PICICA: Os mineiros fazem história na Saúde Mental do país. Enquanto isso em Manaus, os reformistas de araque confudem a opinião pública. Ao se apropriarem da linguagem dos militantes da luta por uma sociedade sem manicômicos, esqueceram-se de um detalhe que pode ser assim traduzido: "mostra-me tua prática e te direi quem és!". Durante esta semana a cidade vem assistindo um festival de des/informação. Estão trocando alhos por bugalhos. Onde já se viu fazer inclusão social de pessoas com transtorno mental dentro de hospício? E alfabetização de pessoa com transtorno mental? É dentro do hospício ou na escola? Só falta voltar à cena a proposta de criação de lares abrigados para pessoas com transtorno mental na periferia da cidade, como esses reformistas chegaram a propor. É leseira pra ninguém botar defeito.
Este é um pequeno vídeo produzido com o intuito de divulgar o 18 de MAIO - Dia Nacional da Luta Antimanicomial - em Belo Horizonte. Desfile este que está em sua 15 Edição e é organizado pelo FÓRUM MINEIRO DE SAÚDE MENTAL.
Música: Sou Rei da Loucura - Autor: Juliano Silva (Usuário do Centro de Convivência Artur Bispo do Rosário e do CERSAM Leste em BH).
Produção do Coletivo Espaço Saúde MG
Saudações Antimanicomiais!
Pátria Livre!
Música: Sou Rei da Loucura - Autor: Juliano Silva (Usuário do Centro de Convivência Artur Bispo do Rosário e do CERSAM Leste em BH).
Produção do Coletivo Espaço Saúde MG
Saudações Antimanicomiais!
Pátria Livre!
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DEZOITO DE MAIO
DIA NACIONAL DA LUTA ANTIMANICOMIAL.
O Cenário é Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, onde vivem cerca de 2.500.000 habitantes. Nesta cidade, faz-se cotidianamente a opção política por um trabalho em saúde mental articulado em rede para substituir os hospitais psiquiátricos, abrindo passagem para a cidadania às pessoas portadoras de sofrimento mental.
Fragmentos da história
As primeiras manifestações do Dezoito de Maio aconteceram de forma tímida, mas ousada, quando alguns técnicos do IRS, saiam daquela instituição em caminhada até a Praça Sete, realizando um percurso de mais ou menos de 4 km. E nesse trajeto, seus poucos participantes receavam um possível apedrejamento pelo que diziam ou propunham, arriscavam-se cidade adentro. Simbolicamente, esse ato é a representação a saída do hospício para a vida.
E a Praça Sete foi ocupada anos depois, quando se faziam acontecer as Feiras de Produtos Antimanicomiais e as oficinas livres e abertas no coração da cidade.
No ano de 1997, fecharam-se as barracas de produtos dos serviços na Praça Sete e em passeata pelas principais ruas do centro, os usuários que faziam seu tratamento na rede substitutiva, os trabalhadores, os militantes da causa antimanicomial gritavam com irreverência: Ah! Eu tô maluco!
Ali se apresentava o esboço da Escola de Samba Liberdade Ainda Que Tam Tam com a paródia de um samba do Martinho da Vila, Canta, canta minha gente, deixa a tristeza pra lá, com a saúde mental encantar BH.
Para o ano do cinqüentenário da Declaração dos Direitos Humanos, em 1998, foi criado o 1º samba enredo: “Pelos Direitos de Vida e de Amor,” uma composição de Ana Marta Lobosque e Weber Lopes.
Trios elétricos e a organização das pessoas em diferentes agrupamentos denominados os quais denominamos alas temáticas, delineavam o formato de um carnaval diferente. E partindo da Praça Sete, a manifestação ganhou a principal avenida do centro da cidade, a Afonso Pena.
No ano seguinte, 1999, tanto a organização quanto a beleza dos parangolés, demonstravam o refinamento crescente.
O belíssimo samba de enredo denominado Louco Encanto, uma composição de Airton Meireles, deu o tom e a sensibilidade necessárias para a homenagem a César Rodrigues Campos, companheiro da luta falecido poucos meses antes. Com o título, A César o que é de César, a última ala da Escola fez subir aos céus balões brancos como símbolo de agradecimento e reverência, demonstrando o tamanho da saudade de todos.
No ano 2000, tendo como tema eixo o Hospício Vai Para o Espaço, um foguete produzido numa serralheria, com sua estrutura recoberta com garrafas pet, resultou numa bela alegoria puxada por um carrinho de catador da ASMARE, protegida por seis anjos guardiões que queriam garantir o não retrocesso ao modelo hospitalocêntrico, segregador e mais uma vez outro um samba do Airton Meireles, anunciava que trabalho com emprego pode preparar, que o louco de hoje em dia quer até sambar...
Por causa de seu tamanho e a dificuldade de se conseguir o transporte, essa alegoria não retornou ao Centro de Convivência São Paulo, ficando por quase um ano de canto a canto pelo centro da Cidade, presentificando o 18 de Maio.
