Nota do blog: Com essa postagem homenageio o companheiro Márcio Jordelane, novo presidente da aguerrida e propositiva Associação Chico Inácio - núcleo do Amazonas da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial, eleito no sábado, dia 17 de Outubro, para o biênio 2010-2011.
3 x 4 da Reforma Psiquiátrica
Nos anos 1960, imperava no Brasil a psiquiatria conservadora. Seu legado resiste, ainda hoje, em dar lugar aos serviços que substituem o hospital psiquiátrico. Contra esse modelo obsoleto uma voz rompeu o silêncio: o psiquiatra Luiz Cerqueira. Tive o prazer de conhecê-lo no IV Congresso Brasileiro de Psiquiatria, em Fortaleza-CE, em 1976.
Durante os anos 1970, ensaiamos algumas respostas. Mesmo desarticuladas elas se disseminaram pelo país. Humberto Mendonça, estudante de medicina em Manaus, encarnou esse espírito. Nada sobrou do que documentou com a jornalista Ádria Mendonça sobre os horrores do isolamento a que humanos eram submetidos no Hospital Psiquiátrico Eduardo Ribeiro. O filme foi confiscado pelo mesmo diretor afastado por corrupção no hospício público em 1980.
A vinda de Franco Basaglia ao Brasil em 1978, criador da psiquiatria democrática na Itália, fortaleceu a luta dos trabalhadores de saúde mental contra a indústria da loucura e um parque de 100 mil leitos psiquiátricos. Dez anos depois o movimento radicaliza. A humanização do hospital psiquiátrico fôra assimilada por administrações descomprometidas com o futuro dos “doentes mentais”. Daí a nova bandeira de luta: “Por uma sociedade sem manicômios”. Estávamos em 1987.
Em 1989, a administração de Telma de Souza, do PT, tendo David Capistrano Filho como Secretário Municipal de Saúde de Santos, inicia o desmonte da Clínica Anchieta, inovando ao implantar cinco Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS). Através do conceito de território, um conjunto de equipamentos sociais, culturais e de saúde põe-se a serviço da cidadania e da inclusão social dos “pacientes psiquiátricos”. Conheço remanescentes daquele hospício, que saíram do horror do confinamento para o tratamento em liberdade.
Nos anos 1990 surge um importante protagonista no campo da saúde mental: o agora denominado usuário de saúde mental, conforme decisão num encontro de familiares e usuários do movimento antimanicomial, até então contando com participação majoritária dos técnicos em saúde mental.
Em Manaus, o fotógrafo Nivaldo de Lima, sobrevivente dos horrores dos manicômios de Recife, submetido a 13 eletrochoques, é um desses milhares de brasileiros que não trocam o tratamento em liberdade pela medicalização dos ambulatórios de hospitais psiquiátricos humanizados. O problema é que Manaus só tem um CAPS (criado pelo governo estadual), na zona norte da cidade. Até agora nenhuma administração municipal assumiu a responsabilidade de implantar a rede de Centros de Atenção Psicossocial. Lástima!
Manaus, Setembro de 2009.
Rogelio Casado, especialista em Saúde Mental
Pro-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da UEA
www.rogeliocasado.blogspot.com
Nota do blog: Artigo publicado no caderno Saúde & Bem Estar do jornal Amazonas em Tempo.
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