fevereiro 24, 2010

Ufa! Mais um CAPS...

Marcha dos Usuários de Saúde Mental a Brasília
Foto: Nivya Valente - Brasília-DF - Setembro, 2009

Ufa! Mais um CAPS...

Bem vindos, companheiros(as) do Centro de Atenção Psicossocial da Cachoeirinha. Finalmente, saiu o primeiro CAPS da Prefeitura. A Associação Chico Inácio – filiada à Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial – fez uma visita no local, no mês de janeiro, e me garantiu que a equipe que a recebeu merece crédito. O espírito ali reinante é antimanicomial, até que se prove o contrário.

O déficit de CAPS em Manaus, bem como a implantação de leitos psiquiátricos no hospital geral, ainda é muito grande. Com apenas dois CAPS, estamos aquém das demandas de uma cidade com dois milhões de habitantes. Nos sessenta e dois municípios amazonenses ainda não chegamos a meia dúzia de CAPS. É pouco.

Vale a pena repetir: é preciso CAPS para adultos com problemas severos e persistentes, CAPS para crianças e adolescentes psicóticos e autistas, CAPS para abusadores de álcool e outras drogas, sem esquecermos dos Centros de Convivência com programas de geração de renda.

A Associação Chico Inácio não pretende baixar a guarda dos direitos de cidadania dos usuários dos serviços de saúde mental de Manaus. Enquanto não houver uma rede de CAPS capaz de oferecer tratamento que não se baseie apenas em medicamentos, silenciar é pecado capital.

Basta o silêncio de anos seguidos de quem tem a responsabilidade de gestão da saúde. Um deles chegou a dizer que “era só o que faltava investir em presos e loucos”. Essa cultura da indiferença vem sendo enfrentada pela Chico Inácio com a dignidade dos que jamais perdem a cordialidade.

É fundamental não perder o espírito crítico, sob pena de retrocesso das poucas conquistas obtidas. E isso vale para todos, sobretudo para a categoria mais reticente aos princípios que norteiam a reforma psiquiátrica brasileira: médicos.

Lembro-me do questionamento que fizemos, ainda estudante de medicina, no IV Congresso Brasileiro de Psiquiatria, realizado em Fortaleza, no Ceará. Época de ditadura militar. A formação do estudante de medicina em psiquiatria era o tema do congresso:


“Nós não compreendemos porque ocupando os psiquiatras irremediavelmente o lugar de intelectuais, negam esse papel e simplesmente se justapõem ao aparelho burocrático estatal que consideram incondicionalmente benéfico e justo”.


O texto lido por mim na plenária final do congresso é de autoria do saudoso Humberto Marouelli Mendonça, médico psiquiatria com quem dividi importantes momentos da vida acadêmica em Manaus. Seu texto continua atual. Até porque pouco mudou na formação elitizada da medicina brasileira.

Moral da história: mesmo numa cidade habituada a promover a “desafiliação” dos que nadam contra a correnteza, uma outra gramática é possível.

Manaus, Fevereiro de 2010.
Rogelio Casado, especialista em Saúde Mental
Pro-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da UEA
www.rogeliocasado.blogspot.com

Nota do blog: Artigo publicado no jornal Amazonas em Tempo, no caderno Saúde & Bem Estar, que sai aos domingos.


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