agosto 31, 2006

ABP versus Reforma Psiquiátrica

Arte de Salvador Dali - A persistência da memória












Nota: Leia artigo publicado na Coluna de
Opinião do jornal Amazonas em Tempo,
no dia 30 de agosto de 2006.

ABP versus Reforma Psiquiátrica

O relacionamento da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) com a Reforma Psiquiátrica é marcado pela ambigüidade. Criada em 1970, com objetivos científicos e corporativos, seus quadros eram compostos, inicialmente, por segmentos conservadores da universidade, da prática clínica particular, da tecno-burocracia do Estado e do empresariado da saúde.

Raros foram os dirigentes que souberam interpretar o momento político vivido, manifestando compromissos com a democracia que queríamos nos anos da luta contra o autoritarismo no país: Marcos Toledo Ferraz foi um desses exemplos.

É fato que a ABP já não tem o domínio hegemônico dos anos de autoritarismo, inclusive porque segmentos declaradamente biologizantes criaram suas próprias entidades, como a Sociedade Brasileira de Psiquiatria Biológica e a Associação Brasileira de Psiquiatria Clínica. E, ainda que tenha havido mudanças nos seus quadros, com a incorporação de profissionais ligados ao serviço público em busca de titularidade, o espírito conservador da instituição permanece. E se manifesta.

Foi o que aconteceu na recente declaração do presidente da ABP em mídia nacional. Mais uma vez, os segmentos conservadores desembarcam da viagem por uma sociedade sem manicômios, surgida em 1987 como bandeira radical do Movimento pela Reforma Psiquiátrica que queremos no Brasil.

Em jogo, o que ainda resta dos 80 mil leitos psiquiátricos privados desde que a Reforma Psiquiátrica brasileira foi iniciada em 1980. Reduzidos a 40 mil, os empresários do setor usam o seu braço institucional para manter serviços nos quais a abordagem psicofarmacológica é dominante. Nada a ver com o nobre espírito científico, senão com a conta bancária de um setor outrora conhecido como “indústria da loucura”.

Ao pretender “zerar” a Reforma Psiquiátrica, o presidente da ABP nega a história de um movimento social que ganhou respeito internacional pela ousadia da experimentação de novos dispositivos técnicos, assistenciais e éticos como os CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), os SRT (Serviços Residenciais Terapêuticos), Centros de Convivência, leitos psiquiátricos em hospitais gerais etc. Além disso, ignora acintosamente as entidades representativas de familiares, usuários e técnicos de saúde mental, as conferências de saúde mental e todas as entidades democráticas que apóiam a luta por um sociedade sem manicômios, como o Conselho Federal de Psicologia, para citar a mais combativa delas.

Quem conhece a proto-história o Movimento pela Reforma Psiquiátrica no Brasil, entre os anos 1978 e 1980, sabe que quem se projetou no cenário político, como principal ator social, foi o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM). Dele faziam parte os Núcleos Estaduais de Saúde Mental do Centro Brasileiro de Saúde (CEBES), Comissões de Saúde Mental dos Sindicatos dos Médicos, Movimento de Renovação Médica (REME) e a Rede de Alternativas à Psiquiatria. Nele a ABP estava ausente. Sentiam-se desconfortáveis com as primeiras críticas públicas à cronificação do manicômio e ao uso do eletrochoque.

Se o V Congresso Brasileiro de Psiquiatria, em outubro de 1978, conhecido como o “Congresso da Abertura”, serviu como palco para a organização nacional do Movimento, foi graças à ousadia dos militantes deste último que os setores conservadores da Associação Brasileira de Psiquiatria embarcaram no barco da Reforma Psiquiátrica: nem todos estavam fazendo a mesma viagem.

Até quando ficaremos sujeitos aos humores dos que defendem com zelo o conservadorismo e o corporativismo de ontem e de hoje? Não é hora de surgir uma entidade que represente os trabalhadores de saúde mental comprometidos com a mudança do paradigma assistencial em saúde mental, capaz de enfrentar o desafio de estabelecer novos parâmetros na formação do médico psiquiatra?

Manaus, Agosto de 2006

Rogelio Casado, médico psiquiatra
Coordenador de Saúde Mental do Estado do Amazonas
E-mail: rogeliocasado@uol.com.br
Site: www.picica.com.br Posted by Picasa

Coordenação Municipal de Saúde Mental de Belo Horizonte: em defesa da Reforma Psiquiátrica Brasileira

Foto: Rogelio Casado - Encontro Nacional de Saúde Mental, BH-MG, 2006









Da esq. para a direita: Marcus Vinicius Oliveira, Vice-Presidente do Conselho Federal de Psicologia; Domingos Sávio, ex-Coordenador Nacional de Saúde Mental; Pedro Gabriel Delgado, atual Coordenador Nacional de Saúde Mental; Miriam Abou-Yd, psiquiatra - Rosemeire Silva, psicóloga - Políbio José de Campos, psiquiatra: trinca de Coordenadores Municipais de Saúde Mental de Belo Horizonte. Os três últimos assinam um manifesto em defesa da Reforma Psiquiátrica Brasileira. Leia abaixo.

(No Encontro Nacional de Saúde Mental, ocorrido entre os dias 13, 14, 15, e 16 de julho de 2006, em Belo Horizonte-MG, Domingos Sávio foi homenageado pelos serviços prestados à Reforma Psiquiátrica Brasileira: as primeiras portarias ministeriais que regulamentavam a implantação dos serviços substitutivos de saúde mental ao modelo baseado no hospital psiquiátrico e seus ambulatórios foram assinadas por ele, constituindo-se um marco na história da Saúde Mental).


EM DEFESA DA REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA:
BELO HORIZONTE DECLARA SUA POSIÇÃO

Tomamos conhecimento das posições assumidas publicamente pelo presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) em relação à Política de Saúde Mental deste Ministério, que expressam desconhecimento ou mesmo desrespeito quanto às deliberações de todas as Conferências Nacionais de Saúde Mental que, uma após a outra, reafirmaram a necessidade de superar o paradigma manicomial hegemônico e iatrogênico, construindo alternativas reais de tratamento e inclusão social dos portadores de sofrimento mental. Ou seja, a sociedade brasileira, ao contrário do que afirma o presidente da ABP, escolheu uma direção para a política de saúde mental do país, sem a presença nefasta do hospital psiquiátrico, desde o primeiro momento em que foi convocada a se posicionar, quando pôde retomar o direito à voz e a participação no fim do regime autoritário, com o retorno da democracia. A partir de então, a Reforma Psiquiátrica passa a ser uma Política do Estado Brasileiro, atravessando gestões de matizes partidários distintos e evoluindo ao longo deste percurso.

A potência desta política e suas condições de possibilidade encontram-se articuladas diretamente, de um lado, à posição da sociedade civil, sem a qual, nenhum governo seria capaz de empreender tamanha revolução e, por outro, ao processo de construção e funcionamento do Sistema Único de Saúde. A Reforma Psiquiátrica aprende com o SUS que a política se faz é no município, lugar onde vivem os sujeitos. A sua elaboração, implementação e controle social é realizada por todos os atores que o movimento colocou em ação, categorias profissionais diversas, governos, instâncias do poder judiciário e legislativo e, principalmente, os usuários. Ela não se faz nos gabinetes e centros do poder ou menos ainda, do que ambiciona a ABP neste momento, nos ninhos das corporações; não é propriedade de nenhum saber ou profissão: é conquista da sociedade.

Seguindo o princípio da municipalização e tendo por norte a construção de uma sociedade sem manicômios, Belo Horizonte vem desde 1993 trabalhando nesta perspectiva, sustentando a radicalidade necessária a esta Política, articulando a criação de uma rede substitutiva de serviços à redução de leitos psiquiátricos e deste modo, pode afirmar, assim como inúmeros outros municípios brasileiros, a partir de indicadores da assistência e de relatos dos usuários e seus familiares, que cumpre o objetivo proposto e não promove nem jamais promoveu, desassistência, sucateamento de serviços ou contigenciamento de recursos, como afirma o presidente da ABP. É uma política responsável e conseqüente, que promove o acesso à vida, aos direitos sociais para aqueles que a instituição psiquiátrica tornou inválidos, incapazes, perigosos e ausentes da vida coletiva.

Aqui, talvez caiba reafirmar, que há um modelo que necessita e, de modo urgente, ser amplamente reformado, ou melhor, como nos ensinam nossos usuários, substituído. O hospital psiquiátrico, secular modelo de tratamento da loucura, ainda é lugar de anulação de direitos civis, de supressão da subjetividade, sendo, portanto, incompatível e contrário a qualquer projeto democrático de cidade e de país. O apelo que faz a sociedade brasileira a todos os atores diretamente envolvidos e responsáveis pelo cuidado, pela assistência, é de que sejamos capazes de inverter a tradição e criar condições de tratamento adequadas e coerentes com os direitos humanos. Na clínica da Reforma Psiquiátrica, teremos todos que aprender a conjugar loucura com cidadania, dignidade com tratamento, respeito com eficácia, ciência com ética.

Portanto, criticar e de forma tão virulenta e desrespeitosa uma Política que se assenta sob os princípios da solidariedade e do direito à diferença, é fazer a defesa de interesses tecidos em corredores sombrios, nos bastidores da vida, sustentados pela mesquinha lógica do privilégio.

Como gestores municipais da Política de Saúde Mental de Belo Horizonte, declaramos nosso orgulho em fazer parte deste empreendimento e reafirmamos nosso desejo cidadão de vê-la avançar cada vez mais, alcançando cada usuário e cada cidade, num tempo e ritmo cada vez mais ágil e resolutivo, tornando enfim real a utopia ativa que funda a lógica antimanicomial: a sociedade sem manicômios, onde todo homem e mulher, loucos ou não, encontrem seu lugar e sua forma de pertencimento, mantendo sempre intocado, seu direito à liberdade. É nisso que apostamos para Belo Horizonte e para o Brasil e confiamos que a Política da Reforma Psiquiátrica será capaz de tornar efetivo este projeto de mundo.

Miriam Abou-Yd, psiquiatra, psicóloga, Coordenação de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte.

Políbio José de Campos, psiquiatra, Coordenação de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte.

Rosimeire Silva, psicóloga, Coordenação de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte.

