maio 18, 2011

O Fórum Mineiro de Saúde Mental pede passagem

PICICA: Os mineiros fazem história na Saúde Mental do país. Enquanto isso em Manaus, os reformistas de araque confudem a opinião pública. Ao se apropriarem da linguagem dos militantes da luta por uma sociedade sem manicômicos, esqueceram-se de um detalhe que pode ser assim traduzido: "mostra-me tua prática e te direi quem és!". Durante esta semana a cidade vem assistindo um festival de des/informação. Estão trocando alhos por bugalhos. Onde já se viu fazer inclusão social de pessoas com transtorno mental dentro de hospício? E alfabetização de pessoa com transtorno mental? É dentro do hospício ou na escola? Só falta voltar à cena a proposta de criação de lares abrigados para pessoas com transtorno mental na periferia da cidade, como esses reformistas chegaram a propor. É leseira pra ninguém botar defeito.
Enviado por em 13/05/2011
Este é um pequeno vídeo produzido com o intuito de divulgar o 18 de MAIO - Dia Nacional da Luta Antimanicomial - em Belo Horizonte. Desfile este que está em sua 15 Edição e é organizado pelo FÓRUM MINEIRO DE SAÚDE MENTAL.

Música: Sou Rei da Loucura - Autor: Juliano Silva (Usuário do Centro de Convivência Artur Bispo do Rosário e do CERSAM Leste em BH).


Produção do Coletivo Espaço Saúde MG

Saudações Antimanicomiais!

Pátria Livre!

***

DEZOITO DE MAIO
                      
DIA NACIONAL DA LUTA  ANTIMANICOMIAL.

O Cenário é Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, onde vivem cerca de 2.500.000 habitantes. Nesta cidade, faz-se cotidianamente a opção política por um trabalho em saúde mental  articulado em rede  para substituir os hospitais psiquiátricos, abrindo passagem para a cidadania às pessoas  portadoras de sofrimento mental.

Fragmentos da história

As primeiras manifestações do Dezoito de Maio aconteceram de forma tímida, mas ousada, quando alguns técnicos do IRS, saiam daquela instituição  em caminhada  até a Praça Sete,  realizando  um percurso de mais ou menos  de 4 km. E nesse trajeto, seus poucos participantes receavam um possível apedrejamento pelo que diziam ou propunham, arriscavam-se cidade adentro. Simbolicamente, esse ato é a  representação a saída do hospício para a vida.

E  a Praça Sete foi ocupada   anos depois,  quando se  faziam acontecer  as Feiras de Produtos Antimanicomiais e   as oficinas  livres e abertas no coração  da cidade.

No ano de 1997, fecharam-se  as barracas de produtos dos serviços na Praça Sete  e em  passeata pelas principais ruas do centro, os usuários que faziam seu  tratamento na rede substitutiva,  os trabalhadores, os militantes da causa antimanicomial   gritavam com irreverência: Ah! Eu tô maluco!
 
Ali se apresentava o esboço da Escola de Samba Liberdade Ainda Que Tam Tam  com a paródia de um samba do Martinho da Vila, Canta, canta minha gente, deixa a tristeza pra lá, com a saúde mental encantar BH.

Para o ano do cinqüentenário da Declaração  dos Direitos Humanos, em 1998, foi criado o 1º samba enredo: “Pelos Direitos de Vida e de Amor,” uma composição de  Ana Marta Lobosque e Weber Lopes.

Trios elétricos e a  organização   das pessoas em diferentes agrupamentos denominados os quais denominamos   alas  temáticas, delineavam o formato de um carnaval diferente. E  partindo da Praça Sete, a manifestação ganhou  a principal  avenida do centro da cidade, a Afonso Pena.

No ano seguinte, 1999, tanto a organização  quanto  a beleza dos parangolés, demonstravam o refinamento crescente.

 O belíssimo samba de enredo denominado Louco Encanto, uma composição de Airton Meireles, deu o tom e a sensibilidade necessárias para a homenagem a César Rodrigues Campos, companheiro da luta  falecido poucos  meses antes. Com o título, A César o que é de César,  a última ala da Escola  fez subir aos céus balões brancos como símbolo de  agradecimento e reverência,  demonstrando o tamanho da saudade de todos.

No ano 2000,  tendo como tema eixo  o Hospício Vai Para o Espaço, um foguete produzido numa serralheria,  com sua estrutura recoberta com  garrafas pet, resultou  numa bela alegoria  puxada por um carrinho de catador da ASMARE,  protegida por seis  anjos guardiões que queriam garantir o não retrocesso ao  modelo hospitalocêntrico, segregador e  mais uma vez  outro um samba  do Airton Meireles, anunciava que  trabalho com emprego pode preparar, que o louco de hoje em dia quer até sambar...

Por causa de seu tamanho e a dificuldade de se conseguir o transporte, essa alegoria não retornou ao Centro de Convivência São Paulo, ficando por quase um ano de canto a canto pelo centro da Cidade, presentificando o 18 de Maio.

