outubro 17, 2014

"Carta da Vila Autódromo ao Desembargador Antônio Ibrahim", por Vila Autódromo

PICICA: "Queremos colocar para o Excelentíssimo Senhor Desembargador que ao contrário do que diz a posição do Município no Processo nº 0081973–19.1993.8.19.0001 enviado pela prefeitura para Vossa Excelência, não somos alguns supostos ocupantes, somos uma comunidade bem sólida, organizada a décadas e com títulos de posse, o município não quer o terreno da comunidade para realizar recuperação ambiental e paisagístico, pois, podem fazer a recuperação ambiental com os moradores no local e a conciliação cogitada no documento não é para atender os interesses da justiça, mas sim, para atender interesses particulares da  prefeitura por troca de favores, que negociou o terreno da nossa comunidade sem nos consultar, com as empreiteiras, para que essas construam seus condomínios luxuosos no local, após as olimpíadas.  Achamos Vossa Excelência que não é justo que toda vez que o progresso imobiliário se aproxima das comunidades carentes, essas sejam chutadas para longe, ainda mais uma comunidade titulada e legalizada através de moradores carentes e comuns, com muito suor e sacrifício, achamos também, mesmo que não fosse uma comunidade titulada e legalizada teria sim que ser respeitada os direitos dos cidadãos de acordo com artigo número 429 da lei orgânica do município do Estado Rio de Janeiro."

Carta da Vila Autódromo ao Desembargador Antônio Ibrahim

17/10/2014
Por Vila Autódromo


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AMPVA – Associação de Moradores e Pescadores da Vila  Autódromo  

                 Registrada no Cartório de Pessoas Jurídicas nº 96.462 – livro A – 29, em 10/12/1987 – CNPJ: 30.122.410/0001/76. Isento de Insc. Est. Av. Autódromo 16 – Vila Autódromo – Barra da Tijuca. Cep 22775-080 – Cidade do Rio de Janeiro. Tel: 2421-3376

AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR MARCO ANTONIO IBRAHIM DA QUARTA CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Comunicado a respeito do processo nº 0081973-19.1993.8.19.0001

Somos uma comunidade pacífica e ordeira com mais de 40 anos de existência, que se iniciou com pescadores na década de 70, com algumas famílias já na 4ª geração. Titulada e legalizada através do projeto “meu pé de chão” no governo do Sr. Leonel Brizola em 1986 e confirmado no governo seguinte pelo governador, Sr. Marcelo Allencar (ambos em memória), títulos de posse concedido por 99 anos podendo ser prorrogado por mais 99 anos. Conquistas essas que exigiu muita organização, empenho, perseverança, apoios externos que foram fundamentais e disciplina de toda comunidade; principalmente no controle de seu crescimento desordenado no entorno e beirando o muro do autódromo onde conseguimos manter vazio, respeitando os limites de 20 metros do muro do autódromo até as residências, na época exigência estabelecida pelo Estado e a gestão do autódromo de Jacarepaguá.

Com o progresso e a especulação imobiliária aproximando-se de nossa comunidade, aumentou a valorização do metro quadrado em torno da comunidade e com isso começou as pressões de retirada da comunidade com grande ênfase, também na gestão do prefeito o Sr. César Maia, que disse estar invalidando o título de posse dado anteriormente por dois governadores e apoiado pela governadora a Sra. Rosinha Garotinho, que expediu um documento autorizando a prefeitura a mexer somente dentro do autódromo de Jacarepaguá, esse, com uma cláusula que dizia: Não mexer na comunidade da Vila Autódromo.

Queremos colocar para o Excelentíssimo Senhor Desembargador que ao contrário do que diz a posição do Município no Processo nº 0081973–19.1993.8.19.0001 enviado pela prefeitura para Vossa Excelência, não somos alguns supostos ocupantes, somos uma comunidade bem sólida, organizada a décadas e com títulos de posse, o município não quer o terreno da comunidade para realizar recuperação ambiental e paisagístico, pois, podem fazer a recuperação ambiental com os moradores no local e a conciliação cogitada no documento não é para atender os interesses da justiça, mas sim, para atender interesses particulares da  prefeitura por troca de favores, que negociou o terreno da nossa comunidade sem nos consultar, com as empreiteiras, para que essas construam seus condomínios luxuosos no local, após as olimpíadas.  Achamos Vossa Excelência que não é justo que toda vez que o progresso imobiliário se aproxima das comunidades carentes, essas sejam chutadas para longe, ainda mais uma comunidade titulada e legalizada através de moradores carentes e comuns, com muito suor e sacrifício, achamos também, mesmo que não fosse uma comunidade titulada e legalizada teria sim que ser respeitada os direitos dos cidadãos de acordo com artigo número 429 da lei orgânica do município do Estado Rio de Janeiro.

