moviecomcinemas — 9 de setembro de 2009 — Trailer do filme "A Onda". Moviecom: mais cinema na sua vida!
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[ Amálgama ] |
Posted: 07 May 2010 08:00 AM PDT por Fernando da Mota Lima – O filme A Onda (Alemanha, 2008) é baseado num experimento pedagógico ocorrido na Califórnia em 1967. Transposto para a Alemanha contemporânea, berço do nazismo, resulta num precioso e inquietante documento psicossocial que desce às entranhas das potencialidades destrutivas do gênero humano. Compreendido enquanto cinema, esteticamente falando, A Onda é rasa, mas importa muitíssimo pela idéia recriada para iluminar questões do presente. É isso o que intento explorar um pouco na minha crítica. Embora incapaz de ajustar-me a qualquer movimento ou disciplina partidária, acredito que ninguém pode, a rigor, ser indiferente à política. Como disse alguém, não importa que não nos importemos com ela; ela se importará conosco. Talvez um sintoma da minha descrença na ação política se expresse na preocupação de compreendê-la em termos puramente teóricos – compreender a mais terrível onda bárbara que foi o nazismo, por exemplo. Lendo Freud, Bertrand Russell e Erich Fromm, depois vieram outros, julgo haver compreendido melhor o papel que determinados componentes psicossociais exercem na ação política. Vamos ao filme. Rainer é um professor anarquista que ironicamente se defronta com o desafio de dar um curso sobre autocracia e regimes políticos similares (ditadura, nazismo, fascismo) para uma turma de jovens estudantes. Os jovens têm muitos dos traços psicossociais comuns à juventude do mundo ocidental e suas derivações periféricas. Esses traços decorrem, em suma, da cultura narcisista e consumista cujo solo e circuitos de manifestação contínua bem conhecemos. Incerto sobre o que fazer diante do desafio pedagógico que tem pela frente, Rainer procede a um experimento nazi-fascista em plena sala de aula. As reações dos alunos e as transformações perturbadoras que neles se processam apontam para as fontes psíquicas e sociais geradoras dos regimes políticos de extrema direita. À exceção de Karo e outra aluna que a segue, toda a turma adere entusiasmada à formação de um grupo inspirado pelos valores e práticas do nazismo. A motivação psicológica decisiva para a adesão reside no desejo obscuro de dissolver a individualidade e a liberdade individual, bem mais penosas do que supomos, numa unidade mística e grupal. Essa unidade supõe gestos, rituais e símbolos lastreados na disciplina cega e na força forjada pelo grupo. A figura do líder é a fonte de autoridade e poder com a qual os jovens seguidores cegamente se identificam. Essa identificação liberta os jovens de pensarem e decidirem por si próprios. Pouca gente se dá conta do quanto a liberdade assim compreendida (implicando autonomia, liberdade de escolha e conseqüente responsabilidade em face do que escolhemos) é difícil e mesmo penosa. É desse peso que os jovens participantes do experimento fascista se liberam. O líder ordena e eles disciplinadamente agem. Não ser parte dessa unidade cega e intolerante é uma ameaça à unidade conquistada que precisa crescer na sua força expansiva. É aí que a jovem Karo se torna uma ameaça que precisa ser excluída do grupo. Ela representa os valores da liberdade individual aos quais todos renunciaram. O exemplo extremo dessa renúncia cega e radical é Tim, o jovem que no desfecho do filme se suicida. Quando o professor renuncia ao papel de líder, impondo ao grupo um retorno à situação inicial, ele se revela incapaz de reverter o jogo perigoso proposto pelo professor. Sua renúncia à liberdade individual tocou o extremo passível de o impelir para a destruição completa, que no caso resulta em autodestruição. A Onda sugeriu-me um paralelo com Sociedade dos Poetas Mortos. Este filme, talvez já esquecido, poderia ser interpretado como o oposto simétrico daquele. Também aqui nos vemos diante de um professor, Mr. Keating, cuja personalidade magnética seduz um grupo de jovens estudantes da elite americana. A pedagogia que propõe a seus alunos, inspirado pela tradição romântica libertária, baseia-se em tudo que a ideologia nazista intenta suprimir: a educação compreendida como a realização da singularidade irredutível de cada indivíduo. Faça seu próprio caminho, cante sua própria canção, realize a vida extraordinária que lateja em cada indivíduo. O desfecho de Sociedade dos Poetas Mortos também envolve um suicídio. Neil, o jovem suicida, mata-se por não poder suportar um sentido de repressão imposto pela família e a escola que suprime sua individualidade. É portanto a contraface de Tim, que se mata porque renunciou completamente à possibilidade de se realizar como indivíduo. Anotei no parágrafo acima um paralelo grosseiro entre dois filmes de sentido antagônico com o propósito de sugerir a complexidade da realidade cultural em que vivemos. Ambas as tendências conflitantes ou inconciliáveis se manifestam de muitos modos. Meu coração e minha mente estão totalmente identificados com os valores propostos por Sociedade dos Poetas Mortos. Mas nunca me esqueço, talvez precisamente por escolher o que escolhi, que as forças profundas geradoras do fascismo estão sempre entre nós. Seriam elas acaso passíveis de produzirem um fascismo à brasileira, como aliás tivemos disso um arremedo nos anos trinta com o movimento integralista? Acredito que não. Afinal, concordando com Luciano Oliveira, que tem escrito sobre esta e questões conexas observáveis na nossa sociedade, estamos longe do modelo de sociedade disciplinar proposto por Michel Foucault na sua obra. O nazismo foi um movimento baseado em formas de organização militarista somente concebíveis numa sociedade disciplinar. Nossas formas supremas de mobilização coletiva, o futebol e o carnaval, constituem a evidência de que tendemos mais para a anomia, como diria Durkheim, do que para a arregimentação disciplinar das massas. Eis um caso, talvez o único, em que nossa incurável bagunça é social e politicamente saudável. Leia também: |
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