Belo Horizonte, 25 de agosto de 2006 Posted by Picasa

agosto 26, 2006

Manifesto do Conselho Municipal de Saúde de Belo Horizonte

Foto: Rogelio Casado, SEMSA-BH, julh/2005



















Nota: Um povo que tem um Conselho Municipal de Saúde como o de Belo Horizonte tem razões de sobra para se orgulhar. Leia o manifesto abaixo elaborado por esse importante instrumento de participação na Saúde Pública da sociedade belorizontina, como resposta às acusações do presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria contra a Reforma Psiquiátrica brasileira.

Em defesa da Reforma Psiquiátrica e da Democracia do Brasil!

Diante da gravidade das acusações feitas pelo presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria a respeito da Reforma Psiquiátrica Brasileira e diante de sua repercussão, com manifestações favoráveis de outras entidades médicas, este Conselho de Saúde decidiu manifestar sua posição:
Primeiro tentamos entender o que levou a Associação Brasileira de Psiquiatria a se colocar tão veementemente contra a Reforma Psiquiátrica do Brasil. Certamente não se trata de um movimento em defesa da corporação médica ou do trabalho dos psiquiatras uma vez que nunca se empregou tantos psiquiatras na Saúde Pública e nunca antes eles foram tão respeitados. Também não podemos entender estas acusações como um movimento em defesa dos usuários uma vez que não temos visto nenhum esforço por parte desta Associação para um diálogo construtivo com as associações de usuários do Brasil. Somente os usuários dos serviços de Saúde Pública sabem quão melhor está o acesso ao tratamento psiquiátrico depois do início desta Reforma. Isso nos é dito todos os dias pelos portadores de sofrimento mental do nosso município. Então se trata apenas de um desabafo completamente equivocado de quem não entende nada de Saúde Pública? Certamente, mas não sejamos tão ingênuos. Poderíamos entender esta carta do presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria como mais um movimento em defesa do empresariado da saúde. Uma explicação mais razoável, sem dúvida. Defende o hospital psiquiátrico privado, o aumento do valor da diária para a internação psiquiátrica e defende a compra e o custeio de medicamentos caros reafirmando o laço da Associação Brasileira de Psiquiatria com a indústria farmacêutica. Uma carta em defesa do bolso já abastado de poucos.

Para além desta explicação também simplista, se entendemos que cada um tem direito de defender seus interesses, mesmo que estes coloquem o benefício de poucos em detrimento de muitos, o que se torna inadmissível em uma sociedade democrática é que alguém, não importa o cargo ou sua formação, venha a público dizer “a verdade” sobre a saúde mental do Brasil desrespeitando toda a construção coletiva que vem se dando nos últimos 19 anos.

Mais do que uma afronta, estas acusações colocam em cheque os espaços democráticos construídos e conquistados por todos nós. É inaceitável que qualquer pessoa ou instituição tente se colocar acima de um Conselho Nacional de Saúde, de uma Conferência Nacional de Saúde, de uma Conferência Nacional de Saúde Mental ou do Congresso Brasileiro. Não nos esqueceremos jamais dos anos de chumbo e de como eram os hospitais psiquiátricos do Brasil naquela época – verdadeiros campos de concentração escondidos atrás de discursos nefastos em nome de uma ciência inexistente. Pedimos a todos que também não se esqueçam deste triste passado.

CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE BELO HORIZONTE

END: AV. AFONSO PENA, 2336 – PILOTIS
CEP: 30130-007 – TEL: 3277-7733 FAX: 3277-7814
e-mail: cmsbh@pbh.gov.br Posted by Picasa

Associação Chico Inácio busca respostas para a morte do companheiro Cosme Miranda

Foto: Rogelio Casado, ACI no SPA do Alvorada, agosto/2006













Aderildo Guimarães, presidente da Associação Chico Inácio
encaminha pedido de apoio ao SPA do Alvorada

Associação Chico Inácio visita o local onde foi encontrado morto Cosme Miranda

No dia 25 de agosto, a Associação Chico Inácio (ACI) procurou a direção do Serviço de Pronto Atendimento do bairro de Alvorada. Na pauta, o assassinato do companheiro Cosme Miranda, amaplamente noticiado pela mídia no dia 26 de julho de 2006.

Recebida pelo diretor técnico, Dr. Ivan, na ocasião o presidente da ACI, Aderildo Guimarães, entregou dois documentos: um que foi enviado para os jornais de cidade de Manaus em busca do apoio da imprensa; outro pedindo aos servidores daquela casa de saúde para ajudar a elucidar a morte do querido compnheiro.

Para Aderildo Guimarães, se o Ministério Público do Estado do Amazonas disponibilizar um telefone 0800 podem ser obtidas informações que ajudem o inquérito policial aberto pela Delegacia de Homicídios. Desse modo, quem desejar prestar depoimentos poderá fazê-lo sob sigilo, sem nenhum risco de identificação. Um ofício da Associação Chico Inácio está sendo enviado para o Dr. Vicente Cruz, titular dessa importante instituição pública. Posted by Picasa

agosto 25, 2006

Um mês sem o companheiro Cosme Miranda

Foto: Rogelio Casado - Cosme Miranda, nov. 2005













Nota: Na madrugada de 25 de julho, o companheiro Cosme Miranda foi assassinado. Seu corpo foi encontrado no pátio do Serviço de Pronto-Atendimento do bairro de Alvorada. Até a presente data, ninguém foi indiciado. A Comissão de Direitos Humanos da Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania - único órgão que acolheu a denúncia da Associação Chico Inácio para ajudar a elucidar o caso - colocou uma promotora para acompanhar o processo em andamento na Delegacia de Homicídios. A partir das 08:30 h, a entidade à qual era filiada o querido companheiro fará uma manifestação em frente do SPA do Alvorada.

A dor da gente não sai no jornal

A morte do companheiro Cosme Miranda, assasinado na madrugada de 25 de julho deste ano, foi noticiada em todos os jornais de Manaus.

Cosme Miranda filiou-se à Associação Chico Inácio em 2005. Prestou inestimável serviço à causa dos oprimidos pela condição de portadores de transtorno mental. Foi ali que encontrou o lugar onde podia expressar suas idéias sem ser rotulado como "doente mental".

Amparado na solidariedade dos seus companheiros, encantava a todos com seu projeto para acabar com a miséria. Pretendia aumentar o salário mínimo para 12 mil reais, depois de dar um impeachmeant em todos os políticos corruptos.

Fez muitos amigos, que digam os servidores do Serviço de Pronto Atendimento do Alvorada, local onde seu corpo foi encontrado com graves fraturas nos braços e na cabeça.

Queremos saber que(m) era(m) seu(s) desafeto(s)? Sua morte não pode ficar impune.

Sem a cobrança da imprensa, esse crime entrará para a estatística da violência urbana. As notícias do jornal não adotaram essa tese. Estamos certos de quem matou Cosme Miranda sabia o que estava fazendo.

Queremos justiça!

Cosme Miranda: exemplo de cidadania

A Associação Chico Inácio teve no comportamento do cidadão Cosme Miranda um exemplo na luta por uma sociedade sem manicômios. A dor da sua perda atingiu seus familiares e seus companheiros. Para nós, fica a certeza de que com ele contribuímos para estimular a tolerância para o com o sofrimento da dor psíquica.

Em sua homenagem, foi criado no último dia 19/08/2006 na Zona Norte de Manaus o Núcleo Cosme Miranda, da Associcação Chico Inácio.

Nossa luta por uma sociedade mais fraterna, mais justa e solidária continua.

Cosme Miranda não estará mais conosco nas Paradas do Orgulho Louco, nem nas comemorações do Dia Nacional de Luta Antimanicomial, mas sua memória estará para sempre conosco. Posted by Picasa

agosto 22, 2006

Abaixo a psiquiatria de gravata: CFP contra os feudos corporativos

Arte de Rene Magritte


















Em defesa da Reforma Psiquiátrica brasileira: contra os elitismos corporativistas e contra a covardia !

Num país marcado pela existência de graves injustiças sociais que a condução política jamais ousa enfrentar radicalmente, chama a atenção o singular processo representado pela Reforma Psiquiátrica Brasileira.

Nela, a situação injusta e desumana de milhares de portadores de sofrimento mental, reclusos em hospitais psiquiátricos, vem sendo objeto de um incisivo enfrentamento. Ao longo dos últimos 20 anos, num movimento que já possui lugar na história e firme presença no cenário nacional, conquistas importantes vêm sendo obtidas, no que diz respeito à garantia dos direitos e à oferta de cuidados aos portadores de sofrimento mental.

Denúncias sistemáticas e bem documentadas de violações aos Direitos Humanos nas instituições psiquiátricas chegam ao conhecimento público desde a terrível situação de Barbacena, em 1979, até a divulgação recente de mortes ocorridas em sinistros hospitais psiquiátricos brasileiros. Desde 1992, no Rio Grande do Sul, surgem novas legislações estaduais e municipais que afirmam os inalienáveis direitos de cidadania dos portadores de sofrimento mental, culminando, em 2001, na aprovação da Lei Federal 10.216.

Modelos assistenciais substitutivos aos hospitais psiquiátricos, guiados pela lógica do cuidado, da inclusão e da reinserção social, demonstram concretamente sua viabilidade e eficácia, a começar pelo exemplo de Santos, em 1989, até experiências atuais e atuantes, nos mais diversos locais do país. Em inúmeros espaços públicos de debates e deliberações, vai se delineando, com clareza crescente, uma política voltada para a conquista da cidadania, sempre negada aos chamados doentes mentais, desde o I Encontro Nacional de Trabalhadores de Saúde Mental, em Florianópolis, 1978, até a importante III Conferência Nacional de Saúde Mental, no final de 2001.

Nestas diversas frentes, cabe ressaltar a atuação firme e constante dos movimentos sociais e das entidades profissionais, cobrando do poder público seu compromisso com a efetivação de uma Reforma Psiquiátrica verdadeira. E todo este processo vai se constituindo num verdadeiro patrimônio de toda a sociedade brasileira, no qual a vida de dezenas de milhares de brasileiros é fortemente impactada no seu cotidiano, ampliando-se a sua qualidade, proporcionada por uma atenção efetiva, realizada eticamente, em regime de liberdade e convivência social através dos CAPs, hospitais-dia, moradias protegidas, centros de convivência.

