junho 14, 2009

Editorial de O Globo faz terrorismo com a Reforma Psiquiátrica brasileira

Foto: Nivya Valente - Manifestação contra o hospital psiquiátrico - Manaus-Am, 18 de maio de 2007
Nota do blog: Se alguém tinha dúvida, o editorial do jornal O Globo ao condenar a Reforma Psiquiátrica brasileira confirma o que os militantes da luta por uma sociedade sem manicômios denunciam em suas listas de discussão na net: a Associação Brasileira de Psiquiatria - ABP é a principal interessada na persistente campanha contra a Reforma Psiquiátrica, iniciada em julho de 2006, no mesmo jornal, através de um artigo do presidente da entidade à epoca. Em todos os veículos utilizados pela ABP a mensagem é a mesma: a reforma produz desassistência e morte. Para N.A., militante em defesa da reforma psiquiátrica, a ABP parou de ser queixosa e partiu para uma estratégia de guerra contra a reforma, junto à midia, à sociedade e ao parlamento, numa ação profissional para a qual contratou técnicos especialistas para tal fim. Para N.A., o editorial terrorista afirma que 16, 5 milhões de pessoas precisam de internação. Com que dados se faz essa afirmação? Que página do Manual de Redação dá sustenção para afirmar que fechar os hospitais psiquiátricos é optar pela contramão? A partir de que referências, cara-pálida? Como se pode afirmar que os estratos mais baixos da sociedade vivem um drama, se são justamente os Centros de Atenção Psicossocial que, no Sistema Único de Saúde - SUS, atendem as classes de baixa renda? E o que significa essa pérola: aumentar o contencioso dos serviços públicos de saúde? Com essas indagações, N.A. afirma categoricamente que esse texto cifrado só pode ter sido encomendado pela ABP, única instituição a ser citada no Editorial. Pelo andar da carruagem, já era tempo dos Conselhos Profissionais se manifestarem. Alô, alô!!! Alguém na escuta? E a militância, quando é que vai ocupar os espaços públicos? É hora de ir pra rua!

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Editorial O Globo 13 de junho de 2009

O número de mortes de doentes mentais cresceu 41% no país nos últimos anos. No mesmo período, um quarto dos leitos psiquiátricos foi fechado, sem uma contrapartida de criação de serviços de atendimento alternativos. São dados de um preocupante indicador: à desativação de leitos e à política antimanicomial em curso — fruto de distorcida visão segundo a qual, grosso modo, deve-se acabar com a internação em hospitais psiquiátricos — não sobreveio um programa para dotar os serviços de saúde mental de condições de dar conta das demandas.

Em decorrência, vive-se um quadro dramático. Nos últimos 20 anos, o governo brasileiro fechou 70% dos leitos psiquiátricos, gerando uma economia nos gastos com a manutenção desse tipo de serviço que não se reverteu no atendimento a doentes mentais. Um estudo da Associação Brasileira de Psiquiatria aponta que, neste período, houve corte de dois terços da verba para a área, e o investimento, que era de 5,8% do orçamento do Ministério da Saúde em 1995, caiu para 2,3%, em média, nesta década.

O resultado é palpável: o país, com 16,5 milhões de doentes que precisam de internação, em vez de investir na criação de leitos e vagas na rede de saúde, optou pela contramão, ao fechar hospitais psiquiátricos. O drama, evidentemente, é potencializado nos estratos mais baixos da sociedade, que não dispõem de recursos para cuidar dos seus doentes em casa ou em clínicas especializadas.

Quem lida no dia a dia com as dificuldades de conviver com um parente que sofre de problemas mentais tem a dimensão do problema — que, expresso pelo arrolamento de números frios, se torna visível nas ruas. Incontáveis famílias, sem condições econômicas de manter seus doentes, sem ter como tratá-los e sem opções de internação, optam por abandoná-los à sorte, o que, não raro, equivale a uma condenação à morte.

Acabar com o atendimento psiquiátrico fechado pode ser um objetivo desejável. Mas isso não se faz voltando as costas para a realidade do país, da qual salta um quadro aterrador, a ser enfrentado com uma política de saúde mental responsável, em condições de fazer frente a um problema que leva o drama dos doentes psiquiátricos para o interior de milhões de famílias. Aumentar o contencioso dos serviços públicos de saúde, com o fechamento de hospitais psiquiátricos em vez de abrir novas unidades, é medida que atende a opções ideológicas, mas passa ao largo da solução do problema.
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