fevereiro 05, 2010

Xingu Vivo para Sempre

Nota de desagravo do Movimento Xingu Vivo ao Ministério Público Federal

O Movimento Xingu Vivo para Sempre - Comitê Metropolitano, fórum composto por mais de 20 entidades, entre organizações e movimentos sociais, vem a público apresentar desagravo em favor do Ministério Público Federal (MPF) no Pará, agravado de forma injusta e ameaçadora pela Advocacia-Geral da União (AGU), no que se refere à atuação do MPF no caso da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará.

Sabe-se que o MPF no Pará acompanha desde 1997 o projeto de implantação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Nesses mais de 10 anos o MPF sempre se posicionou de forma coerente e imparcial no que se refere às discussões sobre Belo Monte, garantindo suas funções constitucionais, e procurando defender os direitos sociais e individuais indisponíveis dos cidadãos amazônidas e brasileiros, perante a Justiça Federal no Estado, de forma independente e autônoma.

A AGU ao contrário, no intuito de representar e defender a União, incorre neste momento em erro gravíssimo, totalmente fora dos princípios democráticos vigentes, quando ameaça processar membros do Ministério Público Federal que se contraporem ao processo de licenciamento e construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, alegando que as ações do MPF são “sem fundamento, destinadas exclusivamente a tumultuar a consecução de políticas públicas relevantes para o país”.

O simples ato de ameaçar os membros do Ministério Público que ajuizarem ações contra Belo Monte já demonstra uma percepção e atitude totalmente equivocada, adotada pela Advocacia e pelo governo que ela representa. Poderia se esperar ações desse tipo em um Estado de exceção, em regimes totalitários e ditatoriais, mas nunca em um estado democrático e de direito.

Até o momento todas as questões que o MPF tem levantado sobre Belo Monte, como por exemplo, o problema na quantidade e qualidade das audiências públicas realizadas; em relação ao açodamento do processo desenvolvido; e no que se refere à postergação da solução de problemas que precisam ser resolvidos a priori, são questões da mais alta relevância e pertinência, as quais o Governo Federal, ao contrário de mobilizar sua Advocacia, deveria sim esforçar-se para superar essas pendências, que afetarão a vida de milhares de pessoas, homens e mulheres, populações urbanas, pescadores, agricultores, ribeirinhos, indígenas, povos da floresta, além de comprometer a biodiversidade do rio Xingu, desequilibrando, mais ainda, toda a região amazônica.

Por fim, demonstramos convictamente, através deste ato de desagravo, nossa total solidariedade e confiança nas ações que o Ministério Público Federal no Pará desenvolve em relação à Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

Belém, 03 de fevereiro de 2010

Movimento Xingu Vivo para Sempre - Comitê Metropolitano.

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Carta de repúdio e indignação do Movimento Xingu Vivo para Sempre contra liberação da licença prévia da UHE Belo Monte

Nós, do Movimento Xingu Vivo para Sempre, vimos manifestar nosso repúdio e nossa indignação contra a liberação da licença prévia da UHE Belo Monte, e denunciar o descaso dos órgãos governamentais envolvidos na implantação desta usina, para com o cumprimento das leis que regem esse país, a democracia e o respeito dos direitos fundamentais dos cidadãos e cidadãs brasileiros. No dia 01 de fevereiro de 2010, aqueles que em tese nos representam, ao assinar a famigerada licença, comprometeram o futuro dos povos desta região e de nosso patrimônio maior, o rio Xingu.

