PICICA: "Privatizações. Código de Mineração devastador. Lei
“antiterror”. Maioridade penal. Saiba o que parlamentares querem impor à
sociedade este ano – para resistir melhor"
Congresso: a agenda dos horrores voltou
Privatizações. Código de Mineração devastador. Lei
“antiterror”. Maioridade penal. Saiba o que parlamentares querem impor à
sociedade este ano – para resistir melhor
Inicia-se a sessão legislativa de 2016. Neste primeiro CEN do ano,
apresentamos um olhar sobre o legado da atividade legislativa de 2015.
Dada a composição conservadora do Congresso resultante das últimas
eleições, era de se esperar que no ano passado os direitos sociais e de
minorias sofressem vários retrocessos. Contudo, o cenário legislativo
não apresentou tantos resultados conservadores quanto se havia imaginado
inicialmente. De modo geral, as pautas contra direitos avançaram, mas
não chegaram à aprovação final.
O financiamento empresarial de campanhas é um caso à parte. Apesar das intensas manobras de Eduardo Cunha para constitucionalizar a prática, o STF julgou inconstitucional esse tipo de doação, por entender que a soberania política pertence ao povo — aos indivíduos, cidadãos — e não às empresas. O Congresso ainda aprovou lei posterior prevendo a possibilidade desta prática, mas ela foi vetada por Dilma. Assim, as eleições de 2016 serão um marco histórico, pois os candidatos não contarão com recursos de pessoas jurídicas.
A maior parte das pautas conservadoras ainda tramita. Foram aprovados nas comissões, mas ainda estão pendentes de deliberação pelo Plenário da Câmara, o Estatuto da Família, o PL 5069, de autoria de Eduardo Cunha que tipifica como crime contra a vida o anúncio de meio abortivo e prevê penas específicas para quem induz a gestante à prática de aborto, a revogação do Estatuto do Desarmamento, a PEC 215, que retira do Executivo a exclusividade de demarcar terras indígenas, e a PEC 99, que estende a associações religiosas o poder de propor ações de inconstitucionalidade e ações declaratórias de constitucionalidade ao Supremo Tribunal Federal. Foram aprovadas pela Câmara, mas ainda estão paradas no Senado, a redução da maioridade penal, a terceirização das atividades fim e a restrição da rotulagem de transgênicos. A proposição que está mais próxima de ser aprovada, dependendo só da última palavra da Câmara, é a Lei Antiterrorismo, de iniciativa do Executivo, patrocinada sobretudo pelo ex-Ministro Joaquim Levy e pelo Ministro José Eduardo Cardozo.
Portanto, ao lado da disputa sobre o impeachment e sobre a permanência de Eduardo Cunha como Presidente da Câmara, esses projetos ainda tramitando significam que o ano legislativo de 2016 promete ser intenso. A seguir, notas sobre algumas das principais pautas.
ESTATUTO DA FAMÍLIA
Foi aprovada por Comissão Especial — composta principalmente por
deputados evangélicos e católicos carismáticos — a proposta que retira
os casais homoafetivos do conceito de família. O PL iria direto ao
Senado não fosse recurso interposto pela Deputada Érika Kokay (PT-DF) e
pelo Deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ). O Estatuto seguiu para apreciação
pelo Plenário da Câmara.
A CCJC da Câmara aprovou o projeto de autoria do Deputado Eduardo
Cunha que altera regras sobre o tratamento legal dado a casos de aborto.
O texto aprovado criminaliza quem instiga ao aborto ou quem preste
qualquer auxílio ou até mesmo orientação a mulheres para interrupção da
gravidez. No caso de estupro o aborto só será permitido com exame de
corpo delito. O projeto ainda prevê que “nenhum profissional de saúde ou
instituição, em nenhum caso, poderá ser obrigado a aconselhar, receitar
ou administrar procedimento ou medicamento que considere abortivo”. Ou
seja, o profissional de saúde não é obrigado a dar as devidas
orientações para uma vítima caso ele ou ela considere que pílula do dia
seguinte é abortiva ou que aborto em caso de estupro não é adequado. A
proposta seguiu para apreciação pelo Plenário da Câmara. Na resistência,
destaque para atuação das Deputadas Érika Kokay (PT-DF) e Maria do
Rosário (PT-RS).
