dezembro 11, 2010

Leia Bruno Cava, ao som de "Hey, Jack Kerouac"

PICICA: Bruno Cava afirma assumir o risco de parecer ainda mais "pernóstico" ao produzir o glossário abaixo, e acaba brindando os aprendizes de feiticeiro com fragmentos históricos que só os iniciados podem fazê-lo.

 
PretzelFarmer | 31 de maio de 2009 |
10,000 Maniacs
The Palace Theatre
New Haven, Connecticut, USA
December 5th, 1989


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10 de dezembro de 2010


Glossário e colagem sobre o último post.


Quero primeiro agradecer ao PICICA - Blog do Rogelio Casado, que não só republicou Meus vinte anos bem vividos, como também fez um trabalho de colagem a partir das referências, que tomo a licença de reproduzir.


Alguns leitores acharam o post anterior hermético (pedante). Admito que pode ter sido descortês, embora, defendo-me, o tom confessional não exprima soberba. De qualquer forma, e assumo o risco de parecer ainda mais pernóstico, complemento com um glossário, em ordem de aparição no texto.

Kerouac, Jack. Escritor americano descendente quebecois, messias beatnik, fã de uísque e benzadrina, tinha uma relação edipiana com a mãe, passou a década de 1950 como um vagabundo iluminado a percorrer os EUA de leste a oeste pela Rota 66, e revitalizou o sonho americano num novo horizonte de liberdade e desprendimento.

10.000 Maniacs. Banda americana pop-rock dos 1980-90 com a musa indie feminista Natalie Merchant, gravou a inesquecível canção Jack Kerouac (assistir aqui no youtube).

Cranberries. Banda irlandesa pop-rock e como a maioria da terrinha, engajada politicamente. O terceiro e melhor álbum, de 1996, tem faixas com os títulos Free to Decide, The Rebels, I just shot John Lennon e Bosnia.

Pearl Jam. Referência absoluta da geração roqueira dos 1990, quem não tinha uma camiseta preta deles?

Grunge de Seattle. Movimento de exorcismo coletivo iniciado no oeste norte-americano, devastou o mundo do rock e inaugurou a so-called Geração X, alcançou o auge com Soundgarden, Alice in Chains e Nirvana, peguei o finzinho da onda, a ressaca se deu no final dos 1990 e foi batizada era pós-grunge.

Marxismo de almanaque. Versão for dummies do marxismo, geralmente simplificadora, maniqueísta e banalizante. Mais tarde, eu aderiria ao trotskismo, ao situacionismo e finalmente, ao que me filio agora, o groucho-marxismo.

Defesa Indo-Benoni. No esporte xadrez, a maioria das aberturas com as peças negras chama-se "defesa". Porque existe uma tendência de as brancas atacarem primeiro, devido à vantagem do primeiro lance. A Defesa Indo-Benoni é de contra-ataque, aplicável contra aberturas de peão da dama, em que as negras propõem um jogo dinâmico e caótico, sem simetria alguma em relação aos lances das brancas. Caracteriza-se pelos lances 1. d4 Cf6, 2. c4 c5. Adequada para jogadores criativos e ofensivos. Foi utilizada com sucesso pelo legendário ex-campeão mundial Bobby Fischer numa partida clássica do match Fischer x Spassky, em 1972. No Brasil, é usada por poucos mestres, aprendi-a com o mestre Marcus Vinícius Garcia e joguei-a com relativo sucesso em vários brasileiros sub-12, sub-14 e sub-18, obtendo uma vitória impossível contra o então campeão mundial da categoria sub-14, no Pan-Americano de São Paulo, 1993.

Barthes, Roland. Crítico literário brilhante e sofisticado, pivô do estruturalismo francês, varrido do mapa após 1968, quando os estudantes provaram que não somos estruturas. Na moda acadêmica brazuca, foi substituído pela febre Michel Foucault.

Nietzsche, Friedrich. Ostentava um indefectível bigodão macho e freqüentava prostíbulos italianos. Brigou com o compositor Richard Wagner.