Realizamos todas as exigências propostas por governos anteriores provando que não denegrimos o meio ambiente, não somos uma comunidade violenta (nunca teve tráfico nem milícia) e somos muito organizados, prova disso e que apesar de tantas pressões e tantos julgamentos a comunidade permanece, porque até aqui a lei entende que temos esse direito e respeita nossas conquistas e organização. Não queremos que a medalha posta no peito dos atletas seja com sofrimentos e lágrimas de famílias humildes como em outros países onde foi realizado o evento. Queremos participar desse evento maravilhoso e sermos legado social desse evento, onde a cidade do Rio de Janeiro possa se orgulhar e ter a comunidade da Vila Autódromo como exemplo de uma gestão séria que preservou os direitos conquistados, a cidadania e a socialização. Não somos contra as olimpíadas e o progresso do Estado, somos contra aos desrespeitos com os direitos conquistados a duras penas, o abuso de poder e as injustiças sociais.

Com a aliança dos três poderes recentemente entre Município, Estado e Governo Federal, o governador o Sr. Sérgio Cabral entregou, passou toda área da comunidade que pertencia ao Estado, para o poder do Município, “virando as costas” para a comunidade e sendo conivente com as atitudes e investidas desleais do atual prefeito o Sr. Eduardo Paes. Eduardo Paes que já tentara tirar a comunidade em 1990 quando era subprefeito da Barra e Jacarepaguá, sem sucesso, e agora como prefeito da cidade do Rio de Janeiro parece estar querendo realizar um sonho antigo, muitas das vezes parecendo levar para o lado particular, demonstrando uma vontade obsessiva de ver aquela área da comunidade toda limpa; parecendo querer provar para “alguém” que ele é capaz, que ele conseguiu. Destacamos aqui três exemplos dessa perseguição obsessiva: 1º) Quando o presidente do COI em Copenhague na Dinamarca anunciou o Rio de Janeiro como o Estado vencedor para ser sede das Olimpíadas de 2016 derrotando a cidade de Madri da Espanha, dizendo para espanto de alguns brasileiros e principalmente para nós da comunidade que assistíamos o resultado: Agora podemos retirar a Vila Autódromo! 2º)  Foi a montagem de um claque (teatro) em frente á prefeitura colocando pessoas para gritarem com faixas com nome da comunidade: Queremos remoção! Queremos remoção! Essa encenação com apoio e registro da rede Globo de televisão. Ato esse que nos obrigou a realizar um movimento pacífico e ordeiro em frente à prefeitura uma semana após, contradizendo o claque montado pelo prefeito; 3º) A instalação de uma sede da prefeitura com containers dentro da comunidade, com seus funcionários em horário comercial indo de casa em casa e aterrorizando moradores com terror psicológico dizendo: Ou vocês aceitam o que a prefeitura quer dar ou no final não ganharão nada, entre outros…, fazendo com que vários moradores passassem mal, desorientados, muitos choraram e ficaram depressivos havendo a possibilidade de algum morador principalmente idosos chegar à óbito, uma estratégia usada pela prefeitura mesquinha, irresponsável e covarde, essas não são armas de uma política democrática, mas sim de uma política de ditadura. Essa estratégia funcionou com algumas famílias que perturbadas e com muito medo pensando em seus familiares, cederam e foram para o Parque Lar Carioca, porém, há relatos que algumas famílias após saberem e verem que a maioria não saiu, disseram estar arrependidas.


PLANO POPULAR DA VILA AUTÓDROMO

A comunidade em sua luta não ficou dormindo à sombra de sua destruição, para tanto foi atrás de ajuda e parcerias. Conseguimos os apoios técnicos de núcleos de duas Universidades Federais NEPHU/UFF (Universidade Federal Fluminense) e NEPLAC/ETTERN/IPPUR/UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).  Com apoio técnico dessas Instituições Federais junto com os moradores da comunidade, em dois anos com muitas reuniões e assembleias foi elaborado O PLANO POPULAR DA VILA AUTÓDROMO, sendo sempre todas as opções colocadas pelos técnicos e decididas pelos moradores. O plano popular da Vila Autódromo foi entregue ao prefeito que ficou de responder em quarenta dias, o prefeito o Sr. Eduardo Paes não cumpriu sua promessa, abandonando-nos. Conseguimos levar esse plano popular da Vila Autódromo para o I.A.B (Instituto dos Arquitetos do Brasil) situado na Rua Pinheiro nº 10 no bairro do Catete, para que profissionais renomados e altamente capacitados, avaliassem os dois projetos: o da comunidade orçado em R$ 14 milhões e o da prefeitura do Parque Lar Carioca orçado em R$ 119 milhões, onde o prefeito pretende colocar os moradores. Levamos esse projeto para que esses profissionais dessem um parecer de qual seria o melhor. Após alguns dias o I.A.B. nos entregou um parecer com 90 páginas totalmente favorável ao nosso projeto: Plano Popular da Vila Autódromo, caso esse, inédito no país.

