agosto 23, 2009

A Globo não tem limites

Sem limites

Rita de Cássia de A Almeida
psicanalista

Não é novidade que é o banho da cultura que nos veste, que possibilita dar algum contorno para a nossa animalidade, para o real que se abate sobre nós. É isso que nos faz humanos, que nos permitiu colocar a palavra onde só havia ato e que, em última análise, nos protege da barbárie. Tal contorno estabelece para nós um limite, um limite que não devemos ultrapassar, sob o risco de extrapolarmos nossa própria condição de existência e de romper com aquilo que nos faz humanos.

Manter-nos nesse limite da humanidade é tão importante que mesmo em tempos de guerra, por exemplo, onde os maiores horrores são vivenciados, vários tratados internacionais vigoram com o objetivo de manter um mínimo de ética e de respeito ao ser humano. O fato é que sem nossas vestimentas culturais e simbólicas, ficamos a mercê da selvageria.

E foi isso que se viu no final da noite do último domingo. Quem acreditava já ter visto de tudo na TV, ficou estarrecido com as cenas mostradas em um reality show. A chamada “prova do estômago” exibiu cenas bizarras dos participantes comendo, dentre outras “iguarias”, ovos galados, ou seja, com um feto dentro, na tentativa de manterem suas equipes e, portanto, a si mesmos, com chances de vencer a disputa.

A selvageria à qual me refiro não é resultante do simples fato de se comer o feto cru de uma galinha. Em certas culturas, pode ser que esse tipo de alimento seja apreciado e culturalmente incorporado, entretanto, esse não é o caso. Sendo assim, vivenciada pelos participantes como um mergulho profundo na selvageria, essa experiência grotesca, violenta e de extremo mau gosto mostrada num programa de televisão, nos leva a perguntar: o que se é capaz de fazer por 500 mil reais? E a triste e lamentável conclusão que chegamos é que, em um mundo dominado pelo capital, por 500 mil reais é possível comprar e vender até mesmo a humanidade de alguns. Por esse valor ou por outros até menores, encontramos quem extrapole qualquer limite, inclusive os limites mais fundamentais; aqueles que nos fazem pertencer à raça humana.

Leia outros textos de Rita de Cássia de A Almeida em http://ritadecassiadeaalmeida.blogspot.com/
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