março 01, 2012

Dilma, Dilminha. Cuidado! Ovos de serpente eclodem por todos os lados.


PICICA: Entre os anos 2003 a 2007, quando exercia a função de coordenador do Programa de Saúde Mental do  Estado do Amazonas, várias vezes fui convidado como entrevistado por emissora de TV evangélica de Manaus para tratar do tema saúde mental, na perspectiva de vida numa sociedade sem manicômios. O tema costuma ser elencado com um dos que predomina uma visão conservadora entre as diversas denominações evangélicas, a ponto de fazer parte de um certo folclore popular. Cheguei a temer pela direção a ser tomada pela entrevista. Para minha surpresa, não houve nenhuma ilação entre conflitos psíquicos e conflitos espirituais, como supõe as costumeiras expectativas. A referida emissora prestou um relevante serviço à opinião pública ao tratar o tema com uma dignidade que faltou na longa noite de horror vivida pelas pessoas com transtorno mental que deram com os costados nos hospícios públicos e privados em qualquer latitude imaginável. Diga-se, de passagem, que a credibilidade do entrevistado foi construída a partir de duas entrevistas sobre o tema AIDS, num cenário em que os programas evangélicos de TV vinham se notabilizando por uma onda de preconceitos e milagres espetaculares. A história dessas duas entrevistas ainda está por ser contada. Passou-se o tempo, e eis que este escrevinhador assume a Pro-Reitoria de Extensão da Universidade do Estado do Amazonas. No decorrer do tempo, fui procurado pelo movimento religioso afro-ameríndio, entre eles companheiros com quem dividi as agruras e as delícias  da militância social em Manaus. Nessa mesma época, as duas casas parlamentares da cidade foram palco do antagonismo e da intolerância religiosa. Enquanto a Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas recebia o movimento em suas datas festivas, a Câmara dos Vereadores de Manaus era palco da intolerância religiosa, a ponto de impedir a criação do Parque dos Orixás, na contra-mão da história da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, que soube praticar o preceito bíblico que afirma que "na casa do Senhor há muitas moradas". Os problemas internos do movimento desperdiçaria a oportunidade de ter um magnífico trabalho chancelado pela Universidade do Estado do Amazonas, com verba ministerial destinada a mapear os povos dos terreiros, com particular atenção à saúde e suas tradições culturais. Quem não perdeu a chance de manifestar sua intolerância foi a emissora de TV, depois que esse escrevinhador passou a defender publicamente a causa do movimento religioso afro-ameríndio. Nunca mais seria convidado para qualquer entrevista. Prevaleceu o preconceito. Lembrei-me desses acontecimentos depois da sucessão de episódios escabrosos protagonizados pela bancada evangélica no Congresso Nacional, como o que é objeto do texto abaixo.  E tudo isso acontecendo no mesmo período em que o governo Dilma empossa como Ministro da Pesca um parlamentar evangélico com histórico "mais sujo do que pau de galinheiro". Eclodem ovos de serpente para todos os lados. Só Dilma não vê! Égua, maninho!

E a intolerância, tem cura?

Este tema, o da intolerância,  já foi abordado pela blogueira Jeanne Callegari nesta semana.  Mas quis falar novamente sobre isso porque sempre que penso que não irei mais me surpreender com idéias estapafúrdias e preconceituosas, eis que surge na TL do meu Facebook a notícia de que parlamentares evangélicos pretendem legalizar a “cura gay” .

Projeto Cura Gay. Charge do cartunista Alpino/Yahoo.
Senti como se tivéssemos voltado à Idade Média. Um retrocesso sem precedentes. A gente espera discursos  (não espera, mas acaba se “habituando”)  como este  de pessoas intolerantes. Mas quando falo de pessoas intolerantes, falo de cidadãos comuns, de gente que não vota em projetos de lei. Gente que não tem diretamente nas  mãos o poder de decidir por todos.  É assustador que algo tão absurdo esteja em tramitação no congresso e que talvez, seja legitimado oficialmente.
Sendo o Brasil um Estado Laico, ou seja, um estado com liberdade de culto e de crença, por que dogmas e valores religiosos – mas apenas os cristãos, que fique claro – devem influenciar os direitos dos outros? Qual o intuito da bancada evangélica ao querer alterar uma resolução doConselho Federal de Psicologia?
Não é de hoje que parlamentares religiosos tentam ter controle absoluto sobre as nossas leis, incluindo nestas adendos que favorecem diretamente aos seus interesses. Várias esferas e grupos sociais, sobretudo as minorias, acabam sucumbindo a estes interesses e, consequentemente, perdem a pouca representatividade política que tem.  Bem justo isso, né?
Este é um ano de eleições. Municipais, é verdade. Mas por essas e outras razões que temos que ter cuidado com quem a gente escolhe, temos que pensar muito bem. Procuremos candidatos que valorizem as pessoas pelo simples fato de serem humanos. Candidatos que tenham propostas que visem acabar com preconceitos. E não promover toda uma campanha pautada pelo ódio e pela ignorância.
É importante que tod@s nós manifestemos o nosso repúdio em relação ao projeto supracitado. O respeito à dignidade humana não depende de orientação sexual. Tampouco de religião ou de crença. É questão de cidadania.  Se você é heterossexual e realmente acredita que homossexualidade não é normal ou correta, reveja muito bem os seus conceitos. A doença mais grave que aflige a nossa sociedade é a intolerância. E se nada for feito, desta irá padecer até arruinar-se por completo. Será que ainda tem cura para isso?

Cláudia Gavenas

Paulistana, 23. Sem crenças ou time do coração. Designer, servidora pública, blogueira e eterna curiosa. Feminista. Amo gatos, música e livros. É isso.
Fonte: Blogueiras Feministas

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