dezembro 30, 2008

As políticas naturais de desastre

Santa Catarina - Brasil
As políticas naturais de desastre

por Alex

As catástrofes pouco têm de natural e muito da lógica do capital. O modelo de desenvolvimento implementado, ao ter por norte único o lucro, de qualquer forma possível, tira proveito das destruições do planeta seja como desgraça ou nas conseqüências destas.

Por um lado, temos as autoridades governamentais que buscam se isentarem de suas responsabilidades ao culpar a natureza pelas tragédias, escondendo assim, uma série de (não) políticas públicas que permitiram tal ocorrência. Evita-se uma discussão séria sobre os motivos – através do argumento de "não politizar a situação", liberando a gestão pública e os interesses empresariais de responsabilidades. As catástrofes aparecem quase como um castigo divino, que nada tem a ver com o modelo de desenvolvimento aplicado e que se continua a aplicar.

Por outro lado, tentando uma análise mais abrangente, culpa-se o ser humano pelas mudanças climáticas. Enxerga-se assim a sombra do problema, mas não a sua face. Há que se politizar o sucedido, pois por trás de tudo existe uma série de políticas públicas que têm permitido, em paralelo às causas naturais, a situação que hoje se vive e que se repete como num círculo infernal a cada verão.

O que poderia ser evitável segue se repetindo, sacralizado acima do poder humano e da política, essa transmutação impede que se percebam as causas reais.

Os responsáveis por esses crimes contra a natureza e a humanidade não serão encontrados na explicação da moda, de "mudança climática", ou pela nova-velha teoria de cima, elaborada pelos "especialistas acadêmicos" e comprada no supermercado das idéias pré-fabricadas, que culpam as vítimas pela sua desgraça. "Ocupação irregular do solo" nos dizem eles, mostrando a superfície e não a raiz do problema, como se o direito à habitação não fosse uma questão de políticas e responsabilidade públicas. Senão vejamos:

Segundo o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal, este apenas executou 13% do orçamento previsto (para o ano de 2008) para prevenção e preparação de desastres; No estado de Santa Catarina as Áreas de Preservação Permanente foram diminuídas em extensão por pressão da Bancada Ruralista, a mesma que constrói diques irregulares para valorizar suas propriedades e que, através de uma política de habitação em prol da especulação imobiliária, torna inacessível, para a maioria da população, a moradia nas regiões mais planas e seguras, forçando as pessoas pobres a ocuparem, para poderem sobreviver, as encostas e morros.

A mão do capital acompanha as destruições da natureza, seja via desflorestamento, esgotamento dos solos, contaminação, desequilíbrio ecológico, poluentes atmosféricos, especulação imobiliária, segregação social.

Centenas de mortos, milhares de desabrigados e de pessoas que não poderão voltar aos seus lares. Em meio às tragédias pode-se medir a estatura das pessoas. Para uns e umas estes desastres servem para capitalizar suas imagens através de oportunismos midiáticos, doações avultantes, eventos pirotécnicos. Mas, por outro lado, a anônima solidariedade de baixo se espalha arrecadando muito do pouco que possuem.

Contudo, os bilhões saídos dos cofres públicos agora, e somente agora, que se somam com as doações de solidariedade popular provavelmente serão investidos na reconstrução da infra-estrutura da cidade, ou seja, na construção de pontes, estradas, créditos para (re)construção de moradias… E não é que alimentamos, uma vez mais, os lucros das empreiteiras, construtoras, propriedades agrícolas…? O capital lucra duplamente com as tragédias, na sua causa e nas suas conseqüências. As tragédias, assim, aparecem como oportunidade aos conglomerados empresariais que atuam nos processos de reconstrução.

Entretanto, o capitalismo, enquanto sistema, não é antagônico a proteção ambiental. Este pode apropriar-se do discurso e prática ecológica como mecanismo de sua reprodução, isto é, de acúmulo de lucro e multiplicação de explorações e desigualdades. Em que pese este fato, o aumento do consumo nos atuais padrões energéticos e a sombra da crise financeira pode influenciar o quadro geopolítico e econômico mundial, acirrando nacionalismos e conflitos, incluso armados.

E a população pobre, se não efetivar saídas coletivas e autônomas, se não se mobilizar para uma mudança substancial neste quadro e, ao invés disso continuar a entregar sua vida aos gestores e políticos, deverá ser obrigada a, mais uma vez, reiniciar sua jornada do zero. Tal qual Sísifo, a subir os morros e encostas, para no próximo verão rezar para que todo seu trabalho (suas casas, seus bens, suas vidas) não role morro abaixo. Nova Orleans, Tabasco, La Paz, Santa Catarina, Rio de Janeiro, São Paulo, Sudeste Asiático… mudam-se as localidades, os nomes das cidades e os países, mas as causas das "tragédias naturais do capital" continuam a mesmas.

Fonte: http://coletivosopros.wordpress.com/2008/12/15/as-politicas-naturais-de-desastre/
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