PICICA: "Plataforma de mídia digital fundada por ex-banqueiro de Wall
Street, Oximity, parceiro da NINJA, conta com investidores bilionários e
visa gerar receita através do trabalho voluntário de escritores e
coletivos independentes."
(...)
"Não
há a menor dúvida que as pessoas devem se apropriar de ferramentas de
comunicação, criar veículos independentes e se organizar em rede para
fazer suas próprias vozes serem ouvidas. Isso não está em debate, como
tampouco discute-se aqui a qualidade do Oximity como plataforma de
criação e troca de conteúdo noticioso em diversas línguas. As questões
são: até que ponto Mídia Ninja, leia-se Fora do Eixo, e Oximity pode
ganhar status, fazer banco de dados, ter maior visibilidade e conseguir
financiamento com base na exploração da mão de obra gratuita de
voluntários engajados em determinada causa?
Iniciativas legitimamente ativistas, como o Centro de Mídia Independente (Indymedia),
que nasceu no contexto (e por necessidade) das lutas antiglobalização
no fim dos anos 90, diferem-se de Mídia Ninja e Oximity exatamente nesse
ponto. Ao contrário deles,
o CMI (e tantos outros) foi criado a partir de lutas sociais, de dentro
do movimento conhecido como Ação Global dos Povos (AGP), e não possui ligação com megacapitalistas ávidos por lucro ou governos em busca de conciliações, como no episódio Fora do Eixo/Ninja e a campanha “Existe Amor em SP” ou em embates no Ministério da Cultura (só pra citar dois exemplos). Trata-se de uma rede organizada de forma horizontal e que de fato busca a independência."
Oximity e NINJA: quando ‘mídia independente’ vira negócio
Plataforma de mídia digital fundada por ex-banqueiro de Wall
Street, Oximity, parceiro da NINJA, conta com investidores bilionários e
visa gerar receita através do trabalho voluntário de escritores e
coletivos independentes. Por Cui & Bonno
Anunciada como forma da Mídia Ninja se
libertar de mídias comerciais como o Facebook, a parceria com o Oximity
não tem nada de subversiva quando olhada de perto. Com um investimento
inicial de U$S620 mil, a empresa é uma startup de comunicação
fundada por Sanjay Goel, ex-banqueiro de Wall Street, no Vale do
Silício, Califórnia, em 2012. Seu objetivo? Revolucionar o mercado de
notícias através do empoderamento dos usuários, que criam e consomem
conteúdo na plataforma gratuitamente (por enquanto).
Segundo consta no site da empresa:
A missão da Oximity é a re-engenharia da indústria de notícias, fornecendo uma alternativa substantiva, e melhorar significativamente a mídia tradicional como um provedor de notícias mainstream. Fazemos isso através da captação de notícias diretamente da fonte, facilitando a curadoria pelos leitores, e distribuir o conteúdo das notícias através da internet.
A ideia de uma plataforma colaborativa de notícias não é nova, mas atraiu atenção dos megainvestidores Ronnie Screwvala, Krisnam Ganesh, Sashi Reddi e Anand Ranganathan,
bilionários indianos assim como Sanjay Goel, co-fundador da Oximity com
Christian Hapke, empreendedor alemão na área de TI [Tecnologia da
Informação]. Conforme matéria
do India Times, o grupo segue o movimento de outros bilionários que
buscam engrandecer suas fortunas com investimentos em mídia digital e
expansão da internet em tempos de crise nos veículos tradicionais de
mídia. Fazem parte desse grupo nomes como Pierre Omidyar, fundador do eBay e principal financiador da First Look Media, e “capital ventures” (nome dado a fundos de investimento que apostam em empresas jovens pequenas e médias) como a Spark Capital, que investiu no começo do Tumblr e levantou US$8 milhões para a Upworthy, startup de mídia fundada em 2012 e especializada em conteúdo viral. Hoje a Spark gerencia aproximadamente US$1.825.000.000.
Em comunicado no Facebook, a Mídia
Ninja, principal coletivo de comunicação do Fora do Eixo, diz que “os
veículos independentes não podem ter seu poder de comunicação limitado e
restrito às redes sociais comerciais, como o Facebook, que a cada dia
fortalecem a lógica de monetarização da mídia, cobrando para difundir
conteúdos.”
