fevereiro 19, 2016

Asas do Desejo e a pergunta que o ser humano carrega. Por Anna Lucchese (OBVIOUS)

PICICA: "O filme Asas do Desejo de Wim Wenders mostra a busca de um anjo pela experiência de uma existência completa que acaba revelando a descoberta da paixão. O que leva o ser humano a apaixonar-se por uma pessoa e não por outra?" 


Asas do Desejo e a pergunta que o ser humano carrega


O filme Asas do Desejo de Wim Wenders mostra a busca de um anjo pela experiência de uma existência completa que acaba revelando a descoberta da paixão. O que leva o ser humano a apaixonar-se por uma pessoa e não por outra?

trapezista_asas.jpg ilustração de lecamaria

O que o ser humano busca na pessoa amada? Como acontece essa decisão do amor? A paixão vem daquele que ama e não do outro. O desejo é uma resposta à pergunta que cada pessoa carrega consigo.

No filme "Asas do Desejo", de Wim Wenders, um anjo vaga pelas ruas de Berlim ouvindo os pensamentos dos mortais. Os dias seguem com um ritmo monótono enquanto ele contempla a vida dos outros, até o momento em que se depara com a trapezista.

Ela voa sob o picadeiro com os braços abertos e o cabelo solto navegando pelo ar.

O filme, até então em branco e preto, ganha cor. Ela é a imagem do desejo e a resposta para a pergunta daquele que a observa.

De uma conversa entre ele e outro anjo, dentro de uma concessionária de carros, entendemos essa busca: "É ótimo ser espírito e testemunhar por toda a eternidade apenas o lado espiritual das pessoas. Mas, às vezes, me canso dessa existência espiritual. Não quero pairar para sempre. Quero sentir um certo peso que ponha fim à falta de limite e me prenda ao chão. Eu gostaria de poder dizer 'agora' a cada passo, cada rajada de vento. 'Agora' e 'agora' e não mais 'para sempre' e 'eternamente'. Ser selvagem.

A paixão é o 'agora'. Nada é mais importante. Ninguém responde à grande pergunta existencial como aquela projeção que vemos encarnada no outro, aquele que personifica o objeto do desejo.
Enquanto ele a observa, a trapezista pensa: "É isso que me deixa atrapalhada. A ausência do desejo. Desejo de amar." Mortal e anjo aqui se conectam através da mesma angústia. A paixão nasce dessa conexão. É a resposta aquilo que procuram.

O filme utiliza muitas falas reflexivas para descrever com palavras o que os personagens estão passando e como eles vêm esse processo do encontro.

Na vida real, a coisa não seria tão didática assim. É difícil explicar a conexão entre duas pessoas. Será que foi algo que ele disse? O olhar dela em silêncio? Quando sorriu pela primeira vez em um momento simples, como se tivesse desabrochado de repente, como se pairasse no ar em cima de um trapézio?

Esses pequenos detalhes encontrados no outro e potencializados pela imaginação, de alguma forma, respondem às questões que o ser humano carrega em silêncio pelo espaço e tempo de sua existência.

O filme tenta analisar de forma poética e filosófica os caminhos que envolvem esse mistério. Ele coloca a paixão como o resultado de uma decisão interna, de um encontro maior que uma pessoa tem consigo mesmo para que possa aceitar o desejo.

A trapezista declara seus sentimentos com as seguintes constatações: "Solidão significa o seguinte: finalmente estou inteira." (...) "Não sei se existe destino, mas existe decisão." (...) "Nós agora somos o tempo." (...) "Estou pronta."

No momento do encontro, mais do que aquilo que cada um viu no outro, está claro o que ambos encontraram em si até aquele instante.

Ela diz que eles agora representam todas as pessoas que querem o mesmo e completa: "O jogo está nas suas mãos. Agora ou nunca."

Sem essa decisão a paixão não acontece. É preciso mergulhar nas dores da mortalidade para que o desejo seja encontrado no mar profundo da própria existência.

O anjo aceita a pergunta que carrega consigo e embarca nesse novo mundo de sensações. Unido à trapezista por um pano que dá forma e ritmo aos movimentos dela no ar, conclui: "Quem era quem? Eu estava nela e ela ao redor de mim. Quem no mundo pode afirmar que alguma vez esteve unido a um outro ser humano?"

Quem no mundo pode afirmar que permitiu-se estar unido a um outro ser humano? Quem no mundo encontro em si a pergunta fundamental de sua existência? Aquela pergunta que liberta o desejo dos dias sem cor.



Anna Lucchese

Se me perguntar que palavra me explica melhor, direi "rio".

Fonte: OBVIOUS

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