junho 03, 2014

"RS: “O conflito não é entre agricultores e indígenas, mas da política indigenista”. Entrevista especial com Henrique Kujawa" (IHU)

PICICA: "“A terra por si não resolve as necessidades atuais dos indígenas, pois é preciso discutir quais são as suas necessidades, e como a terra se insere num projeto de etnodesenvolvimento”, afirma o historiador."


RS: “O conflito não é entre agricultores e indígenas, mas da política indigenista”. Entrevista especial com Henrique Kujawa

“A terra por si não resolve as necessidades atuais dos indígenas, pois é preciso discutir quais são as suas necessidades, e como a terra se insere num projeto de etnodesenvolvimento”, afirma o historiador. 

“Por que a situação social entre agricultores e índios está tão tensa? Qual é o papel do Estado em momentos de tensão social como estes?”. Essas são as perguntas que devem ser feitas quando se trata de entender o conflito entre os índios kaingang e os agricultores familiares que vivem no Norte do Rio Grande do Sul. A proposta é do historiador Henrique Kujawa, que acompanha sistematicamente 13 acampamentos indígenas no norte do estado, os quais estão em diferentes estágios no processo administrativo da FUNAI para identificação, delimitação e demarcação das terras.

Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail, Henrique Kujawa se opõe à interpretação de analisar os conflitos da região Norte como uma disputa por terra entre indígenas e agricultores. “O conflito não é entre agricultores e indígenas”, pontua. Trata-se de um fenômeno “bem mais amplo” e complicado, porque se o problema não for visto dessa forma, ressalta, “pode transparecer que a responsabilidade por este conflito é desses dois grupos sociais, o que não é verdade”.

Na avaliação de Kujawa, os fatos históricos e a relação do Estado gaúcho com os indígenas e os agricultores devem estar em perspectiva para compreender o que acontece hoje. “O conflito é do modelo agrário desenvolvido pelo Estado, principalmente no último século, em que destina a mesma terra, em momentos diferentes, para índios e para agricultores. O conflito é da política indigenista, que desde o tempo do Serviço de Proteção aos Índios - SPI, e que continua hoje com a FUNAI, vem gestionando as terras indígenas de forma equivocada, o que não contribui para um etnodesenvolvimento a partir da realidade concreta que os indígenas vivem”, assinala.

Ele acrescenta: “É preciso romper com o romantismo, presente em alguns meios acadêmicos e em boa parte do senso comum, de que o índio é um ser integrado à natureza e que, se estabelecermos novas terras, eles voltariam a viver, em suas comunidades, da caça, pesca e coleta permeados pelo princípio do igualitarismo. Portanto, a terra por si não resolve as necessidades atuais dos indígenas, pois é preciso discutir de forma franca, honesta quais são as suas necessidades, para que eles precisam de terra e como a terra se insere num projeto de etnodesenvolvimento”.

Para ele, o governo gaúcho, ao não reconhecer os conflitos entre indígenas e agricultores, “demorou para compreender a complexidade e a gravidade do conflito, partilhando da visão simplista, de boa parte das instituição indigenista e da FUNAI, que não reconhecem a presença dos agricultores familiares, preferindo classificar o conflito como sendo entre latifundiários e indígenas. O governo assumiu uma postura de intermediação com o Governo Federal após os agricultores e a Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar - FETRAF ocuparem o Centro Administrativo em Maio de 2013”.

Henrique Kujawa é graduado em História pela Universidade de Passo Fundo, mestre em História pela Universidade de Passo Fundo e doutorando em Ciências Sociais no PPG de Ciências Sociais da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS. Lecionou na Universidade de Passo Fundo - UPF e atualmente leciona na Universidade de Chapecó- UNOCHAPECÓ e na Faculdade Meridional – IMED, onde é Diretor de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão.

Confira a entrevista.

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