Nós, moradores dos travessões da transamazônica, das margens do Xingu e de seus afluentes, das reservas extrativistas e terras indígenas, das áreas rurais e das cidades desta região, construímos nossas vidas ao longo de décadas, com tanto amor, suor e dedicação, em torno do rio Xingu, o coração de nossa região e de nossas comunidades. Organizamos nossas vidas em torno deste rio que sempre foi fonte de vida, muitas vezes a única via interligando nossas comunidades, caminho principal para nossas terras, nossas escolas, nossos cemitérios e sítios sagrados, porta de entrada para o resto do mundo. Nós que temos uma relação de amor e respeito pelo rio, pela vida e pelos povos, não assistiremos de braços cruzados aos desmandos daqueles, que desde Brasília, se crêem legitimamente empoderados para decidir o futuro de nossa região, sem nos consultar, sem nos ouvir, sem nos respeitar e alguns sem ter jamais colocado os pés em nossa região.

Questionamos a atuação dos órgãos governamentais de controle e ambiental no desenrolar desse processo. Denunciamos a rapidez e o atropelo que marcaram as diversas etapas do licenciamento ambiental de Belo Monte e a falta de transparência com a omissão de diversos documentos que deveriam por lei estar disponíveis para a sociedade através do site do IBAMA. Afirmamos mais uma vez, que não fomos devidamente consultados e ouvidos durante o processo, apesar de termos requerido novas audiências públicas e oitivas indígenas junto a diversos órgãos. E ficamos extremamente preocupados com a irresponsabilidade daqueles que concederam esta licença prévia: será possível que as graves lacunas identificadas pela equipe de analistas ambientais nas conclusões do Parecer Técnico do IBAMA no. 114/2009, do dia 23 de novembro de 2009, foram inteiramente sanadas em apenas dois meses, de forma a que este mesmo órgão ateste a viabilidade da obra no dia 01 de fevereiro de 2010?

Não assistiremos passivamente a transformação de nosso território em um imenso canteiro de obras para a construção de uma usina, que não produzirá 11.000 mW (e sim 4.000 mW de energia média!), nem energia barata (as tarifas energéticas no estado do Pará estando entre as mais altas do país!), muito menos limpa (aqui sentiremos para sempre danos socioambientais irreversíveis) e certamente não para este Estado! Nem o rio Xingu, nem nossas vidas estão à venda e portanto não aceitaremos a implantação de uma usina que somente beneficiará o capital das grandes empreiteiras, mineradoras, indústrias siderúrgicas nacionais e estrangeiras.

Somos povos combativos e há 20 anos resistimos à esse projeto. Saibam que nossa luta continua, que a aliança entre os povos da região se fortalece a cada novo desafio, que nossa causa vem conquistando novos aliados à cada dia, ganhando uma dimensão que não conhece fronteiras.

Diante disso, afirmamos que caso a usina de Belo Monte venha a ser executada, todas as desgraças e mazelas oriundas deste projeto estão creditadas na conta de todos aqueles que, em desrespeito à todos os povos da Bacia do Xingu, compactuaram com essa tragédia.

Movimento Xingu Vivo para Sempre!

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MPF responde nota da Advocacia-Geral da União sobre caso Belo Monte

Procuradores da República no Pará defendem trabalho que MPF realizou em relação ao projeto hidrelétrico

O Ministério Público Federal (MPF) no Pará divulgou nesta quarta-feira, 3 de fevereiro, texto em resposta à nota pública em que a Advocacia-Geral da União (AGU) afirma que poderá recorrer ao Conselho Nacional do Ministério Público e ajuizar ações de improbidade contra os responsáveis pelo ajuizamento das ações referentes à Usina de Belo Monte. Veja a íntegra da resposta do MPF:

"A pretexto de posicionar-se quanto ao licenciamento prévio concedido para a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, a Advocacia-Geral da União divulgou nota pública em que aponta desvio de conduta na atuação do Ministério Público Federal no Estado do Pará.
Tais críticas, em tom ácido, parecem desprezar que um Estado democrático não se constrói com base na coerção, direta ou velada, provenha ela de onde vier.
O embate de ideias e o debate quanto à extensão da proteção constitucional ao meio ambiente e ao patrimônio público, bem como a obrigação do Estado brasileiro de proteger minorias étnicas e sociais são temas que não se amoldam a discursos fáceis ou a arroubos de estilo.

