Passavam das 19h00 quando foi oficialmente aberta a exposição "Segunda Pele", de Arthur Bispo do Rosário, e "Território", de Nivaldo de Lima, no Centro Cultural Palácio da Justiça. O primeiro recompõe o mundo através de uma "metáfora delirante" reciclando os materiais que encontrava pelo caminho. O segundo recompõe, através da fotografia, o território dos excluídos que perambulam na cidade de Manaus. Arte pra ninguém botar defeito.
Em vários momentos da cena cultural do século XX, para desqualificar uma obra bastava chamar o autor de "louco". Na linguagem pós-moderna, há quem prefira rotular de "lixo" a obra que lhe escapa ao entendimento.
Ora, Bispo do Rosário e Nivaldo de Lima conheceram os horrores da psiquiatria carcerária. O Bispo obteve uma vitória sobre a psiquiatria conservadora ao deixar de usar remédios para controlar o delírio. Deste fez o chão da sua vasta obra.
Já Nivaldo decidiu que nenhum tratamento pode prescindir da liberdade. Deu-se alta, jamais voltou ao hospital psiquiátrico, e desenvolveu uma aguda percepção sobre o "lixo" produzido pela sociedade contemporânea. Os painéis que encimam o andar superior do Palácio da Justiça espelham a grandeza do seu olhar.
Ambas as obras provocam no espectador, no mínimo, dois sentimentos: deleite e estranhamento. Nelas não se enunciam a verdade da loucura, tampouco a "louca" visão de mundo dos autores enunciam a verdade da arte.
Insondáveis são os mistérios da criatividade humana que resiste à decadência da sociedade industrial, num cenário em que muitos artistas não encontram mais na loucura um modo de marginalidade radical e contestação. Segundo Teixeira Coelho, esta migrou para o crime, o novo mercado da contestação. Teixeira nos lembra, a título de advertência, que Rimbaud, quando desistiu da poesia para traficar armas no norte da África, deixou de fazer poesia, tampouco vendeu-a para quem comprava suas armas.
O certo é que as obras em exposição no Palácio da Justiça são arte para além da loucura entendida como ideal romântico, arte como expressão da imensa diversidade cultural das gentes do povo brasileiro.
No flagrante fotográfico, Flávia Corpas, do Museu Bispo do Rosário de Arte Contemporânea, e o artista Nivaldo de Lima em êxtase estético.
A exposição das obras vai até o dia 9 de dezembro.
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