janeiro 27, 2010

Saúde Mental e Economia Solidária

Acervo Associação Chico Inácio
(filiada à Rede Nacional Intenúcleos da Luta Antimanicomial - RENILA)


Associação Chico Inácio na luta pela IV Conferência Nacional de Saúde Mental
(Por uma Reforma Psiquiátrica Antimanicomial): de olho nas etapas municipal e estadual

Saúde Mental e Economia Solidária


Iniciou-se em Manaus curso sobre economia solidária para profissionais de saúde mental e organizações da sociedade civil. Lugar escolhido: Hospital Psiquiátrico Eduardo Ribeiro.

O lugar não poderia ter sido pior. A bandeira de luta por uma sociedade sem manicômios é de 1987, e a meta da política nacional de saúde mental é substituir hospitais psiquiátricos por uma rede de atenção em saúde mental, que tem no CAPS - Centro de Atenção Psicossocial – um dos seus dispositivos de cuidados.

A baixa oferta de CAPS em Manaus (um implantado no governo Eduardo Braga em 2006; outro recém-inaugurado pelo município, a quem compete oferecer esse serviço) não nos autoriza a criar “alternativas” que comprometam os princípios éticos da reforma psiquiátrica antimanicomial que queremos, às vésperas da IV Conferência Nacional de Saúde Mental.

Voltando à vaca fria: por que o local é problemático? Porque não pode haver dubiedade de comunicação com a sociedade. Se queremos o fim do hospício, realizar um curso dessa relevância ali será interpretado como sinal de que ele pode ser "humanizado" e continuar entre nós depois de um século de existência (vixe!).

Fui honrosamente indicado pela professora Heloisa Helena Corrêa da Silva para palestrar no evento. Ponderei sobre a impropriedade do local. Resumo da ópera: o segundo módulo será oferecido fora do espaço hospitalar, caso contrário declinarei do convite, por uma questão de princípios.

Também me foi assegurado que o curso se propõe a fomentar iniciativas de economia solidária fora do espaço hospitalar. O tempo de ações intra-muros passou.

No início dos anos 1980, quando criei um trabalho de reabilitação num espaço abandonado do velho hospício, tinha dupla intenção: produzir novos efeitos de sentido quanto ao lugar do louco na nossa cultura e começar o processo de criação de novos territórios existenciais fora dos muros do hospício.

A escolha do trabalho agrícola remunerado foi uma opção política: além de ir ao encontro da história dos usuários, teve ótima acolhida pela opinião pública, graças ao apoio da imprensa local. Inicia aí o processo de restituição da cidadania negada aos usuários de saúde mental, e interrompida por todos os anos 1990.

É hora de trabalhar o setor, sobretudo os CAPS. Alguns deles costumam, nas falhas das políticas públicas, abrigar projetos que tem como efeito perverso vincular o usuário ao dispositivo. A hora é essa: criar novos territórios na cultura, fora dos hospícios e dos CAPS, sem desvirtuar princípios, nem da economia solidária, nem da reforma psiquiátrica.

Manaus, Janeiro de 2010.
Rogelio Casado, especialista em Saúde Mental
Pro-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da UEA
www.rogeliocasado.blogspot.com

Nota do blog: Artigo publicado no caderno Saúde & Bem Estar do jornal Amazonas em Tempo, que sai aos domingos.
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