maio 25, 2006

Um poema e uma carta de Anibal Beça sobre um certo imbróglio na cultura manaura

Turenko Beça, ©












O sono dos justos

Anibal Beça

Sob o mormaço
todos dormem a sesta
na pequenina vila.
Somente o louco da cidade
caminha ao sol sua desventura
e o jargão:

"Quando eu morrer
para que lado ficarão meus calcanhares?
Leste, Sul, Norte, Oeste?
Meu corpo em cruz
e a Rosa-dos-Ventos
tatuada em minha testa
e cada falange
uma lua azul em gravitação."

Estranha obsessão do louco da cidade:
para que lado ficarão seus calcanhares?
E nesse ir e vir
(deambulante vôo delirante)
enxerga o que não vê
e atira no que vê:

O suspiro da filha-de-Maria
por entre as barbas
do capuchinho confessor;

o açougueiro da esquina
que acaba de esquartejar
a paixão da sua vida;

a língua do pastor
– da 1ª Igreja Pentecostal –
umedecendo as coxas da mulher
(falando a linguagem dos homens)
e conferindo o dízimo do dia.

Mas é à noite
(sob o signo da lua)
que o louco da cidade
atira no que vê
e enxerga o que não vê:
o prefeito se esgueirando
pelas sombras
à procura dos seios
de dona Justina
que, entre outras coisas,
é presidente da Câmara Municipal
e mulher do seu melhor amigo.

*****

Amigo Rogelio,

Um pouco atrasado, mas compareço. Primeiro, para lhe parabenizar pela sua brilhante e combativa resistência empunhando a bandeira da luta antimanicomial, com ações que resultam em boa visibilidade - o que é importante, mexendo e chamando a cidade para o debate. Tudo de maneira inteligente, impactante, alegre, sem raivosidade, e tampouco se utilizando do manjado expediente dos famigerados chororôs habituais. Concordo e aplaudo. Como canta Cartola: "Alegria!!! Era o que faltava pra mim (...)"

O segundo motivo, me pegou de surpresa, pela carga de emoção. Não se esqueça que no dia 13 de setembro interio (como diz nosso caboclo) sessentinha. O que me enquadra na tchurma da "Terceira Idade". Já tomei até a vacina contra gripe. Traduzindo: emoçõs fortes, por que perigosas, nunca mais. C'est la vie.

O meu muito obrigado, querido Rogélio, por estampar e albergar esse episódio triste do Bafafá dialogado com o Chico Cardoso. Tomara que a cidade e os burocratas entendam, que o exercício do debate, e a formulação de críticas, é salutar. Mormente em nossa combalida Manaus, que há muito não se aplica nesse dever (que deveria ser regra natural). Dever de casa transparente, como deseja a vontade política do prefeito Serafim Corrrêa. Resta-nos esperar, na prática, pelo desenrolar dessa discussão mais que pertinente para o meio artístico e cultural. Se virá de maneira cosmopolita, antenada com a modernidade, ou se no vôo anacrônico, de ranço misoneísta, na forma paroquial e provinciana do tempo da Vila de São José da Barra do Rio Negro. Não creio. Seria um retrocesso atroz, um passo para trás, a entronização de um reino do atraso. É esperar pra ver.

Grande abraço

Anibal

PS- Recomendações à "Belíssima"(com todo o respeito), e um beijo no Juanito.

Nota 1: "Belíssima" é como o poeta se refere a Nivya Valente, mãe de Juan e o amor da minha vida.

Nota 2: Saiba mais sobre o poeta e sua obra nos seguintes endereços:

EM PORTUGUÊS

www.portalamazonia.com/anibal
http://br.geocities.com/abeca552002/CASA.html
http://www.secrel.com.br/jpoesia/abeca.html

EN ESPAÑOL

http://www.letras.s5.com/archivobeca.htm
http://www.felinia.org/f3/liter/liter32.htm
http://www.poeticas.com.ar/Biblioteca/Poemas_Beca/poemasframe.html

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