PICICA: "“A terra por si não
resolve as necessidades atuais dos indígenas, pois é preciso discutir
quais são as suas necessidades, e como a terra se insere num projeto de
etnodesenvolvimento”, afirma o historiador."
RS: “O conflito não é entre agricultores e indígenas, mas da política indigenista”. Entrevista especial com Henrique Kujawa
“A terra por si não
resolve as necessidades atuais dos indígenas, pois é preciso discutir
quais são as suas necessidades, e como a terra se insere num projeto de
etnodesenvolvimento”, afirma o historiador.
“Por que a situação social entre
agricultores e índios está tão tensa? Qual é o papel do Estado em
momentos de tensão social como estes?”. Essas são as perguntas que devem
ser feitas quando se trata de entender o conflito entre os índios kaingang e os agricultores familiares que vivem no Norte do Rio Grande do Sul. A proposta é do historiador Henrique Kujawa,
que acompanha sistematicamente 13 acampamentos indígenas no norte do
estado, os quais estão em diferentes estágios no processo administrativo
da FUNAI para identificação, delimitação e demarcação das terras.
Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail, Henrique Kujawa
se opõe à interpretação de analisar os conflitos da região Norte como
uma disputa por terra entre indígenas e agricultores. “O conflito não é
entre agricultores e indígenas”, pontua. Trata-se de um fenômeno “bem mais amplo”
e complicado, porque se o problema não for visto dessa forma, ressalta,
“pode transparecer que a responsabilidade por este conflito é desses
dois grupos sociais, o que não é verdade”.
Na avaliação de Kujawa,
os fatos históricos e a relação do Estado gaúcho com os indígenas e os
agricultores devem estar em perspectiva para compreender o que acontece
hoje. “O conflito é do modelo agrário desenvolvido pelo Estado,
principalmente no último século, em que destina a mesma terra, em
momentos diferentes, para índios e para agricultores. O conflito é da
política indigenista, que desde o tempo do Serviço de Proteção aos Índios - SPI, e que continua hoje com a FUNAI,
vem gestionando as terras indígenas de forma equivocada, o que não
contribui para um etnodesenvolvimento a partir da realidade concreta que
os indígenas vivem”, assinala.
Ele acrescenta: “É preciso romper com o
romantismo, presente em alguns meios acadêmicos e em boa parte do senso
comum, de que o índio é um ser integrado à natureza e que, se
estabelecermos novas terras, eles voltariam a viver, em suas
comunidades, da caça, pesca e coleta permeados pelo princípio do
igualitarismo. Portanto, a terra por si não resolve as necessidades
atuais dos indígenas, pois é preciso discutir de forma franca, honesta
quais são as suas necessidades, para que eles precisam de terra e como a
terra se insere num projeto de etnodesenvolvimento”.
Para ele, o governo gaúcho, ao não reconhecer os conflitos entre indígenas e agricultores,
“demorou para compreender a complexidade e a gravidade do conflito,
partilhando da visão simplista, de boa parte das instituição indigenista
e da FUNAI, que não reconhecem a presença dos
agricultores familiares, preferindo classificar o conflito como sendo
entre latifundiários e indígenas. O governo assumiu uma postura de
intermediação com o Governo Federal após os agricultores e a Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar - FETRAF ocuparem o Centro Administrativo em Maio de 2013”.
Henrique Kujawa
é graduado em História pela Universidade de Passo Fundo, mestre em
História pela Universidade de Passo Fundo e doutorando em Ciências
Sociais no PPG de Ciências Sociais da Universidade do Vale do Rio dos
Sinos - UNISINOS. Lecionou na Universidade de Passo Fundo - UPF e
atualmente leciona na Universidade de Chapecó- UNOCHAPECÓ e na Faculdade
Meridional – IMED, onde é Diretor de Pós-graduação, Pesquisa e
Extensão.
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