PICICA: "Neurocientista
afirma que a repressão diária aos moradores de favelas "como se fossem
território inimigo" mostra que Brasil vive em estado de emergência."
Carl Hart: o "problema" da guerra às drogas no Brasil me lembra o Apartheid
Neurocientista afirma que a repressão diária aos moradores de favelas "como se fossem território inimigo" mostra que Brasil vive em estado de emergência.
Na última terça-feira (13/05), o neurocientista e professor de Psicologia e Psiquiatria da Universidade de Columbia nos Estados Unidos, Carl Hart esteve presente no debate Drogas e Saúde na casa Matilha Cultural em São Paulo. Conhecido pelo seu trabalho sobre o vício e o abuso de drogas, Hart apontou para as questões polemicas que costuma abordar em suas pesquisas.
Como o primeiro negro a se tornar professor de ciências na Universidade de Columbia, desde pequeno vive entre contradições. Nasceu pobre em periferia além de ter usado e traficado drogas. No decorrer de sua vida, graças a programas sociais, iniciou os estudos em neurociência e tornou-se doutor. Assustado com os preconceitos sociais e raciais de seu país, começou a questionar as opiniões cristalizadas da sociedade e a refutá-las.
Mediada por Bruno Torturra, jornalista do Mídia Ninja, a conversa em São Paulo começou com uma menção ao termo "Cracolândia". Segundo Carl, o termo usado no Brasil só serve para denegrir usuários e expôr uma situação que não é o que parece ser. Se referindo às “crack houses” norte-americanas, o professor salientou como é inapropriado o termo uma vez que, nessas “crack houses”, o uso do crack não comanda as atividades cotidianas. As pessoas não vão para lá somente para fumar. O mesmo acontece na "Cracolândia".
O tema da ocupação militar nas favelas do Rio de Janeiro também esteve presente no debate. O professor se mostrou indignado com a manipulação policial nas periferias e o jogo de interesses que determina o futuro dos mais pobres. "Pelo visto, a Copa é uma emergência aqui. Só em tempos de emergência a polícia pode mandar no povo. Essa repressão diária aos moradores, o jeito dos policiais lidarem com as favelas como se fossem território inimigo e essa guerra às drogas constante me lembram o Apartheid", disse.
Relembrando a famosa entrevista que o neurocientista concedeu ao Democracy Now!, Bruno Torturra perguntou: "se a droga não é o problema, o que é?". Segundo Carl, "culpar a droga não aborda o problema real dos usuários. Uma preocupação importante é a adulteração que as drogas sofrem e, com isso, se tornam muito mais tóxicas para os usuários. As pessoas não vão deteriorar por usarem drogas somente e o papel da polícia no caso não deveria ser prender e denegrir a imagem do usuário, mas sim, analisar os componentes que adulteram a droga afim de eliminar sua toxicidade letal", afirmou.
As mesmas falhas acontecem nos testes feitos por psicólogos quando analisam um usuário. De acordo com Carl, os médicos fazem questionários como "você se sente desconfortável em público?" para um grupo de usuários e um grupo de não usuários. Como um exemplo, 4 dentre 5 usuários dizem que sim e 2 entre 5 não usuários dizem que sim. Nessa perspectiva, chegam à conclusão de que a maconha está ligada sim à comportamentos psicóticos e que seus usuários necessitam de ajuda. Testes irreais e sem embasamento.
Em entrevista exclusiva:
Carta Maior – Fale sobre as críticas que recebeu no mundo acadêmico tendo em vista suas opiniões contra-hegemônicas no quesito guerra às drogas.
Carl Hart – Estou num mundo acadêmico em que as pessoas são muito conservadoras. O jeito que resolvo meus problemas se baseia no fato de que essas são as pessoas mais inteligentes que conheço, elas me desafiam intelectualmente, me ajudam a ser uma pessoa melhor e um melhor crítico. Faço piadas chamando-os de "quadrados" mas não no intuito de desrespeitá-los. Tenho muito respeito por elas, mesmo às vezes me desapontando com seus comportamentos. Com ou sem críticas, minhas opiniões contra-hegemônicas podem, eventualmente, ajudar a nossa sociedade.
Carta Maior – Em São Paulo, o prefeito Fernando Haddad implementou um programa de assistência aos usuários de drogas e frequentadores da "Cracolândia" chamado Braços Abertos. O programa fornece moradia, alimentação e oferta de trabalho para os dependentes, quebrando um tabu. Qual a sua opinião?
