setembro 19, 2012

"Open source, política e economia para o século XXI", por Moysés Pinto Neto

PICICA: "Mais do que nunca, o Estado está à beira da falência. Não apenas falência econômica, pois sabemos que a próxima grande crise está relacionada às dívidas públicas contraídas para salvar banqueiros e evitar o colapso geral do sistema, mas uma falência no sentido do reconhecimento de dar conta das próprias demandas que estão sendo ventiladas. Poder Executivo e Legislativo estão amarrados a uma estrutura corrupta (lícita e ilícita) que envolve financiamento de campanha e círculos viciosos em que não raro os agentes trabalham apenas para se conservarem e reproduzirem. Por outro lado, mesmo aqueles que desejam mudanças se sentem esmagados pela pressão colossal que emana de uma estrutura aparentemente invencível, seja pela estabilidade com que essas máfias se apropriaram do espaço público, seja pela ausência de alternativas por dentro capazes de reverter significamente o quadro geral. Isso sem mencionar a própria “globalização”, isto é, internacionalização dos mercados, que leva a uma pressão externa capaz de abalroar qualquer projeto alternativo à “ortodoxia” econômica que, na prática, é apenas uma doxa para manter bem ricos os poderosos. Por fim, o Poder Judiciário também vê mais do que nunca a insustentabilidade da sua expansão, o malefício mortífero da burocratização dos conflitos humanos e a tentativa frustrada de incorporar o papel de transformador social em instituições que são compostas majoritariamente por agentes conservadores"

OPEN SOURCE, POLÍTICA E ECONOMIA PARA O SÉCULO XXI

Os movimentos de 2011 têm indicado um esgotamento das duas formações fundamentais que a Modernidade nos legou: o Estado e o capitalismo. É verdade que essa frase pode parecer muito vaga e talvez arriscada, pois se está tocando em duas placas tectônicas do nosso mundo, mas parece que ambos processos estão chegando a um momento de esgotamento, ainda que ele não se faça visível a todos.

Mais do que nunca, o Estado está à beira da falência. Não apenas falência econômica, pois sabemos que a próxima grande crise está relacionada às dívidas públicas contraídas para salvar banqueiros e evitar o colapso geral do sistema, mas uma falência no sentido do reconhecimento de dar conta das próprias demandas que estão sendo ventiladas. Poder Executivo e Legislativo estão amarrados a uma estrutura corrupta (lícita e ilícita) que envolve financiamento de campanha e círculos viciosos em que não raro os agentes trabalham apenas para se conservarem e reproduzirem. Por outro lado, mesmo aqueles que desejam mudanças se sentem esmagados pela pressão colossal que emana de uma estrutura aparentemente invencível, seja pela estabilidade com que essas máfias se apropriaram do espaço público, seja pela ausência de alternativas por dentro capazes de reverter significamente o quadro geral. Isso sem mencionar a própria “globalização”, isto é, internacionalização dos mercados, que leva a uma pressão externa capaz de abalroar qualquer projeto alternativo à “ortodoxia” econômica que, na prática, é apenas uma doxa para manter bem ricos os poderosos. Por fim, o Poder Judiciário também vê mais do que nunca a insustentabilidade da sua expansão, o malefício mortífero da burocratização dos conflitos humanos e a tentativa frustrada de incorporar o papel de transformador social em instituições que são compostas majoritariamente por agentes conservadores.

A descrença na burocracia pública e no Estado central é generalizada.

De outro lado, o “capitalismo”, para ser mais específico esse sistema baseado na economia de mercado que hoje é sustentado por um aparato técnico-industrial movido pela demanda de consumo igualmente está em vias de colapso. Em primeiro lugar, porque já se fazem sentir os sintomas sociais de esgotamento psíquico dos sujeitos diante da demanda fetichista do consumo, no processo que Bernard Stiegler descreve como destruição da economia libidinal e Christoph Türcke como o enfraquecimento das conexões neurais que levaram o humano, historicamente, ao pensamento; para ambos autores (e tantos outros), os efeitos colaterais desse processo são gigantescos. Em segundo lugar, mais importante é evidentemente o impacto ecológico desse sistema baseado no consumo e na troca utilitária: mais do que nunca, é evidente a insustentabilidade do crescimento baseado no consumo e da produtividade baseada no domínio aterrador do humano sobre a natureza. O pensamento do século XXI é eminentemente um pensamento ecológico, pois se preocupar com a ecologia é hoje em dia pensar o fim do mundo que se avizinha a continuarmos nos mesmos trilhos.

Horizonte parece sinistro, não fosse o fato de que podemos igualmente ver transformações práticas no mundo. Não apenas pelos movimentos sociais 2.0, pela juventude que reivindica a construção de uma nova forma-de-vida não-burocrática e ecologicamente viável, mas pela própria dinâmica interna da produção das relações humanas. Nesse sentido, o capitalismo não foi invenção de Adam Smith, mas um fenômeno que foi se produzindo gradualmente até ganhar seu aparato teórico. Da mesma forma, a Open Source – baseada na economia contributiva, no renascimento da dádiva e na descentralização como princípio – pode ser um pharmakon terapêutico para um novo modelo político e econômico. Político, pensando-se na possibilidade anarquista do fim do Estado burocrático centralizado, péssima invenção recente e hoje totalmente naturalizada. Econômico, se pensarmos na possibilidade de circulação de valor sem que necessariamente isso corresponda a uma troca simétrica, isto é, a dinheiro. Tudo isso não está sendo produzido por intelectuais anticapitalistas de esquerda, mas pelo próprio fluxo de relações espontâneas que vão surgindo nesse século que apenas está começando.

Moysés Pinto Neto
Pesquisador trandisciplinar da violência. Doutorando em Filosofia (PUCRS). Professor da ULBRA.

Fonte: O Ingovernável

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