dezembro 14, 2009

Latinoamericano... pero no mucho

Latinoamericano... pero no mucho
Foto: Rogelio Casado - Manaus-Amazonas-Brasil, 2008

TAQUI PRA TI
SOY LATINOAMERICANO
José Ribamar Bessa Freire
13/12/2009 - Diário do Amazonas

O tema era a solidariedade entre os povos da América. O lugar: o Teatro Banzeiros, em Porto Velho (RO), lotado por universitários, professores, ambientalistas, gente da comunidade e, sobretudo, estudantes secundaristas. Os debatedores: o poeta Thiago de Mello, o engenheiro florestal peruano Jhon Yuri e esse locutor que vos fala, os três participantes de uma mesa coordenada anteontem pelo historiador Marco Teixeira, autor de pesquisas sobre os quilombolas.

Pensei em fazer um discurso paletó-e-gravata, com direito à definição prévia do conceito de solidariedade. Ainda bem que desisti. Ninguém deu conferência. O tom foi coloquial, de bate-papo, quase saudosista. Aproveitamos para jogar conversa fora diante de uma platéia que reverenciou o poeta da floresta, o grande homenageado. Lembrei que foi com ele, Thiago, que aprendi a conhecer e a amar a América Latina, depois de juntos atravessarmos a pé a fronteira do Uruguai, em 1969, fugindo da polícia.

Parei por aqui; se você quiser leia mais em TAQUIPRATI.

Nota do blog: O cavalheiro que escreveu a crônica acima é latinoamerico acima de qualquer suspeita. Já o poeta mencionado, tenho cá minhas dúvidas (eu e a torcida do América), sobretudo quando o assunto é so-li-da-ri-e-da-de. Há algum tempo atrás Ana Maria Miranda, nas páginas de Caros Amigos, perguntava pela criatura. Tive ganas em dizê-lo. Mas agora que o cavalheiro de triste figura pega carona nas asas do texto do meu considerado José Ribamar Bessa Freire, lembro um episódio de dessolidariedade, ocorrido lá pelo final dos anos 1970, que a mim pareceu melhor, a partir dali, separar o homem da obra. Vivia-se o clima de luta pela anistia em todo o país. Grandes expectativas tomavam conta de toda a América Latina. Afinal estávamos diante de um fato político extraordinário. Exilados políticos retornavam ao Brasil, depois de longos e amargos anos vivendo fora da sua pátria. Em Manaus, universitários sob a liderança de José Carlos Sardinha empunhavam a bandeira com galhardia. Foi então que tiveram a idéia de buscar apoio na figura quase mítica do poeta. Quem disse que ele aceitou a honraria errou feio. Também! Que motivações teria nosso personagem a fazê-lo, afora escrever poesias de forte apelo político? Quem disse que ele precisava acreditar no que escrevia? Ora, cada um tem o direito de declinar missões que não lhes toca o coração e a mente. Há homens que vivem de imagens. Entre elas, algumas pra lá de surradas. Como decifrar esse enigma? Teria o poeta Manuel Bandeira em sua aguda percepção vislumbrado o que os mortais comuns demoram a reconhecer:

Thiago de Mello, cuidado!
Poupa o teu novo sorriso.
Não o dês (nem é preciso)
Ao amigo refalsado,
Ao crítico canastrão,
Ao político safado,
À mulher sem coração!
Não o dês, nem é decente
À direita e à esquerda, a tantas
Inúteis coisas e gente:
A fariseus faroleiros,
A cachordas sicofantas,
Brasileiros, estrangeiros!
Adverte, em teus desenganos,
Que vale vinte e três anos,
Mil e oitocentos cruzeiros!

Manuel Bandeira
Poesia Completa e Prosa, p. 328
4a. Edição, 1990
Editora Nova Aguilar - RJ
Relendo os Estatutos do Homem, vejo que poderiam ser acrescentados alguns versos (atrevo-me):

"Fica combinado que a solidariedade não brota de decretos.
Ela nasce do coração do homem
em qualquer latitude do planeta,
sob pena de se perder a alegria de viver".
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