PICICA: "O abuso de uso da máquina pública faliu o Estado Brasileiro. Há muitos anos, tenta-se restaurar um verdadeiro Estado democrático e cidadão. Este é ainda o maior desafio para a República Brasileira."
Educar para um novo poder
By Antonio Martins – 05/12/2010
Posted in: Capa
Por Marilza de Melo FoucherO poder existe desde que o planeta Terra foi habitado. E é exercido em todos os tipos de organização social, em toda a relação humana. Não existe sociedade sem poder, mesmo nas formas que a antropologia política chama de primitivas. As relações de poder nascem naturalmente dentro de toda sociedade. O poder político vai surgir de modo universal com o nascimento do Estado, e ele terá a responsabilidade de definir as regras sociais que estabelecem as relações entre os concidadãos. Ele repousa na vontade de organizar, proteger e assegurar a vida em sociedade. Anteriormente, o poder pertencia exclusivamente a alguns homens. Com o Estado, nascem as instituições e os regimes políticos modernos que, por princípio, foram criados para por fim ao sistema de poder pessoal.
O poder é uma palavra completamente rebelde para se definir, ela pode se apresentar como um nome comum que se esconde atrás de um nome próprio PODER. O Poder designa uma capacidade de agir direta e indiretamente sobre as coisas ou sobre as pessoas, sobre objetos, sobre as vontades. O Poder de ter a capacidade de fazer alguma coisa, o Poder de como fazer. O filósofo e psicólogo francês Michel Paul Focault, foi quem melhor analisou como os mecanismos de poder operam na sociedade. Sua reflexão sobre o poder vai muito mais além da esfera publica e política, ele aprofunda a discussão sobre o poder em outros âmbitos da vida social, seja na família, na vida de um casal, na relação com os companheiros (as), nos distintos espaços da vida como no trabalho, no partido político, numa organização social, enfim em qualquer espaço de interação sócio-individual. Para resumir, segundo Foucault o poder estar na base de todas as nossas práticas sociais.
O poder não é algo que possuímos, é uma relação entre duas ou mais pessoas. Logo que as relações se estabelecem – por exemplo, entre dois pareceiros – as forças de que cada um dispõe geram um campo de poder, que pode ser exercido por meio do enfrentamento ou do diálogo, criando-se uma correlação de forças. O poder está presente numa multitude de relações microsociais e jamais será exercido sem resistência. Mas o poder obedece também a regras sociais, umas são institucionais outras sócio-culturais e por vezes interiorizadas pelos indivíduos. Daí certos comportamentos podem ser adotados espontaneamente pela sociedade que passa a julgar normal, por exemplo, certo abuso do poder. O Brasil está cheio de exemplos!
O poder político no Brasil
O poder burocrático exercido pela hierarquia é dificilmente assimilado com o poder democratizado, no qual, o cidadão funcionário age em função da igualdade dos direitos e se torna um defensor do bom funcionamento da máquina estatal. Infelizmente, essa concepção de burocracia como forma de poder vai se instalar também em alguns partidos políticos.
O poder na historia política do Brasil vai ser praticado como uma forma de tutela e de favor, sem mediações políticas e sociais. O governante é sempre aquele que detém o poder, o saber sobre a lei e sobre o social, privando os governados dos conhecimentos, criando-se assim uma relação clientelista e de favor.
Essa prática de poder vai contribuir para propagação do vírus da corrupção em todos os níveis de poder. Infelizmente, no imaginário popular o poder político vai ser assimilado como sinônimo de corrupção. O abuso de uso da máquina pública faliu o Estado Brasileiro. Há muitos anos, tenta-se restaurar um verdadeiro Estado democrático e cidadão. Este é ainda o maior desafio para a República Brasileira.
Relação de poder
Conquistamos cidadania civil (direito de votar), mas a cidadania política ainda é restrita. Se ampliarmos os espaços para exercer nossa cidadania, estaremos contribuindo para a emergência de uma sociedade civil mais organizada e combativa. Com isto, teríamos a capacidade de um maior controle social sobre o Estado. Este poder dos cidadãos organizados e legitimamente representados na esfera publica pode ser fértil para o fortalecimento da democracia e quem sabe pode nos educar para mudar nossa relação com o poder e para o seu exercício. Eleger alguém quer dizer exercer um poder de escolher os ocupantes temporários do governo. Entretanto, não devemos esquecer que a democracia é fundada na noção dos direitos entre governados e governantes. Daí a exigência de vigilância do poder político.
O papel preponderante da educação
Vale relembrar o que o filósofo e psicólogo Foucault dizia: “Todo lugar de exercício do poder é ao mesmo tempo um lugar de formação do saber”. A construção do poder democrático e ético no Brasil é um desafio a ser vencido e deveria ser ensinado como educação cívica nas escolas públicas (do ensino fundamental até o ensino médio), para que desde cedo nossos jovens possam aprender o que é o Poder, qual a função do poder político, quais são as qualidades necessárias para o exercício do poder político. Se não somos educados para lidar com o poder, podemos ser facilmente contaminados pelo vírus da corrupção.
Enquanto cidadãos (ãs), devemos guardar a capacidade de nos revoltar, de nos indignar frente ao poder corrompido e às injustiças ligadas ao modo de lidar com o poder. Educar-se para o exercício do poder é uma tarefa prioritária para todos que exercem, na esfera publica ou privada, algum poder. E para o cidadão e cidadã, uma boa formação de educação cívica para entender o poder político e a coisa pública passa a ser urgente e prioritário. Para poder decifrar a realidade em que ele vive, saber exercer seus direitos e cumprir com as obrigações face ao Estado democrático.
A verdadeira revolução é aquela que tem um papel construtivo e educador. As reformas não reformam quando os atores do desenvolvimento não estão preparados ao exercício da cidadania e do poder. Nesse sentido, o futuro governo de Dilma, deveria tirar aprendizado da metodologia de educação popular do saudoso Paulo Freire. A educação popular fornece instrumentos pedagógicos para que seja possível codificar e decodificar a realidade brasileira. A luta contra a exclusão começa quando o excluído vira sujeito-cidadão e acaba participando ativamente no processo coletivo de mudanças.
Fonte: Outras Palavras
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