PICICA: "[..]nada consta, no documento governamental, sobre melhora das condições de ensino e trabalho – ou seja, da infraestrutura das universidades. Segundo a presidente do sindicato, Marinalva Oliveira, são comuns instituições federais “sem professores, sem laboratórios, sem salas de aulas, sem refeitórios ou restaurantes universitários, até sem bebedouros e papel higiênico, afetando diretamente a qualidade de ensino”."
Por que as universidades continuam paradas
Depois de dois meses de greve, as negociações foram abertas. Mas a primeira proposta do governo é pífia e ilusória
Por Bruna Bernacchio
Em 13 de julho, quando a greve dos professores das universidades federais já estava a ponto de completar dois meses, o governo finalmente abriu negociações e ofereceu à categoria uma proposta. Ela foi apresentada pelo secretário de Relações do Trabalho do ministério do Planejamento, Sérgio Mendonça, ao sindicato nacional dos docentes do ensino público (Andes).
Será, agora, examinada e debatida em assembleias em todo o país. As primeiras análises, feitas pelo Comando Nacional de Greve e publicadas pelo Andes, contudo, revelam que as chances de um acordo, nas bases atuais, são mínimas. Dos três principais pontos reivindicados pelos professores – reajuste salarial, novo plano de carreira e melhora das condições de ensino e pesquisa – nenhum foi realmente atendido. Segundo os docentes, a proposta do governo é, na verdade, um retrocesso.
Os reajustes salariais oferecidos pelo governo variam entre 12% e 45%, dependendo do nível de carreira dos professores. Aparentemente, é algo significativo, mas a impressão não resiste a um olhar mais atento. Primeiro, os valores da proposta salarial (ver tabela) incidem sobre os salários de julho de 2010. Ou seja, é preciso descontar, dos índices propostos, 4 pontos percentuais, já conquistados pelos docentes no final do ano passado e incorporados aos salários em março.
Além disso, o pagamento do percentual que restar será realizado em etapas, até o ano de 2015, sendo que o governo sequer comprometeu-se com valores a cada ano. Em outras palavras, dos 12% a 45% propostos, é preciso descontar a inflação entre 2010 e 2015. A partir dos dados do ICV/Dieese e de uma projeção futura, o Andes estimou-a em 35%. Para a maior parte dos docentes, portanto, a proposta do governo significará, em 2015, um salário real menor que o recebido em 2000. Apenas quem está no topo da carreira (um em cada dez docentes), terá ganho real no período.
A segunda reivindicação central é a reestruturação da carreira docente. Em março de 2011, o congresso nacional do ANDES apresentou uma proposta para isso (desdobrando-a, inclusive, em projeto de lei). A base é a instituição de uma carreira única, com 13 níveis de progressão – ao invés dos 17 atuais. Cada degrau poderá ser vencido em dois anos e significará um acréscimo de 5% na referência salarial. O professor poderá atingir o topo da carreira em 25 anos.
A contra-proposta do governo admite os 13 níveis na carreira, mas não especifica como a promoção se dará. O texto apenas diz: “Poderá ocorrer, exclusivamente, por desempenho acadêmico e científico, nos termos das normas regulamentares a serem expedidas pelo Ministério da Educação”. Ou seja, o poder para criar e regulamentar critérios e procedimentos está unicamente nas mãos do MEC. É negativa frontal a uma das ideias centrais da greve: negociar diretamente, com o governo, as bases da progressão.
Ainda em relação à carreira, os professores julgam inaceitável um trecho da proposta governamental que diz: “a classe de professor titular será acessível a 20% do quadro de docentes da Instituição”. Significa que, por mais que o professor tenha mérito em chegar à condição de titular (o topo da carreira), só poderá assumi-la se houver vagas. Por tudo isso, um dos documentos do Andes sintetiza: “Os aspectos conceituais apresentados pelo governo reforçam a hierarquização verticalizada, a lógica do produtivismo medidos pelo atendimento de metas de curto prazo e da competição predatória, as quais têm sido veementemente rejeitadas pela categoria”.
Finalmente, nada consta, no documento governamental, sobre melhora das condições de ensino e trabalho – ou seja, da infraestrutura das universidades. Segundo a presidente do sindicato, Marinalva Oliveira, são comuns instituições federais “sem professores, sem laboratórios, sem salas de aulas, sem refeitórios ou restaurantes universitários, até sem bebedouros e papel higiênico, afetando diretamente a qualidade de ensino”.
Diante dessa proposta, a tendência é a greve continuar. O site do Andes recomenda: “A tarefa é manter e radicalizar a greve. Nesta semana, isto significa: intensificar o movimento e desmascarar a proposta do governo”.
Fonte: Outras Palavras
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