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Aníbal Beça ©
Inventa mundos nuevos y cuida tu palabra;
el adjetivo, cuando no da vida, mata.
Vicente Huidobro
É preciso urgente cortar os excedentes.
Nada de adiposidades.
Estamos em crise.
Os adjetivos que me perdoem,
os substantivos são mais esbeltos,
e a Nova Era recomenda que sejamos seletos.
Há uma pena de andorinha voando à toa.
Há um redemoinho que nos afunda a proa.
Há uma onda marejada que não se escoa.
É preciso pôr um bêbado no timão do barco.
Que saiba das marés pelo trago das estrelas,
que saiba afundar levantando um brinde,
e mesmo nos destroços saber-se príncipe
salvo do rescaldo para o cetro da palavra:
La parole est morte. Vive la parole!
Há uma paixão em cada esquina torta.
Há um resto de angústia celebrando a morta.
Há um boi no labirinto procurando a porta.
É preciso correr atrás da utopia que se fez distante
para que ela volte a habitar os dias mais comuns,
e faça que o sonho se pareça ao sonho,
mesmo sob o manto pessimista da névoa,
afiando o sabre na pedra que restou da cachoeira.
Ah, nuvens vermelhas, derramai vossa chuva de fogo!
Há um canto entravado na garganta.
Há um sufoco que já não me espanta.
Há um espelho que já não me encanta.
É preciso fugir do tempo perdido.
O que ficou pra trás encantou-se com a serpente,
e todos os dias buscamos novos corredores:
aléias renovadas para as pegadas recentes.
Salvemos aqui a parelha dos pés que suporta a canga
nesse itinerário do agora recolhendo ontens.
Há um solitário na mesa de um bar.
Há um suicida na voragem do mar.
Há um reclamante do verbo amar.
É preciso, finalmente, se apaixonar todos os dias.
Experimentar o gesto no corpo da amada.
Imprimir no toque a tatuagem serena
para que fique perene quando for saudade:
A vida se amplia num flash de coisas pequeninas,
e o que ficar são ecos de melodia transitória.
Há um desejo que me faz cantor.
Há uma paixão saída da sua cor.
Há um amor na contramão da dor.
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