setembro 21, 2012

Vale a pena ler de novo: texto sobre corte de árvores em Manaus

PICICA: O corte de uma castanholeira em frente ao meu consultório é de 2003 (administração Alfredo Nascimento); o texto abaixo veio à luz quando uma floresta urbana foi posta abaixo (administração Serafim Corrêa) no ano de 2008. O corte da mangueira do largo de São Sebastião, ao lado do Teatro Amazonas, neste ano de 2012 (administração do Prefeito Amazonino Mendes, licenciado para tratamento de sáude), ensejou a (re)postagem de hoje. As agressões conduzidas pelo poder público não são fato isolado. Em todos os cantos da cidade as agressões ambientais se multiplicam, sob o olhar cúmplice da maioria dos nossos parlamentares. Por tudo isso, acho inútil mudar o 'feitor' da colônia, sem mudar o hábito de alguns colonos. Eles se merecem. Precisamos urgentemente de novas formas de governar a cidade. EM TEMPO: Já que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente vai plantar 50 mudas  para compensar a mangueira sacrificada no largo de São Sebastião, aproveitem senhores para plantar um ipê no lugar da castanholeira sacrificada em 2003 em frente do meu consultório. A cidade agradece. Só assim vovó Maria e o comandante Rogelio Casado Marinho, meu pai, finalmente poderão descansar em paz. Amém!

A dor de Elisa

Foto: Rogelio Casado - Violência institucional, Manaus-AM, 2003
O pombinho ainda procura a árvore que sombreava o parapeito do prédio onde costumava repousar nas tardes ensolaradas de Manaus.
"Corta no toco" - Como é que o senhor quer o corte, 'dotô'? - pergunta, pelo celular, o zeloso funcionário público. Maninho, corta no toco e 'tamos conversado - respondeu do outro lado da linha a 'otoridade' em pessoa.

O chefe mandou dizer que um pedido seu é uma ordem (a ligação cai)... Égua do mal educado, nem agradeceu - resmungou a criatura entrando num automóvel, a serviço da prefeitura, e dirigindo-se para o local onde mais uma árvore seria sacrificada, sem que a autoria do pedido fosse conhecida.

Algumas semanas antes várias árvores desapareceram próximo à praça do Colégio N.S. Auxiliadora. Nesta última, um grupo de teatro local chegou a realizar uma manifestação de protesto. Na primeira, não ouve choro nem vela. A não ser o meu. Choro de dor e de impotência.

A árvore em questão havia sido plantada por mim e por meu pai há mais de trinta anos passados, defronte à casa de minha avó Maria, na rua dos Andradas, numa época em que a civilização do automóvel ainda não contribuira de maneira decisiva para tornar um inferno a região onde nasci - área portuária de Manaus -; inferno que, por extensão, findou por estender-se a todo o perímetro urbano. O contrasenso é que no período dos cortes dessas árvores o prefeito Alfredo Nascimento estava plantando palmeiras imperiais num extenso corredor viário, a preços salgados.

E pensar que os cuidados oferecidos por minha amada avó não custou um centavo para os cofres da prefeitura - responsável constitucional em zelar pelo patrimônio urbanístico -, e ainda ajudou a humanizar a cidade, melhorando a qualidade de vida, tão celeremente destruída pela ocupação desordenada da urbe nos anos vindouros.

O diálogo acima é fictício. O fato, não. Alguém com poder de mando determinou o corte de uma castanholeira plantada por um ato de amor à cidade. Nem podia ser diferente. Meu pai nasceu e foi criado na cidade de Belém - terra das mangueiras -, onde sabidamente um sentimento coletivo preserva o verde dos espaços públicos. Contraditoriamente, os paraenses não conseguiram manter de pé as florestas do seu território; o que decididamente não é o caso do Amazonas, salvo ao sul do estado onde o 'bicho tá pegando'.

Contradições à parte, saí em busca dos meus direitos de cidadão. O que se passou entre a pessoa física e o Ministério Público de Estado do Amazonas é digno de ir para os anais da obra de Stanislaw Ponte Preta. Mas essa é uma outra história.

