PICICA: "O estudo completo foi publicado no livro “Custódia e Tratamento Psiquiátrico no Brasil: Censo 2011”, de Debora Diniz. O livro, com tiragem de 3 mil exemplares, está sendo distribuído pelo Ministério da Justiça para bibliotecas, centros de pesquisa, órgãos e agências governamentais no campo da saúde mental e do sistema prisional, gestores, ministério público e demais instâncias jurídicas, além de OABs e Conselhos Federais ligados ao tema, entre outros. O livro também foi publicado em versão eletrônica. O e-book, com download e distribuição gratuita, pode ser encontrado aqui." EM TEMPO: A dica é do ex-Vice Presidente do Conselho Federal de Psicologia Marcus Vinicius Oliveira.
Prisão perpétua em Manicômios Judiciários: Primeiro Censo revela violações de direitos em hospitais de custódia
Estudo sistematiza, pela primeira vez, as informações psiquiátricas, jurídicas e sociodemográficas de uma população invisível e vulnerável: "os loucos infratores"
Censo nos Estabelecimentos de Custódia e Tratamento Psiquiátrico 2011 |
Ser contado é uma forma de existir. A partir de agora, os loucos infratores internados em hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico e alas psiquiátricas em presídios em todo o Brasil passaram a existir. O Censo nos Estabelecimentos de Custódia e Tratamento Psiquiátrico 2011, contou 3.989 homens e mulheres vivendo em regime de clausura para tratamento psiquiátrico compulsório por determinações judiciais: um contingente temido, pois são indivíduos tidos como perigosos para a vida social. Entretanto, o estudo mostra que o diagnóstico psiquiátrico de sofrimento mental não é o que determina a periculosidade de uma pessoa. O estudo foi financiado pelo Ministério da Justiça, por meio do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN).
Principais resultados
Campo psiquiátrico: não há periculosidade inerente aos diagnósticos psiquiátricos. Há uma concentração populacional de esquizofrênicos o que deve indicar um filtro de entrada pelas perícias psiquiátricas, mas não uma periculosidade inerente a esse grupo. Indivíduos com diferentes diagnósticos psiquiátricos cometem de forma semelhante mesmas infrações penais. Ao contrário da clínica psiquiátrica civil, em que não há previsões de internação por tempo longo prédeterminado, o tempo médio de medida de segurança sem conversão de pena é de seis anos no país.
Campo penal: não são garantidas as determinações legais de permanência, laudos e decisões judiciais. A média de atraso para laudos psiquiátricos (10 meses, sendo que a legislação determina até 45 dias), média de atraso para exames de cessação de periculosidade (32 meses, sendo que a legislação determina a cada 12 meses), a presença de 606 indivíduos internados há mais tempo que a pena máxima em abstrato para a pena relativa ao ato infracional cometido, e a identificação de 18 indivíduos internados há mais de 30 anos são indicativos de graves violações de direitos.
A recidiva específica para homicídio é de 1% no total da população e de 5% no total da população em medida de segurança, o que contesta a hipótese da grave periculosidade penal do louco.
Com uma esquizofrenia residual e deficit de atenção e inteligência, Reginaldo (D) está há 31 anos detido em Salvador, tempo superior ao máximo permitido no país Foto: Iano Andradade |
Campo social: o perfil da população internada em medida de segurança representa a desigualdade do país: indivíduos negros, com baixa escolaridade, periférica inserção no mundo do trabalho, sem vínculos familiares. Há uma concentração de 12 homens para cada mulher, o que torna a situação das mulheres ainda mais dramática dado o perfil do crime cometido por elas (majoritariamente homicídio contra a família) e a baixa presença populacional para a garantia de direitos.
Campo legal: a medida de segurança se justifica por um dispositivo frágil do ponto de vista psiquiátrico e penal – a periculosidade do indivíduo. A medida de segurança não deve ser aplicada por tempo indeterminado, mas 17% da população internada após a Lei 10.216/2001 recebeu medida de segurança por tempo indeterminado. O segundo grupo populacional internado é de deficientes mentais (classificados pelo CID 10 como “retardo mental), sendo 16% da população total. O Brasil é signatário da Convenção de Pessoas Portadoras de Deficiência, a primeira do século XXI, em que se proíbe o tratamento da deficiência por confinamento.
Dados
A pesquisa apresenta dados nacionais e por instituição como a população total, população em medida de segurança, população temporária, proporção entre mulheres e homens, infrações penais mais comuns, população internada por instituição, indivíduos internados há mais tempo que a pena máxima em abstrato para a infração cometida, indivíduos internados há mais de trinta anos, quem são as vítimas dos indivíduos que cometeram crimes contra a vida, média de espera por laudos e exames de cessação de periculosidade, entre outros.
Avaliação
Os Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico são instituições híbridas de confinamento penal e internação psiquiátrica. Elas abrigam indivíduos pobres, analfabetos, negros e em sofrimento mental, os desaparecidos da vida social. A periculosidade não é demonstrada pelos diagnósticos psiquiátricos nem pela trajetória criminal dos indivíduos. A reforma psiquiátrica dos anos 2000 não atingiu os HCTPs: a loucura ainda é mantida sob encarceramento para a proteção social. Políticas sociais devidas a essa população – em particular saúde e assistência – são periféricas para a
garantia de direitos. O principal direito violado é o direito a estar no mundo. Esses são indivíduos em regime de abandono perpétuo.
A pesquisa foi realizada pela Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, presidida pela médica Cássia de Castro. A coordenadora geral da pesquisa foi a antropóloga Debora Diniz, professora da Universidade de Brasília e pesquisadora da Anis. A entidade co-executora foi a Universidade de Brasília. Outros centros e institutos de pesquisa atuaram como consultores e
especialistas em diferentes etapas da pesquisa, tais como: IPUB/UFRJ; IBCCRIM; Ministério Público Federal; UERJ; Fiocruz; MPDFT; Justiça Federal; e MPGO.
Publicação
O estudo completo foi publicado no livro “Custódia e Tratamento Psiquiátrico no Brasil: Censo 2011”, de Debora Diniz. O livro, com tiragem de 3 mil exemplares, está sendo distribuído pelo Ministério da Justiça para bibliotecas, centros de pesquisa, órgãos e agências governamentais no campo da saúde mental e do sistema prisional, gestores, ministério público e demais instâncias jurídicas, além de OABs e Conselhos Federais ligados ao tema, entre outros. O livro também foi publicado em versão eletrônica. O e-book, com download e distribuição gratuita, pode ser encontrado aqui.
Com informações: Anis
Fonte: Arma Branca
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