Ninguém é louco de discordar que ser
refém do Facebook não é uma boa para veículos independentes. Mas será
que o Oximity é tão diferente? Você realmente acredita que três
bilionários só querem a “democratização da indústria da notícia”, como
alega Ronnie Screwvala, fundador de um dos maiores conglomerados de
mídia indianos, a UTV Communications, que hoje pertence a Walt Disney
Co? Em entrevista ao Indian Times, Ronnie paradoxalmente revelou que vê o
Oximity como ferramenta para a democratização ao mesmo tempo em que
defende a empresa como potencial “dominant player” (agente dominante) no
novo cenário da indústria da notícia. Democratização com monopólio e
agente dominante? E pensa que engana…
Quem lucra com a sua colaboração gratuita
Não
há a menor dúvida que as pessoas devem se apropriar de ferramentas de
comunicação, criar veículos independentes e se organizar em rede para
fazer suas próprias vozes serem ouvidas. Isso não está em debate, como
tampouco discute-se aqui a qualidade do Oximity como plataforma de
criação e troca de conteúdo noticioso em diversas línguas. As questões
são: até que ponto Mídia Ninja, leia-se Fora do Eixo, e Oximity pode
ganhar status, fazer banco de dados, ter maior visibilidade e conseguir
financiamento com base na exploração da mão de obra gratuita de
voluntários engajados em determinada causa?
Iniciativas legitimamente ativistas, como o Centro de Mídia Independente (Indymedia),
que nasceu no contexto (e por necessidade) das lutas antiglobalização
no fim dos anos 90, diferem-se de Mídia Ninja e Oximity exatamente nesse
ponto. Ao contrário deles,
o CMI (e tantos outros) foi criado a partir de lutas sociais, de dentro
do movimento conhecido como Ação Global dos Povos (AGP), e não possui ligação com megacapitalistas ávidos por lucro ou governos em busca de conciliações, como no episódio Fora do Eixo/Ninja e a campanha “Existe Amor em SP” ou em embates no Ministério da Cultura (só pra citar dois exemplos). Trata-se de uma rede organizada de forma horizontal e que de fato busca a independência.
Mas
se a plataforma Oximity e o novo Portal Mídia Ninja são totalmente
gratuitos, como os investidores lucram com o negócio? Da mesma forma que
o Facebook quando começou: coleta e venda de dados. É bem simples. Ao
se inscrever no Oximity através de sua conta no Twitter, Facebook ou
Google Plus, o usuário entrega o seu perfil de bandeja. E quem quer
saber se você gosta de reggae, rock ou samba? Se curte homens, mulheres
ou trans? A resposta é: TODAS AS EMPRESAS PRESENTES NA INTERNET. Através
da compra e análise de dados aparentemente supérfluos, empresas podem
orientar melhor suas campanhas digitais. E isso os megainvestidores do
Vale do Silício sabem muito bem e costumam colocar avisos na parte de
Termos e Compromisso — que quase ninguém lê antes de se cadastrar em
plataformas ou baixar aplicativos. Embora Fora do Eixo e Mídia Ninja
tentem pintar a parceria como uma iniciativa ativista e sem interesses
comerciais, o Oximity não é diferente de outras plataformas e traz o
seguinte em seu site:
Não divulgamos informações sobre pessoas identificáveis para os nossos anunciantes, mas podemos fornecer-lhes informações agregadas sobre nossos usuários. Também podemos usar essa informação agregada para ajudar os anunciantes a atingir o tipo de público que deseja atingir. Podemos fazer uso dos dados pessoais que coletamos de você para que possamos atender aos desejos de nossos anunciantes por expor o seu anúncio para que público-alvo.
Além de gerar dados para serem vendidos a
diferentes empresas, o aumento da base de usuários também pode se
converter em dinheiro de outras maneiras. Lembra-se da época em que o
Facebook não pedia grana para bombar posts de fanpages? Ou quando não
haviam anúncios na timeline? Tudo indica que vai acontecer uma
transformação semelhante no Oximity. Como prever? Fácil. A empresa não
esconde a estratégia e diz em seu site:
No momento estamos completamente focados em construir o melhor produto possível, envolver os usuários e aprender com eles para refinar ainda mais o nosso produto. Uma vez que tenhamos isso, e ter uma massa crítica de usuários, vamos começar a apresentar alguns modelos de receita propostos para obter feedback dos nossos usuários.
Ainda no site da empresa, dessa vez na
seção Termos e Compromissos, a Oximity pede plenos poderes sobre os
perfis de seus usuários, podendo, inclusive, alterar os preços das
contas (hoje gratuitas).
