julho 28, 2007

Dia do motociclista: duas matérias jornalísticas com a mesma síndrome

Foto: Rogelio Casado - Campanha de reeleição de Lula, Manaus-AM, 2006

Ontem, 27 de julho, comemorou-se o Dia Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho e Dia do Motociclista.

Leia a
matéria publicada na home page de A Crítica:

Liberdade e perigo sobre duas rodas

Nas ruas de Manaus é cada vez maior a presença de pessoas dirigindo motos, como meio de transporte e trabalho

Cristiane Silveira
Da Equipe de A CRÍTICA

Mais educação no trânsito e respeito com os motociclistas. São esses os desejos da categoria no Dia do Motociclista, comemorado hoje. Em Manaus, a data será festejada com uma carreata cujo objetivo é promover a conscientização dos motociclistas para normas de segurança.

No Brasil, eles já somam cerca de sete milhões. No Amazonas, a reportagem não conseguiu obter esse tipo de dado no Detran. O órgão informou, contudo, que os acidentes envolvendo motociclistas só perdem para os atropelamentos.

O Detran garante, porém, que o índice de mortalidade aqui é menor do que a média nacional, que teve crescimento de 35%. No Estado, de janeiro a maio deste ano, foram notificadas 28 mortes contra 31 no mesmo período do ano passado, uma redução de 10%.
Motociclista há mais de 30 anos, o mecânico de motos, André Souza, 52, afirma que os motociclistas são hoje marginalizados tanto pela sociedade quanto pelo poder público. Ele diz isso explicando que no trânsito os motoristas não os vêem como cidadãos que pagam todos os impostos para trafegar normalmente pelas vias da cidade.

Da mesma forma ele declara acontecer por parte do poder público, que generaliza o fato da maioria dos assaltantes utilizarem como meio de transporte a motocicleta. "Se somos parados em uma blitz, abordam-nos como se fôssemos bandidos", ressalta ele, sugerindo que a solução para esses problemas é educação da sociedade e dos órgãos competentes pela fiscalização.

Para André, não é seguro andar de moto nas vias da cidade por causa da imprudência, tanto dos motociclistas quanto dos motoristas de um modo geral. "O nosso trânsito está muito louco. Quando comecei a andar de moto, as vias eram mais tranqüilas. Hoje, corremos toda hora risco de sofrer um acidente", comenta, informando que Deus o livrou de colisões mais graves nessas três décadas em cima de duas rodas.

Passeata
O Departamento Estadual de Trânsito (Detran/AM) realiza hoje passeata com motos em comemoração ao Dia do Motociclista. A concentração será em frente à sede do órgão, na rua Recife, Zona Centro-Sul, e os motociclistas participantes sairão às 8h rumo à Zona Leste. Em todo o percurso, haverá conscientização sobre os cuidados no trânsito e sobre o uso dos equipamentos de segurança, principalmente o capacete.

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Dia do motociclista: duas matérias jornalísticas com a mesma síndrome

Nem de longe a matéria de A Crítica faz qualquer alusão as causas subjacentes a tantos acidentes fatais dos últimos anos. Reduzi-la à imprudência dos motociclistas ou dos motoristas é simplificar os múltiplos fatores determinantes desse fato social.

Sou motociclista desde o final dos anos 1960. Talvez, proporcionalmente, naquela época, com a instalação da Zona Franca de Manaus, para uma cidade com pouco mais de 300 mil habitantes, tenhamos conhecido um maior número de vítimas, quando as motocicletas passaram a fazer parte da paisagem e do cotidiano da cidade recém-alçada à condição de Zona Franca, do que agora, quando ela beira os 2 milhões de habitantes.

A atração que a motocicleta estimulava, e ainda estimula, no imaginário da humanidade pressupunha uma liberdade que desafiava inúmeros jovens a estabelecer, perigosamente, seus limites, numa versão distorcida do lema da época: viver perigosamente.

Comparativamente, os tempos atuais nem de longe lembram a selvageria com que se enfrentavam motociclistas e motoristas daqueles tempos.

Os tempos mudaram. A motocicleta passou a ser uma necessidade do homem contemporâneo. Tornou-se seu instrumento de transporte e de trabalho. Nisto a matéria acerta. Entretanto, assim como é desconhecido o número de motocicletas na cidade, o leitor fica sem saber se nas estatísticas dos acidentes fatais quantas vidas desaparecem em razão da lógica perversa do trabalho a que estão submetidos os que dependem desse veículo como fonte de renda. Quantos trabalhadores anônimos são exigidos pelos serviços de entrega rápida a abusar da velocidade, uma vez que dela depende a produção da sua renda?

Tampouco há uma linha sequer sobre o estado das artérias por onde trafegam nossos veículos. Quando não são ruas esburacadas, são ruas de uma irregularidade incompatível com o volume de impostos que circulam na cidade de um dos maiores PIBs do Brasil.

Se as omissões contidas no texto jornalístico fossem consideradas como uma síndrome, deveria ter Jô Soares como patrono. É sabido que o gordo sofreu dois graves acidentes, fraturando o pulso direito e esquerdo em cada um deles. A partir daí passou a considerá-lo um veículo perigoso. Entretanto, não me recordo que ele tenha feito qualquer cobrança às autoridades federais responsáveis pela manutenção das nossas estradas. Lá, como cá, enxerga-se a árvore, mas perde-se a dimensão da floresta.

A matéria do Amazonas em Tempo, intitulada Motociclistas pedem paz no trânsito, padece da mesma síndrome.

Rogelio Casado

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