ramirez, diretor-executivo da produtora digital Colméia – Folha de S. Paulo, 23-07-2012.


Acredito em tudo!


“Sou religioso, mas acredito em tudo. Acredito em espiritismo. Quando rezo, costumo rezar o Pai Nosso, rezar para o anjo da guarda. Acredito em Deus. Acredito na energia, acredito na força do pensamento, acredito que tudo é um conjunto” – Cauã Reymond, ator – O Estado de S. Paulo, 23-07-2012.


Quente e frio


“Há uma corrida desenfreada por concursos e vagas públicas. Simultaneamente, uma onda de greves e protestos de servidores. Afinal, é bom ou não é?” – Eliane Cantanhêde, jornalista – Folha de S. Paulo, 22-07-2012.


“Direito é o curso mais procurado do país, mas não significa uma vocação coletiva, ou que todos os vestibulandos queiram ser advogados, juízes, delegados. A maioria quer usar a faculdade como "cursinho" para fazer concurso - não importa o setor” – Eliane Cantanhêde, jornalista – Folha de S. Paulo, 22-07-2012.


Eu grevo e Dilma grita!


“Um jornal do Acre inventou um novo verbo: "Eletricitários grevam por tempo indeterminado". Greve já tem até verbo: eu grevo, tu grevas e a Dilma grita”  – José Simão, humorista – Folha de S. Paulo, 26-07-2012.
Indefinido


"Quando meu pai notou um movimento de mulher na minha vida, me disse: 'Isso que você está fazendo é errado, você tem que se definir'. Tenho que definir o quê? Eu não sou indefinido" - Ney Matogrosso, cantor, falando sobre o passado de "homem, mulher, bicho, inseto, índio" na reportagem de capa da revista "Personnalité" – Folha de S. Paulo, 19-07-2012.

Fonte: IHU