agosto 08, 2010

Marcus Vinicius parabeniza o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária

Nivaldo de Lima e Marcus Vinicius de Oliveira
20 anos de Luta Antimanicomial
Foto: Rogelio Casado - Bauru-SP, 2007

Sr. Presidente do CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA
DD. Doutor Geder Luiz Rocha Gomes


Na condição de militante  do Movimento Antimanicomial e da luta pelos  Direitos Humanos venho pela presente parabenizar e reconhecer a importancia histórica da resolução, ora editada pelo CNPCP, que estabelece um novo patamar para a abordagem da relação crime e justiça, com importantes efeitos para a vida de milhares de portadores de transtornos mentais. Desde a nossa campanha de Direitos Humanos realizada pelo Conselho Federal de Psicologia em idos de 1998 - "Manicômios Judiciários: o Pior do Pior!", em que desvelamos e denunciamos os absurdos destas casas, passando pela ousada experiência pioneira do Tribunal de Justiça de Minas Gerais , através da criação da metodologia do PAIPJ e o surgimento de seus sucedâneos como o PAILI de Goiás, e as inúmeras iniciativas militantes que insistiram na promoção deste debate, tais como as ações no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul,  a edição desta resolução vem coroar um processo de lutas e realizar um importante acerto de contas da justiça para com a própria justiça.
Certamente a implementação desta resolução ainda enfrentará os grandes desafios dos preconceitos, dos imaginários da periculosidade, do despreparo técnico dos profissionais para esta "clinica do risco calculado" mas com a resolução o Estado Brasileiro certamente deu um importante passo no que diz respeito a tratar com dignidade e justiça a estes que fazem parte dos elos mais frágeis dos vínculos sociais. Como sempre afirma a nossa colega Fernanda Otoni , idealizadora do PAIPJ-MG, os portadores de transtornos mentais quando comentem algum crime, invariavelmente revelam  uma lacuna das políticas publicas que deveriam ter-lhe garantido outras possibilidades...
Assim saúdo aos integrantes deste CNPCP pela coragem de se fazer "a coisa certa" e especialmente ao seu presidente pela liderança exercida rumo a tão importantes transformações.

Atenciosamente,

 
--
Prof. Marcus Vinicius de Oliveira
IPSI-UFBA

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RESENHA / D.O. U / SEÇÃO: 1
  
EDIÇÃO Nº 146, SEGUNDA-FEIRA, 2 DE AGOSTO DE 2010
SEÇÃO 1

CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA

RESOLUÇÃO No- 4, DE 30 DE JULHO DE 2010

Dispõe sobre as Diretrizes Nacionais de Atenção aos Pacientes Judiciários e Execução da Medida de Segurança.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA, no uso de suas atribuições legais, previstas no Art. 64, I, Lei nº 7.210/84, CONSIDERANDO a Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental; CONSIDERANDO os princípios e diretrizes aprovados na III Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada de 11 a 15 de dezembro de 2001; CONSIDERANDO os princípios e diretrizes aprovados na IV Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada de 27 de junho a 1 de julho de 2010; CONSIDERANDO a Resolução N° 5, de 4 de maio de 2004, deste Conselho, que dispõe a respeito das diretrizes para o cumprimento das medidas de segurança, adequando-as à previsão contida na Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001; CONSIDERANDO a Resolução N° 113, de 20 de abril de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que, entre outras providências, dispõe sobre o procedimento relativo à execução de pena privativa de liberdade e medida de segurança; CONSIDERANDO, finalmente, o aprendizado a partir do amadurecimento de programas pioneiros no Brasil de atenção a pacientes judiciários adotando a política antimanicomial; resolve:

Art. 1º - O CNPCP, como órgão responsável pelo aprimoramento da política criminal, recomenda a adoção da política antimanicomial no que tange à atenção aos pacientes judiciários e à execução da medida de segurança.
§ 1° - Devem ser observados na execução da medida de segurança os princípios estabelecidos pela Lei 10.216/2001, que dispõe sobre a proteção dos direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial de tratamento e cuidado em saúde mental que deve acontecer de modo antimanicomial, em serviços substitutivos em meio aberto;
§ 2° - Devem ser também respeitadas as seguintes orientações:

