PICICA: "O Brasil tem hoje 720 mil presos, atrás apenas de China e Estados Unidos. Desse contingente, 210 mil estão acima da lotação dos presídios. 74% dos presos
são homens negros e pobres, entre 18 e 34 anos. Tem ainda 4 mil presos
em hospitais psiquiátricos, em condições piores. Numa grande cidade onde
a execução costuma ser sumária, para muitos chegar ao presídio
significa uma carreira de sucesso. Os presos condenados não votam e não
tem nenhuma forma de representação política."
Laranjas sem cabeça
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O jornalista americano James Foley foi decapitado pelo Estado Islâmico (ISIS), em 19 de agosto deste ano. O vídeo do Youtube correu as mídias internacionais chocando todas as sensibilidades. Cinco dias depois, dois presos foram decapitados durante uma rebelião em Cascavel, no Paraná. Dois presos que não saberemos os nomes, porque nenhum jornal vai noticiar. Aparecem como anônimos. Os triturados cotidianamente pelo sistema penal nunca tiveram nome. Conseguir dar o nome a um deles, chamá-lo de Amarildo, já é uma grande vitória.
O Brasil tem hoje 720 mil presos, atrás apenas de China e Estados Unidos. Desse contingente, 210 mil estão acima da lotação dos presídios. 74% dos presos são homens negros e pobres, entre 18 e 34 anos. Tem ainda 4 mil presos em hospitais psiquiátricos, em condições piores. Numa grande cidade onde a execução costuma ser sumária, para muitos chegar ao presídio significa uma carreira de sucesso. Os presos condenados não votam e não tem nenhuma forma de representação política.
O direito moderno nasceu com os 20 mil decapitados da Place de la Concorde, no verão de 1793. Por aqui, os agentes da lei expuseram em Salvador a cabeça decapitada de Antonio Conselheiro, troféu da república e do republicanismo. Já as cabeças de Lampião e seu bando compuseram um altar macabro da pacificação dos sertões, ainda em 1938, como retratado em foto imortal. Depois, em Aracaju, as cabeças dos cangaceiros foram medidas, pesadas e estudadas pelo Dr. Carlos Menezes e criminalistas, para averiguar a anatomia de um criminoso.
Não são indivíduos maus ou grupos sanguinários que promovem a violência. Ela é sistêmica e estruturante, e orgânica ao funcionamento do estado. A cor no Iraque ou no Paraná é a mesma: os presos vestem laranja. A barbárie não está distante, em lugares exóticos, incitada por extremistas religiosos e guerras santas: está bem mais perto, entranhada naquilo que chamamos, com insuperável idealismo, de estado democrático de direito. A exceção pra muita gente é a regra. Nossos presídios deveriam ser aposentados, convertidos em museus da barbárie.
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Foto: Jairo Filho
Fonte: Quadrado dos Loucos
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