Destacamos o cenário adverso em que se dão estas importantes conquistas: num contexto nacional onde as políticas sociais são escassas e pobres, enfrentamos ainda a existência de um parque manicomial de cerca de 40 mil leitos, consumindo ainda quase meio bilhão de reais por ano dos recursos do SUS. É a chamada indústria da loucura, embora não tão rentável como já foi, que ainda exerce inescrupulosamente, em todo o país, o destrato, o descuido, o abandono, atingindo pesadamente um grande contingente dos portadores de sofrimento mental brasileiros.

Neste cenário surpreende, causa repúdio as declarações “de encomenda” da Associação Brasileira de Psiquiatria, representada pelo seu presidente Dr. Josimar França, (veiculado no Jornal O Globo, de 20/07/2006) que, se pretextando “ofendido” com a associação entre certas condições assistenciais, ainda persistentes, e a existência de violação de Direitos Humanos na área da Saude Mental, aproveita para desembarcar de vez, com todas as suas malas, do bonde democrático do processo da Reforma Psiquiátrica e atacar as suas conquistas.

Usando e abusando de falácias, o seu artigo na verdade tem como finalidade advogar, na contra mão das tendências mundiais, a favor da manutenção dos hospitais psiquiátricos como feudos corporativos e contra o incômodo fim dos privilégios dos empresários da Psiquiatria e de uma certa elite acadêmica. A Psiquiatria de gravata utiliza destes estabelecimentos como campo privilegiado para experimentos locais, teleguiados pela indústria farmacêutica mundial.

Na verdade, desde o início da Reforma Psiquiátrica no país, diferentemente, a maioria dos milhares de psiquiatras brasileiros, parceiramente, sustentam o processo no cotidiano dos Serviços Substitutivos e nunca deixaram de combater e colocar obstáculos para que se pudesse fazer avançar a democratização da assistência à Saúde Mental. Mas não é nova essa posição que sempre apostou no insucesso da Reforma, que a difamou, que mentiu, que buscou manipular familiares e a opinião pública, impedindo de todas as formas o acesso da sociedade brasileira à terrível realidade dos hospitais psiquiátricos. O que é novo é a sua exposição desesperada diante do êxito e da expansão dessa política pública, nesse último governo. É o uso da autoridade da entidade nacional dos psiquiatras, que,desde 1990, vinha apoiando a Reforma Psiquiátrica Brasileira, através de vários manifestos e posicionamentos oficiais, para a veiculação das atuais teses corporativistas das entidades médicas, lamentavelmente associadas à inconformidade com as exigências de um relacionamento mais democrático dos médicos no interior das equipes multiprofissionais de saúde, de um relacionamento mais democrático dos profissionais de saúde para com os usuários dos serviços substitutivos, de um relacionamento mais horizontal entre os vários saberes e profissões que hoje constroem o Sistema Único de Saúde.

O que fica evidente, na extemporânea linha de argumentação do dirigente, é o seu alinhamento com a política corporativista do ATO MÉDICO, é a defesa da manutenção do hospital como a garantia da existência de um feudo, onde o poder médico ainda possa ser exercido e defendido, a despeito do custo negativo que isso possa ter para a vida e para o tratamento dos portadores de transtorno mental. E a defesa de uma pratica médica onde seja possível ao profissional se desresponsabilizar diretamente pelo cuidado dos pacientes de quem ele trata, reduzindo a sua atuação a uma mera prescrição farmacológica.É a tentativa de não participação do médico no cotidiano dos cuidados hoje desenvolvidos nos serviços substitutivos de forma integrada por todos os integrantes da equipe multiprofissional. Como sabem aqueles que realmente trabalham em serviços territoriais: paciente preso (internado) no hospício, médico solto; paciente solto no território, médico preso no serviço! Tentativa deplorável pela posição que representa: inteiramente descomprometida com a dimensão pública, estritamente voltada para interesses coorporativos e privados. Deplorável pelo seu alinhamento tão estreito, com os interesses mesquinhos da “indústria da loucura”, representada pela FBH, que sempre reuniu a fauna faminta dos detratores da Reforma Psiquiátrica.

Contrapondo-se ao covarde ataque corporativista, este manifesto vem reafirmar a beleza e o vigor da Reforma Psiquiátrica em andamento. Sustentamos a defesa deste alicerce de um modelo de assistência para o sofrimento mental, e de uma presença na cultura para a diferença, que são motivos do mais justo orgulho para a sociedade brasileira.

Na III Conferência Nacional de Saúde Mental, órgão máximo do controle social do SUS - em dezembro de 2001, reuniram-se cerca de 1.250 participantes dentre os quais mais da metade eram usuários, familiares, representantes de movimentos sociais e membros usuários de Conselhos de Saúde. Neste fórum expressivo e amplo, manifestou-se de forma inequívoca a deliberação pela extinção progressiva dos hospitais psiquiátricos e da implantação de um modelo substitutivo de assistência ao sofrimento mental. Reiterando nosso apoio a esta corajosa decisão, as entidades e instituições abaixo-assinadas convocam os numerosos atores, defensores e participantes da construção da Reforma Psiquiátrica a defendê-la conosco, mais uma vez, contra a ação covarde de todos os manicômios e dos seus patrocinadores.

Conselho Federal de Psicologia
http://www.pol.org.br/noticias/materia.cfm?id=618&materia=943
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Decisão da OEA coloca em cena outras tragédias dos hospitais psiquiátricos brasileiros

Arte de Teodoru Badiou
















Nota: Eliana Simonetti é jornalista em São Paulo. Fez várias tentativas de colocar na pauta da grande mídia a tragédia que tirou a vida das meninas do Rio Grande-RGS. Todas foram infrutíferas. Por fim, ofereceu sua colaboração para reativar o site Observatório da Saúde Mental, da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, uma novela particular dessa importante Ong, com final imprevisível: está fazendo des-aniversário a tentativa de ressuscitá-lo. Até a presente data, Eliana não recebeu uma comunicação sequer dos seus dirigentes. Lástima! Resta-me publicar a matéria escrita pela competente jornalista em fins de julho de 2006. A morte das meninas ocorreu no início de julho. O tempo não pára.

Problema não resolvido

Hospitais psiquiátricos abrigam menores dependentes de drogas e são cenários de tragédias

Os que acompanham as notícias sobre a desativação de manicômios podem ter a impressão de que o antigo problema – acerca do qual, aliás, ninguém gosta muito de ouvir ou falar – está superado no Brasil. A impressão é falsa. E o caso toma dimensões dramáticas quando se considera que as clínicas, que deveriam estar desaparecendo, hoje abrigam inúmeros adolescentes, condenados em processos judiciais por envolvimento com drogas ilegais – atualmente um comportamento praticamente generalizado, em todo o planeta, numa determinada fase da vida das pessoas.

No início de julho, no Rio Grande do Sul, um evento pouco noticiado demonstra que a luta antimanicomial continua a ser um movimento importante no país, e merece a atenção de todos.
O caso ocorreu no Hospital Psiquiátrico da Santa Casa de Rio Grande. Ali, às 22h50 da quarta-feira, dia 5 de julho, três adolescentes, trancadas num quarto, morreram carbonizadas. A informação do hospital: foram as próprias garotas, de 14, 15 e 17 anos de idade, as autoras do incêndio suicida. Agravante dessa história: duas delas já haviam recebido alta dos médicos, mas permaneciam internadas por decisão da Justiça.

No dia seguinte às mortes, uma equipe composta, entre outros, por Sandra Fagundes, do Ministério da Saúde e Neuza Guareschi, do conselho Regional de Psicologia, esteve no local. Foi recebida pelo diretor administrativo do complexo da Santa Casa, Rodolfo de Brito. Segundo ele, a instituição tem uma equipe formada por diversos especialistas, residência em psiquiatria, e é considerada uma referência no estado, mas sua vocação não é abrigar dependentes de drogas. Na ocasião, o administrador disse, ainda, que a tragédia aconteceu porque, mesmo sem ter estrutura para isso, o hospital é obrigado a acolher os jovens enviados, de forma compulsória, por decisão judicial.

Para apurar o que ocorreu, na Justiça e no hospital, já estão em andamento um inquérito policial e um processo do Ministério Público. E aqui há mais um agravante: os quartos e a enfermaria entraram em reforma no dia seguinte ao incêndio – o que impossibilita a realização de uma perícia esclarecedora acerca do ocorrido naquela noite.

Em dezembro do ano passado, o Brasil foi processado na Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), pela morte de Damião Ximenes Lopes na Casa de Repouso Guararapes, em Sobral (CE), em 1999. Foi acusado de violar quatro artigos da Convenção Americana: os direitos à vida, à integridade física, às garantias judiciais e à proteção judicial. À época, a Subsecretaria de Direitos Humanos da Presidência da República informou que o Estado brasileiro reconheceu que a violação dos direitos à vida e à integridade física "foi conseqüência da insuficiência de resultados positivos na implementação das políticas públicas de reforma da saúde mental que possibilitassem procedimentos de credenciamento e fiscalização mais eficazes de instituições privadas de saúde". A defesa brasileira alegou, no entanto, que tal situação "não corresponde" ao atual grau de evolução e implementação das políticas públicas na área de saúde mental e direitos humanos dos pacientes em todo o território brasileiro.

O caso das três garotas, como se vê, não é apenas um exemplo, mas um indicador de que as políticas públicas ainda deixam a desejar. Para compreender melhor o que aconteceu no Rio Grande do Sul, vale a pena visitar o site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no link http://www.tj.rs.gov.br/institu/projetos/justica_terapeutica.html. Ali se lê, entre outras coisas: “A Justiça Terapêutica é um programa judicial para atendimento integral do indivíduo, adolescente ou maior, envolvido com drogas lícitas ou ilícitas, inclusive alcoolismo, e violência doméstica ou social, priorizando a recuperação do autor da infração e a reparação dos danos à vítima. É um instrumento judicial para evitar a imposição de penas privativas de liberdade ou até mesmo penas de multa - que, no caso, podem se mostrar ineficientes -, deslocando o foco da punição pura e simples para a recuperação biopsicossocial do agente.” Ou seja: a internação numa clínica psiquiátrica, do ponto de vista do tribunal, não implica em privação de liberdade.
Segundo pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Informações Sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), da Universidade Federal de São Paulo, quase um quinto dos brasileiros entre 12 e 65 anos, em 107 cidades com mais de 200 mil habitantes, já experimentou algum tipo de droga ilegal (outras que não álcool ou tabaco). É de se imaginar o que aconteceria com o orçamento do Sistema Único de Saúde (SUS) se toda essa gente fosse submetida à “recuperação biopsicossocial”...