Carl Hart – Só é um tabu para idiotas. Aqui em São Paulo vocês estão agindo como agimos com nossas crianças. Vocês formatam seus comportamentos, dando recompensas. Se quisermos que nossas crianças se comportem de um modo, compramos um videogamepara elas, por exemplo. Com os usuários a mesma coisa, pagam-nos para agirem do jeito que queremos. Isso é boa psicologia se aplicada de um modo correto! As pessoas que criticam esse método não entendem os princípios de mudança comportamental. E se temos alguém que entende do assunto e ainda assim o critíca, ela é o exemplo clássico de alguém que não se preocupa com a sociedade.
Como o primeiro negro a se tornar professor de ciências na Universidade de Columbia, desde pequeno vive entre contradições. Nasceu pobre em periferia além de ter usado e traficado drogas. No decorrer de sua vida, graças a programas sociais, iniciou os estudos em neurociência e tornou-se doutor. Assustado com os preconceitos sociais e raciais de seu país, começou a questionar as opiniões cristalizadas da sociedade e a refutá-las.
Mediada por Bruno Torturra, jornalista do Mídia Ninja, a conversa em São Paulo começou com uma menção ao termo "Cracolândia". Segundo Carl, o termo usado no Brasil só serve para denegrir usuários e expôr uma situação que não é o que parece ser. Se referindo às “crack houses” norte-americanas, o professor salientou como é inapropriado o termo uma vez que, nessas “crack houses”, o uso do crack não comanda as atividades cotidianas. As pessoas não vão para lá somente para fumar. O mesmo acontece na "Cracolândia".
O tema da ocupação militar nas favelas do Rio de Janeiro também esteve presente no debate. O professor se mostrou indignado com a manipulação policial nas periferias e o jogo de interesses que determina o futuro dos mais pobres. "Pelo visto, a Copa é uma emergência aqui. Só em tempos de emergência a polícia pode mandar no povo. Essa repressão diária aos moradores, o jeito dos policiais lidarem com as favelas como se fossem território inimigo e essa guerra às drogas constante me lembram o Apartheid", disse.
Relembrando a famosa entrevista que o neurocientista concedeu ao Democracy Now!, Bruno Torturra perguntou: "se a droga não é o problema, o que é?". Segundo Carl, "culpar a droga não aborda o problema real dos usuários. Uma preocupação importante é a adulteração que as drogas sofrem e, com isso, se tornam muito mais tóxicas para os usuários. As pessoas não vão deteriorar por usarem drogas somente e o papel da polícia no caso não deveria ser prender e denegrir a imagem do usuário, mas sim, analisar os componentes que adulteram a droga afim de eliminar sua toxicidade letal", afirmou.
As mesmas falhas acontecem nos testes feitos por psicólogos quando analisam um usuário. De acordo com Carl, os médicos fazem questionários como "você se sente desconfortável em público?" para um grupo de usuários e um grupo de não usuários. Como um exemplo, 4 dentre 5 usuários dizem que sim e 2 entre 5 não usuários dizem que sim. Nessa perspectiva, chegam à conclusão de que a maconha está ligada sim à comportamentos psicóticos e que seus usuários necessitam de ajuda. Testes irreais e sem embasamento.
Em entrevista exclusiva:
Carta Maior – Fale sobre as críticas que recebeu no mundo acadêmico tendo em vista suas opiniões contra-hegemônicas no quesito guerra às drogas.
Carl Hart – Estou num mundo acadêmico em que as pessoas são muito conservadoras. O jeito que resolvo meus problemas se baseia no fato de que essas são as pessoas mais inteligentes que conheço, elas me desafiam intelectualmente, me ajudam a ser uma pessoa melhor e um melhor crítico. Faço piadas chamando-os de "quadrados" mas não no intuito de desrespeitá-los. Tenho muito respeito por elas, mesmo às vezes me desapontando com seus comportamentos. Com ou sem críticas, minhas opiniões contra-hegemônicas podem, eventualmente, ajudar a nossa sociedade.
Carta Maior – Em São Paulo, o prefeito Fernando Haddad implementou um programa de assistência aos usuários de drogas e frequentadores da "Cracolândia" chamado Braços Abertos. O programa fornece moradia, alimentação e oferta de trabalho para os dependentes, quebrando um tabu. Qual a sua opinião?
Carl Hart – Só é um tabu para idiotas. Aqui em São Paulo vocês estão agindo como agimos com nossas crianças. Vocês formatam seus comportamentos, dando recompensas. Se quisermos que nossas crianças se comportem de um modo, compramos um videogamepara elas, por exemplo. Com os usuários a mesma coisa, pagam-nos para agirem do jeito que queremos. Isso é boa psicologia se aplicada de um modo correto! As pessoas que criticam esse método não entendem os princípios de mudança comportamental. E se temos alguém que entende do assunto e ainda assim o critíca, ela é o exemplo clássico de alguém que não se preocupa com a sociedade.
Créditos da foto: Isabela Palhares
Fonte: Carta Maior
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