Nota do blog: Tia Pátria, se tivesse viva, e lido o texto do ilustre professor João Bosco Araújo, publicado neste domingo, no jornal Amazonas em Tempo, certamente diria: "É o sujo falando do mal lavado". Tia Pátria, segundo o meu amigo João Bosco Chamma, arquiteto de formação, seria uma executiva se a baixa escolaridade e a pobreza não levasse essa filha de imigrantes portugueses, após a morte do pai, a vender um dos tacacás mais saborosos da cidade de Manaus, por mais de três décadas, entre os anos 1940 a 1960 - único modo que encontrou para sobreviver na incipiente economia daqueles anos. Sua banca de tacacá não poderia se situar em melhor lugar. Defronte à Faculdade de Direito, convivendo com inúmeros estudantes - que se tornariam personagem públicos, para o bem e para o mal -, aos poucos desenvolveu uma aguda percepção das manhas e artimanhas praticadas na política daqueles tempos provincianos. A vida sabe o que faz. Hoje na Manaus da Zona Franca, ela estaria, liderando greves, e sabe-se lá o que mais. Suponhamos que o Lula tenha tido uma oportunidade a mais na sociedade industrial da São Paulo dos anos 1960-1970. Experiência que lhe permitiu codificar o significado da relação de sua família com os "coronéis" da Garanhuns-PE da sua infância, bem como sua relação pessoal com o patronato paulista ao ingessar no mundo do trabalho. E que a partir daí tenha iniciado sua vida política, como resposta ao quadro de iniquidades vivida pelos trabalhadores brasileiros, sobretudo na ditadura civil-militar que se instalara no país desde 1964. Suponhamos que tenha sido a sabedoria acumulada ao longo do tempo que permitiu ao presidente Lula ter "superado" a falta de instrução, e assim galgar o mais alto posto da república. O que surpreende no texto do articulista é sua tentativa de banalizar o exercício do poder, reduzindo à dinâmica da vida política a um enredo fajuto de novela das 7. É de se esperar mais de alguém que conviveu com as fímbrias do poder, e que com ele estabeleceu relações de subserviência, como registra a crônica jornalística amazonense. A caracterização do que teria restado de Lula - aos olhos do articulista "contaminado e distorcido pela mosca azul do poder" -, perdoem-me os mais sensíveis, parece mais com as identificações projetivas que acometem indivíduos que passaram pela experiência de submissão ao jogo do poder, que conhecem bem as manobras políticas usadas para manter-se ou beneficiar-se do poder. Não é só a deformação do poder que está em causa, mas a deformação intelectual, que mais uma vez tenta naturalizar a complexa relação entre as classes sociais no Brasil. Meu caro professor, as ambiguidades do governo Lula merecem crítica mais aprofundada, como a que enseja a afirmação de 'nunca os ricos ganharam tanto nem os pobres melhoraram tanto de vida'; ou a ainda a aliança com o capital exportador, em especial o agronegócio; na forma como a terra é explorada, com reflexos sobre nossa incipiente reforma agrária. Mas aí é muita farinha pra quem apenas pretendia fazer uma declaração de voto. Deixo pra outra ocasião, um aspecto que não é periférico no seu texto domingueiro: a relação de Lula com a imprensa, num cenário em que os meios de comunicação de massa flertam com o poder oligárquico. Em causa um outro aspecto da soberania e da defesa dos direitos fundamentais contra a oligarquia-nossa-de-cada-dia, capaz de provocar irreparáveis deformações. É isso aí!
PICICA - Blog do Rogelio Casado - "Uma palavra pode ter seu sentido e seu contrário, a língua não cessa de decidir de outra forma" (Charles Melman) PICICA - meninote, fedelho (Ceará). Coisa insignificante. Pessoa muito baixa; aquele que mete o bedelho onde não deve (Norte). Azar (dicionário do matuto). Alto lá! Para este blogueiro, na esteira de Melman, o piciqueiro é também aquele que usa o discurso como forma de resistência da vida.
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