Peru
Resistência indígena dos povos amazónicos põe em cheque o governo do Peru
Linda Lema Tucker
O governo de Alan García não resolveu os problemas que mantém com os povos indígenas da Amazónia. No próximo dia 19 de Setembro, os dirigentes indígenas esperam a decisão final que o Executivo tomará a respeito da revogação dos decretos legislativos, anulados quer pela Comissão dos Povos Amazónicos, Andinos e Afroperuanos como pelo Congresso. Um dirigente do Povo Awajun disse que tinha muito poucas esperanças de que o Governo mudasse a sua dura posição por respeito aos interesses económicos que representa. De seguida insistiu em dizer que tinham esperado pacientemente porque esse foi o compromisso assumido pelos povos indígenas.
O certo é que o Estado Peruano em vez de avançar na reivindicação dos direitos indígenas, como estão a fazer outros países da Região Latino-americana, está a retroceder com a aprovação das normas inconstitucionais que atentam contra os compromissos e as declarações internacionais que os povos indígenas amazónicos não estão dispostos a aceitar.
O levantamento indígena empreendido em Agosto revela-nos que o Peru começa a viver um momento distinto da sua história. Os povos indígenas já não sãoi nvisíveis. As suas acções empreendidas puseram a descoberto milhares de indígenas que defendem os seus territórios, os seus recursos, o seu trabalho, as suas famílias, toda a sua vida.
A paralisação amazónica foi sabiamente planificada. Primeiro, os indígenas decidiram levantar-se em Bagua e Utcubamba (Amazonas), Datem del Marañón (Loreto) e no distrito de Echarate, da província de La Convención (Cusco) quando sentiram que as suas florestas, os seus rios e os seus territórios sagrados estavam a ser ameaçados com o pacote de normas do governo. Segundo, a luta amazónica foi assumida por mais de 300 mil habitantes das 1,279 comunidades localizadas na selva, ocupando 13 milhões de hectares, e terceiro, os povos indígenas da Amazónia sabem que as suas lutas são contra o modelo neoliberal que o governo promove e que ele põe em perigo as suas vidas e os seus territórios.
Neste contexto, os indígenas peruanos foram capazes de pôr em cheque o governo de García. Com lanças e flechas, caras e corpos pintados demonstraram estar em guerra e colocar em perigo o desenvolvimento de zonas económicas estratégicas no país: bloquearam rios, encerraram as instalações petrolíferas e tomaram a central hidroeléctrica de Muyo, Amazonas.
Como respondeu o governo de Alan García?
O governo, no entanto, desvirtuou a luta indígena e no seu afã de intimidar manifestou que por trás das acções estavam organizações não governamentais (ONG) e os partidos de esquerda. Nada mais absurdo. E se tivesse sido assim, qual era o problema? Mas pior, tentou dividi-los sentando à mesma mesa Alberto Pisando, presidente e líder da Associação Interétnica de Desenvolvimento da Selva Peruana (AIDESEP) e artífice da gesta indígena com César Sara Sara, um representante da Confederação de Nacionalidades Amazónicas do Peru (CONAP) que no ano passado em conjunto com Daniel Saba da Peru Petro ofereceram as concessões dos lotes 132, 133, 136 e 139 de hidrocarburantes às corporações estrangeiras. Recordemos que o que em Houston Texas, Sara Sara afirmou:
“Durante muitos anos mostraram-nos que o Estado e as empresas são inimigos dos povos indígenas. A organização CONAP está pronta e com os braços abertos para os receber… E queremos que a experiência do gás da CAMISESA seja um modelo para o Peru e para a humanidade.” (Servindi: 25.05.07).
Será que os indígenas negam o desenvolvimento e a modernidade…?
Os indígenas peruanos em reiteradas oportunidades afirmaram que não estão contra a modernidade, aspiram a que as normas do investimento estejam orientadas para o desenvolvimento do mercado e que sejam adquiridos os produtos que as comunidades nativas produzem.
Mas, para os indígenas o conceito de desenvolvimento está vinculado a uma visão de equilíbrio com o meio ambiente. Por isso, formulam uma agricultura de subsistência, sustentável, que respeite os ciclos produtivos da terra e não a sobre-exploração porque a Amazónia é um território frágil. Também defendem uma gestão sustentável das florestas, dos rios, das plantas medicinais.
Numa recente entrevista com admirável claridade e inteligência, GilInoach, dirigente destacado de AIDESEP sublinhou não estar de acordo com o discurso que tenta mostrar que o progresso só será possível quando os territórios indígenas forem expostos no mercado livre. Aprofundando a análise, o líder do Povo Awajun assinala:
“Essa modalidade de subjugação já a experimentámos no tempo da colónia-ainda que de forma distinta, mas igualmente humilhante- e sabemosperfeitamente para onde nos leva. Pelo contrário há uma outra forma depromover uma economia local sustentável das comunidades ao incorporartecnologias externas apropriadas para a inovação e o desenvolvimento queafiançará os nossos conhecimentos para transformar os recursos com a nossaprópria dinâmica e criatividade. Esta política promoverá o surgimento denovos empresários indígenas e a associação destes empresários com omercado nacional e de exportação, quer seja em aliança com os investidoresquer seja sozinhos. (…). É equivocada a decisão governamental de afirmarque para sair da pobreza há que arrendar ou hipotecar as terras comunais”.
O governo de Alan García comprometeu-se a promulgar nesta sexta-feira arevogação das leis sobre a propriedade dos territórios comunais, se isso não acontecer os povos indígenas da Amazónia não reconhecerão o presidente da República e irão expulsar os representantes do Estado, assim informou Alberto Pisando, presidente de AIDESEP:
“Vamos rechaçar o seu sistema de educação, de saúde. Os nossos filhos não irão às escolas do Estado. Não vamos permitir que se façam as explorações petrolíferas nas nossas terras. Se as companhias querem entrar será a morte para ambos os lados. Não nos estão a dar outra alternativa” (La Primera, 1 de Setembro de 2008 )
Entretanto, a Terceira Cimeira Amazónica decorre em Yurimaguas, Ucayalie ntre 20 e 21 de Setembro, onde se avaliará a actuação pelo movimento indígena e se definirá a plataforma indígena. Em Lima, os dirigentes indígenas amazónicos não desistirão do seu empenho de tornar efectivo o respeito pelas diferenças, pela existência de diversas culturas, identidades e modos de vida conjugando-os com as normas de investimento com as quais ganhem as comunidades nativas da Amazónia.
Antes de terminar de escrever esta humilde reflexão, envio as minhas sinceras felicitações aos amigos e irmãos indígenas que me ensinaram uma nova forma de ver a vida, a todos os povos indígenas amazónicos pelos seus grandes conselhos e porque nos estão a assinalar o caminho que terá de seguir o nosso país.
(tradução: http://infoalternativa.org/)
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