PICICA: "Foi mais um descalabro da ditadura, submeter civis à Justiça Militar, com oficiais da Arma respectiva e um juiz auditor fazendo as vezes de jurados isentos."
DITADURA: A FOTO DA DILMA E O TEATRINHO MILITAR
Já
que fui citado na imprensa como um dos réus clicados no mesmo lote da
fotografia de 1970 da presidente Dilma Rousseff, vale a pena falar um
pouco sobre como, durante a ditadura de 1964/85, encenavam-se
julgamentos nas auditorias militares para justificar as sentenças que os
serviços de Inteligência e o comando das Forças Armadas previamente
estipulavam.
Deu n'O Globo (vide íntegra aqui):
"No começo de 2011, quando o país assistia meio incrédulo à festança de chegada ao poder de uma mulher e ex-guerrilheira, caíram nas mãos do pesquisador Vladmir Sachetta, por acaso, três fotos que revelavam um dos momentos mais marcantes da 'terrorista' Vanda. As fotos são da presidente Dilma Rousseff no frescor de seus 22 anos, com ar rebelde, e de seu ex-marido Carlos Araújo, em depoimento na Primeira Auditoria Militar do Rio, em novembro de 1970.
Sachetta (...) procurava imagens de militares da Aeronáutica envolvidos no sequestro, desaparecimento e morte de Rubens Paiva. Caiu nas mãos dele uma pasta com o título Justiça Militar. Na última página, encontrou as fotos de Dilma, Araújo e do estudante Celso Lungaretti, feitas por um fotógrafo da Última Hora (...) e publicadas uma só vez, na capa do jornal, em 18 de novembro de 1970.
...no arquivo do jornal, no dia da publicação, a foto de Dilma recebeu a seguinte identificação no verso: '1 Auditoria do Exército (Julgamento dos terroristas Celso Lungaretti, Carlos Franklin Paixão de Araújo e Dilma Rousseff Linhares). Na foto a estudante terrorista Dilma Rousseff Linhares quando era sumariada'".
A minha foto até agora não encontrei (*); a da Dilma está espalhadíssima na internet; e na biografia autorizada da presidente (A vida quer é coragem) aparece a do Max (Carlos Franklin Paixão de Araújo).
Respondi a quatro processos, os da VPR e da VAR-Palmares, em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Isto porque ingressei na VPR
em abril/1969, a organização se fundiu com o Colina no meio do ano
(formando a VAR) e em outubro reconstituímos a VPR, depois de racharmos no Congresso de Teresópolis.
No fundo, os militares não
fizeram direito a lição de casa, pois eu militei na VPR nos dois
Estados, mas só militei na VAR em SP. Deveria ter ficado de fora do
processo da VAR no RJ --exatamente aquele de que a notícia trata.
Eu só me lembrava da Vanda no Congresso do racha, quando nos colocamos em campos opostos. Mas, como vários jornalistas andaram me ligando para saber se eu tinha algo de interessante a relatar sobre a nova presidente --não tinha--, cheguei a pensar que provavelmente nos haveríamos reencontrado como réus de um ou dos dois processos da VAR. Agora isto está confirmado.
Eu só me lembrava da Vanda no Congresso do racha, quando nos colocamos em campos opostos. Mas, como vários jornalistas andaram me ligando para saber se eu tinha algo de interessante a relatar sobre a nova presidente --não tinha--, cheguei a pensar que provavelmente nos haveríamos reencontrado como réus de um ou dos dois processos da VAR. Agora isto está confirmado.
Apesar de já se terem passado mais
de quatro décadas, fico meio perplexo por haver esquecido tão
completamente muito do que rolou nas auditorias.
Talvez
porque aquele jogo de cartas marcadas me entediasse mortalmente:
graças às informações que reunira como comandante de Inteligência da VPR
e da VAR, eu tinha absoluta certeza de que as sentenças eram
previamente definidas pelo alto comando, a partir das avaliações da 2ª
Seção do Exército, do Cenimar e do Cisa, só cabendo àqueles figurantes
simularem que estavam nos julgando.
