janeiro 30, 2011

Saúde Mental no Amazonas: avançamos? (II)

PICICA: "Os fundamentos da clínica antimanicomial, por exemplo, tal como proposta por Ana Marta Lobosque e Miriam Abou-Yd, ainda não fazem parte do processo de formação dos trabalhadores de saúde mental no território amazonense." Essa dívida por ser dividida, sem medo de errar, com um dos parceiros da Reforma Psiquiátrica. O Amazonas fez sua parte, no entanto a Coordenação Nacional de Saúde Mental não estendeu seu braço para vincular a Residência Médica em Psiquiatria, que aqui criamos, a uma das nossas mais respeitadas instituições universitárias - no caso o IPUB, doa UFRJ, como era nosso pleito. Entretanto, outros estados com maior densidade política foram contemplados com generoso apoio, como no caso das residências multiprofissionais. O documento enviado pela coordenação estadual sequer teve, para o seu pedido, uma negativa formal. Esse desequilíbrio entre os estados é de tirar sono dos justos.

Saúde Mental no Amazonas: avançamos? (II)

         Acompanhe os comentários do texto escrito, depois de amplo debate público, em 2003, como Introdução à Política Estadual de Saúde Mental do Amazonas, aprovado pelo Conselho Estadual de Saúde, na minha gestão como coordenador do Programa de Saúde Mental (2001-2007).

         “Apesar de revertermos a ideologia do isolamento do doente mental, o novo tipo de contrato com a população atendida, tal como proposta pela Reforma Psiquiátrica brasileira ao assumir o lema “Por uma sociedade sem manicômios”, foi frustrada no Amazonas não mais pela acolhida passiva dos doentes, mas porque o novo papel social dos técnicos em saúde mental foi negligenciado ao deixar de receber investimentos por um outro tipo de formação que os novos tempos continuam requerendo.” (Somente em 2004 e 2005, a Fiocruz ofereceria dois cursos de saúde mental com quarenta vagas cada um, em nível de especialização; e em 2007, a Secretaria Estadual de Saúde criou a residência médica em psiquiatria, com três anos de duração, tendo formado cinco especialistas. Sobre este último, infelizmente ele tem seu campo de prática basicamente no antigo hospício público, correndo o risco de reproduzir o velho modelo manicomial de atenção ao portador de sofrimento psíquico).

         “Os fundamentos da clínica antimanicomial, por exemplo, tal como proposta por Ana Marta Lobosque e Miriam Abou-Yd, ainda não fazem parte do processo de formação dos trabalhadores de saúde mental no território amazonense. Além da agilidade teórica e do delicado manejo da prática proporcionada pela clínica antimanicomial, para o avanço da Reforma Psiquiátrica no Amazonas deve-se agregar a Reabilitação Psicossocial, tal como defende a psiquiatra Ana Maria Fernandes Pitta, que ocupou a Secretaria Nacional para o Brasil da Associação Mundial para Reabilitação Psicossocial, como um programa eticamente responsável, como “uma estratégia, uma vontade política, uma modalidade compreensiva, complexa e delicada de cuidados para pessoas vulneráveis aos modos de sociabilidade habituais que necessitam cuidados igualmente complexos e delicados”.” (Tanto assim que o médico residente encontra dificuldades de adaptação ao novo modelo praticado nos únicos dois centros de atenção psicossocial de Manaus).

         “Nos últimos 16 anos, o Estado do Amazonas – hoje com uma população de 2.961.804 habitantes – não fez nenhum investimento na construção de uma rede de serviços de atenção diária às pessoas com transtorno mental, tampouco os técnicos em saúde mental receberam qualquer tipo de capacitação que os habilitassem a atuar nos serviços substitutivos à dobradinha hospital psiquiátrico-ambulatório, conforme definem as portarias ministeriais desde o início dos anos 90. Serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico inexistem em todo o Estado do Amazonas.” (Salvo em Manaus, onde fora implantados dois CAPS, um em 2006 e outro em 2010, no interior do estado apenas cinco municípios cumpriram suas obrigações: Parintins, Tefé, Iranduba, Rio Preto da Eva e Manicoré. É pouco. O texto, portanto, expressa a inquietação reinante no setor até o ano de 2003, quando foi iniciada a retomada da reforma psiquiátrica entre nós, amazonenses). 

Manaus, Dezembro de 2010.
Rogelio Casado, especialista em Saúde Mental


PICICA: Artigo publicado no caderno Saúde & Bem Estar, do jornal Amazonas em Tempo.

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