fevereiro 09, 2008

A luta contra a privatização da água


Astrid Lima e Andrea Palladino comentam a luta contra a privatização da água na Itália

No centro da Itália - entre elas a cidade de Aprilia - a água foi privatizada. Na verdade, parcialmente privatizada, haja vista a implantação do sistema público-privado, um novo eufemismo que mascara interesses não públicos.

A privatização alcança grupos de cidades que se reúnem num território onde tem uma unidade de distribuição da água, chamada ATO, através de uma lei chamada Lei Galli, de 1996.

Foi justamente Aprilia quem iniciou um movimento de resistência popular.

Diante do aumento das contas da água (em alguns casos de 400%, 800%!) várias pessoas, das mais diferentes experiências e profissões, resolveram se organizar para lidar com o problema.

O primeiro argumento dos resistentes: eles não reconhecem "Acqualatina" (como se chama a empresa público-privada) como interlocutor, afirmando que enquanto clientes eles tem um contrato de fornecimento de água com a prefeitura e nunca assinaram um novo contrato com o novo gestor.

O que fizeram? Depositaram 1 euro na antiga conta corrente (que recebia os pagamentos das contas da água) da prefeitura, verificaram que a conta ainda era ativa e daquele momento em diante mais de 6 mil cidadãos decidiram continuar, sim, a pagar as contas da água para a prefeitura e não para a companhia "Acqua Latina"...

É como se em Manaus a população decidisse não reconhecer Águas do Amazonas porque não assinaram nenhum contrato com ela e resolvessem continuar pagando as contas para a Cosama, calculando os valores da conta em índices de preços legítimos.

O caso da Acqua Latina

A privatização da gestão da água na Itália é uma coisa complicada. Vejamos o caso específico da Acqua Latina.

Tudo começou com a lei Galli de 1996 que cria os ATO (de âmbito territorial) e permite às empresas privadas de entrarem na gestão da água em toda a Itália.

Acqualatina é uma sociedade mista cujo capital é dividido da seguinte maneira:

- 51% - público (que compreende todas as prefeituras reunidas no ATO mais as províncias de Latina e Roma): cada municipio tem uma quota a segundo do percentual da população.

- 49% - Veolia (multinacional francesa).

Na realidade existe um pacto que prevê que de fato a gestão fique completamente nas mãos do parceiro privado, com 49%.

O conselho de administração é presidido por um administrador indicado pela parte privada, nesse caso a Veolia. Quanto aos conselheiros, metade é público e metade é privado. Ocorre que eles não podem tomar decisões importantes sem o voto dos conselheiros nominados pelo parceiro privado.

Os conselheiros públicos, claramente, são de nomeação política, ganhando salários estratosféricos.

Alguns dias atrás o anti-trust italiano bloqueou a atuação de uma companhia de água de uma parte da Toscana (nesse caso Acea e Suez eram sócias). Além disso, acabou de passar na lei financeira do congresso italiano uma moratória que bloqueia por 1 ano qualquer novo financiamento de sociedades mistas público-privadas ou privadas da gestão da água no território nacional. Nesse meio tempo será aberta uma discussão sobre o assunto.

Além da Veolia, estarão presentes a Suez e, obviamente, a Acea (multinacional italiana).

Está provado que onde chega a empresa privada os preços sobem, a qualidade diminue, os direitos não são garantidos. O movimento italiano entende que a água não é uma mercadoria e sim um bem ao qual todos devem ter assegurados o acesso, porque água é vida...

O que a Colônia Antonio Aleixo, em Manaus, tem a ver com a questão da privatização da água na Itália?

A Colonia Antonio Aleixo foi criada em 1942 como complexo residencial e de segregação para os portadores do Mal de Hansen (ou hansenianos como são chamados no Brasil os doentes de lepra). O bairro fica situado na zona oeste de Manaus, cerca de 20 km do centro da cidade.

Em 1978 o leprosário foi desativado e aberto definitivamente aos familiares dos doentes e à população em geral. Atualmente o bairro é composto de 7 complexos comunitários com uma população de 12.475 habitantes (fonte IBGE 2001).

FUBENE

A Fubene (Fundação Beneficiente Nova Esperança) é uma associação formada por ex-hansenianos criada em 2003. O seu presidente é Braulino Almeida.

Braulino Almeida administra os 3 poços artesianos que fornecem água a 150 familias que, por sua vez, pagam uma quota mensal de 15 reais (cerca de 5.80 euros)

Quando a distribuição da água estava sob a gestão da companhia pública Cosama, a manutenção dos poços era garantida pela própria companhia. A partir do ano 2000, após a privatização da água na cidade de Manaus, as várias organizações populares que administram os poços comunitários, entre as quais aquela de Braulino, se encontraram na difícil situação de providenciarem autonomamente a manutenção dos poços artesianos. A quota de cerca de 6 euros ao mês dificilmente pode ser paga com regularidade pelas famílias, considerando a difícil situação econômica dessas populações.

É importante ressaltar que o não pagamento da quota mensal não comporta a interrupção do fornecimento de água. É necessário a solidariedade de cidadão a cidadão. É necessário garantir para Braulino e sua comunidade o fornecimento de água para todos, apesar das dificuldades.

(Tradução da ficha técnica feita pelo Comitê da Água Pública de Aprilia, onde está sendo feita uma campanha de apoio a Braulino).

Como conhecemos a realidade de Braulino e da sua gente

Astrid Lima e Andrea Palladino são um casal de repórteres que transformaram a profissão de registrar imagens em um ato de amor sobre as verdades que ninguém conta.

Quando, através dos meios de comunicação, eles souberam da atual situação da questão água pública da cidade de Aprilia vieram a nos encontrar e mostraram o documentário deles, L'Acqua Invisible (http://www.invisiblewater.org/) que conta os efeitos da privatização do serviço público em Manaus. Ficamos surpresos constatando que também na outra parte do mundo o primeiro efeito da privatização da água foi o aumento dos custos e da exclusão do acesso à vida para os mais fracos.

Foi através daquela reportagem que nós conhecemos a carga humana de Braulino e o seu povo, que não se perderam, e de como se organizaram para a auto-gestão de um bem tão precioso quanto indispensável.

De onde nasce a necessidade da colheita de fundos

O estado atual dos poços artesianos é muito precário. As bombas utilizadas não têm a força suficiente para distribuir a água para todas as famílias. A campanha proposta prevê compra de três bombas submersas para os três poços comunitários.

Um comentário:

myra disse...

o trabalho de informacao de Andrea e ASstrid, é muito bom e sobretodo mto importante !!!