dezembro 30, 2009

CAPS vs. Hospício (II)

Mapa dos serviços de sáude mental da cidade de Manaus
Nota do blog: Há 7 anos ininterruptos colaboro com o jornal Amazonas em Tempo escrevendo sobre o espinhoso tema reforma psiquiátrica e saúde mental. Na verdade, não tão ininterruptamente assim. Neste ano que está findando, lá no seu comecinho, fiquei mais de um mes sem publicação dos meus artigos. Transmiti para a editoria do caderno a perplexidade dos meus leitores (diferentemente de Márcio Souza que diz ser lido, em A Crítica, por apenas sete leitores, só o pessoal de casa ultrapassa esse montante). Desculpas à parte, o fato voltou a se repetir. Pedi novos esclarecimentos. Obtive como resposta a mudança de publicação dos artigos: de semanal para quinzenal. Para quem já escreveu mais de 4 mil caracteres com espaço, foi reduzido a 1500, passou para 2500, e é capaz de escrever se lhe for dado apenas 100 palavrinhas, habituado a fazer samba com uma nota só, as variações sempre foram bem recebidas, afinal o jornal tem sua política de editoria. Duro é ficar na dependência dos humores da editoria. O artigo abaixo, por exemplo, deveria ter saído no domingo retrasado. Como ando tão atarefado, sem tempo nem pra ler jornal, só ontem soube que ele não havia sido publicado, depois de ter enviado o CAPS vs. Hospício (III), que deve ser publicado no primeiro domingo de 2010. Por respeito aos meus leitores (mais de sete), publico o CAPS vs. Hospício (II), pois que se trata de uma sequência cuja alteração da ordem dos tratores altera a estrada da compreensão do que estou a comunicar. Se resolvermos essa questão ética, estou certo de que o caráter didático dessa comunicação será preservado. Aproveito o ensejo para manifestar minha gratidão ao jornal Amazonas em Tempo pelo único espaço a divulgar a experiência de trinta anos de compromissos com a sociedade amazonense e de leitura crítica da cultura institucional e dos movimentos sociais do meu estado, fiel ao propósito de transformar informação em conhecimento.

CAPS vs. Hospício (II)

Estamos traçando um paralelo entre dois modelos de saúde mental com diferentes dimensões político-ideológicas. Semana retrasada foi a vez do modelo manicomial, cuja referência é o hospício. Hoje é a do modelo psicossocial, que tem no CAPS – Centro de Atenção Psicossocial – um dos seus dispositivos (além dos Centros de Convivência, Serviços Residenciais Terapêuticos, leitos psiquiátricos em hospitais gerais, cooperativas sociais).

Antes, um lembrete: falar em novo paradigma em saúde mental é reconhecer que entre seus componentes estão novas formas de divisão de trabalho, novos dispositivos institucionais, novos modos de relacionamento entre os usuários dos serviços com a população, e que são outras as implicações éticas das novas práticas em termos jurídicos, teórico-técnicos e ideológicos. Valho-me das afirmações abaixo, do professor e psicanalista Abílio da Costa-Rosa, para dizer que sem elas não há radicalidade na mudança de modelo.

O modelo psicossocial tem entre seus objetos e meios de trabalho as psicoterapias, laborterapias, socioterapias e um conjunto de dispositivos de reintegração social, com ênfase nas cooperativas de trabalho, além da medicação.

É decisiva a participação do sujeito no tratamento, consideradas suas peculiaridades individuais e socioculturais.

Assume capital importância a relação do indivíduo com seu grupo social e familiar. Ambos são trabalhados como agentes das mudanças que se pretende.

Dado que o indivíduo não é único problemático, a família é incluída no tratamento.

Vale lembrar que a loucura não é um fenômeno exclusivamente individual, mas social, ainda que nossa cultura o negue.

É a participação da família e dos grupos sociais referidos ao usuário, sob as mais variadas formas, quem supera as posturas assistencial e orientadora do modelo manicomial. As próprias associações de usuários, surgidas sob inspiração do modelo psicossocial, tem papel ativo no tratamento, sobretudo na inclusão social dos usuários dos serviços.

O contexto social assume uma importância fundamental na medida em que é no espaço social que se praticam as mudanças desejadas na relação sociedade e loucura.

A loucura e o sofrimento psíquico não precisam mais ser removidos a qualquer preço. Ambos passam a ser reintegrados como parte da existência e, portanto, considerados como um patrimônio inalienável dos sujeitos e da humanidade.

No modelo psicossocial, os conflitos são considerados constitutivos e designam o posicionamento do sujeito e o lugar do homem na sociedade e na cultura.

Tem mais no próximo artigo.

Manaus, Dezembro de 2009.
Rogelio Casado, especialista em Saúde Mental
Pro-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da UEA
www.rogeliocasado.blogspot.com

Nota do blog: Artigo que deveria ter sido publicado, duas semanas passadas, no Caderno Saúde & Bem Estar do jornal Amazonas em Tempo.
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