De 2001 a 2004, um grande expresso da agonia trouxe como emblema, a folia. As luas cheias em chave de cadeia, Abriram alas pra loucura. Os livres soldado na luta vencem a exclusão na avenida e é sabido que quando chega a liberdade, faz-se um mundo em aquarela. Estas são frases, verdadeiras pérolas, estão nos sambas de Airton Meireles no período citado.
Em 2005, inaugurou-se outra fase com a realização do concurso para a escolha da melhor proposta de samba enredo dentro do tema eixo construído coletivamente a cada ano: É o pré – Dezoito de Maio.
A cidade se mobiliza, os municípios do interior vem junto, reunindo uma diversidade de pessoas em espaços culturais: O mercado Distrital de Santa Tereza que abrigou esta festa nos 3 primeiros anos. Nos últimos anos o palco da cidadania tem sido instalado no Parque Lagoa do Nado no bairro Itapoã.
E quão difíceis todas as escolhas, pela beleza, pela quantidade e pela diversidade de propostas. Para esta escolha, são convidados artistas, publicitários, músicos, produtores culturais da cidade que descrevem esses momentos como ”uma experiência de raro encanto!”.
Duas criações coletivas realizadas nas oficinas de música do Centro de Convivência São Paulo venceram os dois primeiros concursos..
Os devotos de São Doidão, afirmaram convictos que gente é para brilhar e que a nossa luta é por delicadeza...
Em 2007, nos 20 anos de história do Movimento da Luta Antimanicomial, o concurso se amplia ao se realizar também a escolha da rainha de bateria, pois a partir de então a Liberdade Ainda Que Tam Tam, tem uma bateria.
No refrão do samba vencedor do concurso, o autor Márcio Lima, com sensibilidade desafia: me mostra preto no branco, que eu quero ver, a verdadeira mentira aparecer. Me prendo na liberdade de ser então, das ruas desta cidade um louco cidadão.
Em 2008, o samba escolhido para embalar a festa/ manifestação foi uma composição de Rômulo Garcias, vai lembrar a todos que “ todo ano eu passa por aqui, prá cantar em versos o que eu vivi” Em 2009, o refrão do samba composto coletivamente pelo Centro de Convivência Cesar Campos convidou a todos: Vem, vem que na avenida você tem, os tambores como atores batucando pelo bem!
Vem também viajar no nosso trem, pois o preconceito fica fora e não embarca com ninguém!
Ao trabalhar o tema Solidariedade, Há em Ti Há em Mim, o coletivo Centro de Convivência São Paulo vence mais uma vez o concurso quando em seus versos propõe: Tec, tec, tônica, parece uma bomba atômica, todo abalo à sociedade que vive sem a solidariedade, mandando o hospício para a rima que o pariu!
E a pergunta roda:
O jornal de maior circulação do estado, por ocasião 18 de Maio, fez por dois anos consecutivos, uma enquete sobre o lugar e a forma de tratamento para o portador de sofrimento mental.
Foi unanimidade a escolha pelo tratamento digno e em liberdade.
A partir de 1998, no dia seguinte à manifestação, as primeiras páginas dos principais jornais davam notícias sobre o evento, com algumas matérias bem elaboradas e outras nem tanto, mas lá estava.
Para saber do desfile pela televisão, é prática ir depressa para casa e ligar a TV para assistir aos primeiros jornais da noite, para “ver a gente no Dezoito de Maio”.
E a cabeça agita:
Em 2007, as primeiras páginas do jornal de circulação mais ampla no Estado, trouxe duas imagens que diziam mais que duas mil palavras: De um lado a alegria, a beleza e irreverência do desfile/ manifestação do Dezoito de Maio e do outro, imagens da grotesca violação dos Direitos Humanos dos pacientes no pátio de um hospital psiquiátrico na zona sul da cidade. Os quase 200 leitos do referido hospício chegaram ao fim, sendo fechados depois do enfrentamento de fortes batalhas.
Eu fico com a pureza da resposta das crianças...
Ao longo desse período, em determinado momento de tensionamento e dificuldades, foi importante a entrada dos manifestantes na sede do governo municipal para entregar uma carta ao prefeito com recomendações e reivindicações em relação à política de saúde mental em Belo Horizonte.
Foi de igual relevância estender o percurso do desfile por mais um enoooooorme quarteirão e passar em frente ao CRM para reafirmar importância da abertura da hospitalidade noturna e o funcionamento dos CERSAMs 24 horas. Isso deu força para o avanço da política de saúde mental.
Palhaços em pernas de pau, malabaristas, rainhas e princesas, engolidores de fogo, bailarinas, bispos do rosário, napoleões e bonapartes, vangoghs, olímpias, rauls e seixas, meninas de sinhá, tambolêlês, são destaques, são heróis, são referência ou convidados.
