Missão Impossível 4: Protocolo Fantasma
Mais do mesmo, só que diferente
A sinopse de Missão Impossível 4:
Protocolo Fantasma é bastante simples: logo após ser acusado pelo
bombardeio terrorista ao Kremlin, o agente especial da IMF Ethan Hunt
(Tom Cruise) é desautorizado pelo presidente dos Estados Unidos,
justamente com sua equipe, a continuar com suas missões. Então tem
início o Protocolo Fantasma. Na tentativa de completar a missão mesmo
sem o aval do presidente, Ethan, agora clandestinamente, sai à caça dos russos que querem destruir o mundo com mísseis nucleares. Do
clima da Guerra Fria (referência à crise dos mísseis), instaura-se a
agenda de todo o filme: a ação não se dará por coerção ou convencimento,
mas por sinergia. Há, no contexto agressivo do cinema em questão, uma
valorização de proposições absolutamente marcadas, e por isso
inevitavelmente certo de sua precisão.
Reduzir a potência de Protocolo Fantasma as
suas cenas de ação ou a critérios bastante duvidosos (divertido,
fantástico, empolgante) não só é uma armadilha para a crítica como
também desmerece todo um trabalho de incorporação da velha sucata
hollywoodiana em um filme certamente muito mais consciente de suas
virtudes do que qualquer outro exemplar da série protagonizada por Tom
Cruise. Brad Bird não arrisca aquele movimento de câmera espetaculoso,
ele o potencializa, na iminência gritante de sua função crítica diante
do volume intenso de sequências ágeis, no domínio exato da fruição da
ação física (mise en scène) e da ação técnica (câmera). O
controle dessa ação não é só um trabalho de virtuose, mas sim um
exercício de consciência fílmica insondável a qualquer cineasta
explosivo contemporâneo, que prefere ainda filmar sempre aquele mesmo
conjunto de proposições verborrágicas e implausíveis, para daí se
refestelar com finais dignos de uma panacéia infantil. O olhar de Bird é
a um só tempo oitentista e contemporâneo dos anos 2000, cinema que bebe
da fonte transbordante de um John McTiernan (no conceito pleno de
tensão) e de um James Cameron (em termos de fruição), sem com isso ser
genérico ou pastiche mal enjambrado. Protocolo Fantasma é um filme de autoridade, não se dá por acidentes.
A tal consciência referida anteriormente
passa também por esse processo de higienização do padrão Hollywood, no
sentido de que encontrar brechas no sistema para assumir elas mesmas
enquanto condições enriquecedoras, e não como fonte de clichês,
significa um olhar estruturado conjuntamente (é notável que falamos de
um filme de equipe, mas que, essencialmente, tem a consciência de um
cineasta seguro na manipulação). Essa identidade, tão facilmente
localizada aqui, surpreende não somente pela força que tenciona sobre
suas opções narrativas na direção do estiramento da ação, não de sua
redutibilidade. Brad Bird suspende a tensão, alarga a possibilidade
temporal do drama e converte o mais inimaginável conceito do fantástico
do cinema do mainstream em um filme que, longe de congelar a
ação por sua implausibilidade, faz justamente o contrário, exagerando o
plano. Não existe o impossível no cinema. E se tem uma coisa que
contagia o espectador é justamente essa mentira de que, plenamente
conscientes, gozamos como verdade provisória. É uma boa mentira, não uma
boa desculpa, pois percebemos que o fantasma do título alude à própria
prisão que distancia certos personagens e também ao próprio mistério do protagonista em si (perpetuar-se na fumaça; ser invisível é não morrer).
Se grande parte dos filmes de ação
(entendemos que todo o filme é um filme de ação, mas cultuaremos a
palavra para localizar as relações causais entre os gêneros e atingir,
assim, uma crítica interna na direção do próprio gênero) não apresenta
um rompimento em relação ao que é legal para o público (adrenalina) e o
que é legal para o filme (adrenalina com intensificação e coerência), Protocolo Fantasma
insurge até com certa rebeldia. No entanto, o que temos aqui não é uma
proposta de inovação de gênero, apenas uma solução outra, um caminho
distinto, para conduzir uma mesma história. Dramaticamente, não há de
muito distante entre os filmes da série. A mudança se dá no campo do
olhar. Bird reconhece, por exemplo, que ação e adrenalina são coisas
distintas, logo, um filme de ação não tem, obrigatoriamente, adrenalina
embutida. Chegar à adrenalina é um processo, e um processo muito caro
inclusive ao Missão Impossível de John Woo (o segundo). Essa
liberdade tecnológica (e também mercadológica), aliada a coreografia do
drama e da ação, é o que faz desse um filme um golpe certeiro. Confluir
esse entrechoque é uma arma poderosa contra a futilidade do consenso.
Eis um filme que se libertou da camisa de força.
(Mission: Impossible – Ghost Protocol,
EUA, 2011) De Brad Bird. Com Tom Cruise, Jeremy Renner, Simon Pegg,
Paula Patton, Michael Nyqvist, Vladimir Mashkov, Josh Holloway, Anil
Kapoor, Léa Seydoux.
Fonte: Tudo [é] Crítica
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