Tudo isso veio à baila quando li o texto enviado pela pesquisadora do INPA Elisa Wandelli, de quem fui vizinho, nos anos 1980, no conjunto Acariquara, um dos poucos condomínios que respeitou, durante sua construção, o verde existente na área. Por um defeito no meu computador, deixei de publicá-lo.

O texto de Elisa trata do fim que foi dado à pequena floresta urbana da Magistral, local onde está sendo erguido um shopping center, entre as ruas Recife e Paraíba (ruas que haverão de serem assim lembradas pelo cidadão comum, a despeito da mudança dos nomes; se vivos, os homenageados teriam criticado a iniciativa - tanto o jornalista Humberto Calderaro, quanto o historiador Mario Ypiranga). A força do seu texto não passou desapercebida pelo imortal Ribamar Bessa, criador da coluna Taquiprati, tendo sido publicada no dia 27 de janeiro naquele espaço (Desculpas manauaras). 

De alguma maneira, a decepção de Elisa com as autoridades se assemelham ao que vivi por ocasião da perda da árvore plantada por meu pai em via pública. Se no meu caso, junto ao MP, houve uma falha individual da autoridade, é preocupante quando a instituição não consegue sustentar os direitos coletivos. O raciocínio vale também para os órgãos ambientais. 

Moral da história: A julgar por Elisa, como disse Adorno, as pessoas ainda são melhores do que a cultura em que vivem.

Por essa e por outras que o meu considerado Ribamar Bessa há três domingos vem elegendo as árvores de Manaus - inclusive a jaqueira da Preta - como objeto de sua crônica. A deste domingo tá imperdível. Confira no Taquiprati.

A luta continua.

***

TAQUI PRA TI

DESCULPAS MANAUARAS
José Ribamar Bessa Freire
27/01/2008 - Diário do Amazonas

Por que quase sempre os bandidos ganham e os mocinhos perdem, tanto na vida real como nas telenovelas? O teatrólogo alemão Bertold Brecht acha que “os bons perdem não porque são bons, mas porque são fracos”. A derrota, portanto, não é inerente à bondade, mas à fraqueza. Basta, então, que os bons fiquem fortes, para que os malvados sejam derrotados. É a lição que precisa ser aprendida por todos aqueles que lutam para conservar os espaços verdes de Manaus. Esse é o sentido da mensagem de Elisa Wandelli, que se destacou nessa luta. O espaço da coluna vai dedicado à sua carta, publicada abaixo na íntegra. Ela diz: Não podemos iniciar 2008 sem pedir desculpas por não termos conseguido preservar o fragmento florestal situado entre as avenidas Paraíba e Recife, conhecido como "Igarapé da Magistral", que apesar do apelo popular teve sua destruição autorizada pelos órgãos ambientais (SEMMA e IPAAM) para construção do Shopping da Sonae Sierra e cujo desmatamento iniciou-se no dia mundial do meio ambiente em 2007. Pedimos desculpas às gerações passadas e futuras, aos moradores de Adrianópolis, desde os mais humildes até os residentes nos prédios de alto padrão, que sofreram igualmente com o desmatamento; às idosas senhoras que choraram pela preservação da área de lazer de suas infâncias; às donas de casa indignadas com o destino das cotias, das preguiças, dos gaviões, e aos jovens liderados por Gustavo Nogueira, que nos procuraram para ajudá-los a salvar a floresta. Infelizmente rechaçamos suas idéias de "amarrarem-se às arvores", convencendo-os, ilusoriamente, que o caminho correto seria denunciar aos órgãos ambientais e ao Ministério Público. Pedimos desculpas especiais a todos que usaram o dom da palavra para bradar contra o desmatamento: ao José Ribamar Bessa, que com o "Taqui pra ti" do "Diário do Amazonas" clamou a infância de todos e a importância de preservarmos o Igarapé da Magistral com as inteligentes e hilárias, mas sensíveis e deliciosas crônicas endereçadas ao presidente do Grupo Sonae Sierra (O Shopping e a floresta - 10/06/2007)) e ao Belão, presidente da ALE, solicitando que o shopping fosse construído em outra área (Entre a maloca e o castelo - 24/06/2007).

Leia mais na coluna Taquiprati


fevereiro 17, 2008

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