Foguetes e trens, carrinho de catador e lona de circo, a nau dos loucos, dragões, bois da manta e a casa de moça namoradeira, são as alegorias produzidas com esmero.
Brumadinho, Dores do Indaiá, Monlevade, Betim, Ipatinga, Lagoa Santa, Perdões, Diamantina, Teófilo Otoni, Santa Luzia, Ouro Preto, Lafaiete, Esmeraldas,São Joaquim de Bicas, Araçuaí, Igarapé, Sabará, Nova Lima, Contagem, Caeté, Ribeirão das Neves, são algumas das cidades que participaram ou participam do desfile em BH, trazendo sua alegria, compromisso e crédito na reforma psiquiátrica antimanicomial.
È a vida, é bonita e é bonita!!
O encantamento acontece, a cidade pára, as pessoas querem saber o que é isso?.
Alguns sinais positivos são a chuva de papéis que caem dos prédios, aplausos, expressões de espanto ou surpresa, adesões ao cortejo.
Catadores, pastoral de rua, movimento estudantil, mídias comunitárias, universidades, entidades de Direitos Humanos, sindicatos, conselhos e parlamentares se juntam à luta por uma sociedade sem manicômios.
Dezoito de Maio: Um fazer/ Processo:
Na última reunião do Fórum do ano anterior, um grupo de pessoas se apresenta para organizar o 18 de maio, é a Comissão do Dezoito do Fórum Mineiro de Saúde Mental. Este grupo vai se ampliando com representantes dos serviços da rede de BH, dos serviços da Região Metropolitana e de outros segmentos: Universidades, centros culturais, representantes das mídias comunitárias, grupos de defesa os direitos humanos, conselhos de classe, etc.
Diante de uma folha em branco, nada pronto, tudo por fazer. Sem uma coordenação vertical – todos podem, todos falam,, pensam, ponderam, contrapõem, exercitam o pensamento, deliram, analisam a conjuntura, relatam experiências...
Compartilhamento, cumplicidade e coletividade são os elementos que se destacam nesse modo de construção.
Achar o tom, formular o conceito , a estética, a estratégia, definir o tema eixo e conceber os nomes das alas é a tarefa encomendada.
Liberdade e ousadia é a condição.
Enquanto a produção vai tomando forma,, as informações são repassadas aos serviços e instituições ali representadas, que retornam através de sugestões e idéias, Significa que o debate se estendeu, provocou e se ramificou, como a água que busca frestas pra encontrar caminhos...
Concluída a primeira etapa, cada serviço ou segmento, escolhe a ala com a qual mais se identifica e a partir daí, criam-se as subcomissões que darão continuidade ao trabalho nos “barracões” na produção as fantasias e adereços, se organizando para o grande desfile. Nos últimos anos, participaram do desfile/manifestação, cerca de 3 mil pessoas.
Concomitante a tudo isso, acontece a busca de parcerias e apoios, para o financiamento dos trios elétricos, banheiro químico, transporte das pessoas, materiais para as fantasias, alegorias e adereços. A busca de recursos para a produção do cartaz temático, para a gravação do samba de enredo, para a produção dos panfletos, etc. É definido então quem vai atender a imprensa, quais serão os animadores, os anjos da guarda. E não sem sofrimento, acontece também a imprescindível organização burocrática para a liberação das ruas, autorização dos bombeiros, etc.
A Política:
A intervenção do 18 de maio inicia-se com cada pessoa que escolhe participar, que descobre porque participar e inventa como fazê-lo. Essa construção de cada um, passa a envolver pequenos coletivos que se ampliam até a ação política do Dezoito enquanto uma data que carrega em si a proposição: Por uma sociedades sem manicômios.
Um exemplo da contribuição do Dezoito de Maio enquanto espaço de intervenção pode ser a crítica refinada às relações paralisantes do absoluto poder fazendo um paralelo entre o imperialismo e o manicômio: imposição e hegemonia é o mesmo que intolerância à diferença e à diversidade.
Percebe-se a clareza sobre o que se entende por modelo de tratamento: livre, com respeito e dignidade. A “gaiola dourada” ou o hospício melhorado, pode ser uma armadilha!
Transparece o posicionamento frente aos desmandos da corrupção, das desigualdades sociais geradoras de exclusão para muitos.
É um modo de fazer política onde não se perdem os sonhos ao se criticar duramente o modelo de sociedade colocado e de forma demonstrativa, propõe caminhos possíveis de superação, combinando cores, acordes e sentidos na construção de novas formas de sociabilidade.
Do exercício no cotidiano desse processo, aos resultados e efeitos, demonstra-se a força que move esse coletivo e propulsiona mudanças. E para fechar essa história que não tem fim afirmamos que nada pode apagar esse amor* pela liberdade!
*Nome de uma das alas do desfile de 2002.
Belo Horizonte, abril de 2011.
Marta Soares
Fórum Mineiro de Saúde Mental
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