I - Intersetorialidade como forma de abordagem, buscando o diálogo e a parceria entre as diversas políticas públicas e a sociedade civil e criando espaços e processos integradores de saberes e poderes;
II - Acompanhamento psicossocial contínuo, realizado pela equipe interdisciplinar que secretaria o transcurso do processo e oferece os recursos necessários para a promoção do tratamento em saúde mental e invenção do laço social possível compartilhando os espaços da cidade, bem como realiza a coleta de subsídios que auxiliem na adequação da medida judicial às condições singulares de tratamento e inserção social;
III - Individualização da medida, respeitando as singularidades psíquicas, sociais e biológicas do sujeito, bem como as circunstâncias do delito;
IV - Inserção social, que promove a acessibilidade do sujeito aos seus direitos fundamentais gerais e sociais, bem como a sua circulação na sociedade, colocando-o de modo responsável para com
o mundo público;
V - Fortalecimento das habilidades e capacidades do sujeito em responder pelo que faz ou deixa de fazer por meio do laço social, através da oferta de recursos simbólicos que viabilizem a resignificação de sua história, produção de sentido e novas respostas na sua relação com o outro;

Art. 2° - A abordagem à pessoa com doença mental na condição de autor do fato, réu ou sentenciado em processo criminal, deve ser objeto de atendimento por programa específico de atenção destinado a acompanhar o paciente judiciário nas diversas fases processuais, mediando as relações entre o Poder Judiciário e o Poder Executivo, visando à promoção da individualização da aplicação das penas e medidas de segurança e no encaminhamento das questões de execução penal dos pacientes judiciários;

I - A União e os Estados devem garantir que o programa específico de atenção ao paciente judiciário tenha extensão em todo o território nacional, podendo contar nos Estados com uma estrutura central e núcleos regionais ou municipais.

Art. 3º - São responsabilidades do programa específico de atenção ao paciente judiciário:

I - promover o estudo e o acompanhamento dos processos criminais e infracionais em que figurem pacientes judiciários, visando à elaboração de projeto individualizado de atenção integral;
II - realizar o acompanhamento psicológico, jurídico e social do paciente judiciário usando a rede substitutiva de serviços de saúde mental;
III - manter contato e articulação intersetoriais, em caráter permanente, com:
a) a rede pública de saúde, visando a efetivar a individualização do projeto de atenção integral;
b) a rede social, visando à promoção social do paciente judiciário e à efetivação das políticas públicas pertinentes ao caso;

IV - realizar discussões com peritos criminais nos casos em que houver exame de sanidade mental e cessação de periculosidade, apresentando, em caso de determinação judicial, dados relativos ao acompanhamento do paciente;
V - emitir relatórios e pareceres ao juiz competente sobre o acompanhamento do paciente judiciário nas diversas fases processuais;
VI - sugerir à autoridade judicial medidas processuais pertinentes, com base em subsídios advindos do acompanhamento clínico- social;
VII - prestar ao juiz competente as informações clínicosociais necessárias à garantia dos direitos do paciente judiciário.

Parágrafo único - Para o cumprimento das responsabilidades de que trata este artigo, serão realizadas diligências externas, sempre que necessário.

Art. 4º - Em caso de internação, mediante o laudo médico circunstanciado, deve ela ocorrer na rede de saúde municipal com acompanhamento do programa especializado de atenção ao paciente judiciário.
Parágrafo único - Recomenda-se às autoridades responsáveis que evitem tanto quanto possível a internação em manicômio judiciário.

Art. 5º - O paciente judiciário há longo tempo internado em cumprimento de medida de segurança, ou para o qual se caracterize situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de ausência de suporte social, será encaminhado para
política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, conforme previsão no art. 5º da Lei 10.216, de 2001.

Art. 6º - O Poder Executivo, em parceria com o Poder Judiciário, irá implantar e concluir, no prazo de 10 anos, a substituição do modelo manicomial de cumprimento de medida de segurança para o modelo antimanicomial, valendo-se do programa específico de atenção ao paciente judiciário.
§ 1° - Será realizado levantamento trimestral de dados estatísticos sobre as medidas de seguranças impostas e executadas, de incumbência dos órgãos responsáveis pelos internamentos e tratamentos impostos.
§ 2° - O levantamento a que se refere o parágrafo anterior será realizado por equipe constituída pelo Ministério da Justiça, Ministério da Saúde, Ministério do Desenvolvimento Social e Conselho Nacional de Justiça.

Art. 7º - Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
GEDER LUIZ ROCHA GOMES

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