Esse plano popular da Vila Autódromo foi colocado em um concurso internacional de urbanismo organizado por uma empresa alemã aqui no Estado do Rio de Janeiro, concorrendo com 170 projetos da região metropolitana do Rio de Janeiro, o Plano Popular da Vila Autódromo foi o campeão, ganhando o prêmio em primeiro lugar no dia 03 de dezembro de 2013, recebendo troféu e um valor de $ 80 mil dólares, prêmio que segundo a empresa organizadora deveria ser entregue pelas mãos do prefeito da cidade como é de práxis em outras cidades, em outros países onde é realizado o concurso, o prefeito não compareceu para nos entregar o troféu em mãos, sendo entregue por representantes da empresa organizadora.

Outros reconhecimentos:

● Medalha JORGE CARELLI de direitos humanos, concedida pela FIOCRUZ pela valorosa luta contra a remoção em defesa do direito à moradia digna, em 12 de setembro de 2013.

● Medalha PEDRO ERNESTO concedida pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro através do vereador Renato Cinco, considerada a comenda máxima do município em cidadania, em 16 de junho de 2014.

● Moção dada pelo vereador Reimont sobre resistência.

● Homenagem realizada pelo deputado Marcelo Freixo dos direitos humanos pela resistência.


A comunidade Vila Autódromo possui RGI (registros gerais dos imóveis) registrado no cartório do 9º ofício e nossas ruas estão registradas no mapa físico da cidade com CEPS próprios. Solicitamos também vários pedidos de legalização da nossa água potável junto a ADPERJ, não fomos atendidos.

A comunidade da Vila Autódromo hoje é um símbolo e uma referência no país, de uma luta genuinamente democrática e social que dá um verdadeiro exemplo de cidadania por envolver tantas pessoas, movimentos e instituições; trazendo a mídia de todos os cantos do Brasil e do mundo interessados em divulgar uma luta abusiva, desleal e covarde por parte do poder público. Na realidade sabemos que o que nos ameaça de verdade não é as Olimpíadas de 2016, como também não foi a Copa do Mundo de 2014 e nem o Pan de 2007 onde sofremos investidas violentas do Sr. prefeito Cesar Maia, mais sim, a troca de favores entre poder público e as empreiteiras que financiam suas campanhas milionárias e que querem desesperadamente aqueles metros quadrados de terra para construírem seus condomínios de luxo. Os mega eventos são na realidade apenas um motivo, um pretexto para o poder público e empreiteiras atingirem seus objetivos particulares.

Não temos culpa se o progresso nos alcançou e o poder público ficou assistindo de “braços cruzados” procrastinando a responsabilidade da urbanização da comunidade, tornando com o passar dos anos um contraste: Comunidade versos o poder imobiliário ao redor. Não podemos pagar com nossos lares e com as nossas histórias de vida por não sermos bem vistos “esteticamente” aos olhos empresariais e está desvalorizando seus imóveis nas proximidades da comunidade, por um evento que embora seja honroso, só irá durar 17 dias (Olimpíadas de 2016) ou por “caprichos” e objetivos particulares da prefeitura e empreiteiras. Não podemos ser um joguete nas mãos do poder público e dos empresários, todas as vezes que eles assim decidirem, estamos falando de pessoas, seres humanos, que envolve: sentimentos, caráter, dignidade, respeito as leis, respeito ao próximo e histórias de vida, que na opinião dos que não cederam as pressões do poder público e continuam lutando pelos seus direitos, toda essa vivência não tem preço como muitos acham que tem. Queremos agradecer a Vossa Excelência de nos conceder a oportunidade de manifestar nossa indignação e esclarecer resumidamente nossa agonia e sofrimento que tem perdurado ao longo dessas décadas, essa oportunidade de contar parte da nossa história, nos mostra que ainda podemos acreditar na democracia do nosso país.

Sabendo que não é vossa excelência que vai julgar sozinho o processo da comunidade da vila autódromo, porém sabendo que na condição de juiz relator, pedimos encarecidamente que vossa excelência ao levar o resumos dessa reunião para o outros dois desembargadores juízes que irão junto com vossa excelência julgar o nosso caso, que vossa excelência leve em consideração nossas histórias de vidas com família na quarta geração.

Fonte: Universidade Nômade Brasil

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