maio 12, 2014

"Deleuze – 5 proposições sobre a psicanálise" (Razão Inadequada)

PICICA: "Deleuze escreveu em vários momentos de sua vida sobre a psicanálise, principalmente em “O Anti-Édipo“, até finalmente se afastar completamente dela em Mil Platôs. Sua posição crítica está resumida neste artigo, “cinco proposições sobre a psicanálise”, onde ele procura, de forma perigosamente sucinta, explicar por que sua filosofia da diferença não pode conciliar-se com a máquina psicanalítica."


Deleuze – 5 proposições sobre a psicanálise


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Deleuze escreveu em vários momentos de sua vida sobre a psicanálise, principalmente em “O Anti-Édipo“, até finalmente se afastar completamente dela em Mil Platôs. Sua posição crítica está resumida neste artigo, “cinco proposições sobre a psicanálise”, onde ele procura, de forma perigosamente sucinta, explicar por que sua filosofia da diferença não pode conciliar-se com a máquina psicanalítica.

  1. “A psicanálise funciona ao ar livre”: Deleuze nos alerta para os perigos da psicanálise agir no “poros livres da sociedade”. Não mais dentro de um hospital psiquiátrico, mas agindo agora dentro das escolas, empresas, consultórios privados. “Todos deveriam fazer terapia”, é o que dizem os psicólogos, será? A psicanálise leva consigo o discurso do inconsciente para todos os cantos, “mas é sempre para reduzi-lo”; já para Deleuze, “trata-se [...] de produzir inconsciente: não há um inconsciente que estaria já por aí, o inconsciente deve ser produzido”. Como quebrar com o inconsciente psicanalítico para finalmente produzir seu próprio inconsciente? “Em quais circunstâncias, com o auxílio de que acontecimentos, pode haver produção de inconsciente?”.
  2. “A psicanálise é uma máquina já pronta”: ela não permite que seus pacientes falem. Por mais que tentem, todo discurso é codificado, reduzido a “Édipo, pela castração, pelo romance familiar”. Os fluxos param, são estancados, entopem e, muitas vezes, morrem. A máquina interpretativa não permite linhas de fuga: “produz-se uma espécie de esmagamento graças à psicanálise, que dispõe de um código pré-existente”. A psicanálise não dá conta das multiplicidades, ela esquematiza tudo em um discurso familiar que não abrange o campo histórico, “as classes, os povos, as raças, as massas, as matilhas”. Por isso, quando o pequeno Hans sonha com lobos, Freud só consegue ver um lobo, seu pai.
  3. A psicanálise “dispõe de uma máquina automática de interpretação”: tudo que o analisando diz, o analista entende outra coisa. Tudo que o analisando fizer, pensar, agir, o analista interpretará outra coisa. Esta cilada psicanalítica permite os permite falar em “livre associação”. Mas trata-se de um engodo, você pode falar o que quiser porque seu discurso não é “livre”. No fim das contas, o analista sempre achará papai e mamãe. “A tarefa de uma verdadeira análise, de uma análise antipsicanalítica, é descobrir esses agenciamentos coletivos de enunciação, esses encadeamentos coletivos, esses povos que estão em nós e que nos fazem falar, e a partir dos quais nós produzimos enunciados. É nesse sentido que opomos todo um campo de experimentação, de experimentação pessoal ou de grupo, às atividades de interpretação psicanalítica.
  4. “A psicanálise implica uma relação de forças bastante particular”: esta seria a forma burguesa liberal do contrato. A psicanálise enfia goela abaixo a família, a falta, castração, desejo (sempre como falta), mas você aceitou o contrato, então a culpa é sua. Estes enunciados coletivos são próprios de nosso tempo, se increvem em nosso período histórico. Esta prática inscreve o indivíduo em seu tempo, sem dar chances de fazer seus próprios enunciados, criar suas linhas de fuga. Apesar dos esforços psicanalíticos, Édipo não é universal – nós que olhamos o universo com os olhos edípicos. “É preciso fazer exatamente o inverso, quer dizer, partir dos verdadeiro enunciados individuais, dar às pessoas condições, inclusive condições materias, de produção de seus enunciados individuais para descobrir os verdadeiros agenciamentos coletivos que os produzem”
  5. “Não desejamos, no que diz respeito, participar de tentativa alguma que se inscreva numa perspectiva freude-marxista”: por que? O freude-marxismo ainda está preso às origens, ainda possui ídolos (dois, no caso). Seus textos são sagrados, revistos, reexamindados para encontrar a verdade que foi distorcida na realidade. Queremos quebrar o aparelho burocrático psicanalítico e marxista. Ainda há um culto à memória, “acreditamos, ao contrário, que é preciso falar em nome de uma força positiva do esquecimento”.

Todas estas questões são muito complicadas para serem expostas em poucas linhas, até mesmo porque no próprio artigo do Deleuze estas proposições já são curtas (é muito fácil achar o arquivo na internet). Aconselhamos a leitura de outros textos de nossa página (ver, Esquizoanálise) e dos livros de Deleuze e Guattari que tratam do assunto.


“O que nos interessa atualmente são as linhas de fuga nos sistemas, as condições nas quais essas linhas formam ou suscitam forças revolucionárias, ou permanecem anedóticas. As probabilidades revolucionárias não consistem em contradições do sistema capitalista, mas em movimentos de fuga que o minam, sempre inesperados, sempre renovados” – Deleuze, Cinco proposições sobre a psicanálise

Fonte: Razão Inadequada

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