Oximity pode mudar as características de qualquer tipo de conta, pode retirar ou introduzir novas funcionalidades, produtos ou tipos de conta a qualquer momento e por qualquer motivo, e pode alterar os preços cobrados por qualquer uma de suas contas ao longo do tempo. Em caso de qualquer aumento no preço ou material redução nas características de qualquer conta para a qual você se inscreveu, essa mudança (s) será comunicada para você e só terá efeito em relação a qualquer renovação ulterior da sua assinatura. Em todos os outros casos, em que Oximity propõe a fazer alterações em qualquer tipo de conta que você se inscrever, e essas mudanças são relevantes e sua desvantagem, Oximity irá notificá-lo sobre as alterações propostas pelo envio de uma mensagem na sua conta Oximity e / ou um e-mail para o endereço de e-mail, em seguida, atual que temos para a sua conta com, pelo menos, 48 horas de antecedência. Você não terá nenhuma obrigação de continuar a utilizar a plataforma depois de qualquer notificação, mas se você não cancelar a sua conta, conforme descrito na seção de Rescisão abaixo, durante esse período de 48 horas, o uso continuado de sua conta após o fim desse período de 48 horas constituirá a sua aceitação das alterações na sua conta.
Talvez Mídia Ninja/Fora do Eixo não
tenham lido atentamente a parte das “perguntas frequentes” ou dos
“termos e compromissos” de cadastro e por isso anunciam a parceria como
uma forma de se livrar da crescente monetarização do Facebook e de
outras plataformas comerciais. Talvez pulem fora quando começar a tal
“geração de receita”. Isso só o futuro vai dizer. Mas uma coisa é certa:
Mídia Ninja/FdE
não dorme no ponto. Se o Oximity quer imitar o Facebook e formar uma
boa base de usuários/produtores de conteúdo antes de lucrar em cima
deles, a Ninja já abriu seu canal de doações e fechou parceria com a
Fundação Ford.
A grana arrecada por crowdfunding
(financiamento coletivo) ou oriunda de outras fontes, no entanto, não
chega nas mãos dos produtores de conteúdo que mantêm vivo o projeto do
Fora do Eixo, famoso por arrecadar verdadeiras fortunas em editais
públicos e criar sua própria moeda: os cubo cards. Se o dinheiro real
que entra para a Mídia Ninja é reinvestido na rede ou vira cubo card
poucos podem responder, já que o balanço com receitas e despesas não é
divulgado no portal.
Já na página em que pede doações,
a Ninja mostra mais uma vez aparente desconhecimento sobre seus novos
parceiros megacapitalistas para justificar o pedido por dinheiro,
contribuindo para a manutenção da cortina de fumaça que nebula as relações de trabalho e exploração presentes na rede.
O debate em torno da economia e financiamento coletivo, bancada pelo próprio público e participantes de projetos, causas e ideias, aponta para um novo horizonte da economia do Comum. Não queremos vender publicidade nem nos atrelar ao mercado, sabemos a importância de inovar e combater os interesses corporativos dentro e fora das redações.
Ao participar de uma plataforma gerida e fundada por Sanjay Goel — ex-banqueiro de Wall Street e especialista
em estruturação de mercados emergentes, trabalho que realizou para
bancos como HSBC e Deutche Bank — e financiada por um barão da mídia
tradicional indiana, o senhor Ronnie Screwvala, a Mídia Ninja contradiz
seu discurso de “não se atrelar ao mercado”. A relação com o mercado
pode não estar escancarada através de venda de espaço para publicidade,
mas é facilmente percebida em qualquer análise grosseira da parceria.
Para Sanjay, Ronnie, Ganesh, Reddi e
Rajaraman, empreendedores em série, o Oximity é mais uma de suas
empresas que pode ser extremamente lucrativa em um mercado emergente, o
de mídias ‘independentes’. Para exemplificar como a relação
investidor-produto é orientada quase que exclusivamente pelo lucro,
depois de vender seu conglomerado de mídia para a Walt Disney, Screwvala
passou a investir no comércio de produtos de fazenda, lingeries, óculos
e outros, seguindo apenas critérios de mercado.