Desde 1997, o MPF vem acompanhando e abertamente discutindo as várias questões sociais, ambientais e patrimoniais que se inserem no complexo projeto da Hidrelétrica de Belo Monte e sobre elas nunca se furtou ao cumprimento de suas funções.

Ao contrário do que faz parecer a nota divulgada pela Advocacia-Geral da União, nenhum juízo de valor definitivo foi externado pelos membros do MPF, quer quanto ao comportamento de servidores públicos federais, quer quanto ao teor da recém-divulgada licença de instalação concedida pelo Ibama. E mais, a posição até aqui externada não se baseia em “postura preconceituosa, precipitada e desprovida de análise técnica e jurídica consistente”, e, sim, no desenrolar de uma análise impessoal, objetiva e cuidadosa, resultado do acompanhamento por quase treze anos de inúmeras discussões que vem sendo travadas e da qual participaram diversos membros do MPF e suas instâncias internas de coordenação e revisão. Não há, então, nem mesmo resquício da quebra da impessoalidade e da isenção que se exige dos agentes públicos.
Tal constatação, todavia, não afasta alguns fatos concretos:

1 - em diversas oportunidades, quer em juízo, quer administrativamente, o MPF deixou claro que vários vícios procedimentais estavam sendo praticados (tais como a realização meramente formal de audiências públicas, que, na forma como conduzidas, obrigariam um ribeirinho atingido pela obra a se deslocar de 200 a 255 quilômetros para falar por, no máximo, três minutos) e que tais erros implicariam na nulidade da licença que viesse a ser concedida;

2 - ainda durante a fase de análise do licenciamento, o MPF sustentou (e continua a fazê-lo) que estudos que seriam necessários para a análise prévia não poderiam ser postergados e, portanto, se era obrigação, por exemplo, estudar os impactos da obra sobre a população ribeirinha como um dos elementos do diagnóstico do Estudo Prévio de Impacto Ambiental, não poderia a licença prévia transformar tal obrigação em condicionante, jogando para o futuro aquilo que era obrigação do passado.

Estes dois exemplos demonstram, claramente, que não há açodamento e que as conclusões iniciais não se construíram em horas, mas, sim, em anos de acompanhamento de um processo que envolve bem mais do que o marketing oficial ou a vontade soberana de quem quer que seja.

É necessário, dentre outros temas, que o Estado brasileiro assuma quais os dados reais desta obra, tais como seu custo (se R$ 9,6 bilhões, como declarado no licenciamento, ou algo entre R$ 22 bilhões e R$ 30 bilhões como se anuncia agora), sua capacidade de produção de energia (já que a propaganda oficial insiste em divulgar 11 mil megawatts, deixando de anunciar que tal produção ocorrerá em apenas poucos meses de alguns anos e que estima-se uma produção efetiva de energia não superior a 4 mil megawatts), que condicionam a viabilidade econômico-financeira da obra e os impactos de tais decisões sobre o modelo de desenvolvimento sustentável que se pretende implantar.

É necessário que a sociedade brasileira efetivamente veja suas instituições públicas funcionando, com o MPF exercendo sua função de fiscal da atividade estatal, com o Ibama velando por um licenciamento adequado e com a AGU atuando na defesa do Estado brasileiro, todos de forma responsável, sem incidir no risco da prematura condenação quanto às críticas aos atos administrativos.

A crítica e o debate franco não deveriam, ainda hoje, causar tanto desconforto em quem ocupa funções públicas e deve estar aberto a ouvir a sociedade e a cumprir a obrigação da transparência e do respeito à ordem jurídica à coisa pública.
Ao MPF a crítica é bem-vinda, será sempre considerada, mas não resultará no abandono de suas obrigações e no cumprimento de seu papel, com lealdade e sem arrogância."

Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República no Pará
Twitter: @MPF_PA

Fonte: Xingu Vivo para Sempre

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