Comissão especial aprovou o que significa na prática a revogação do
Estatuto do Desarmamento. O porte de armas, hoje restrito a policiais e
determinadas autoridades como juízes, poderá ser conferido a qualquer
pessoa com requisitos mínimos. O projeto seguiu para apreciação pelo
Plenário da Câmara. Destaque para a atuação dos Deputados Alessandro
Molon (REDE-RJ) e Ivan Valente (PSOL-RJ) na oposição ao projeto.
Depois de 15 anos tramitando na Câmara, a bancada ruralista
conseguiu aprovar na comissão especial a PEC 215. Inicialmente a PEC
previa simplesmente a competência do legislativo para demarcar terras — o
que já impossibilitaria, na prática, futuras demarcações. A versão
aprovada é ainda pior. Transforma as terras tradicionais em equivalentes
a outra propriedade rural: podem ser arrendadas, divididas e permutadas
e ainda receber empreendimentos econômicos. Isso permite a investida de
empreendimentos econômicos sobre terras indígenas homologadas, acabando
com a noção de tradicionalidade. A PEC estende o “marco temporal”
(necessidade de os indígenas estarem sobre a terra tradicional em
outubro de 1988) também às comunidades quilombolas. Ou seja, é danosa
também para esses povos tradicionais. A PEC seguiu para apreciação pelo
Plenário da Câmara.
RELIGIÃO – PEC 99
Foi aprovada por comissão especial a proposta que diz que as
associações religiosas podem ajuizar ações de inconstitucionalidade
perante o STF — hoje são legitimadas autoridades públicas e entidades
representativas como sindicatos. O autor da proposta é o Deputado João
Campos (PSDB-GO), da bancada evangélica, e o relator é o Deputado
Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), católico. A PEC agora precisa ser
apreciada pelo Plenário da Câmara.
A proposta, de autoria do Executivo, cria o crime de terrorismo
no Brasil. Ela está trancando a pauta do Plenário da Câmara (é o quinto
item), que decidirá qual texto prevalece: o do Senado ou o aprovado
pelos Deputados. Dos 193 países da ONU só 18 tipificaram o terrorismo —
todos vítimas de algum ataque. A maioria dos países tem instrumentos
legais para combater o financiamento das organizações internacionais,
mecanismos que o Brasil já tem previstos na Lei de Organizações
Criminosas. Noventa entidades da sociedade civil apresentaram manifesto
contra a tipificação do terrorismo. O Conselho Nacional de Direitos
Humanos aprovou Resolução sobre o tema, pedindo que o projeto fosse
arquivado. Quatro relatores especiais da ONU também expressaram
preocupação quanto ao projeto de lei brasileiro. O Senador Lindbergh
Farias (PT-RJ) e os Deputados Wadih Damous (PT-RJ) e Paulo Pimenta
(PT-RS) têm se manifestado contra a proposta.
O Código de Mineração é objeto de questionamento de movimentos
sociais — cujos ativistas chegaram a ser presos por dias por se
manifestarem contra ele na Câmara. O Presidente Deputado Eduardo Cunha
chegou a anunciar que colocaria em pauta a proposta, que ainda não
passou pela comissão especial, mas que pode chegar ao Plenário pelo
atalho do regime de urgência. O projeto vai ao sentido contrário das
necessidades indicadas pelo desastre de Mariana. Na opinião dos
movimentos sociais ligados à temática, o código antes incentiva que
regula a mineração.
AUTOS DE RESISTÊNCIA
O projeto, que obriga a investigação de mortes causadas por
policiais — hoje rotuladas na maioria das vezes como decorrentes de
resistência da vítima — está pronto para ser votado pelo Plenário da
Câmara desde 2014. (Já o projeto que previa a transformação do homicídio
de policiais em crimes hediondos transformou-se em Lei em 2015.)
REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
Depois de acirradíssimo embate, foi aprovada pelo Plenário da
Câmara a redução da maioridade penal, de 18 para 16 anos, nos casos de
crimes hediondos (como latrocínio e estupro), homicídio doloso e lesão
corporal seguida de morte. O resultado foi produto de uma negociação.