De 2001 a 2004, um grande expresso da agonia trouxe como emblema, a folia. As luas cheias  em chave de cadeia, Abriram alas pra loucura. Os livres soldado na luta vencem a exclusão na avenida e é sabido  que quando chega  a liberdade,    faz-se um mundo em aquarela. Estas são frases, verdadeiras  pérolas, estão  nos   sambas  de Airton Meireles no  período citado.

Em 2005, inaugurou-se  outra fase com a realização  do concurso para a escolha da melhor  proposta de samba enredo dentro do tema eixo construído coletivamente a cada ano: É o pré – Dezoito de Maio.

A cidade se mobiliza, os municípios do interior vem junto, reunindo uma diversidade de pessoas em espaços culturais: O mercado Distrital de Santa Tereza que abrigou  esta festa nos 3 primeiros anos. Nos últimos anos o palco da cidadania tem sido  instalado no Parque  Lagoa do Nado no bairro Itapoã.

E quão difíceis todas as escolhas, pela  beleza, pela quantidade e pela diversidade de propostas. Para esta escolha, são convidados artistas, publicitários,  músicos, produtores culturais da cidade que descrevem esses momentos como ”uma experiência de raro encanto!”.

 Duas criações coletivas realizadas nas oficinas de música do Centro de Convivência São Paulo venceram os dois primeiros concursos..
Os  devotos de São Doidão, afirmaram convictos que gente é para brilhar e que a nossa luta é por delicadeza...

 Em 2007,  nos 20 anos de história do Movimento  da Luta Antimanicomial, o concurso se amplia  ao se realizar também   a  escolha da rainha de bateria, pois a partir de então a Liberdade Ainda Que Tam Tam, tem  uma  bateria. 

No refrão do samba vencedor do concurso, o autor Márcio Lima, com sensibilidade desafia: me mostra preto no branco, que eu quero ver, a verdadeira mentira aparecer. Me prendo na liberdade de ser então, das ruas desta cidade um louco cidadão.

Em 2008, o samba escolhido para embalar a festa/ manifestação foi uma composição de Rômulo Garcias, vai lembrar a todos  que “ todo ano eu passa por aqui, prá cantar em versos o que eu vivi” Em 2009, o refrão do samba composto coletivamente pelo Centro de Convivência Cesar Campos convidou a todos: Vem, vem que  na avenida você tem, os tambores como atores batucando pelo bem!

Vem também viajar no nosso trem, pois o preconceito fica fora e não embarca com ninguém!

Ao trabalhar o tema Solidariedade, Há em Ti Há em Mim, o coletivo Centro de Convivência São Paulo vence mais uma vez o concurso quando em seus  versos propõe: Tec, tec, tônica, parece uma bomba atômica, todo abalo à sociedade que vive sem a solidariedade,  mandando o hospício para a rima que o pariu!

E a pergunta roda:

O  jornal  de maior circulação do estado, por ocasião 18 de Maio, fez por dois anos consecutivos, uma enquete  sobre  o lugar  e a forma de tratamento  para o portador de sofrimento  mental. 

Foi unanimidade a escolha pelo tratamento digno e  em liberdade. 

A partir de 1998, no dia seguinte à manifestação, as primeiras páginas dos principais jornais davam  notícias sobre  o evento, com algumas matérias bem elaboradas e outras nem tanto, mas lá estava. 

Para saber do desfile pela televisão, é prática ir depressa  para  casa e ligar a TV para  assistir aos primeiros jornais da noite,  para “ver a gente no Dezoito de Maio”.

E a cabeça agita:

Em  2007, as primeiras páginas do jornal de circulação mais ampla no Estado, trouxe  duas imagens  que diziam mais que  duas mil palavras: De um lado a alegria, a  beleza e irreverência  do desfile/ manifestação do Dezoito de Maio  e do outro, imagens  da grotesca violação dos Direitos Humanos dos  pacientes no  pátio de um hospital psiquiátrico na zona sul da cidade. Os quase  200 leitos do referido hospício  chegaram ao fim, sendo fechados  depois  do enfrentamento de fortes batalhas.

Eu fico com a pureza da resposta das crianças...

Ao longo desse período, em determinado momento  de tensionamento  e dificuldades, foi importante a entrada dos manifestantes na sede do governo municipal  para entregar uma carta ao prefeito com recomendações e  reivindicações em relação à política de saúde mental em Belo Horizonte. 

Foi de igual relevância estender o percurso do desfile  por mais um enoooooorme quarteirão  e passar   em  frente ao CRM  para  reafirmar  importância da  abertura  da hospitalidade noturna e o funcionamento dos CERSAMs 24 horas. Isso deu força para o avanço da  política de saúde mental.

Palhaços  em pernas de pau, malabaristas, rainhas e princesas, engolidores de fogo, bailarinas, bispos do rosário, napoleões e bonapartes, vangoghs, olímpias, rauls e seixas, meninas de sinhá, tambolêlês, são destaques, são heróis, são referência ou  convidados.

