janeiro 16, 2011

Saúde Mental no Amazonas: avançamos? (I)

PICICA: O artigo abaixo foi publicado na edição de hoje do jornal Amazonas em Tempo. Face à alteração provocada por um corte no início do texto, o que prejudica a compreensão da intenção do autor, resolvi postá-lo, com a esperança que o leitor do jornal, que boiou sem querer, possa vir a lê-lo tal como ele foi concebido.

Saúde Mental no Amazonas: avançamos? (I)

         Comparada à última década do século XX, sim, porém timidamente. Acompanhe o texto que escrevi, depois de amplo debate público, em 2003, como Introdução à Política Estadual de Saúde Mental do Amazonas, aprovado pelo Conselho Estadual de Saúde, na minha gestão como coordenador do Programa de Saúde Mental (2001-2007). Entre parênteses, os comentários sobre os modestos avanços.

                   “Até a presente data, reproduzindo tendência de muitas partes do mundo, os transtornos mentais não tiveram a mesma importância dada à saúde física no Estado do Amazonas. Programas de saúde mental são ignorados em todos os 62 municípios amazonenses. (Atualmente existe um Centro de Atenção Psicossocial – CAPS nos seguintes municípios: Parintins, Tefé, Manacapuru, Iranduba, Rio Preto da Eva e Manaus. Os três primeiros integram os 14 municípios-polo de saúde; dos três últimos, apenas a capital é município-sede, que está defasado quanto a quantidade de CAPS necessários ao atendimento das demandas de cerca de 2 milhões de habitantes).

         Com a primeira fase da Reforma Psiquiátrica amazonense, construída a partir do início de 1980, o primeiro Programa Estadual de Saúde Mental, só surgiria na segunda metade dos anos 80 do século XX, ficando circunscrito ao município de Manaus, onde estão situados os parcos serviços de saúde pública para patologias mentais. (Até o final do século XX, essa era a realidade do Estado, que perdeu o compasso da Reforma Psiquiátrica depois de ter sido o estado brasileiro pioneiro em seus primeiros passos).

         Ainda hoje, pessoas com transtorno mental têm como referência, no âmbito do SUS, os seguintes serviços: o Centro Psiquiátrico Eduardo Ribeiro, fundado em 1896, com 120 leitos, que dispõe de um serviço de emergência, criado em 1985, para internações de pessoas em crise aguda, que não excede 72 horas, onde são realizados mais de 800 atendimentos por mês, e um ambulatório onde circulam, mensalmente, cerca de 1400 pessoas; além desses serviços, a cidade de Manaus tem um ambulatório de especialidades – entre elas, saúde mental – que recebe mais de 1500 pessoas para tratamento de transtornos mentais. Em ambos os serviços ambulatoriais há filas de espera. (Sabidamente, cabe ao Município, após a municipalização da saúde em 2004, a oferta de serviços que substituam o hospício; no entanto, a existência de apenas dois CAPS, deixa de fora da assistência os populosos bairros da zona oeste e leste da cidade; sem contar que o CAPS da zona norte não consegue dar contar de toda a demanda de adultos portadores de transtorno mental grave e persistente; portanto, estão fora da política pública de saúde mental, as crianças autistas e psicóticas, os abusadores de álcool e outras drogas. O Município anuncia para este ano um CAPS para crianças e jovens, e o Estado, um Centro de Reabilitação para Usuários de Drogas).

         Embora a Reforma Psiquiátrica amazonense tenha impedido a criação de novos leitos psiquiátricos, invertendo a relação internação psiquiátrica / exclusão social, com a despolitização do social no decorrer dos anos 90, acabou-se por institucionalizar um modelo fortemente hospitalocêntrico: por um lado, mantinha-se o controle das internações desnecessárias através de um serviço de emergência – recurso assistencial nascido para combater as deformações da psiquiatria privada; e, por outro lado, a ingênua eficiência do “bom” ambulatório, cujo potencial iatrogênico acaba encoberto pela via da oferta de benefícios. Essas novas formas de controle técnico-administrativo tiveram como seus críticos, entre outros, o psicanalista Benilton Bezerra e o psiquiatra Pedro Gabriel Delgado. (Em Manaus temos um modelo híbrido, não desejável: CAPS convivem com o único hospício da cidade, cujo processo de desmonte tarda no Amazonas)". 

Manaus, Dezembro de 2010.
Rogelio Casado, especialista em Saúde Mental

PICICA: Artigo publicado no caderno Saude & Bem estar, do jornal Amazonas em Tempo.

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