Havia os que defendiam o fim de qualquer idade penal, até os que eram
contra qualquer mudança na Constituição. As bancadas evangélica e da
segurança pública foram protagonistas na proposta de redução. A PEC,
apresentada em 1993, seguiu para o Senado.
A Câmara aprovou a flexibilização da lei trabalhista. O projeto
permite a terceirização das atividades-fim, e não apenas limpeza,
segurança e outras atividades-meio, como atualmente. O PL seguiu ao
Senado. É a maior investida da história contra o legado varguista. PT e
PC do B lideraram as principais críticas ao projeto.
A Câmara aprovou o fim da exigência do símbolo “T” nos produtos que
contém transgênicos. O autor do PL, Luiz Carlos Heinze (PP-RS), é o
mesmo que declarou que “quilombolas, índios, gays, lésbicas” são “tudo
que não presta”. Na resistência ao projeto, parlamentares como o
deputado Padre João (PT-MG) e Sarney Filho (PV-MS). A proposta seguiu
para o Senado.
O Plenário do Senado chegou a aprovar regime de urgência para o
projeto que regulamenta a emenda constitucional do trabalho escravo. A
nova regulamentação proposta é vista como retrocesso pelos órgãos que
lutam contra o trabalho escravo, pois inviabiliza a atuação dos fiscais
do Ministério Público do Trabalho no combate ao crime. Mas, após
audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação
Participativa, a proposta voltou à Comissão de Constituição e Justiça do
Senado para ser debatida de modo mais aprofundado.
Está pendente de deliberação a apreciação a PEC de autoria do
Deputado Dirceu Sperafico (PP-PR), que pretende autorizar o trabalho a
partir dos 14 anos (hoje a idade mínima é 16). Os parlamentares Maria do
Rosário (PT-RS), Glauber Braga (PSOL-RJ) e Chico Alencar (PSOL-RJ)
destacam-se na resistência à proposta.
Depende de deliberação do Plenário do Senado proposta do Senador
José Serra (PSDB-SP) que acaba com a obrigatoriedade de que Petrobrás
atue com participação mínima de 30% nas operações do pré-sal. Também
está na ordem do dia do Senado o projeto de “responsabilidade das
estatais” (que faz parte da Agenda Brasil de Renan Calheiros). Pela
proposta, empresas públicas como a Caixa podem ter parte de seu capital
vendido e se transformar em sociedades de economia mista.
Em sua oitava sessão, o Conselho de Ética pôde finalmente votar a
admissibilidade da representação contra Eduardo Cunha, promovida por
REDE e PSOL e apoiada por deputados do PT, PC do B e outros. Cunha se
recusou a receber, no dia marcado, a notificação da admissibilidade. Ele
ainda recorreu à CCJ, para anulação de todo o processo desde a escolha
do relator. O Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, pediu o
afastamento de Eduardo Cunha do cargo de Presidente da Câmara — com
argumentos que poderiam inclusive justificar sua prisão, diante da
novíssima jurisprudência segundo a qual parlamentares podem ser presos
preventivamente. O Supremo deve julgar seu afastamento ainda em
fevereiro.
IMPEACHMENT
O imbróglio segue, mesmo após a decisão do STF que derrubou o rito
estabelecido por Eduardo Cunha para o processo do impeachment.
A Câmara apresentou ontem (01/02) recurso contra a decisão do Supremo, questionando a proibição de chapa avulsa e de votação secreta para eleição de comissão especial e os outros pontos do julgamento. Segundo anunciou Eduardo Cunha à imprensa, não ocorrerá eleição de nenhuma comissão permanente da Câmara até que o STF esclareça sua decisão.
O relator das contas de 2014 na Comissão Mista de Orçamento (CMO),
Senador Acir Gurgacz (PDT-RO), apresentou parecer pela aprovação com
ressalva. O TCU havia recomendado rejeição. As contas do exercício de
2014 são o principal fundamento de mérito do impeachment.
Redação
Fonte: OUTRAS MÍDIAS
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