Foi mais um descalabro da
ditadura, submeter civis à Justiça Militar, com oficiais da Arma
respectiva e um juiz auditor fazendo as vezes de jurados isentos.
Se fosse para valer, que chance teríamos? Nenhuma, nossa condenação seria inevitável segundo as leis de exceção impostas pelos que haviam estuprado a liberdade.
E, não sendo para valer, eles eram obrigados a obedecer às ordens recebidas.
Se fosse para valer, que chance teríamos? Nenhuma, nossa condenação seria inevitável segundo as leis de exceção impostas pelos que haviam estuprado a liberdade.
E, não sendo para valer, eles eram obrigados a obedecer às ordens recebidas.
Era tudo tão patético que,
certa vez, em pleno julgamento, o advogado de ofício começou a não
falar coisa com coisa. Percebendo que ele estava bêbado, o juiz
auditor o expulsou e designou outro, que foi obrigado a improvisar a
defesa... em cerca de dez minutos!
Suspenderam a sessão para o
cafezinho e ele passou os olhos pelo processo. Na reabertura fez sua
arenga, apelando para generalidades e platitudes, já que não
conseguira inteirar-se das especificidades do caso.
A lembrança mais nítida que conservo é a de Matos (Cláudio de Souza Ribeiro) com olhar perdido, parecendo nem reconhecer os antigos companheiros.
Ele vinha dos movimentos da marujada que antecederam o golpe e chegou até a ser comandante da VPR e da VAR. Mas, entrou em crise, afastou-se da militância e foi levar vida de civil numa aldeia de pescadores, montando casa com uma militante de base que desistiu da luta por ele.
Ele vinha dos movimentos da marujada que antecederam o golpe e chegou até a ser comandante da VPR e da VAR. Mas, entrou em crise, afastou-se da militância e foi levar vida de civil numa aldeia de pescadores, montando casa com uma militante de base que desistiu da luta por ele.
Traído (sexualmente...) por
ela e diante da perspectiva de ser abandonado, assassinou-a e foi
entregar-se à polícia. Acabou no DOI-Codi, suplicando para que o
matassem e ouvindo a resposta de que lá só morria quem eles queriam,
não aqueles que queriam morrer.
Vê-lo reduzido a trapo me
chocou e consternou. Era o único de nós que estava algemado em plena
auditoria, sentado com um agente de cada lado --temiam que ele
realmente desse cabo da vida. Sua história (mais detalhes aqui) é dilacerante.
Por último: muitos internautas
comentaram que, na foto da Dilma, os militares escondiam a cara por
vergonha. Não, era por paúra mesmo. Temiam ser retaliados, como se não
soubéssemos que seu papel era decorativo.
Se havia contas a acertarmos,
era com os torturadores, com seus mandantes, com os financiadores da
repressão, etc. Não com esses atores de quinta categoria.
P.S.: no dia seguinte, o Ricardo Amaral, gentilmente, enviou-me a foto, vide aqui
P.S.: no dia seguinte, o Ricardo Amaral, gentilmente, enviou-me a foto, vide aqui
Um comentário:
Olá, boa tarde.
Me chamo Victoria Deviá e sou assistente de produção de fotografia da revista Lola Magazine da editora Abril. Estamos entrando em contato pois para nossa próxima edição iremos publicar uma matéria sobre a presidenta Dilma em seus tempos de militância e para isso estou fazendo uma grande pesquisa de imagens. entre várias imagens, selecionamos uma postada por você no post acima e gostariamos de saber se essa imagem é sua e se sim, se você a possui em alta resolução (300dpis) ou se teria como envia-la em seu tamanho normal para nós.
Estamos fechando essa matéria e só nos restam algumas imagens, entre elas a sua!
Por isso vou pedir para que entre em contato comigo no e-mail victoria.devia@abril.com.br ou no telefone (11) 3037-6980 o quanto antes !!!!
Agradeço desde já pela atenção e aguardo ansiosamente por uma resposta.
Atenciosamente,
Victoria Deviá
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