PICICA: (...)"a despeito de qualquer comentário do tipo “o mundo acabando e vocês discutindo BBB”, respondo que, para mim, essa não foi uma discussão sobre BBB. Foi uma discussão sobre estupro. Essa palavra feia que nos esforçamos para não pensar nela e no crime que ela nomeia e que queremos manter longe das nossas conversas."
Houve ou não estupro? Sinceramente, eu acho que sim, mas essa é minha opinião pessoal mesmo diante da negativa da moça. Em toda essa discussão da qual tentei me ausentar, mas que não consegui, claro, o que mais me chamou a atenção foi o machismo sendo colocado pra fora, assim sem pudor.
Chamaram a moça de puta, disseram que “cu de bbbêbada não tem dono”, que “aquela era a prova da comida”, enfim, a imaginação machista foi longe na hora de julgar a mulher que é vítima de estupro. Lembremos aqui que as discussões nos perfis, no Twitter, nas mesas de bares, nos locais de trabalho não foram só sobre a moça do BBB. Foi uma discussão sobre todas nós mulheres e quem nós somos.
Percebi que somos piranhas, que provocamos os homens e depois fazemos cu doce. Somos vadias que enchem a cara e não sabem beber como homens. Somos putas que querem ser estupradas quando desmaiamos pelo excesso de álcool em nosso corpo. E que depois reclamam só porque o cara dá uma bolinadinha de nada. Ou seja, nossos corpos estão no mundo para servir ao prazer dos homens. Nada mais.
Mesmo diante dessa enxurrada de frases e conceitos, ou melhor, preconceitos, contra as mulheres, confesso que todo esse episódio me trouxe um certo alento, digamos assim. Eu explico. Primeiro, que a despeito de qualquer comentário do tipo “o mundo acabando e vocês discutindo BBB”, respondo que, para mim, essa não foi uma discussão sobre BBB. Foi uma discussão sobre estupro. Essa palavra feia que nos esforçamos para não pensar nela e no crime que ela nomeia e que queremos manter longe das nossas conversas.
Quando pensamos em estupro, pensamos em algo bem distante, um crime cometido contra uma mulher sem rosto, sem vida, sem história, por um homem qualquer, em alguma periferia de cidade ou em algum interior bem longe de nós. Para mim, o que ficou claro com toda essa discussão é que conseguimos falar que o estupro acontece em todos os lugares. É preciso lembrar que relações pessoais entre casais são muitas vezes marcadas pela violência, que não se configura só na violência física. Quantas histórias já ouvimos de mulheres que fazem sexo obrigadas com seus parceiros? Ou de mulheres abusadas por homens em boates, em shows?
É importante falar dessa palavra, que causa tanto asco, porque é um crime cometido prioritariamente contra mulheres e meninas. E aí, parece que é um crime menor, sem relevância. Quantas notícias sobre guerras falam das mulheres estupradas pelos inimigos? Quantas matérias jornalísticas falam do atendimento psicológico a uma mulher vítima de estupro?
Acho que só vi esse assunto sendo tão falado assim, na época que explodiram as Marchas das Vadias em todo o país e no mundo todo. Ah, e como foi bom saber dos relatos de quem participou e como foi bom participar dessas manifestações. Porque é isso. É necessário falar. O crime existe, acontece com uma freqüência assustadora, atinge mulheres e meninas de todas as idades, os criminosos são desconhecidos, mas são também os pais, os irmãos, os maridos, os namorados e os ficantes.
E as desculpas para se estuprar uma mulher são muitas. Mas o que temos feito (feministas desse país inteiro) é mostrar que não há desculpas e que NÃO ACEITAMOS MAIS qualquer tipo de violência. E toda essa reação com um caso mostrou que a palavra de ordem “Mexeu com uma, mexeu com todas”, que esteve tão presente nas Marchas das Vadias, está mais forte ainda!
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