Foguetes e trens, carrinho de catador e  lona de circo, a nau dos loucos, dragões, bois da manta e a  casa de  moça namoradeira, são as alegorias produzidas com esmero.

Brumadinho, Dores do Indaiá, Monlevade, Betim, Ipatinga, Lagoa Santa,  Perdões, Diamantina, Teófilo Otoni, Santa Luzia, Ouro Preto, Lafaiete, Esmeraldas,São Joaquim de Bicas, Araçuaí, Igarapé,  Sabará, Nova Lima, Contagem, Caeté,  Ribeirão das Neves,  são algumas  das cidades que   participaram ou participam do desfile em BH, trazendo  sua alegria, compromisso  e crédito na  reforma psiquiátrica antimanicomial.

È a vida, é bonita e é bonita!!
 
O encantamento acontece, a cidade pára, as pessoas querem saber o que é isso?.

Alguns sinais positivos são a chuva de papéis   que caem dos prédios,  aplausos, expressões de espanto ou surpresa, adesões ao cortejo.

Catadores, pastoral de rua, movimento estudantil, mídias comunitárias, universidades, entidades de Direitos Humanos, sindicatos, conselhos e  parlamentares se juntam à luta por uma sociedade sem manicômios.

Dezoito de Maio: Um fazer/ Processo:

Na última reunião do Fórum do ano anterior, um grupo de pessoas se apresenta para organizar  o 18 de maio, é  a Comissão do Dezoito do Fórum Mineiro de Saúde Mental.  Este grupo vai se ampliando com  representantes dos serviços da rede de BH, dos serviços da Região Metropolitana e de outros  segmentos: Universidades, centros culturais,  representantes das mídias comunitárias, grupos  de defesa os direitos humanos, conselhos de classe, etc.

Diante de uma folha em branco, nada pronto, tudo por fazer. Sem uma coordenação vertical – todos podem, todos falam,, pensam, ponderam, contrapõem, exercitam o pensamento, deliram, analisam a conjuntura, relatam experiências...
  
Compartilhamento, cumplicidade e coletividade são os elementos que se destacam nesse modo de  construção. 

Achar o tom, formular o  conceito , a  estética, a estratégia, definir o tema eixo e  conceber  os nomes das alas é a tarefa encomendada.

Liberdade e ousadia é a condição.

Enquanto  a produção vai tomando forma,, as informações são repassadas aos serviços e instituições ali representadas, que retornam através de sugestões e idéias, Significa que o debate se estendeu, provocou e se ramificou, como a água  que busca frestas pra encontrar caminhos...

Concluída a primeira etapa, cada serviço ou segmento, escolhe  a  ala com a qual mais se identifica e a partir daí, criam-se  as subcomissões que  darão continuidade ao  trabalho nos “barracões” na produção as fantasias e adereços, se organizando para  o grande desfile. Nos últimos anos, participaram do desfile/manifestação, cerca de 3 mil pessoas.

Concomitante  a tudo isso, acontece  a busca de parcerias  e apoios, para  o financiamento dos trios elétricos, banheiro químico, transporte das pessoas, materiais para as fantasias, alegorias e adereços. A busca de recursos  para a produção do cartaz temático, para  a gravação do samba de  enredo, para a produção dos panfletos, etc. É definido então  quem vai atender a imprensa, quais serão os animadores, os anjos da guarda. E não sem sofrimento, acontece também  a imprescindível  organização burocrática para a liberação das ruas, autorização dos bombeiros, etc.
             
A Política:

A intervenção do 18 de maio inicia-se com cada pessoa que escolhe participar, que descobre porque participar e inventa como fazê-lo. Essa construção de cada um, passa a envolver  pequenos coletivos que  se ampliam até a ação política do Dezoito enquanto  uma data que carrega  em si a proposição: Por uma sociedades  sem manicômios.

Um exemplo da contribuição do Dezoito de Maio enquanto espaço de intervenção pode  ser a  crítica refinada às relações  paralisantes do absoluto poder fazendo um paralelo   entre o imperialismo e o manicômio: imposição e hegemonia é o mesmo que  intolerância à diferença e à diversidade.

Percebe-se a clareza sobre o que se entende por modelo de tratamento: livre, com respeito e dignidade. A “gaiola dourada” ou o  hospício melhorado, pode  ser uma armadilha!
Transparece  o posicionamento frente aos desmandos da corrupção, das desigualdades sociais geradoras de exclusão  para muitos.

É um modo de  fazer política onde não se  perdem os sonhos ao   se criticar duramente  o modelo de sociedade colocado e  de forma demonstrativa,  propõe  caminhos possíveis de superação, combinando  cores, acordes e sentidos na construção de novas formas de sociabilidade.

Do exercício no cotidiano desse processo,  aos   resultados e efeitos,   demonstra-se   a força  que move  esse  coletivo e propulsiona mudanças. E para fechar essa história que não tem fim afirmamos que  nada pode apagar esse amor* pela liberdade!

*Nome de uma das alas do desfile de 2002.

Belo Horizonte, abril  de 2011.
           
Marta Soares 
Fórum Mineiro de Saúde Mental

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