Em tempo: a Biblioteca Virtual em Saúde Mental, do sistema Prossiga, mantido pelo governo federal, não inclui a Santa Casa de Rio Grande entre as clínicas especializadas em tratamento de doentes mentais ou de adictos. Considerando que os juízes gaúchos estão orientados a internar adolescentes envolvidos com drogas, poderiam ter escolhido uma das seguintes instituições, em seu estado:

Clínica Pinel
http://200.201.133.14/clin11br/index.php
A Clínica Pinel dispõe de quatro unidades: Unidade Paulo Guedes voltada para atender pessoas cujas capacidades psíquicas estão mais abaladas; Centro Vitae específico para tratamentos de dependentes químicos; Unidade Mario Martins voltada para pessoas com capacidade de auto-gerenciamento e a Unidade Melanie Klein que dispõe de um serviço diferenciado com infra-estrutura personalizada, voltada a atender às necessidades do paciente, tanto psíquicas, quanto de hotelaria de alto nível. O site apresenta os convênios e oferece atendimento ambulatorial. Contato: http://200.201.133.14/clin11br/fale_conosco.php

Hospital de Clínicas de Porto Alegre - HCPA. Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
http://www.ufrgs.br/psiq/spsiq001.html
Oferece Serviço de Psiquiatria geral e Serviço de Psiquiatria da Infância e da Adolescência. No âmbito assistencial, funciona em 3 áreas básicas: Unidade de Internação Psiquiátrica, disponibilizando 26 leitos para atendimento do SUS, 4 privativos e 6 semi-privativos e mantém uma extensa rotina de trabalho. Ambulatórios de Psiquiatria, operando em seus programas de atendimentos específicos e Consultoria Psiquiátrica. Por ser um hospital universitário, desenvolvem também as diversas linhas de pesquisa tanto do Serviço como do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da UFRGS.
Contato: psiq@hcpa.ufrgs.br

Prontopsiquiatria. Centro Psiquiátrico de Pronto Atendimento
http://www.prontopsiquiatria.com.br/
O Prontopsiquiatria é um serviço na área da neuropsiquiatria que atua na Clínica São José em Porto Alegre - Rio Grande do Sul. Oferece aos clientes pronto atendimento, emergência psiquiátrica, atendimento domiciliar, remoções e internação hospitalar. Trabalha com vários convênios e também realiza diversos eventos, com os objetivos voltados para a assistência, o ensino e a pesquisa. Contato: psiquiatria@prontopsiquiatria.com.br

Está visto que há muito a investigar – no caso específico das garotas mortas em Rio Grande, no que diz respeito aos Direitos da Criança e do Adolescente, e também no âmbito da política judiciária.

Eliana Giannella Simonetti, jornalista, São Paulo Posted by Picasa

Nem tudo tá perdido

Foto: Arnaud Frich - Statue de Saint François d'Assise, Rome-Itália
















Nota: Valei-me, São Francisquinho! Nem tudo tá perdido. Enquanto alguns dirigentes de CRMs (Conselhos Regionais de Medicina) flertam com os partidários da contra-reforma psiquiátrica, e alguns dirigentes de CRPs (Conselhos Regionais de Psicologia) preferem manter-se distantes da luta antimanicomial, Marcus Vinicius de Oliveira, vice-presidente do Conselho Federal de Psicologia dá um exemplo de como conciliar atitude profissional e comportamento político, em defesa de uma outra Psicologia no país. Leia matéria publicada em Agência Notícias do Planalto: http://www.noticiasdoplanalto.net/index.php?option=com_content&task=view&id=1505&Itemid=43

TERRA EM DEBATE: Psicologia quer contribuir na transformação da estrutura fundiária

ENTREVISTA -Entendendo que as questões agrárias são mais uma preocupação que também deve contar com a contribuição da Psicologia, vários profissionais e estudantes da área estão buscando a aproximação com as comunidades tradicionais (índios, trabalhadores rurais e quilombolas). Eles querem entender quais são as dificuldades enfrentadas por estes povos e aos poucos levar o atendimento e as técnicas da área para dentro destas comunidades, que muitas vezes não dispõem deste atendimento profissional.

Para saber mais sobre até que ponto a Psicologia pode ajudar na questão agrária, a Agência Notícias do Planalto conversou com o vice-presidente do Conselho Federal de Psicologia, Marcus Vinicius de Oliveira. Ouça agora a entrevista:

Agência Noticias do Planalto: Marcus, qual a ligação entre a Psicologia e os temas que envolvem a luta pela terra?

Marcus Vinicius de Oliveira: A Psicologia como ciência e como profissão tem muitas contribuições para oferecer para a sociedade. No Brasil a Psicologia tem uma tradição de trabalho muito elitista, por isso um grupo de psicólogos que trabalham no Conselho tem tido a preocupação em fazer com que a Psicologia possa dialogar mais com as problemáticas que são próprias das populações da sociedade brasileira. Especialmente um conjunto destes segmentos que envolvem indígenas, quilombolas, assentados. Estas populações têm algo em comum a nosso ver. São comunidade que, por um lado encontram-se fragilizadas porque estão à margem das políticas públicas e, por outro lado, são populações que têm na luta pela terra um ponto central de sua identidade. Por isso, nós achamos que a Psicologia pode ter uma contribuição.

ANP: E na sua opinião, qual é o entendimento que a sociedade tem destas questões fundiárias?

MVO: O latifúndio hoje é um latifúndio diferente. Não quer dizer que é melhor, é diferente porque hoje, por incrível que pareça, ele parece mais apoiado do que ele já teria sido anteriormente. O latifúndio consegue uma metamorfose e consegue produzir legimitidade. Com isso estou querendo dizer que a sociedade brasileira tem uma dificuldade de percepção da gravidade da estrutura fundiária e da percepção dos reflexos desta estrutura fundiária que determinam muitos aspectos da vida da sociedade. Há uma despolitização uma inconsciência da sociedade.

ANP: Por ser um tema novo em discussão na Psicologia qual o entendimento dos profissionais da área destas questões?

MVO: No nosso grupo dos psicólogos, vou te confessar que não é muito diferente. Esta é uma questão que nós, como Conselho Federal de Psicologia (que somos o órgão de fiscalização profissional), estamos cumprindo nosso papel de alertar nossos colegas que existe aí uma área de atuação possível para a Psicologia. Mas obviamente a gente não pode desprezar o elemento político e ideológico que está envolvido nesta compressão da necessidade de transformação da estrutura fundiária. Mas objetivamente é um lugar onde os psicólogos podem vir a contribuir e ter um papel importante.

ANP: Em julho, foi criada a Rede de articulação nacional para debater essa relação entre luta pela terra e Psicologia. Qual o papel dela?

MVO: Essa rede é a tentativa de manter acesa a chama de um esforço de investigação. Não basta o apoio político e ideológico, é preciso ter uma competência tecnológica. É preciso que o psicólogo, além de ser favorável a luta dos índios, do MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], é preciso que ele saiba dialogar com estes grupos populacionais, saiba compreender as especificidades culturais destes grupos, saiba compreender as dinâmica sociais da convivência, dos conflitos. Enfim, que o psicólogo possa conhecer esta população. Então esta rede ela vai ser responsável pela construção deste projeto, de que a Psicologia possa cada vez mais, ser mais adequada e competente para oferecer a sua contribuição para esses movimentos sociais.

Vocês acabaram de ouvir a entrevista com o vice-presidente do Conselho Federal de Psicologia, Marcus Vinicius de Oliveira.

De Brasília, da Agência Notícias do Planalto, Gisele Barbieri

17/08/06 Posted by Picasa

Ensaio sobre a cegueira no Brasil













"São Doidão, afastai de nós essa cegueira".

Ensaio sobre a cegueira no Brasil

Saramago há de perdoar o plágio. A causa é justa. Hospitais psiquiátricos fechados ainda abrigam pessoas com distúrbios mentais e menores dependentes de drogas no país. São cenários de tragédias pouco divulgadas

Alguns tipos de histórias provocam repulsa entre leitores. Espantam compradores de revistas das bancas. Como raramente são publicadas, permanecem desconhecidas. E não há mobilização alguma para resolver os problemas que elas envolvem. Círculo vicioso, diria alguém. Expressão que, no caso, vem bem a calhar. Esse é um texto do tipo ‘prefiro não saber’. Trata de loucos, adictos, manicômios. Mas como nesse mundo são raras as bailarinas e, como disse Chico Buarque de Holanda, todo mundo tem um irmão meio zarolho, arrisco a escrita.

Os que acompanham as notícias sobre a desativação de manicômios no Brasil podem ter a impressão de que este é um capítulo encerrado. A impressão é falsa. E o caso toma dimensões dramáticas quando se considera que as clínicas estão ativas (e lucrativas), e abrigam inúmeros adolescentes, condenados em processos judiciais por envolvimento com drogas ilegais. Sim, porque a lei prevê essa pena para a moçada. E muitos pais, desavisados, internam seus filhos por conta própria, na tentativa de passar a outros a responsabilidade sobre uma questão com a qual não sabem lidar.

A dimensão da coisa? Segundo uma pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Informações Sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), da Universidade Federal de São Paulo, quase um quinto dos brasileiros entre 12 e 65 anos, em 107 cidades com mais de 200 mil habitantes, já experimentou algum tipo de droga ilegal (outras que não álcool ou tabaco). É de se imaginar o que aconteceria se toda essa gente fosse parar em manicômios, para ser submetida à chamada “recuperação biopsicossocial” prevista em lei...

Mas vamos aos fatos. O primeiro. Hospital Psiquiátrico da Santa Casa de Rio Grande, no Rio Grande do Sul. Ali, às 22h50 da quarta-feira, dia 5 de julho, três adolescentes, trancadas num quarto, morreram carbonizadas. A informação do hospital: o incêndio foi suicida, provocado pelas garotas, de 14, 15 e 17 anos de idade. Duas delas já haviam recebido alta dos médicos, mas permaneciam internadas por decisão da Justiça. No dia seguinte às mortes, uma equipe composta, entre outros, por Sandra Fagundes, do Ministério da Saúde e Neuza Guareschi, do Conselho Regional de Psicologia, esteve no local. Foi recebida pelo diretor administrativo do complexo da Santa Casa, Rodolfo de Brito. Segundo ele, a instituição tem uma equipe formada por diversos especialistas, residência em psiquiatria, e é considerada uma referência no estado, mas sua vocação não é abrigar dependentes de drogas. No entanto, acolhe jovens enviados, de forma compulsória, por decisão judicial. Detalhe: os quartos e a enfermaria entraram em reforma no dia seguinte ao incêndio, antes de qualquer perícia policial. Rádio e TV da Rede Brasil Sul de comunicação deram nota curta. Mais tarde, houve alguma repercussão, no portal da Assembléia Gaúcha (www.al.rs.gov.br/ag/noticias.asp?txtIDMATERIA=153179&txtIdTipoMateria=2) e no Diário Popular, de São Paulo (www.diariopopular.com.br/08_07_06/p1102.html).

