PICICA: "este é um
governo popular – estamos para o país assim como a fratura exposta está para o
esporte – nunca antes bancos e empreiteiras lucraram tanto com justiça social –
a liberdade de imprensa, fundamental para os elogios ao governo – causou dano
ao patrimônio público, nunca mais foi vista – beijo no coração e no rifle para
os senadores do agronegócio – exatamente como a maioria, respeitamos as
minorias – com agrotóxico brindamos na garganta alheia nossa permanência na
colonialidade – recorde mundial de suicídio de índios, o progresso escalou os
troncos derrubados – prefiro cachorros a gatos porque só aqueles podem ser
policiais – recorde mundial de assassinato de ativistas ambientais, derrotamos
o problema do meio ambiente – abrimos a copa com um festival de tiros em nome
dos direitos humanos – avisamos os repórteres onde eles poderiam ficar – financiamos
o agrotóxico para os pesquisadores descobrirem como torná-lo vivo – foi
alvejada, mas não era imprensa, era um jornal pequeno – gol contra também é
gol, contabilize entre os restos a pagar – falou mal do governo, isto é, causou
dano ao patrimônio público – o agrotóxico, quando vivo, servirá para outras
funções na fazenda, carregará armas –
perguntou onde estava a identificação policial, ou seja, falou mal do
governo –
montar,
combinar; com essas peças, inútil."
#NãoVaiTerCopa, algo como um poema
#NãoVaiTerCopa
I
Os cães precisam ter várias gargantas
para dar conta das mil cabeças do povo,
indaga o
governo democrático;
nenhum
dos assessores late em retorno,
são os
dentes que respondem:
a filosofia do Espírito
culmina no gás lacrimogêneo.
Somente um povo basta
para a fome infinita do orçamento,
duvida o
governo, que redige
a minuta
pré-eleitoral dos mísseis
de boas
vindas para as multidões.
a filosofia do Espírito
enche bolas de gás, estoura-as
e pede ressarcimento.
Após serem devorados, os manifestantes
voltarão vivos na merda dos cães,
nega o
ministro, entupindo de escargot
seu
nacionalismo, assinando a compra
de bombas
para a Pasta de Esporte.
a filosofia do Espírito
solta gases por todos os
orifícios
II
O jogador
patrocinado
para
fazer gols, ouve tiros;
exigência
do patrocínio:
ele não
pisa no gramado
sem que
chegue aos seus ouvidos
a música
própria do Estado,
a salva
com que os soldados
tornam o
povo em morticínio.
Menino,
não estava a salvo
nem da
milícia nem da tropa.
Mas,
entre tiros, jogar quis.
Hoje, que
é uma estrela na copa
e
representa o seu país,
todo o
povo deve ser o alvo.
III
A imagem
do país, digo,
pois este
país tem uma
imagem,
repito, e ai dos
invejosos
que negam
que o
país tem imagem,
e a
possui com todo direito,
e tem até
mais imagem
do que
direito, poder-se-ia
dizer,
pois quando se vê
o país,
nós o vemos, ele
tem uma
imagem, tão
bela e
altaneira e viril,
já nos
sentamos para vê-la,
que não
poderíamos negar
que este
é um país,
de fato,
e de direito, mais
de
direito que de fato,
e é um
país que tem
uma
imagem, todos que têm
espelhos
em casa podem
neles se
ver e conferir
se o que
é refletido não é
uma
imagem do país, e se
não for, há
algo de estranho,
há algo
de indigno em quem
se mira
sem refletir o próprio
país, talvez
um cão atrás
mordendo
as possibilidades
da bunda
para o assento,
os
estrangeiros que vêm
não podem
negar que vieram
e viram a
feliz imagem do país,
a recusa
à felicidade seria
não ver
nosso progresso
com segurança,
mais segurança
do que
progresso, ou progresso
da
segurança, com as bombas
e balas e
ordem assegurando
a paz da
imagem do país,
seria enfim
recusar que o país
tem uma
imagem, dado que
não poderia
ser mostrado
se fosse
de outra maneira,
portanto
digo, novamente,
não pode viver
nesta terra
e deve
deixá-la por coerência,
ou pelo
mau gosto de não combinar
com a
bela imagem do país
aquele
que nega os fatos
todos que
demonstrei
tão
vivamente agora e em
todas as
vezes que os chamei
para
sentarem-se quietos
diante do
espetáculo do país.
IV
O
patrocínio é o treinador
e os
tiros jogam para ele
com graça
e precisão,
os tiros
são o ingresso que o patrocinador
cobrou do
público.