Em sua “venture” com Sanjay, a Oximity, Screwvala divide com Ganesh, Reddi e Rajaraman o título de “investidor anjo”,
nome dado ao financiador que faz grande aporte de dinheiro em uma
empresa recém-criada e assume riscos em troca de compensações futuras. É
aí que a supracitada “economia do Comum” (termo usado pelo Fora do
Eixo) revela a quem está submetida. Aos produtores de conteúdo
sobra apenas o status de ser um colaborador, alguns tapinhas nas costas e
a sensação de dever cumprido. Enquanto isso, os investidores
indianos lucram com a exploração da mão de obra gratuita de coletivos
como a Mídia Ninja, e a alta cúpula do Fora do Eixo ganha em exposição, expande seu mercado cultural e aumenta sua influência e poder de barganha com governos e empresas.
Fazer jornalismo tradicional demanda um
bom volume de dinheiro. É preciso pagar equipamentos e profissionais
qualificados. Já o jornalismo-ninja-streaming baseado em crowdsourcing
é bem mais barato. Sim, você precisa de bons equipamentos e alguns
voluntários que dominem técnicas de comunicação. No entanto, o grosso do
negócio, de acordo com Rafael Vilela, coordenador do lançamento do novo
portal Ninja, é fazer conteúdo de “baixa resolução e alta fidelidade”.
E para isso são necessários apenas smartphones, boa conexão e, o mais
importante, alguém disposto a ir ao local de cobertura e trabalhar de
graça.
Muitas vezes, a cobertura é feita em
zonas de conflito, como manifestações brutalmente reprimidas pela
polícia, oferecendo risco ao ninja que está em campo. Mas tudo bem.
Afinal, vale tudo “pela causa”. O problema é que tem gente capitalizando
em cima do trabalho e “da causa” desse ninja, que vira inocente útil
nas mãos de quem sabe muito bem o que faz. Diferente seria se o fazer
voluntário do repórter não se convertesse no lucro de poucos ou se ao
menos a relação de trabalho fosse clara aos colaboradores da Mídia Ninja
e demais coletivos e escritores do Oximity.
Não caia em ciladas — SIGA O DINHEIRO!
Para evitar ser explorado de maneira
desonesta seja por mídias que se dizem independentes ou por tradicionais
jornalões, basta seguir o caminho do dinheiro. Não muito diferente do
que ocorre em veículos da grande mídia, no caso de Oximity e Ninja,
assim como a produção de conteúdo é feita de baixo pra cima, o fluxo de
capital (real e simbólico) segue a mesma lógica. Na maioria dos veículos
da grande mídia o repórter é superexplorado e censurado, mas sabe muito
bem quem ganha com seu trabalho. Já no caso da Mídia Ninja e Oximity
existe uma cortina de fumaça pseudoativista-altermundista que nebula a
relação entre o trabalho dos ninjas e o lucro real e simbólico dos
investidores indianos e de pessoas bem posicionadas na hierarquia do Fora do Eixo.
Oximity x Ninja: troca-troca sacaninha
Segundo matéria
da Folha de São Paulo, o contrato de um ano entre Oximity e Ninja não
envolve dinheiro, mas um troca-troca entre as partes. Os brasileiros dão
subsídios para o desenvolvimento da plataforma, além de entrarem com
uma base de usuários que se convertem em dados geradores de receita para
a empresa de tecnologia. O Oximity, por sua vez, hospeda o site da
Mídia Ninja em sua plataforma sem cobrar nada. Assim, o que é anunciado
como “lógica solidária de fortalecimento mútuo” não passa da velha
mão-que-lava-a-outra em transações capitalistas, a permuta, ou de troca
de favores e assinaturas entre políticos e empresários.
A semelhança entre Fora do Eixo e os
megainvestidores indianos não para no fato de usarem máscaras
pseudoativistas para esconder interesses políticos e econômicos. Da
mesma forma em que o Fora do Eixo faz uso da estratégia de fundar (e
afundar) centenas de coletivos pra ver qual “vira”, empreendedores em
série, como os indianos, abrem uma empresa atrás da outra com o mesmo
objetivo. Enquanto Screwvala controla fundos capitalistas que investem
em milhares de startups, o Fora do Eixo investe boa parte da receita
ganha com editais e cubo cards na criação de novos coletivos.
Evidentemente, tanto Screwvala e Sanjay quanto a alta cúpula do FdE, que
tem mais de 57 CNPJs
ligados ao seu nome, posam de filantropos e-ou altermundistas
interessados somente em tornar o mundo um lugar melhor. Engraçado é que o
mundo deles funciona sobre as mesmas relações de poder que anunciam querer derrubar. Na dúvida, é só perguntar Cui Bono – A quem interessa?
Fonte: Passa Palavra
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