O segundo. No início de agosto, Maurilton Morais, diretor da Associação de Psiquiatria do estado do Rio Grande do Norte, denunciou descaso hospitalar na morte de um paciente internado no Hospital Psiquiátrico João Machado. Segundo ele, no dia 19 de julho, José Felipe dos Santos, de 60 anos, foi encontrado morto, com queimaduras, numa das quadras da instituição – por familiares, já que a equipe do hospital não sabia de seu paradeiro. “Sem ninguém saber, ele ficou quatro horas exposto ao sol”, disse o médico em entrevista ao jornal Diário de Natal (www.diariodenatal.com.br), único que divulgou a notícia no país e a nota foi reproduzida no site da organização não governamental Inverso – Instituto de convivência e de recriação do espaço social (http://www.inverso.org.br/index.php/content/view/14104.html). “Tem havido muita propaganda, mas pouco se tem evoluído.” O Hospital João Machado tem uma estrutura antiga de manicômio fechado, com grades e isolamento.

O terceiro. Em dezembro do ano passado, o Brasil foi processado na Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), pela morte de Damião Ximenes Lopes na Casa de Repouso Guararapes, em Sobral, no estado do Ceará, em 1999. Foi acusado de violar quatro artigos da Convenção Americana: os direitos à vida, à integridade física, às garantias judiciais e à proteção judicial. Na época, a Subsecretaria de Direitos Humanos da Presidência da República informou que o Estado brasileiro reconheceu a violação dos direitos à vida e à integridade física: "foi conseqüência da insuficiência de resultados positivos na implementação das políticas públicas de reforma da saúde mental que possibilitassem procedimentos de credenciamento e fiscalização mais eficazes de instituições privadas de saúde". A defesa brasileira alegou que tal situação "não corresponde" ao atual grau de evolução das políticas públicas na área de saúde mental e direitos humanos dos pacientes em todo o território brasileiro. Mas parece que as coisas não são bem assim... O país foi condenado no dia 17 de agosto. A notícia, como era de se esperar, só apareceu num site: www.reportersocial.com.br.

Eliana Giannella Simonetti, jornalista Posted by Picasa

agosto 21, 2006

Nota à imprensa sobre decisão da Corte da OEA






Assessoria Técnica
Coordenação Nacional de Saúde Mental
DAPE/SAS/MS
Tel: (61) 3315-2655
Fax: (61) 3315-2313

Nota à imprensa - Caso Damião Ximenes Lopes

A Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) divulgou ontem a decisão relativa ao Caso Damião Ximenes Lopes, em tramitação naquele Tribunal Internacional. O Caso se refere à morte de Damião Ximenes, portador de transtorno mental, falecido em 4 de outubro de 1999, vítima de maus-tratos quando internado em um hospital psiquiátrico privado conveniado ao Sistema Único de Saúde, no Município de Sobral, Estado do Ceará.

A Corte determinou ao Estado brasileiro o pagamento, no prazo de um ano, de indenização pecuniária a familiares da vítima por danos materiais e imateriais, e que garanta, em um prazo razoável, a conclusão do processo judicial interno destinado a julgar os responsáveis pela morte de Damião. O Tribunal ainda dispôs que o Brasil deverá continuar a desenvolver programas de formação e capacitação de profissionais envolvidos no atendimento à saúde mental.

O teor da decisão reconhece os avanços ocorridos no sistema de atenção à saúde mental no país, que passou a enfatizar os direitos humanos dos portadores de transtornos mentais, especialmente após a aprovação e implementação da Lei nº 10.216/2001, que trata da Reforma Psiquiátrica. A Política Nacional de Saúde Mental promoveu uma importante reorientação do modelo centrado no hospital para uma rede de serviços extra-hospitalares, de base comunitária. E o Município de Sobral, onde ocorreram os fatos, é atualmente referência nacional em políticas de saúde mental.

O Estado brasileiro já está estudando as formas necessárias para dar pleno cumprimento a todos os itens da sentença da Corte. No que diz respeito, especificamente, à garantia de maior celeridade à ação penal, está sendo constituído grupo, que deverá ser integrado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Conselho Nacional de Justiça, Ministério das Relações Exteriores e Advocacia-Geral da União, para agilizar este e outros processos judiciais internos cujos objetos estão sob consideração dos órgãos internacionais de proteção e promoção dos direitos humanos.

Secretaria Especial dos Direitos Humanos

Ministério da Saúde

Ministério das Relações Exteriores
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Condenação em corte da OEA expõe falhas em sistema de saúde mental brasileiro















Nota: Cotinua repercutindo a condenação do Brasil pela Corte da OEA. Desta vez na Agência Repórter Social www.reportersocial.com.br A psiquiatria conservadora está com as barbas de molho, pois como ressalva o texto abaixo: "... é importante ressaltar que não é o sistema de saúde mental brasileiro e suas recentes reformas que foram analisadas pela Corte Interamericana, mas sim as violações de direitos humanos cometidas contra Damião Ximenes e seus familiares".

20/08/2006 04:40h

Condenação em corte da OEA expõe falhas em sistema de saúde mental brasileiro
Na última quinta-feira (17 de agosto), o Brasil foi condenado pela primeira vez na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Por sete votos a zero, os juízes decidiram que o Estado brasileiro foi co-responsável pela morte por maus-tratos do paciente de distúrbio mental Daniel Ximenes Lopes. Ximenes foi internado em outubro de 1999 em uma clínica psiquiátrica em Sobral (CE) e teria sido espancado até a morte por funcionários.

A decisão da Corte (cujo resumo é publicado abaixo) aponta falhas que ainda persistem no sistema de saúde mental brasileiro, apesar de admitir que houve alguma melhora de 1999 até hoje: “Apesar de certa evolução no tratamento de portadores de transtornos mentais, não foi criado nenhum instrumento adequado e eficaz para combater, investigar e monitorar as violações de direitos humanos cometidas contra pacientes psiquiátricos.”

Também afirma ser urgente o fechamento de unidades psiquiátricas reprovadas pelo Programa Nacional de Avaliação dos Hospitais Psiquiátricos (PNASH). Segundo a OEA, dos dez hospitais reprovados entre 2002 e 2004, apenas três foram fechados. Os sete que continuam funcionando, segundo a Corte, “não possuem condições de atendimento digno aos portadores de transtornos mentais, sendo portanto potenciais violadores de seus direitos humanos”. Para exemplificar que o caso Ximenes não foi um fato isolado, a decisão relaciona casos recentes de mortes em instituições psiquiátricas, incluindo uma ocorrida em julho deste ano, quando três adolescentes morreram em uma clínica de Rio Grande (RS).

Para a primeira condenação brasileira, pesaram também as falhas do processo que investigou a morte de Ximenes e a lentidão do processo judicial, ainda em andamento. Pela decisão da Corte da OEA, o governo brasileiro deverá pagar U$ 146 mil (pouco mais de R$ 300 mil) à família da vítima, além de ser obrigado a publicar trechos da decisão no Diário Oficial da União e em um jornal de grande circulação.

Leia a seguir o resumo da decisão:

Caso Ximenes Lopes vs. Brasil - Resumo

Dos Fatos

Em 1º de outubro de 1999, Albertina Ximenes internou seu filho, Damião Ximenes Lopes, portador de transtorno mental, na Casa de Repouso Guararapes - a única clínica psiquiátrica da região de Sobral. Três dias mais tarde, no dia 4 de outubro, Albertina retornou à clínica para visitá-lo, mas foi informada por um funcionário que Damião “não estaria em condições de receber visitas”. Inconformada, entrou na clínica gritando pelo nome do filho; Damião veio ao seu encontro em estado altamente deplorável, sangrando bastante, com diversas escoriações, hematomas e com as mãos amarradas. Ela solicitou a um funcionário que o levasse para tomar banho; em seguida, procurou pelo médico responsável, Francisco Ivo de Vasconcelos – diretor da Casa de Repouso Guararapes e legista do Instituto Médico Legal (IML) de Sobral – que apenas prescreveu alguns medicamentos, sem sequer examinar Damião.

Quando mais uma vez procurava por seu filho, uma servente da clínica lhe informou que havia ocorrido uma forte luta entre Damião e os enfermeiros, e que em virtude disso ele teria ficado muito machucado. Albertina encontrou-o ao lado de uma cama, completamente nu e ainda com as mãos amarradas. Como não podia levar Damião de volta, Albertina retornou à sua residência, mas quando chegou já recebeu a informação de que a Casa de Repouso Guararapes havia comunicado o falecimento de seu filho.

O laudo emitido no mesmo dia pela clínica e assinado pelo Dr. Francisco Ivo de Vasconcelos atestava a morte de Damião por “parada cárdio-respiratória”. Diante das circunstâncias, os familiares de Damião decidiram levar seu corpo para necropsia na capital, Fortaleza, uma vez que o legista do IML de Sobral também ocupava o cargo de diretor da clínica onde Damião havia falecido. O IML da capital, apesar de todas as evidências de violência sofrida por Damião, atestou “morte real de causa indeterminada”.

A partir deste momento, Irene Ximenes Miranda, irmã de Damião Ximenes Lopes, inicia sua busca por justiça denunciando o ocorrido a todas as autoridades competentes como Polícia Civil, Ministério Público Federal e Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Ceará. Irene denunciou também a dificuldade de produção de provas da morte sob tortura de Damião Ximenes. Em documento depoimento enviado à Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Ceará no dia 31 de janeiro de 2000, ela observou que no relatório remetido pela delegacia de polícia ao Ministério Público faltavam importantes depoimentos que indicavam a responsabilidade da clínica. Ao questionar o delegado sobre o fato, este alegou que a documentação poderia estar em sua residência. Logo depois o delegado foi para sua residência e voltou trazendo para a delegacia os documentos que faltavam. Ressalta-se outro fato de relevância. Irene foi informada de que não teria acesso ao processo referente à auditoria da clínica, mas tão somente ao relatório; e que o processo seria entregue ao prefeito, cuja família era a proprietária da Casa de Repouso Guararapes.