O
patrocínio late
músicas
alegres
para o
gozo do público.
– Um cachorro
chutaria melhor!
– Tudo
bem, os cartolas compensam, ladram mais ferozes do que os cães.
O
patrocínio é o estádio
em que
foram enterrados
alguns
operários imprevidentes
e algumas
verbas adicionais
com que o
patrocínio multiplicou os estádios
e
diminuiu o público.
– Quanto
custa o patriotismo?
– Barato,
o exército nacional já ocupa as ruas para lucro de organização estrangeira.
O latido
vende brindes
para
crianças
aprenderem
a língua do patrocínio.
O
patrocínio é a bola
e corre
pelo campo
sem
precisar de jogadores,
na
verdade poderia dispensar as pernas e o suor
se não
fossem necessários
para
carregar caixotes
e estrelar
comerciais de cerveja.
– Quanto nos
custa o patriotismo?
– Só o copyright. O congresso nacional deu de
brinde o nome do país, agora marca de organização estrangeira.
Na
verdade o patrocínio é o governo
e joga no
campo mais importante,
mas
ninguém o vê,
e esse é
o primeiro prêmio;
longe do
público,
conquista
a proeza de vencer todo o público,
e tal é o
segundo prêmio;
e, enfim,
não há outro prêmio senão ele mesmo,
sua
terceira e maior conquista.
O
patrocínio está abrindo um buraco na grama do campo;
espera
achar um osso,
espera
nele guardar o latido
com que
assinou o último contrato
entre as
pernas e a mutilação?
V
Já em
disparada
ao fugir,
caiu;
a apanhou
o Brasil,
teve a
perna fraturada.
Contra a
violência marchava
e a polícia
a viu.
Na tevê
ninguém mostrou,
não interessa
o episódio.
A perna
quebrou,
mas não
os negócios.
Em plena
jogada
o teto
caiu;
via o
jogo do Brasil,
teve a
perna fraturada.
Indigno
da pátria amada
o acidente
vil.
Na tevê
ninguém mostrou,
prejudicaria
os sócios.
A perna
quebrou,
mas não
os negócios.
Em plena
jogada
a falta, e
caiu;
a chuteira
do Brasil
teve a
perna fraturada.
A derrota
acelerada,
prejuízos
mil.
A tevê
tudo mudou,
agora só fala
de ossos.
A perna
quebrou,
este é o
negócio.
VI
este é um
governo popular – estamos para o país assim como a fratura exposta está para o
esporte – nunca antes bancos e empreiteiras lucraram tanto com justiça social –
a liberdade de imprensa, fundamental para os elogios ao governo – causou dano
ao patrimônio público, nunca mais foi vista – beijo no coração e no rifle para
os senadores do agronegócio – exatamente como a maioria, respeitamos as
minorias – com agrotóxico brindamos na garganta alheia nossa permanência na
colonialidade – recorde mundial de suicídio de índios, o progresso escalou os
troncos derrubados – prefiro cachorros a gatos porque só aqueles podem ser
policiais – recorde mundial de assassinato de ativistas ambientais, derrotamos
o problema do meio ambiente – abrimos a copa com um festival de tiros em nome
dos direitos humanos – avisamos os repórteres onde eles poderiam ficar – financiamos
o agrotóxico para os pesquisadores descobrirem como torná-lo vivo – foi
alvejada, mas não era imprensa, era um jornal pequeno – gol contra também é
gol, contabilize entre os restos a pagar – falou mal do governo, isto é, causou
dano ao patrimônio público – o agrotóxico, quando vivo, servirá para outras
funções na fazenda, carregará armas –
perguntou onde estava a identificação policial, ou seja, falou mal do
governo –
montar,
combinar; com essas peças, inútil.
VII
A merda
do cão.
Mas jura
que é inofensiva.
A merda
do cão.
Fede, mas
logo será esquecida.
Os
manifestantes que nela pisaram
não
reclamaram, preocupados com a polícia.
Os
policiais que por elas passaram
não se
incomodaram, seus cavalos defecam em maiores dimensões e seus
governos também.
A merda
do cão,
sua parte
mais inofensiva.
Mesmo
quem a pisou
e levou
algo dela consigo
logo a
esquecerá
sem
perceber
o quanto
de conhecimento
ela lhe
traria
das ruas em
que pisou,
do país
em que essas ruas são possíveis,
das gotas
de sangue mal digerido,
o sangue das
pernas abocanhadas
porque
corriam
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