maio 15, 2006

Passa em branco a data maior do povo negro

Nestor Nascimento
Houve um tempo em que a libertação dos escravos era comemorada com várias manifestações públicas, especialmente na cidade do Rio de Janeiro onde se concentrou o maior contigente de cativos no mundo desde a queda do Império Romano.

Com o fim do regime militar e a redemocratização do país, finalmente foi reconhecida a importância histórica dos líderes negros, como Zumbi. Os festejos do dia 13 de maio - dia da libertação do cativeiro - ganharam um novo sentido histórico. Ao recuperar a história dos seus líderes, o movimento negro tinha motivação para comemoração.

Talvez porque os novos tempos são de afirmação da negritude é que a data vem perdendo seu caráter simbólico, o que parece um contra-senso, afinal, quando se fala em exclusão social, a maioria da população negra é visivelmente a mais penalizada.

No último país a abolir a escravatura, o Amazonas contribuiu para essa vergonha internacional com a presença de 979 escravos em seu território, segundo o Censo de de 1872, representando 1,7% da população da província e 0,06% no total de escravos do Império.

Muitos deles participaram da construção do maior ícone da cultura amazonense: o Teatro Amazonas. Tinham no bairro da Praça 14 de Janeiro seu local de moradia.

Neste bairro nasceu e morou o saudoso companheiro Nestor Nascimento, melhor dizer camarada Nestor, ou simplesmente Nego Nestor, como era chamado carinhosamente pelos mais íntimos. Tinha orgulho do seu passado no Partido Comunista Brasileiro. Teve curta passagem no Partido dos Trabalhadores. Durante a repressão a uma manifestação contra o regime militar no Rio de Janeiro, onde estudava, teve dois dentes da arcada superior quebrados. Recusou usar qualquer tipo de prótese. Optou por dizer não à violência ostentando sua marca no próprio corpo, numa espécie de didática da não-violência.

Advogado por formação, participou da luta pelos direitos humanos, como militante e como dirigente. Em 1998, acompanhado pelo Human Rights, recebi-o na condição de dirigente do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico de Manaus - lugar onde cumpriam medidas de segurança os loucos infratores. Fui o único dirigente a ficar na sala onde se ouvia o depoimento dos presos submetidos à violência carcerária, tal era a confiança que merecia do velho companheiro.

Estou certo de que hoje Nestor estaria participando da luta pela construção de uma sociedade sem manicômios e não teria perdido uma Parada do Orgulho Louco, tampouco a comemoração do Dia Nacional de Luta Antimanicomial, que é festejada todo dia 18 de maio.

Saudades, companheiro. Posted by Picasa

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