Decepcionada com a inércia e ineficiência das autoridades competentes brasileiras, Irene enviou a denuncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Posteriormente, a organização não-governamental Justiça Global passou a integrar o caso como co-peticionária no Sistema Interamericano.

A Casa de Repouso Guararapes

A Casa de Repouso Guararapes, criada em 1974, integrava a rede de instituições privadas conveniadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) para prestar serviços de atendimento às pessoas com transtornos mentais. Era a única na região, pois não existiam nem mesmo instituições de caráter ambulatorial. Após a repercussão da morte de Damião Ximenes, em 10 de julho de 2000 foi concluída a intervenção na Casa de Repouso Guararapes e foi estabelecido o cancelamento do credenciamento da referida clínica como instituição psiquiátrica para prestar serviços ao SUS na área de assistência hospitalar em psiquiatria.

Ausência de fiscalização e controle por parte das autoridades municipais, estaduais e federais

A despeito da obrigação do município de “celebrar contratos e convênios com entidades prestadoras de serviços privados de saúde, bem como controlar e avaliar sua execução”, nenhum contrato pormenorizando foi apresentado pelo município de Sobral comprovando a relação entre a Casa de Repouso Guararapes e o Município, posteriormente às denúncias relativas à morte de Damião Ximenes.

Durante os anos que precederam a morte de Damião, apenas uma vistoria foi realizada na Casa de Repouso Guararapes, em maio de 1996, pelo Grupo de Acompanhamento da Assistência Psiquiátrica (GAP). Nesta vistoria foi constatada superlotação e condições físicas e estruturais precárias, entre várias outras irregularidades no funcionamento da instituição. Apesar dessas observações terem sido devidamente apresentadas aos órgãos governamentais responsáveis pela fiscalização e controle dos estabelecimentos de saúde, a Casa de Repouso Guararapes continuou funcionando normalmente até 10 de julho de 2000.

A Responsabilidade do Estado brasileiro

A Constituição Brasileira e a legislação específica sobre o tema autorizam a utilização de instituições privadas para complementar o dever público do Estado de prover assistência médica por meio de instituições públicas. Quando um Estado confere autoridade, direta ou indiretamente, a um indivíduo ou entidade, cria-se uma extensão do exercício do poder público. Dessa forma, o Estado brasileiro é responsável pelos atos dos empregados da Casa de Repouso Guararapes, vez que delegou sua autoridade para prestar atendimento médico – função e dever do Estado, constitucionalmente tutelados – na região de Sobral, Ceará, e ainda conferiu autoridade à Casa de Repouso Guararapes para que operasse em nome do poder público.

As Cortes internacionais têm entendido que nenhum Estado está eximido da responsabilidade por atos de entidades privadas que desenvolvem funções públicas. Neste sentido, a Casa de Repouso Guararapes era, de fato, agente do Estado brasileiro, já que este delegou elementos de sua autoridade à instituição que exercia nesta condição – exercício de funções públicas para o alcance de objetivos estatais. A jurisprudência internacional e o direito internacional costumeiro embasam a conclusão de que a Casa de Repouso Guararapes atuou como agente do Estado brasileiro.

As investigações e punição dos responsáveis

A família de Damião Ximenes empreendeu muitos esforços para cooperar nas investigações de seu assassinato. Irene Ximenes investigou e levou várias pessoas para prestar depoimento na delegacia, pois sempre se deparava com a inércia e o descaso das autoridades policiais; desta forma ela tentou suprir a obrigação investigativa da polícia. Menos de um mês depois da morte de seu irmão, em 28 de outubro de 1999, ao saber que nenhuma investigação havia sido sequer iniciada, Irene encaminhou a denúncia ao Conselho de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH) e ao Conselho de Participação da Sociedade do Estado do Ceará. No ano 2000, quando o caso foi finalmente iniciado, Albertina Ximenes Lopes, mãe de Damião, requereu e tornou-se assistente do Ministério Público na ação penal para poder ter maior controle sobre o desenrolar do caso.

Em 27 de março de 2001, Irene e Albertina Ximenes receberam a informação de que o Promotor de Justiça havia ignorado o pedido do Centro de Apoio Operacional aos Grupos Socialmente Discriminados do Ministério Público do estado do Ceará para emendar a denúncia e incluir Francisco Ivo de Vasconcelos, Marcelo Messias Barros, Maria Verônica Bezerra, José Eliéser Silva Procópio e Elias Gomes Coimbra como réus no processo criminal. Albertina Ximenes e Irene Ximenes tiveram que oficiar o Promotor de Justiça da comarca de Sobral requerendo o aditamento da denúncia nos termos oferecidos pelo Centro de Apoio Operacional.

A Ação Penal nº 2000.0172.9186-1/0, sobre o assassinato de Damião Ximenes, está tramitando na 3ª Vara da Comarca de Sobral, estado do Ceará, desde 28 de março de 2000. São réus na ação Sérgio Antunes Ferreira (proprietário e diretor financeiro da Casa de Repouso Guararapes), Carlos Alberto Rodrigues dos Santos (auxiliar de enfermagem), André Tavares do Nascimento (auxiliar de pátio) e Maria Salete Moraes Melo de Mesquita (enfermeira), denunciados pelo crime de maus-tratos seguido de morte, de acordo com o art. 136 § 2º do Código Penal brasileiro.

Apenas em 22 de setembro de 2003, após insistentes pedidos dos familiares, o Ministério Público requereu a inclusão de Francisco Ivo de Vasconcelos (diretor clínico da Casa de Repouso Guararapes) e de Elias Gomes Coimbra (auxiliar de enfermagem) como co-réus do referido processo. Após seis anos de tramitação, este processo ainda não foi concluído.

A Ação Cível n° 200001730797-0/0 interposta pela mãe de Damião Ximenes encontra-se ainda em fase de instrução processual. Assim como na ação penal em curso, passados mais de seis anos esta a ação cível ainda não obteve uma decisão definitiva. A família Ximenes segue sem a devida reparação por todo dano e sofrimento que lhes foi causado.

A tramitação do Caso no Sistema Interamericano

A denúncia foi apresentada em dezembro de 1999. Em 9 de outubro de 2002, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) acatou a denúncia e passou a processar o caso, conferindo o número 12.237 ao processo.

Durante o 118º Período de Sessões da Comissão Interamericana e Direitos Humanos, celebrado em outubro de 2003, a CIDH concluiu que o Estado brasileiro era responsável por violar os direitos à integridade pessoal, à vida, à proteção judicial e às garantias judiciais, consagrados nos artigos 5, 4, 8 e 25, respectivamente da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Estas violações decorrem do tratamento cruel, desumano e degradante dado a Damião Ximenes e à tortura e conseqüente assassinato no interior da Casa de Repouso Guararapes. As violações da obrigação de investigar os crimes, do direito a um recurso efetivo e das garantias judiciais são relacionadas com a investigação dos fatos e o sistema de justiça brasileiro.

A CIDH concluiu também que o Estado brasileiro violou o seu dever genérico de respeitar e garantir os direitos consagrados na Convenção Americana.

A sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre o caso de Damião Ximenes é a primeira a abordar o tratamento cruel e discriminatório dispensado às pessoas portadoras de transtorno mental. O reconhecimento da situação vulnerável a que estão submetidas estas pessoas pela Corte amplia a jurisprudência internacional e fortalece, nacionalmente, o trabalho de denúncia das organizações do movimento anti-manicomial, no que diz respeito à violação de direitos humanos em estabelecimentos psiquiátricos.

A conduta das autoridades brasileiras e o Sistema de Saúde Mental

Até hoje, nenhum indivíduo ou instituição foi responsabilizado pelo assassinato de Damião Ximenes Lopes. Apesar de o Ministério Público ter denunciado o proprietário e três empregados da Casa de Repouso Guararapes pela morte de Damião, em março de 2000, e posteriormente ter incluído na denúncia o diretor clínico e mais um empregado da instituição psiquiátrica, não houve qualquer decisão judicial no caso até a presente data.

A partir do momento da morte de Damião as ações dos oficiais do Estado têm obstruído a busca por justiça e causado atrasos injustificados. Tanto no tratamento inicial sobre a morte como no subseqüente processo dos responsáveis, o Estado mostrou uma clara falta de vontade em estender as proteções do sistema judicial e garantir um recurso legal em tempo apropriado para o presente caso.

Durante audiência realizada em San Jose, Costa Rica, na sede da Corte Interamericana de Direitos Humanos, durante os dias de 30 de novembro e 1 de dezembro de 2005, o Estado brasileiro reconheceu a sua responsabilidade sobre os fatos relacionados aos artigos 4 e 5 (direito à vida e à integridade física, respectivamente) da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Em seguida, alegou em sua defesa a implementação de políticas de redução de leitos e fiscalização dos serviços destinados às pessoas portadoras de transtorno mental realizados pela coordenação nacional do programa de saúde mental do Ministério da Saúde. No entender do Brasil, estas poucas medidas cumpririam as recomendações feitas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos em seu relatório de mérito sobre o caso em 2003.

Entretanto, é importante ressaltar que não é o sistema de saúde mental brasileiro e suas recentes reformas que foram analisadas pela Corte Interamericana, mas sim as violações de direitos humanos cometidas contra Damião Ximenes e seus familiares. Apesar de certa evolução no tratamento de portadores de transtornos mentais, não foi criado nenhum instrumento adequado e eficaz para combater, investigar e monitorar as violações de direitos humanos cometidas contra pacientes psiquiátricos.

Como forma de não repetição de casos semelhantes aos de Damião Ximenes, é urgente que o Estado brasileiro proceda o fechamento das unidades psiquiátricas reprovadas pelo Programa Nacional de Avaliação dos Hospitais Psiquiátricos (PNASH), que ainda se encontrem em funcionamento ou que futuramente vierem a ter seu descredenciamento recomendado por este Programa de Avaliação. A má avaliação destes centros e hospitais psiquiátricos pelo PNASH atesta que os mesmos não possuem condições de atendimento digno aos portadores de transtornos mentais, sendo portanto potenciais violadores de seus direitos humanos.

