dezembro 25, 2011

Sob a acusação de paganizar a festa do Natal, cristãos enforcaram Papai Noel na França dos anos 1950


PICICA: "Papai Noel foi enforcado ontem à tarde nas grades da Catedral de Dijon e queimado publicamente em seu átrio." 

Leia trecho de 'O Suplício do Papai Noel', de Lévi-Strauss

da Livraria da Folha
Texto baseado em informações fornecidas pela editora da obra.
Na década de 1950, alguns franceses fizeram um linchamento simbólico do Papai Noel. O curioso evento serviu de inspiração para "O Suplício do Papai Noel", de Lévi-Strauss (1908-2009). O antropólogo parte desse insólito acontecimento para analisar o mito do bom velhinho ao longo dos tempos, a comercialização das datas tradicionais e a influência norte-americana nesse processo. Abaixo, leia um trecho do livro.
Atenção: o texto reproduzido abaixo mantém a ortografia original do livro e não está atualizado de acordo com as regras do Novo Acordo Ortográfico. Conheça o livro "Escrevendo pela Nova Ortografia".
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Reprodução
Texto: O antropólogo francês Claude Lévi-Strauss no Laboratório de Antropologia Social do College de France, em Paris (França).
Claude Lévi-Strauss no Laboratório de Antropologia Social do College de France
As festas de Natal de 1951 ficarão marcadas na França por uma polêmica que encontrou grande repercussão junto à imprensa e à opinião pública e introduziu um tom de inusitado azedume no clima geralmente alegre dessa época do ano. Há vários meses as autoridades eclesiásticas, na voz de alguns prelados, já manifestavam sua desaprovação à importância cada vez maior que as famílias e os comerciantes vinham dando à figura do Papai Noel. Elas denunciavam uma preocupante "paganização" do dia de Natal, desviando o espírito público do sentido propriamente cristão dessa comemoração, em favor de um mito sem valor religioso. Tais ataques aumentaram nas vésperas do Natal; com maior discrição, mas igual firmeza, a Igreja Protestante uniu sua voz à da Igreja Católica.
Cartas de leitores e artigos nos jornais já vinham demonstrando de maneiras variadas, geralmente contrárias à posição eclesiástica, o interesse despertado pelo assunto. Por fim, o ponto culminante ocorreu em 24 de dezembro, durante uma manifestação que foi descrita pelo repórter do jornal France-Soir nos seguintes termos:
PAPAI NOEL É QUEIMADO NO ÁTRIO DA CATEDRAL
DE DIJON DIANTE DE CRIANÇAS DE ORFANATOS
Dijon, 24 de dezembro (enviado do France-Soir)
Papai Noel foi enforcado ontem à tarde nas grades da Catedral de Dijon e queimado publicamente em seu átrio. Essa execução espetacular se realizou na presença de várias centenas de internos de orfanatos. Ela contou com o aval do clero, que condenara Papai Noel como usurpador e herege. Ele foi acusado de paganizar a festa de Natal e de se instalar como um intruso, ocupando um espaço cada vez maior. Censuram-no, sobretudo, por ter-se introduzido em todas as escolas públicas, de onde o presépio foi meticulosamente banido.
Às três horas da tarde do domingo, o infeliz velhinho de barbas brancas pagou, como muitos inocentes, por um erro cujos culpados eram os que aplaudiram a execução. O fogo queimou suas barbas e ele se esvaiu na fumaça.
Ao final da execução, distribuiu-se um comunicado cujos principais termos eram:
Representando todos os lares cristãos da paróquia, dispostos a lutar contra a mentira, 250 crianças, reunidas diante da porta principal da Catedral de Dijon, queimaram o Papai Noel.
Não se tratou de um espetáculo, e sim de um gesto simbólico. Papai Noel foi sacrificado em holocausto. De fato, a mentira não pode despertar o sentimento religioso na criança e não é, de modo algum, um método educativo - que outros digam e escrevam o que quiserem e façam de Papai Noel o contrapeso do Père Fouettard.1
Para nós, cristãos, o Natal deve continuar a ser o festejo que comemora o nascimento do Salvador.
A execução de Papai Noel no átrio da catedral foi avaliada de diversas maneiras pela população e despertou vivos comentários mesmo entre os católicos. Além disso, essa manifestação intempestiva corre o risco de ter conseqüências não previstas por seus organizadores.
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"O Suplício do Papai Noel"
Autor: Claude Lévi-Strauss
Editora: Cosac Naify
Páginas: 56
Quanto: R$ 28,10 (preço promocional*)
Onde comprar: pelo telefone 0800-140090 ou pelo site da Livraria da Folha

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