Joy Division. Banda inglesa de 1976 pós-punk afterglow baixo-astral beira-do-colapso, melhor expressão musical da geração Holocausto Nuclear, letras e vocal do mito Ian Curtis, que se enforcou na cozinha de casa depois de assistir a um filme de Werner Herzog, em 1980.

William Gibson. Na década de 1990, se você era um nerd metido, tinha que ler Gibson, mitólogo da ficção científica e profeta de um novo futurismo tecno-noir. Neuromancer começa assim: "The sky above the port was the color of television, tuned to a dead channel."

Raul Seixas. Toca Rauuuuul!!

Oasis x Blur. Rivalidade. Exato instante em que o britpop nascido em Manchester e inspirado por The Smiths se tornou mainstream. O Blur era considerada a maior banda de rock da última semana até o Oasis disparar a ogiva nuclear (What´s the Story) Morning Glory?, álbum de 1995 todo ele feito de hits.

Noel Gallagher. Letrista da geração que nascemos entre 1975 e 1985.

Monstro do Pântano. Personagem existencialista trágico cuja máxima expressão se deu na pena do escritor inglês Alan Moore.

Defesa Alekhine. Outra defesa de contra-ataque para as negras, desta vez contra abertura de peão de rei, inventada pelo grande mestre russo e campeão mundial Alexander Alekhine, que fugiu do país na Revolução Russa, foi abrigado na Alemanha, manteve relações dúbias com o nazi-fascismo, desenterraram dele um artigo antissemita e o enxadrista terminou assassinado pela KGB estalinista, causa mortis oficial: engasgado com um osso de galinha, em 1946, morto com o título. O próximo campeão curiosamente foi o primeiro russo, Mikhail Botvnik, e a Escola Soviética manteria soberana o cinturão do xadrez até a jornada épica de Bobby Fischer, em 1972.

Isaac Asimov. Mais inspirado nos contos de fantasia do que nos romances de ficção científica.

Aldous Huxley. Escritor distópico.

Camões. Aventureiro a toda prova, foi soldado e poeta, amante das belas mulheres e de idílios praianos.

Putsch, Ersatz, cul-de-sac, weltanshaung, tutti quanti e leitmotiv. Na maioria das vezes, essas palavras terminam por exprimir mais a afetação do autor do que seu conteúdo semântico. Podem ser substituídas por golpe, clone, mato sem cachorro, cosmovisão, todos quantos e ritmo. Admito que Ersatz e leitmotiv são menos dóceis de traduzir e, dependendo da economia textual, podem ser insubstituíveis.

Henry Miller. Um dos maiores escritores de língua inglesa do século 20, largou o cargo burocrático para se dedicar à vida artística aos 33 anos, passou fome em Paris e publicou o seu primeiro romance, com dinheiro da amante, aos 43.

Dostoievski, Fiodor. Tudo o que você precisa saber sobre a vida está nas mil páginas de Os Irmãos Karamázov. Leia e viva.

Wittgenstein, Ludwig. Filósofo maior da primeira metade do século 20, perscrutou os confins da linguagem e da lógica, afundando num misticismo silenciador. Quando voltou à Inglaterra depois de uma temporada no exterior, os estudantes de Oxford prepararam uma faixa pra ele: "Bem-vindo de volta, Deus".

Shakespeare, William. Quem não leu, não leu nada.

Derivada de arco-tangente de x. "A derivada da função tangente de um arco u, onde u é uma função de x, é: y = tg u →y’ = u’ . sec2 u".

Joyce, James. Inventou a prosa contemporânea. A literatura divide-se em pré-Joyce e pós-Joyce.


Terra em Transe. Obra magna do cineasta baiano Gláuber Rocha, de 1967, filme alegórico, plurissintático, lúcido e politicamente dramático.

Folha de São Paulo. Membro honorário do PIG ("Partido da Imprensa Golpista", segundo Paulo Henrique Amorim), bastião do franquismo paulistano e falso grande jornal. Li religiosamente dos 7 aos 20 anos, sempre ao café-da-manhã. Me liga todo ano para tentar reatar a relação, mas virei a página.

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