Também é essencial a implementação de mecanismos eficazes de recebimento e apuração de denúncias sobre violências e maus tratos cometidos contra pessoas portadoras de transtornos mentais, destacando-se a importância da participação de representantes da sociedade civil organizada, do Ministério Público e de entidades representativas de profissionais da área de saúde, a fim de criar um canal de comunicação entre usuários e familiares de usuários do sistema de saúde mental e coibir condutas que violem direitos das pessoas portadores de transtornos mentais.

Outros casos de violência contra portadores de transtornos mentais

O Hospital Psiquiátrico Dr. Milton Marinho, localizado no município de Caicó, estado do Rio Grande do Norte foi palco de dois assassinatos de portadores de transtornos psiquiátricos nos anos de 2000 (José Martins da Silva) e 2002 (Sandro Fragoso) que continuam sem solução até o presente momento: a clínica permanece em funcionamento e os responsáveis pelas mortes não foram processados. Apesar de uma auditoria do Ministério da Saúde ter concluído que quanto “[as] denúncias atribuídas ao Hospital Psiquiátrico Dr. Milton Marinho sobre as mortes dos pacientes José Martins da Silva e Sandro Fragoso é nosso parecer que os fatos ocorridos tem relação direta com a precariedade da assistência prestada aos pacientes”, o hospital continua em funcionamento.

Em Juiz de Fora, Minas Gerais, há outro caso emblemático de impunidade de responsáveis pela morte de pessoas portadoras de transtornos mentais: o assassinato de Wanderley Sobrinho Alves de Oliveira, 53 anos, portador de esquizofrenia, internado no Hospital Dr. Penido, que morreu no dia 22 de setembro de 2000, tendo como causa mortis distúrbio hidroeletrolítico grave, decorrente de queimadura em quase todo o corpo. Passados mais de cinco anos do assassinato de Wanderley de Oliveira, a ação penal ainda não foi ajuizada, ou seja, o processo criminal não foi instaurado.

No município de Rio Grande, no estado do Rio Grande do Sul, ocorreu recentemente, em 5 de julho de 2006, um caso gravíssimo de violação de direitos humanos em uma clínica psiquiátrica. Três meninas morreram carbonizadas em um incêndio ocorrido em um dos quartos do pavilhão feminino do Hospital Psiquiátrico da associação de Caridade Santa Casa de Rio Grande no Rio Grande do Sul. A.S.G., 17 anos, A.P.R.S., 14 anos, e A.C.S.M., 15 anos, estavam internadas por causa de dependência química. O laudo do Instituto Geral de Perícias (IGP) concluiu que o incêndio foi causado por ação humana, possivelmente por uma das vítimas. As mortes estão sendo investigadas, há um inquérito policial em andamento.

Seguindo critérios de classificação dos hospitais psiquiátricos, que incluem a qualidade de assistência, número de leitos, estrutura física e dinâmica de funcionamento, adequação e inserção da instituição à rede de saúde mental e às normas técnicas do SUS, o Programa Nacional de Avaliação dos Hospitais Psiquiátricos (PNASH) recomendou o descredenciamento das seguintes instituições:

Em seu relatório sobre o ano 2002: 1) Casa de Saúde Santa Catarina – Montes Claros, Minas Gerais – 124 leitos; 2) Instituto de Reabilitação Funcional – Campina Grande, Paraíba – 145 leitos; 3) Fundação Hospitalar do Seridó (Hospital Psiquiátrico Dr. Milton Marinho) – Caicó, Rio Grande do Norte – 72 leitos; 4) Casa de Saúde Dr. Eiras – Paracambi, Rio de Janeiro – 980 leitos; e 5) Hospital Estadual Teixeira Brandão – Rio de Janeiro – 102 leitos;

Em seu relatório sobre 2003 e 2004: 1) Sanatório São Paulo – Salvador, Bahia – 175 leitos; 2) Sanatório Nossa Senhora de Fátima – Juazeiro, Bahia – 80 leitos; 3) Hospital José Alberto Maia – Camaragibe, Pernambuco – 980 leitos; 4) Hospital Santa Cecília – Nova Iguaçu, Rio de Janeiro – 200 leitos; 5) Hospital Colônia Lopes Rodrigues – Feira de Santana, Bahia – 500 leitos.

Destes dez hospitais, de acordo com informação da Coordenadoria de Saúde Mental do Ministério da Saúde em 6 de janeiro de 2006, apenas três hospitais foram fechados. Sete continuam funcionando.

Sobre o Sistema Interamericano de Direitos Humanos

Para maiores informações sobre a Corte Interamericana, visite:
http://www.corteidh.or.cr/inf_general/historia.html

Para informações sobre a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, visite:
http://www.cidh.org/que.htm Posted by Picasa

Encontro em defesa da Reforma Psiquiátrica

Rio por Flávia Campuzano











ENCONTRO EM DEFESA DA REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA

Apesar do consenso obtido a partir da Declaração de Caracas, da II e da III Conferências Nacionais de Saúde Mental, e da Lei 10.216, além das várias conquistas obtidas no processo de reforma psiquiátrica brasileira desde 1990, hoje estas diretrizes estão sendo frontalmente desafiadas por alguns setores da psiquiatria brasileira.

A realização do 8.o Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva e 11.o Congresso Mundial de Saúde Pública, nos dias 21 a 22 de agosto de 2006, no RioCentro, Rio de Janeiro, nos proporciona a oportunidade de nos encontrarmos, avaliarmos esta realidade e principalmente, nos posicionarmos formalmente.

Assim, várias entidades e militantes da reforma psiquiátrica e do movimento da luta antimanicomial no Brasil, em comum acordo, estamos convocando este encontro, sugerindo que todas as associações civis, movimentos sociais, entidades e organizações profissionais, equipes de profissionais ligados a serviços, coordenações e gestores municipais e estaduais, e todos os demais interessados, venham se juntar a nós e que tragam seu posicionamento neste encontro, se possível por escrito.

Colabore também com este processo e divulgue este convite através de sua lista de e-mail. Estamos sugerindo que as várias pessoas e entidades que apóiam o evento o divulguem em seu nome pessoal ou institucional, para aumentar a legitimidade do encontro.

Como um dos que tomaram a iniciativa desta convocação, subscrevo-me,

Prof. Eduardo Vasconcelos (UFRJ)


DIA e HORA: Dia 23, quarta-feira, às 16 hs.

LOCAL: Tenda Paulo Freire, localizada na entrada do pavilhão 4 do Riocentro. Esta tenda é uma iniciativa da Articulação Nacional de Movimentos e Práticas de Educação Popular em Saúde e do GT de Educação Popular em Saúde da ABRASCO, que gentilmente cederam o espaço para nosso encontro.

COMO CHEGAR: O RioCentro fica em Jacarepaguá, depois da Barra. Há ônibus e vans se dirigindo para lá a partir do centro do Rio e de toda a orla marítima, particularmente nos dias de grandes eventos como este congresso. Para os que estão vindo exclusivamente ao encontro, a Tenda Paulo Freire constitui o único local aberto fora da área restrita aos inscritos no congresso, e portanto é accessível a todos os interessados. No caso de chegada por ônibus, consulte o motorista sobre a parada mais próxima do Pavilhão n.o 4. Indo em carro próprio, verifique nas placas localizadas na portaria dos vários estacionamentos qual o que dá acesso mais direto a este pavilhão. Posted by Picasa

agosto 20, 2006

Corte da OEA condena o Brasil pela morte de Damião Ximenes

Damião Ximenes











Conheça a história de Damião Ximenes, cidadão portador de transtorno mental encontrado morto, com marcas de brutalidade, em clínica psiquiátrica privada no Ceará.

Acesse a página da Associação de Parentes e Amigos de Vítimas da Violência e leia o depoimento de Irene Ximenes Lopes Miranda sobre a morte do irmão na Casa de Repouso Guararapes, Sobral-CE: http://www.apavv.org.br/casos/D/005.htm

Conheça o Centro de Justiça Global, organização não governamental dedicada à promoção da justiça social e dos direitos humanos no Brasil, que sustentam a tese de que "o estado brasileiro é responsável, por ação e omissão, pelos atos cometidos pelos funcionários da Casa de Repouso Guararapes que violam os preceitos contidos na Convenção Americana de Direitos Humanos". O texto recebe a assinatura, entre outros, da companheira Lídia Dias Costa, que coordenava, na época, o Fórum Cearense de Saúde Mental, filiada à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial. Acesse http://www.global.org.br/portuguese/arquivos/damiaox.html

Leia a repercussão da morte de Damião Ximenes na imprensa brasileira:

Direitos Humanos 18/08/2006 Carta Maior
http://agenciacartamaior.uol.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=12017&boletim_id=99&componente_id=1796

DECISÃO INÉDITA

Corte da OEA condena Brasil por morte de portador de transtorno mental


Primeira sentença do órgão relacionada ao Brasil é resultado das denúncias de tortura e morte de um paciente em uma clínica psiquiátrica cearense, em 1999. A decisão é considerada um avanço na área de saúde mental, em especial para a luta antimanicomial.

Fernanda Sucupira – Carta Maior

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Cotidiano [19/08/2006] Folha de São Paulo
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1908200611.htm

Corte da OEA condena Brasil por morte

Maus-tratos que vitimaram paciente com problemas mentais em 1999 resultaram na 1ª sentença do tribunal contra o país

Para entidade, Estado brasileiro é co-responsável pela morte de Damião Ximenes Lopes em clínica psiquiátrica no Ceará

EDUARDO DE OLIVEIRA - DA AGÊNCIA FOLHA

Nota: Exemplar o tratamento dado pelos editores e jornalistas das duas matérias. Em nenhuma delas Damião Ximenes é nomeado como doente mental, uma forma discriminatória de identificar quem é portador de transtorno mental. Como os humanos se distinguem por estarem atravessados pela linguagem - o que significa dizer que somos o que dizemos e o que escrevemos -, parabéns Fernanda Sucupira e Eduardo Oliveira; parabéns Carta Capital e Folha de São Paulo. Posted by Picasa

agosto 17, 2006

Associação Chico Inácio: manifesto político, ético e estético em defesa da Reforma Psiquiátrica















Manifesto político, ético e estético em defesa da Reforma Psiquiátrica Brasileira

A Associação Chico Inácio - organização política de familiares, usuários, técnicos em saúde mental e cidadãos de boa vontade do estado do Amazonas - apoia todas as manifestações de repúdio contra o discurso pretencioso de quem quer "zerar" a Reforma Psiquiátrica que ajudamos a construir em direção à uma sociedade sem manicômios.

