Queria comentar um pouco como foi a primeira marcha da maconha em Natal. Estou cansada, mas gostaria de compartilhar com vocês o que foi nosso dia hoje.
Durante uma semana, a mídia foi atualizando os conflitos que a marcha daqui estava causando. Fato é que o ministério público, a PM, a Polícia Civil, a Denarc, e a secretaria de segurança, foram pegas de surpresa e deram declarações em que foram obrigados a voltar atrás. Tivemos reunião com o MP, com chefe do comando da polícia militar, chefe da inteligência, delegado da Denarc, tudo foi esclarecido: não é um movimento de apologia, não é incitação à violência. O habeas corpus saiu e, dessa forma, marchamos hoje, dia 30.07, dentro da UFRN.
Fomos às ruas, a tarde estava linda, e o primeiro problema apareceu: estavam querendo impedir o carro de som de entrar na UFRN e queriam multar o carro por estar esperando uma resposta da segurança do campus permitir a entrada. Fato é que não permitiram e mudamos o início do trajeto, e assim saímos. Antes, colocamos "Porcos Fardados", do Planet Hemp em homenagem a todas as forças policialescas repressivas da cidade de Natal e do Estado do Rio Grande Norte presentes no momento.
A marcha teve em torno de 500 pessoas nas ruas. Todo o percusso foi tranqüilo, apesar de ter até helicóptero da polícia sobrevoando o ambiente.
Optamos por tomar o campus, apesar de estar amparado legalmente para fechar a BR, mas prefirimos fazer as coisas com cautela, estratégia para poder levar o debate de forma menos agressiva para uma sociedade que "precisa chegar cedo em casa". Conseguimos nosso objetivo: tivemos a oportunidade de levar e elevar o debate sobre a descriminalizaçã
A mídia veio fazer uma mega cobertura e demos entrevistas para todos eles, com excessão da TV Ponta Negra que veiculou uma informação na quarta feira em seu site dizendo que tinha procurado os organizadores da marcha e nós tinhamos nos negado a dar entrevistas. Fato é que isso nunca ocorreu, nunca fomos procurados e, por isso, decidimos não dar nenhuma declaração à TV Ponta Negra. Igualmente ocorreu com TVU, que não veicularam duas entrevistas antes da marcha, além de terem censurado o Xeque Mate com um dos integrantes do Coletivo Cannabis Ativa. Fora estes, todos que chegaram para conversar com nós tiveram nossa posição.
Fizemos uma paralização em frente à reitoria da UFRN, onde colocamos o debate de maneira séria, legal, ética, responsável, científica e política. O ato durou em torno de 15 a 20 minutos e partimos em direção ao setor 2, onde tudo da marcha começou.
Fizemos quase que um ritual de ciranda com o Pau e Lata, que foram responsáveis por segurar e muito o batuque da marcha por todo o percusso. Dispersamos e....continuamos a noite.
A marcha continuou no show do Tom Zé, na praça cívica, onde o número de policiais parecia ter triplicado e se concentrado na região da praça cívica onde nós, do Coletivo Cannabis Ativa permanecemos, para ver se estávamos fumando. Não conseguiram achar ninguém praticando tal ato e ficaram perdidos olhando as pessoas. Assim começou uma grande vaia e todos cantando com toda força "polícia para quem precisa, polícia para quem precisa de polícia".
Pouco tempo depois um conhecido nosso foi pego com fumo e fumando, e foi levado pela polícia. Fomos atrás e, por mais que o nosso conhecido tivesse errado nessa situação, fomos atrás para que ele não fosse preso e que a lei 11.343, por mais que seja proibicionista, fosse cumprida. O que aconteceu é que eu e outra integrante do Coletivo Cannabis Ativa fomos ameaçadas de serem presas pois, segundo um dos policiais, nossa camisa que tinha escrito "marcha da maconha" era apologia. O que eles não sabia, e ficaram sem justificativas, foi que tínhamos um habeas corpus que nos protegia desse tipo de coerção. Não conseguimos falar com os advogados, mas sabemos que nosso conhecido foi levado para delegacia e liberado pouco tempo depois.
Imaginávamos que isso seria prato cheio para mídia negativar o movimento, mas não conseguiu nenhum pouco. A primeira marcha da maconha aconteceu, e saber que se o Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes não tivesse vindo nos incomodar com um email bastante repressivo sobre os usuários de maconha no setor 2, creio que isso não estaria ocorrendo. POR ISSO, OBRIGADO CCHLA, POR FAZER INFLAMAR ESSA ORGANIZAÇÃO TODA.
Agradeço a todos que puderam ir, e aos que não puderam valeu por todo apoio dado. Agora é só jogar no google e youtube "marcha da maconha Natal" e ver o que fizemos. Agora vamos nos articular para promover esse debate nas periferias de Natal e em outras áreas da cidade para mostrar a urgência que é esse assunto.
Abraços,
IB
Coletivo Cannabis Ativa
Natal-RN
Nota do blog: As políticas de "repressão" ou "demonização" do uso de drogas se mostraram ineficazes, como afirmam Beatriz Caiuby Labate, Maurício Fiore e Sandra Lucia Goulart, na introdução do livro "Drogas e Cultura: novas perspectivas", obra editada pela EDUFBA/Fapesp, imprescindível para as reflexões públicas que os integrantes da Marcha da Maconha estão propondo ao país. Na contra-mão dessa história, a Universidade Federal do Amazonas mergulhou na onda proibicionista, tudo porque universitários estariam fazendo uso de maconha no campus. Que desperdício! Instituição do saber por excelência, com um quadro de professores e pesquisadores notáveis, capazes de dar profundidade e consistência a um tema tão paradoxal e enigmático como o uso de drogas na sociedade atual, optou-se equivocadamente por uma resposta anti-acadêmica e anti-democrática, em plena era da interdisciplinaridade. Torço para que a comunidade acadêmica aproveite o ensejo para por fim às raízes históricas do proibicionismo. Como egresso desta universidade (que na concepção do marxista José Carlos Mariatégui, compõe o quarto segmento da comunidade acadêmica), reivindico a imediata abertura de um espaço de diálogo que reafirme a universidade como produtora de novas realidades e não reprodutora da nefasta ideologia de "guerra às drogas", cujo cenário é marcado por sequelas de estigmatização, violência, cinismo e estreiteza intelectual. Cabe a universidade o trabalho intelectual contra toda sorte de simplificação conceitual e manipuilação política e, sobretudo, contra a espiral viciosa que naturaliza a ilegalidade e potencializa a repressão, se quisermos impedir que a sociedade seja inundada de preconceitos e a juventude criminalizada. (Dedico essa postagem ao sociólogo, redutor de danos, Dênis Petuco).