Revoguem-se as disposições em contrário.

Ao mal-estar produzido pelo discurso do presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria respondemos com uma imagem tão familiar em nossa cultura. Considerem a nomeação do pica-pau uma homenagem simbólica àqueles que nunca se colocam em questão, pois que a questão é sempre do outro: nós, cara-pálida!

Temos dito.

Josiane da Silva Ferreira
Glaúcia Batista da Silva
Jairo da Silva Ferreira
Aderildo Ribeiro Guimarães
Sódia Matos Sobrinho
Maria de Fátima Nascimento da Silva
Olinda Maria P. de Alecrim
Julio Matos Sobrinho
José Maria de Souza
Nivaldo de Lima
Doriedson de Souza Oliveira
Antônio Souza Araújo
Kennedy Barbosa dos Santos
Maria do Carmo Ribeiro dos Santos
Weber Reis Moraes
Maria Elina N. do Espírito Santos
Lindalva Maria do N. Andrade
Julio Amorim dos Santos
Ana Paula da Câmara dos Santos
Maria Alcinéia Oliveira de Souza
Francineide de Araújo Ribeiro
Márcio Jordelane
Luiz Balbino
Eliana Uchôa Gomes de Lima
Nivya Valente
Maria do Carmos N. da Silva
Maria Vanda da Silva
Rogelio Casado
Isabel Gouvêa Posted by Picasa

agosto 16, 2006

Manifesto em defesa da Reforma Psiquiátrica Brasileira

Foto: Rogelio Casado - Hospital Colônia Eduardo Ribeiro, Cela forte, 1980













Nota: A Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial repudia em manifesto as declarações do presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria. A Associação Chico Inácio é signatária do manifesto pelo estado do Amazonas.

Manifesto Em Defesa da Reforma Psiquiátrica Brasileira

Manifestamos o nosso mais veemente repúdio às declarações do Sr. Josimar França, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria ABP, que, em matéria intitulada “Erro da política de Saúde Mental”, veiculada no dia 20 de julho de 2006, no Jornal O Globo, dirigiu ataques injustificados à Reforma Psiquiátrica do SUS.

Em seu texto, o presidente da ABP faz uma defesa do retorno ao modelo de assistência psiquiátrica centrada no hospital, procurando desvincular esse modelo de sua figura mais expressiva, o manicômio. Arvorando-se numa autoridade científica, e falando em nome da especialidade médica psiquiátrica, defende a internação em hospital psiquiátrico, instituição, essa, denunciada sistematicamente por práticas de violação aos Direitos Humanos, exclusão, humilhação, descaso, abandono, silenciamento, violência e morte.

Consideramos empobrecedora a análise do Sr. Josimar França, em sua crítica contra a política de Saúde Mental. Trata-se de uma análise saturada, monocórdia. Esta questão é multifacetada, pois abrange inúmeros outros conhecimentos e, não apenas, o "pensamento único", anunciado em seu texto. A Reforma Psiquiátrica Brasileira é uma política pública, formulada a partir de uma construção social, que aborda questões, principalmente, de acesso de direito à cidadania, ao portador de sofrimento mental, questões, estas, absolutamente ausentes do referido texto.
Embasada no reducionismo de uma visão organicista, a assistência psiquiátrica centrada no hospital ainda se utiliza de procedimentos invasivos e violentos, como a Eletroconvulsoterapia (eletrochoque) e a psicocirurgia (lobotomia) no "tratamento" das pessoas com sofrimento mental.

Pode-se ver, por suas próprias palavras, quando fala do "atual nível da Psiquiatria brasileira, que se esforçou durante anos para formar profissionais capacitados, desenvolver pesquisas e aparelhar instituições", que sua defesa é em nome da manutenção de privilégios e de interesses corporativos e econômicos. Tenta, com isto, confundir a opinião pública.

O presidente da ABP desconsidera as deliberações dos órgãos de controle social, que transformaram as experiências, construídas coletivamente, em política pública. Atualmente são mais de 800 Centros de Atenção Psicossocial - CAPs, quase 500 Serviços Residenciais Terapêuticos, Centros de Convivências, iniciativas de geração de renda e vários outros dispositivos de cuidado em liberdade, que vêm possibilitando a inclusão social de milhares de pessoas, antes abandonadas e sem direitos. Desconsiderando toda essa construção coletiva, o presidente da ABP investe no atraso, fazendo coro com os empresários da loucura que desejam continuar usando o portador de sofrimento mental como objeto de lucro.

Contrapondo-nos a esses ataques, e na defesa radical da política de Saúde Mental, conclamamos os gestores públicos a acelerarem o ritmo da Reforma Psiquiátrica, adotando medidas mais contundentes, descredenciando imediatamente hospitais psiquiátricos, cujas vistorias comprovam incompetências técnicas e violação aos Direitos Humanos, e ampliando a rede de cuidados em Saúde Mental, com vistas à total substituição dos leitos psiquiátricos e maior investimento na formação dos profissionais, a partir do novo paradigma em Saúde Mental.

REDE NACIONAL INTERNÚCLEOS DA LUTA ANTIMANICOMIAL

1 Associação Chico Inácio (AM)
2. Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de João Monlevade (MG)
3. Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais (MG)
4. Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental do Estado de Goiás (GO)
5. Associação Verde Esperança (MG)
6. Associação Loucos por Você (MG)
7. Fórum Cearense da Luta Antimanicomial (CE)
8. Fórum Gaúcho de Saúde Mental (RS)
9. Fórum Goiano de Saúde Mental (GO)
10. Fórum Mineiro de Saúde Mental (MG)
11. Instituto Damião Ximenes (CE)
12. Movimento dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental da Bahia (BA)
13. Movimento Pró-Saúde Mental do Distrito Federal (DF)
14. Núcleo Antimanicomial do Pará (PA)
15. Núcleo da Luta Antimanicomial da Paraíba (PB)
16. Núcleo de Estudos pela Superação do Manicômio (BA)
17. Núcleo Estadual de Saúde Mental (AL)
18. Núcleo Estadual do Movimento da Luta Antimanicomial (RN)
19. Núcleo Libertando Subjetividades (PE)
20. Núcleo Por Uma Sociedade Sem Manicômios (SP) Posted by Picasa

agosto 14, 2006

Usuários da Saúde Mental de Minas em defesa da Reforma Psiquiátrica

Foto: Rogelio Casado - Hospital Psiquiátrico Eduardo Ribeiro, 1980











Cena como esta, nunca mais!

Nota: Desta vez quem se manifesta em carta aberta é a ASUSSSAM-MG - Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais. A carta manifesta repúdio ao documento que critica a Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde, produzido pelo Fórum de Políticas de Saúde Mental e II Encontro de Saúde Mental de Sorocaba, realizado em 29 de julho de 2006. Leia o documento de Sorocaba em http://www.abpbrasil.org.br/noticias/arquivos/ResultadoForum.pdf , e a carta dos companheiros da ASUSSAM-MG.

ASUSSAM-MG
Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais

Prezados Senhores,

A ASSUSAM-MG – Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais, entidade civil sem fins lucrativos, políticos ou religiosos, juntamente com as associações congêneres que abaixo subscrevem vêm manifestar apoio à Coordenação Geral de Saúde Mental do Ministério da Saúde pela ousadia em efetivar e consolidar a “Reforma Psiquiátrica que queremos” na atual política de saúde mental do Ministério da Saúde.

Nesta perspectiva, as associações que abaixo subscrevem expõem as seguintes considerações:

- Apoiamos incondicionalmente a Lei Federal 10.216, pois a mesma é fruto de uma luta histórica de usuários, familiares, profissionais de saúde, gestores do SUS, Sindicatos, políticos que em um ato de coragem e luta pelos Direitos Humanos estão conseguindo de maneira séria e responsável libertar milhares de pessoas dos grilhões e da opressão em que se encontravam nos cárceres denominados de hospitais psiquiátricos. Neste processo reconhecemos as dificuldades para efetiva implantação da reforma, a necessidade de ampliação e investimentos dos recursos nos níveis federal, estadual e municipal, o que não tem invalidado e nem barrado o avanço que estamos obtendo. Centenas de municípios do Brasil têm oferecido uma assistência integral ao portador de sofrimento mental em serviços abertos e de atenção diária possibilitando a inclusão no meio social.
- Apoiamos os serviços substitutivos em detrimento aos sistemas asilares e de reclusão dos Hospitais Psiquiátricos.
- Apoiamos a criação dos serviços abertos 24 horas e leitos psiquiátricos em hospital geral, pois jamais negamos que em algum momento de fragilidade necessitamos de uma curta internação.
- Defendemos as internações psiquiátricas obedecendo a carta de direitos e deveres dos usuários dos serviços de saúde mental.
- Defendemos, dentro dos princípios constitucionais, a participação dos usuários na construção de qualquer política de saúde mental bem como de todos os agentes envolvidos no processo, respeitando a representatividade do controle social.
- Rechaçamos acatar qualquer proposição de cunho corporativista que reduz a saúde ao mero mercantilismo.

Portanto, reafirmamos que todas as argumentações acima referidas fazem parte de uma discussão contínua que busca não só a garantia de um espaço inclusivo, mas também reafirma e faz valer o direito Constitucional: a saúde como um direito de todos e dever do estado. Embasamos nossos princípios em construções ideológicas exitosas na busca de uma Reforma Psiquiátrica que desmonte o modelo hospitalocêntrico, cuja história já provou ser ineficiente.

Somos solidários e pactuamos com toda a política que garanta a cidadania e que vá ao encontro com a melhoria de nossa qualidade de vida e promoção da nossa saúde.

Atenciosamente,

ASUSSAM-MG

Associação Vida que te quero vida
Associação Verde Esperança
Assume – Associação de Usuários e Familiares de João Monlevade
Asusfam – Associação de Usuários e Familiares de Ponte Nova
Associação Loucos por Você
Associação Novamente / Nova Lima
Associação Mente Especial / Ribeirão das Neves
Grupo Organização de Usuários / Sabará
Associação dos Usuários de Uberlândia
Grupo Organização de Usuários de São João de Bicas
SURICATO – Associação de Produtores da Saúde Mental

Contato ASUSSAM-MG
Daniel da Silveira: (31) 3487-9753 danielsaudemental@yahoo.com.br
Thiago Horta: (31) 9103-6163 corep@crp04.org.br Posted by Picasa